LUTA PELA VIDA
Charles Darwin (1809 – 1882)
Creio que foi Charles Darwin que cunhou a expressão "Struggle for life". Como naturalista que observou de perto o comportamento dos animais da mesma espécie entre si, ele tinha razão em afirmar que as espécies se desenvolvem numa luta constante de modo que o macho fecundante seja o mais forte e possa com a sua superioridade física engendrar descendência forte e saudável. De acordo. Com os homens passa-se o mesmo? Se considerarmos os homens simples animais, somos levados a pensar que a humanidade tem o mesmo fado dos macacos. Porém, são os homens simples símios, quiçá, símios superiores, gorilas ou chimpanzés racionais? Aqui é que está o busílis. Oscilando entre a racionalidade e a irracionalidade, os homens ora seguem a crua e primitiva "struggle for life" (materialidade), ora sobem aos céus da santidade (espiritualidade), onde o "struggle for life" se reduz a um esforço interior de aperfeiçoamento pessoal. O "struggle for life" animalesco evidencia-se à saciedade nos grandes aglomerados populacionais, onde todos lutam, e até se matam, como seres humanos irracionais, na competência por um posto de trabalho, por um aumento do salário, por uma promoção no seu estatuto social. É bem conhecido este fenómeno, a que alguns chamam "corrida de ratos".
É hábito dizer que os macacos são muito parecidos com os humanos, mas talvez fosse mais apropriado dizer que os humanos são muito parecidos com os macacos. Para não o serem era necessário que a comunidade humana, liberta do materialismo, se comportasse com uma dignidade moral que se torna muito difícil no ambiente da vida moderna. Para obviar esta seria preciso que o humano vivesse o mais possível isolado dos outros, como o lavrador numa grande quinta, longe do centro urbano. E como – caso extremo, mas salvador – o ermitão que abandonou o mundo e fala apenas com Deus.
Mas, dirão, como poderia haver progresso se todos os homens fossem ascetas anacoretas? É verdade, não havia "progresso", havia apenas a paz do deserto e a paz da alma, não haveria guerra contra o terror, nem guerra pela democracia, não haveria ladrões nem assassinos, não haveria inveja nem ganância e assim por diante. E quando os pais incitam os filhos a serem ambiciosos e sociáveis, quando eles não têm tendência para sê-lo, estão talvez a promover a macaquice, a hipocrisia e a infelicidade moral.
Isto é evidentemente apenas a opinião duma pessoa que tem tendência para o isolamento, para a associabilidade e para a anarquia, defeitos graves neste mundo macaco.
Joaquim Reis