ÁLVARES DE AZEVEDO
Jovem poeta brasileiro do século XIX (1831-1852)
É espantoso e admirável que um rapaz seja capaz de se rir assim de si mesmo...
NAMORO A CAVALO
Eu moro em Catumby. Mas a desgraça
Que rege minha vida malfadada
Pôs lá no fim da rua do Catete
A minha Dulcineia namorada.
Alugo (três mil reis!) por uma tarde
Um cavalo de trote (que esparrela!)
Só para erguer meus olhos, suspirando,
À minha namorada na janela...
Todo o meu ordenado vai-se em flores
E em lindas folhas de papel bordado
Onde escrevo trémulo, amoroso
Algum verso bonito... mas furtado.
Morro pela menina, junto dela
Nem ouso suspirar de acanhamento...
Se ela quisesse eu acabava a história
Como toda a comédia - em casamento.
Ontem tinha chovido... que desgraça!
Eu ia a trote inglês ardendo em chama,
Mas lá vai senão quando uma carroça
Minhas roupas tafuis encheu de lama...
Eu não desanimei. Se Dom Quixote
No Rocinante erguendo a larga espada
Nunca voltou a medo, eu, mais valente,
Fui mesmo sujo ver a namorada...
Mas eis que no passar pelo sobrado
Onde habita nas lojas minha bela
Por ver-me tão lodoso ela irritada
Bateu-me sobre as ventas a janela...
O cavalo ignorante de namoros
Entre dentes tomou a bofetada,
Arrepia-se, pula, e dá-me um tombo
Com pernas para o ar, sobre a calçada.
Dei ao diabo os namoros. Escovado
Meu chapéu que sofrera no pagode,
Dei de pernas corrido e cabisbaixo
E berrando de raiva como um bode.
Circunstância agravante. A calça inglesa
Rasgou-se ao cair de meio a meio,
O sangue pelas ventas me corria
Em paga do amoroso devaneio!...
(Compilado de "Cancioneiro Alegre" de Camilo Castelo Branco)
Álvares de Azevedo morreu no Rio de Janeiro com 21 anos incompletos devido a uma tuberculose pulmonar e a um tumor na anca
causado pela queda de um cavalo, o mesmo, julgo eu, que ele nos conta na sua divertida poesia. Ele era um jovem brilhante e muito prometedor.
Joaquim Reis