RESUMO DA PALESTRA PROFERIDA EM 7 DE AGOSTO DE 2004 NO CASTELO DE TAVIRA A CONVITE DO ELOS CLUBE
Apenas abordei matérias axiomáticas de modo a servir de pretexto para reflexão sobre o desenvolvimento de Tavira como parcela da sociedade portuguesa. Foram propositadamente ignorados todos os posicionamentos partidários de modo a que de seguida se possa partir para a fixação de parâmetros comuns sem querelas de índole política.
Como pressuposto, considero que o desenvolvimento das nações resulta sobretudo da cultura e nível educacional das populações e só marginalmente depende de condicionalismos geográficos ou da existência de recursos naturais.
No ano de 1998, o grupo etário dos 25 aos 64 anos tinha os seguintes níveis máximos de educação formal:
Básico-Secundário-Superior
PORTUGAL: 80-11-9
Espanha: 67-14-19
Suécia: 22-48-30
França: 39-40-21
EUA: 14-51-35
Em 2000, tivemos em Portugal uma taxa de cerca de 50% de abandono escolar precoce (incumprimento do ensino obrigatório).
Tendo a AIP Associação Industrial Portuguesa proposto em 2003 ao Governo e ao empresariado que se criassem as condições para que Portugal se passasse a igualar aos países europeus mais evoluídos num prazo de 10 anos com base no diagnóstico e nas medidas propostas na Carta Magna da Competitividade, o então Ministro da Economia respondeu publicamente ao desafio com um prazo de 5 anos.
As propostas-base inseridas naquele documento e recebidas como boas tanto pelo Governo como pelo empresariado, respeitam sobretudo à valorização dos recursos humanos portugueses, nomeadamente no que respeita aos níveis de educação formal e de formação profissional.
Mantendo o prazo de 10 anos e apontando como objectivo para 2014 que passemos a dispor de uma estrutura educativa semelhante à sueca em 1998 (15 anos de atraso), isso implicaria que anualmente e em cada um desses 10 anos, com base no Recenseamento Geral da População de 2001:
- Déssemos alguma instrução a cerca de 150.000 pessoas que não possuíam qualquer grau de ensino (analfabetas, com grande probabilidade);
- Fizéssemos completar o Ensino Básico a mais cerca de 6.500 alunos, para além dos que normalmente já o fazem;
- Fizéssemos anualmente completar o Secundário a mais cerca de 90.000 alunos, também para além dos que já o fazem;
- Fizéssemos anualmente concluir uma qualquer licenciatura a mais cerca de 57.000 portugueses, para além dos que já o fazem.
A resposta ministerial de 5 anos foi totalmente irrealista e nem sequer vemos a Nação mentalizada para um esforço educativo tão grande no prazo de 10 anos.
Esqueçamos, pois, a facilidade com que um Ministro diz coisas e tratemos de assuntos sérios.
Vejamos então o que Tavira deveria fazer em 10 anos para ficar só 15 anos atrasada em relação à Suécia.
Conforme o Recenseamento Geral da População de 2001, residiam no Concelho de Tavira 24.997 pessoas (arredondámos para 25 000).
Admitindo que o Concelho tenha uma estrutura educativa semelhante à média nacional, o esforço educativo concelhio deveria ser sensivelmente como segue:
- Dar anualmente e durante 10 anos consecutivos alguma instrução (antiga 2ª classe da instrução primária, por exemplo) a 358 adultos o que equivale a cerca de 24 turmas com 15 alunos e a 24 professores com experiência na educação daquele tipo de alunos;
- Fazer anualmente e durante 10 anos concluir o ensino básico (antiga 4ª classe da instrução primária) a mais 280 alunos, o que equivaleria a mais 10 turmas de 28 alunos (adultos, na maior parte, o que significa separação do ensino das crianças);
- Idem, para o Secundário a mais 785 alunos, o que equivaleria a mais um Liceu, para além do que já existe;
- Idem, para a licenciatura de mais 485 tavirenses, o que equivaleria a ter que trazer o Ensino post-Secundário para a cidade.
A expressão numérica do esforço descrito dá uma ideia clara da magnitude dos trabalhos a desenvolver a nível nacional para que em 2014 apenas se consiga um atraso de 15 anos em relação à Suécia e a nível concelhio essa expressão não deixa por certo de ser altamente preocupante porquanto no diagnóstico se perfilam como necessárias várias acções da responsabilidade autárquica (ensino básico) para as quais poderá não haver disponibilidade orçamental.
A nível concelhio, não se pode esperar grande progresso se os seus jovens têm que abandonar a residência da sua naturalidade se quiserem progredir na carreira educativa ou de formação profissional; admite-se com facilidade que os estudantes-emigrantes dificilmente regressam à terra da sua naturalidade depois de se arrumarem profissionalmente em ambientes mais ambiciosos: Faro, por exemplo.
Na fase de consolidação orçamental por que Portugal passa, não tem lógica propor políticas que impliquem novos esforços por parte de quaisquer verbas oriundas do Orçamento do Estado. Colhe, isso sim, a mobilização de outro tipo de verbas e, tendo-se como positivas as acções públicas em curso a nível dos ensinos primário e secundário (pese embora a quase suspensão das actividades de alfabetização de adultos e a muito discutível eficácia da acção globalmente desenvolvida pelo IEFP Instituto do Emprego e Formação Profissional), parece indispensável desenvolver uma acção de atracção do ensino post-Secundário a Tavira.
O novo ensino a instalar no Concelho deverá, no meu entender, prosseguir dois objectivos paralelos fundamentais:
- Proporcionar à juventude local o desenvolvimento das normais aspirações na vida intelectual e profissional suspendendo total ou parcialmente a actual necessidade de emigração;
- Cativar a juventude de outros Concelhos geograficamente próximos ou distantes que cá venham estudar.
Creio que não fará sentido tentar instalar mais cursos generalistas já muito desenvolvidos noutras cidades portuguesas (para quê mais um curso de Direito?) mas, em compensação, fará todo o sentido instalar cursos técnicos e tecnológicos de directa utilidade para a economia local assim como creio que poderá revestir enorme interesse a instalação de cursos únicos no país que possam atrair forasteiros que venham dinamizar a economia local no período escolar (Inverno, sobretudo) em complemento do que já sucede com o período de Verão pela exploração das virtualidades turísticas locais.
Sugere-nos a própria actuação governamental que decidiu instalar uma nova Universidade pública em Viseu e que, confrontado com a escassez de verbas públicas, recorreu a uma multinacional do ramo da electrónica para assumir essa missão em moldes que ainda não vieram a público mas que podemos imaginar como sendo aquela grande empresa a financiadora e definidora dos cursos e curricula a ministrar. Porque não imaginar que em Tavira se possa instalar uma Escola Superior de Arquitectura Naval? E porque não de Agricultura Mediterrânica? E uma de Fisioterapia em conjunto com a Cruz Vermelha Portuguesa que já cá tem um hospital dessa especialidade e com o Instituto Piaget cujo curriculum já está aprovado? E o Instituto de Novas Profissões cujo curso de Gestão Hoteleira já tem décadas de experiência? E que cursos poderão facultar a Tavira instituições tão importantes para o tecido empresarial português como o ISLA -Instituto Superior de Línguas e Administração, a Universidade Lusófona, etc.? A lista pode ser muito prolongada e eu creio que se deve fazer um desenvolvimento deste debate que agora lanço.
NOTA FINAL: seguiu-se longo e muito interessante debate em que participaram inúmeros membros da assistência, composta por cerca de 50 Sócios do Elos Clube de Tavira e, como seria de esperar, nada aconteceu.
Tavira, 7 de Agosto de 2004
Henrique Salles da Fonseca