COMO VAI O CÉU
Luneta de Galileu
No crepúsculo do dia 30 de Novembro de 1609, Galileu apontou pela primeira vez um telescópio (por ele próprio construído) em direcção a um objecto não terrestre: por muitas horas, sem saber bem se era um cientista meticuloso ou apenas uma criança deslumbrada, observou uma Lua crescente. A sua observação metódica permitiu-lhe descrever aquele corpo celeste de uma forma espantosamente diferente para a sua época. Os conceitos correntes eram ainda, em grande medida, os herdados da Antiguidade. A Lua era explicada como um espelho cósmico que reflectia a terra; ou como esfera de cristal luminosa; ou uma massa de fogo. Outros projectavam nela uma espécie de cópia do ambiente terrestre, com montanhas, mares, grandes planícies. Um requisito religioso dessas concepções era que, ao contrário do nosso planeta, todos os objectos do céu tinham uma natureza divina: só podiam ser, por isso, imutáveis e perfeitos. Outro ponto teológico inalienável era a centralidade da Terra no universo, consequência lógica de toda a criação dever convergir necessariamente para o Homem.
As observações de Galileu vão abrir um longo e duro debate entre Fé e Ciência, transferindo para o Céu um conflito de hermenêuticas. Pena não se ter dado ouvidos, nesse tempo, à sentença prudente do Cardeal Cesar Baronius, que o próprio Galileu parafraseou: «a Bíblia mostra como se vai para o Céu, e não como vai o Céu». Essa mesma frase foi recuperada por João Paulo II, em 1981, o ano em que constituiu a comissão para rever o caso Galileu. É nessa esteira que se criou o clima que permitiu recentemente a D. Gianfranco Ravasi, Presidente do Conselho Pontifício para a Cultura, declarar: «Galileu foi o primeiro homem que olhou com um telescópio para o céu. Abriu para a humanidade um mundo até então pouco conhecido, ampliando os confins de nosso conhecimento e obrigando a reler o livro da natureza com um novo olhar. A Igreja deseja honrar a figura de Galileu, genial e inovador filho da Igreja».
P. Tolentino de Mendonça