BRASIL – A BOLHA
AUMENTO DE CRÉDITO, EUFORIA. É A BOLHA
Talvez apenas nos anos 70 tenhamos observado tal facilidade de acesso ao crédito para compra de imóveis. Mas havia um provedor de crédito, o já falecido BNH
Nas décadas posteriores à segunda guerra mundial o Japão encorajou fortemente a poupança. Com mais dinheiro nos bancos, o crédito se tornou farto. Ao mesmo tempo, o país tinha enormes superávites na conta corrente, e o Yen se valorizou frente às moedas estrangeiras. Os activos financeiros se tornaram muito lucrativos. Muito dinheiro associado a uma grande euforia sobre o futuro - afinal o Japão ia superar os Estados Unidos em pouco tempo - trouxe como resultado mercados altamente especulativos. Principalmente o mercado imobiliário. Imóveis foram vendidos por 1 milhão de dólares o metro quadrado no distrito de Ginza! A bolha estourou em 1990 e os imóveis passaram a ser negociados por preços em torno de 10% do seu valor no pico da euforia. Apenas em 2007 os preços voltaram a subir, mas voltaram a cair em 2008 em função da crise financeira.
Porque começar um artigo sobre imóveis no Brasil com uma história sobre o Japão? É que temos que aprender com a história. E os factos ocorridos no Japão são recorrentes. Aumento no crédito somado à euforia em geral leva a bolhas.
E no Brasil? Será que vivemos uma bolha imobiliária ou simplesmente estamos um pouco atrasados na tendência observada no início deste milénio em diversas economias centrais onde os preços de imóveis subiram muito?
Para responder a esta questão temos que analisar alguns tópicos.
O primeiro é a demanda por imóveis. Ela subiu brutalmente nos últimos anos onde observamos que novos imóveis são vendidos rapidamente, muitas vezes em questão de dias ou horas. E essa demanda é fortemente sustentada pelo crédito. Talvez apenas nos anos 70 tenhamos observado tal facilidade de acesso ao crédito para compra de imóveis. Mas nos anos 70 só havia um provedor de crédito, o já falecido BNH-Banco Nacional da Habitação. Hoje a oferta vem de diferentes fontes como bancos e incorporadoras. E com prazos muito longos. O resultado é uma pressão de demanda como nunca observamos. E essa pressão tem trazido aumentos de preços enormes. O índice Fipe ZAP mostra que em São Paulo entre Janeiro de 2008 e Março de 2011 o preço dos imóveis subiu 57% já descontada a inflação. No Rio de Janeiro o aumento foi ainda maior, igual a 74,5%. Isto em reais. Se calcularmos os preços em dólares, os aumentos serão ainda maiores já que o real teve uma valorização neste período da ordem de 12%.
Um segundo indicador importante da saúde do segmento imobiliário é a relação entre aluguer e preço do imóvel. Para que um imóvel seja um investimento com uma rentabilidade mínima, seu aluguer mensal deve corresponder a algo em torno de 0,6% ou 0,7% do seu valor de mercado. Isso nos daria uma rentabilidade anual da ordem de 7%, compatível com as taxas de juros vigentes. Aqui estamos desconsiderando as variações nos preços e custos associados à manutenção dos imóveis. Será que hoje é possível obter esses índices? A resposta é não. Vimos no parágrafo anterior que o preço dos imóveis subiu 57% e 74,5% em São Paulo e no Rio entre Janeiro de 2008 e Março de 2011. Nesse mesmo período os alugueres subiram, novamente em termos reais, 29% e 40,5% respectivamente. Isto é em São Paulo e no Rio de Janeiro o preço dos imóveis subiu praticamente duas vezes mais que os alugueres. É fácil observar nos anúncios de jornais que os alugueres de imóveis residenciais estão por volta de 0,2% ou 0,3% do seu valor. É fácil entender porque. Hoje em São Paulo e no Rio de Janeiro é fácil encontrar apartamentos de classe média negociados a 10 ou 12 mil reais o metro quadrado. Isso significa que um apartamento de 100 metros quadrados custa R$ 1.000.000 ou pouco mais. E por quanto é possível alugar um apartamento desses? Não mais que R$ 3.000,00 mensais, e não os 6 ou 7 mil que deveríamos ter para que o imóvel fosse um investimento rentável.
Mas será que é o aluguer que está errado ou o preço dos imóveis? Se olharmos a renda per capita da classe média, fica nítido que é o preço dos imóveis. Temos a receita clássica de uma bolha: excesso de crédito que leva a excesso de demanda. E os sintomas também clássicos: preços elevados e rentabilidade baixa.
E a estouro não deve estar longe. Algumas indicações já surgem, como a redução na venda de imóveis e medidas governamentais de restrição ao crédito. E é importante lembrar que o estouro de uma bolha nem sempre é realmente uma explosão, mas pode ser um processo lento com duração de anos. De toda forma é importante estar atento e não se deixar levar pela euforia.
William Eid Junior
PROFESSOR TITULAR, COORDENADOR DO GV CEF (CENTRO DE ESTUDOS EM FINANÇAS) – FGV/EAESP – ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
In O Estado de S. Paulo - 13/05/2011