Fomos várias as gerações de estudantes de Economia que nos deixámos fascinar pelas aulas de Francisco Pereira de Moura. Formalmente, eram aulas; na realidade, tratava-se de conferências que ele nos dava com uma enorme simplicidade, com uma evidência tão essencial que parecia que sempre soubéramos tudo aquilo e que, afinal, só faltava trazermos os conceitos à superfície da consciência (1). Para além de ser um Professor fora do comum, era uma pessoa boa, alguém a quem não se conheciam subterfúgios, sério em todas as circunstâncias. Só quando chegou a Ministro e o vi rodeado de políticos prenhes de estratégias e jogadas partidárias é que percebi como ele era inocente. O mundo real não é uma sala de aulas cheia de alunos motivados ou um anfiteatro de conferências com audiência ilustrada; cá fora anda o povo que não está obrigatoriamente motivado para ouvir falar de assuntos que não entende nem perdoa a quem diz coisas que lhe parecem estranhas. Qualquer incompreensão jornalística é transformada em deslize mediático e aproveitada pelos adversários políticos que se comprazem com a desgraça alheia. Podia bem não ter passado por tanto stress; não merecia tal tratamento. Guardemos dele a memória académica pois foi essa que - passe o pleonasmo - fez escola. No final dos anos 60 do século passado, Francisco Pereira de Moura publicou aquele livro que quase todos lemos com entusiasmo intitulado Para onde vai a Economia Portuguesa?. Pois bem, é esse o título do ciclo de conferências que o ISEG (UTL) está a desenvolver durante o ano lectivo 2005-2006 e a de 13 de Fevereiro de 2006 tinha como título O modelo de desenvolvimento da Economia Portuguesa sendo oradores Miguel Beleza e Victor Constâncio, ambos suficientemente conhecidos para carecerem de apresentações. Auditório repleto de gente ilustre, ao todo identifiquei quatro ex-Ministros das Finanças que refiro por ordem alfabética: Eduardo Catroga, José da Silva Lopes, Miguel Beleza e Victor Constâncio. Em nome da Associação dos Antigos Alunos do Instituto, Catroga fez uma breve introdução ao tema referindo os modelos económicos por que Portugal passou, nomeadamente na época em que Pereira de Moura escreveu o tal livro, depois do 25 de Abril até 1986 e depois da nossa adesão nesse ano à CEE. Retive como importantes as liberalizações comercial e financeira que no seu entendimento ajudaram a definir o actual modelo do nosso desenvolvimento. No seu estilo habitual, Miguel Beleza glosou o tema do gap em relação ao crescimento potencial do PIB (2), referiu a rigidez do mercado nacional de trabalho como um sério entrave à dinâmica empresarial e tipificou os modelos de desenvolvimento anglo-saxónico, escandinavo e da Velha Europa constituindo-os como parâmetros inspiradores para o nosso futuro. Formal, Victor Constâncio dissertou sobre o conceito de modelo de desenvolvimento centrando a atenção nos grandes princípios orientadores das políticas públicas a quem reconheceu o exclusivo na definição dos modelos. Excluiu ab initio quaisquer conceitos baseados nas predominâncias sectoriais ou na imitação internacional e referiu com algum detalhe as recentes condicionantes históricas do nosso modelo, já em União Monetária. Sendo os custos unitários do trabalho de toda a Economia e a política orçamental os dois principais instrumentos que restam a cada Governo nacional para a gestão do desenvolvimento, recordou-nos que a política orçamental, em vez de em contra-ciclo como deveria ser, tem sido pró-cíclica e que o crescimento dos custos unitários do trabalho em toda a Economia se têm destacado por um crescimento percentual muito superior ao verificado nas Economias nossas maiores parceiras (leia-se concorrentes). Ou seja, os dois principais instrumentos de política vêm sendo utilizados ao contrário do que tudo aconselharia. Ocorrendo a redução perene das taxas de juro, verificou-se uma enorme libertação de meios de pagamento fazendo explodir o consumo e o endividamento das famílias; o substancial aumento dos custos unitários de trabalho constitui um importante mecanismo de travagem à capacidade produtiva interna o que se traduz globalmente numa clara perda de competitividade e num significativo agravamento da balança de transacções. No entanto, referiu que, apesar de tudo, a estrutura das nossas exportações vem melhorando com um crescimento sustentado dos produtos de média e alta tecnologia. A este propósito referiu que a questão dos preços só se coloca com grande acuidade nos produtos de baixa tecnologia pelo que quanto mais alto subirmos na escala, menos importância os preços terão. Ainda em relação às exportações referiu a taxa de crescimento média anual entre 1994 e 1999 que rondou os 9% subindo em 2000 para os 11,8% mas descendo em 2001 para 2% e assim sucessivamente até à actualidade. Quando eu esperava que dissesse alguma coisa sobre os 6% previstos no cenário macroeconómico subjacente ao Orçamento do Estado para 2006 . . . devo-me ter distraído e escapou-se-me qualquer referência. Mas não me escaparam as referências ao choque petrolífero em curso que responsabiliza pela quebra de 0,5% no crescimento do nosso PIB e em 0,6% de agravamento no défice orçamental. Com um muito amplo acesso ao capital, sem riscos cambiais e com um mercado livre de dimensões ímpares, os exportadores portugueses contam hoje com condições de funcionamento de que nunca tinham disposto e, por isso, não pode haver razões de queixa. Identificou o Sistema Educativo como o problema mais grave que Portugal tem que resolver e, mesmo assim, lembrou-nos que o World Trade Forum nos classificou em 22º lugar, à frente de Espanha, França e Irlanda. Finalmente, respondeu à questão de qual o modelo português para o futuro imediato: o modelo social europeu parametrizado pelo Tratado de Maastricht (que não referiu mas que subentendi). Seguiu-se um período de diálogo com a assistência a que não assisti dada a já pouca cristandade das horas. CONCLUSÃO: conferência muito interessante. Lisboa, 13 de Fevereiro de 2006 Henrique Salles da Fonseca (1) - No meu tempo de primeiro ano estávamos divididos em duas turmas e se uns começávamos o dia com Economia, outros só a tinham à segunda hora e muitos eram os que faltavam à outra aula para repetirem a conferência de Economia. Tenho a certeza de que não foi Francisco Pereira de Moura que inventou essa coisa ridícula nas Universidades que é o registo das presenças nas aulas. O chumbo por faltas é uma ameaça que se destina a compor minimamente as salas de certos Professores que mais valera que se dedicassem a outras actividades que não ao Ensino. O que digo para o nível Superior não é aplicável ao Secundário onde a imaturidade dos alunos tem que ser disciplinada e muito menos ao Primário onde os alunos devem ser conduzidos pelas Mamãs. (2) - GDP is determined by a macro production function that includes three variables: (1) utilization of the capital stock; (2) labor input; and (3) the efficiency with which these factors are used, namely total factor productivity (TFP). We refer to the annual rate of change in potential output as the potential growth rate (in. http://www.boj.or.jp/en/ronbun/03/ron0305b.htm)