TROIKIANOS, CONFESSEMO-NOS!
Como Nietzsche poderia ter dito, «nós, os que somos donos da verdade, não nos conhecemos a nós próprios» e tendemos a exigir aos troikófagos que nos compreendam sem que nos dignemos explicar-lhes por que somos troikianos. E o pior é que nem sempre temos plena consciência das nossas razões.
E porque – começando pelas nossas – as explicações primam pela ausência, logo saltam impropérios de lado a lado com ofensas graves às honestas mães da nossa banda. Não é esse o nosso estilo, procuremos pôr-lhe um fim.
Confessemos, pois, esta nossa falta e tentemos que os troikófagos entendam as nossas razões. Mais: façamo-lo com humildade e ponhamo-nos em posição de polir as arestas que os nossos raciocínios possam apresentar.
Expliquemos-lhes que a nossa aceitação dos troikistas resulta apenas do facto de eles serem os detentores das «massas» que nós não temos e de que precisamos como de pão para a boca. E isto, no sentido literal.
Expliquemos-lhes que não somos traidores à Pátria e é com enorme pesar que os vemos entrar pela nossa «casa» dentro “amandando bitaites” sobre o modo como devemos resolver os problemas que eles nos apontam. E essas são condições «sine qua, non» para que nos forrem a tesouraria, essa que esvaziámos ao longo de algumas décadas.
Sim, já depois de em 1975 os EUA nos terem abonado com um monte de divisas para então não cessarmos pagamentos externos e depois das visitas de Teresa Ter-Minassian, a Técnica do FMI que nos habilitou à toma de algum juízo para podermos ter o aval daquela instituição por duas vezes, em 1977 e 1983.
Expliquemos-lhes que desde 1974 esta já é a quarta vez que a nossa banca vai à glória e que isso se deve aos descaminhos por que gostamos de andar.
Expliquemos-lhes que esta insistência do FMI na ajuda ao nosso país se deve não ao erro das políticas que eles preconizam para Portugal mas sim ao nosso desvario logo que eles voltam costas.
Expliquemos-lhes que o «modelo de desenvolvimento» que alguém se entreteve a construir destruindo o tecido produtivo nacional, promovendo o consumo e dando prioridade aos bens não transaccionáveis, era insustentável pois não se pode imaginar uma sociedade quase inteira a consumir sem produzir. E era isso que acontecia até ao momento em que os meios de pagamento ao dispor dos consumidores foram há pouco tempo reduzidos com alguma severidade.
Expliquemos-lhes que o novo modelo de desenvolvimento não tem que ser determinado pelo Governo – este ou outro que lhe suceda – mas sim por nós, os que estamos a passar por dificuldades.
Expliquemos-lhes que o fim da crise depende de cada um de nós e que aos governantes apenas cabe impedir o desastre.
Expliquemos-lhes que também nós não queremos ser tutelados por estrangeiros ou nacionais e que quanto mais tempo demorarmos a produzir o que queremos consumir, mais difícil será sairmos do entorpecimento a que anos de aconchego nos conduziram.
Expliquemos-lhes que está na hora de cada um dar a volta por cima e que não é tarde para aprender a fazer alguma coisa de útil.
Expliquemos-lhes que não é indo para o jardim público jogar à batota, chorar no ombro dos amigos ou blasfemar na tasca da esquina que se consegue dar essa volta por cima; há que ir ao biscate e o Gaspar que se lixe!
Sim, essa é conversa que talvez os troikófagos entendam: «o Gaspar que se lixe, vamos todos ao biscate!».
Amigos troikianos, conheçamo-nos a nós próprios e confessemos a nossa grande falta. Qual? O silêncio, amigos!
Março de 2013,