Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

A bem da Nação

A MARINHA PORTUGUESA DE 1974 ATÉ AGORA - UM TESTEMUNHO - V

 

6-Período da Soponata

 

Até à ida em 1983 para a Soponata, estive como responsável de uma pequena empresa que fabricava embarcações e outros equipamentos em fibra de vidro o que me levou a estudar o desenvolvimento possível no estuário do Tejo de navegação de recreio para fins turísticos e de usufruto da população, uma vez que os custos dos postos de amarração seriam muito baixos.

 

Tal iniciativa esbarrou na inércia da APL e no pouco interesse dos municípios ribeirinhos, onde, aliás, só agora vai despontando lentamente alguma atenção pelas atividades náuticas.

 

Com a excepção da Marinha do Tejo que tanto deve ao Prof. Carvalho Rodrigues, e ao Sr. Carlos Salgado com quem trabalhei nos Amigos do Tejo, mas que poderá crescer mais se forem criadas condições operacionais que nem precisam de dinheiro do Estado para serem realizadas. Só é preciso haver decisões corretas.

 

Caso da Marina de Algés

 

No âmbito deste estudo surgiu a ideia de se construir em Algés uma grande marina, com cerca de 2000 postos de amarração, com duas bacias ficando entre elas a entrada e a extenção do Aquário Vasco da Gama que assim ficaria não só com mais área mas também com ligação direta ao mar.

 

 

Nessa altura já havia esforços para que fosse fechada a golada do Bugio o que defenderia mais a margem direita do rio, mas nada foi resolvido e o Presidente da AGPL, antigo colega meu no IST, acabou por me dizer que a ideia parecia boa, mas valia a pena fazer um concurso para ver se haveria algo melhor. O concurso ficou deserto, na minha opinião por estar mal feito, e nada se fez.

 

Aqui, e antes de entrar no tema da minha passagem pela Soponata convém recordar, embora resumidamente o que de mais relevante aconteceu na Marinha Mercante portuguesa nestes anos pós revolucionários, pois parece-me essencial para se melhor entender os acontecimentos desta década que culminaram com o maior desastre que este setor sofreu desde 1945.

 

Em 1975 surgem as ditas nacionalizações, que na verdade são apenas estatizações pois as empresas já eram nacionais, e as reivindicações sindicais que criam dificuldades crescentes à gestão das empresas de navegação além da perda do negócio mais rendoso que era o do transportes para e das ex colónias, como foi o caso da CNN e da CTM extintas em 1985, acumulando dezenas de milhões de contos de prejuízo e milhares de desempregados.

 

Para se ter uma ideia do que foram os desmandos praticados por pretensos defensores dos trabalhadores havia casos de estabelecimento de tripulações em navios em que eram impostos tripulantes na base de um por cada cama existente a bordo e com o acréscimo de uma tripulação completa de substituição, o que mais que duplicava os custos de exploração.

 

Além de outros desmandos na manutenção e na operação dos navios.

 

Por exemplo o Funchal que antes de Abril de 74 tinha resultados positivos passou a dar prejuízos e acabou por ser vendido a um armador grego, felizmente atuando em Portugal.

 

Antes de entrar no capítulo Soponata quero referir o caso do Centro Cultural de Belém que tem alguma relação com o Mar e muita com a forma de praticar política nesse tempo, que em parte explica os desastres que então se iniciaram e resultaram agora no que sabemos e sentimos.

 

Quando mudei a SE do Terreiro do Paço para o edifício do INIP em Algés passava frequentemente em frente dos Jerónimos e assim dei conta de um terreno cheio de máquinas de construção civil que, se não me falha a memória, era um parque de estacionamento relacionado com as estradas, o que parecia ser um péssimo aproveitamento de um dos lados da maior praça do País.

 

Daqui ter nascido a ideia de se construir nele o que foi chamado "As Naus de Belém", onde se procurava abrir ao máximo a vista dos Jerónimos para o rio e dotar o empreendimento de motivações relacionadas com os descobrimentos, que dessem vida á praça diariamente e todo o ano.

 

Para isso haveria uma nau e uma caravela no meio de um lago de cerca de um ha em cujas margens eram instalados restaurantes e lojas de artesanato de todos os locais que os portugueses tinham contactado nos séculos XV e XVI e na parte poente um hotel.

 

 

 

 

Assim se fez e o projeto foi autorizado pelo Presidente da Câmara de Lisboa. Entretanto quando já se iniciara a negociação para o financiamento, o Governo decidiu atropelar a iniciativa privada que daria vida à Praça e receitas ao Estado e pôr a concurso o que é agora o CCB, que dá muito menos vida e muito mais despesa em vez de receita.

 

Os acontecimentos de 1985 vieram, no entanto, a ter consequências positivas pois na Soponata os desmandos cometidos e que tinham criado uma situação financeira negativa, maugrado os esforços de administrações anteriores de quem recebi excelentes conselhos, puderam então ser combatidos e a empresa passou rapidamente a ter resultados positivos, obviamente também porque ainda se mantinha o sistema de fretes protegidos.

 

Convém esclarecer dois pontos essenciais para se poder compreender a evolução desta empresa nestes últimos anos da sua vida que são:

 

1º havia um regime especial de fretes protegidos para garantir a segurança do abastecimento de produtos petrolíferos que permitia obter estes resultados mas que se sabia ter que acabar quando estivéssemos integrados na Comunidade Europeia.

 

2º o negócio do transporte de petróleo, tal como o de granéis sólidos, tem grosso modo duas modalidades a saber: o negócio ocasional praticado por armadores com custos muito baixos (em inglês diz-se "tramping") e os contratos a prazo onde pesam decisivamente os contactos pessoais e onde uma empresa estatizada não tem condições de atuação competitiva.

 

Como tive oportunidades de experimentar, uma em conjunto com o Dr. António de Sousa pelo IPE e o Dr. Norberto Pilar pela Portline, e outra sozinho em Hong-Kong.

 

Assim a estratégia a desenvolver seria diversificar o que se tentou em Macau com a nossa participação maioritária no porto que ia ser construído e em companhias de navegação locais com interesses chineses, e em Portugal com a criação de uma empresa de navios de cruzeiros.

 

Por razões óbvias nesta última empresa, o primeiro seria o Funchal, que tinha acabado de ser posto à venda, e para os novos navios a utilizar, encomendámos ao Eng. Ribeiro e Castro o projeto de um navio de cruzeiros à vela e a motor destinado em particular a explorar a chamada zona ibero africana /ilhas atlânticas. Praticamente a que se chama a Macaronesia.

 

Curiosamente logo a seguir apareceram no mercado navios exatamente com esta configuração o que veio confirmar o acerto da nossa frustrada tentativa.

 

Entretanto fui eleito na ISF- International Shipping Federation seu vice –presidente e chegou a estar prevista a realização em Portugal da sua reunião anual em 1991 mas tudo isso se perdeu.

 

Ambos os projetos foram liminarmente proibidos pelo governo do Prof. Cavaco Silva que nessa altura ainda não pensava como pensa agora. Pena foi não ter começado a pensar assim mais cedo.

 

Esta atitude do governo foi resultante de uma tolice típica da nossa política de transportes desde o século XIX: o desenvolvimento de um meio de transporte ser feito contra outros meios em vez de em conjunto com eles.

 

Assim o comboio destruiu o fluvial e a estrada destruiu o comboio e o marítimo. Temos muitas auto-estradas e portanto o transporte mais caro. Bem como a energia mais cara. E entretanto discutimos à exaustão uns euros de ordenados para melhorar a competitividade.

 

Donde um desabafo: com elites dominantes assim nem precisamos de ter inimigos!

 

Convém neste momento recordar a Federação Portuguesa dos Transportes de que era presidente o Eng. Silva Carvalho em representação da Associação de Armadores da Marinha Mercante e que faleceu, deixando-me esse encargo.

 

Foi nesta altura que a AAPAM, era seu Director o Dr. Mário Salvado, sendo a Soponata o maior sócio, contratou uma agência para fazer uma campanha de informação a fim de lutar pela importância da Marinha Mercante em Portugal.

 

Em seguimento foi realizado um Congresso de Transportes que parece ter tido a oposição do Ministro da tutela porque proibiu as empresas estatais de pertencerem a esta entidade e enviou o seu Secretário de Estado falar comigo porque as nossas opiniões eram contrárias às do Governo. A reunião acabou mal e passado algum tempo fui substituído e a Soponata vendida.

 

(continua)

 

 

Lisboa, 18 de Janeiro de 2012

 

 

José Carlos Gonçalves Viana

Mais sobre mim

foto do autor

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2015
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2014
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2013
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2012
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2011
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2010
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2009
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2008
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2007
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D
  248. 2006
  249. J
  250. F
  251. M
  252. A
  253. M
  254. J
  255. J
  256. A
  257. S
  258. O
  259. N
  260. D
  261. 2005
  262. J
  263. F
  264. M
  265. A
  266. M
  267. J
  268. J
  269. A
  270. S
  271. O
  272. N
  273. D
  274. 2004
  275. J
  276. F
  277. M
  278. A
  279. M
  280. J
  281. J
  282. A
  283. S
  284. O
  285. N
  286. D