O ESTATUTO DA MULHER
Verney escreveu, no séc. XVIII:
«Quanto à necessidade (eu acho-a grande) que as mulheres estudem: Elas, principalmente as mães de família, são as nossas mestras nos primeiros anos da nossa vida: elas nos ensinam a língua; elas nos dão as primeiras ideias das coisas. E que coisa boa nos hão-de ensinar, se elas não sabem o que dizem? Certamente que os prejuízos que nos metem na cabeça, na nossa primeira meninice, são sumamente prejudiciais em todos os estados da vida, e quer-se um grande estudo e reflexão para se despir deles. Além disso, elas governam a casa, e a direcção do económico fica na esfera da sua jurisdição. E que coisa boa pode fazer uma mulher que não tem alguma ideia de economia? Além disso, o estudo pode formar os costumes, dando belíssimos ditames para a vida....... Muito mais, porque não acho texto algum da lei, ou sagrada ou profana, que obrigue as mulheres a serem tolas e não saberem falar................... Enfim, esta matéria é de tanta consideração para a república, que um homem tão pio e douto como M. Fénelon, arcebispo de Cambrai, compôs um belíssimo tratado sobre esta matéria ("L'Éducation des Filles") (e, depois dele, alguns autores franceses e italianos que eu li) em que ensina como se deve regular este estudo, e as utilidades que dele se podem tirar. Ao que eu podia acrescentar algumas experiências e reflexões minhas, feitas sobre as aplicações que observei em algumas mulheres.»
("O Verdadeiro Método de Estudar").
Já no mesmo século de Fénelon, séc. XVII, mas contrariamente a este, o nosso D. Francisco Manuel de Melo se mostrava perfeitamente conservador, a esse respeito, na sua "Carta de Guia de Casados": «O marido tenha as vezes e sol em sua casa, a mulher as de lua; alumie com a luz que ele lhe der, e tenha também alguma claridade. A ele sustente o poder, a ela a estimação. Ela tema a ele, e ele faça que todos a temam ela.»
E mais adiante: «Não venho em que com a mulher se litigue, que é conceder-lhe uma igualdade no juízo e império, cousa de que devemos fugir. Faça-se-lhe certo que à sua conta não está o entender, senão o obedecer e fazer executar, ainda que não entenda. Mostre-se-lhe às vezes que havendo quando se casou entregado sua vontade ao marido, comete agora delito em querer usar daquilo que já não é seu..»
A máxima do Dr. Salles da Fonseca «Uma sociedade será tão mais evoluída quanto elevado for o estatuto da mulher» tem, naturalmente mais afinidade com as do iluminista Verney, conquanto neste as máximas modernizadoras sejam em função da valorização social, não por reconhecimento de paridade intelectual entre o homem e a mulher. Muito longe se estava ainda das lutas pela libertação da mulher, mas era um passo.
Mas a sociedade actual ainda privilegia o estatuto masculino, apesar de tantas mulheres que se distinguem, veremos se Ângela Merkel consegue endireitar o que tantos homens entortaram.