A AGRICULTURA E O DÉFICE
O Dr. Medina Carreira (TSF Rádio em 10-10-2010) disse que o nosso problema não é de finanças mas de economia. Estou totalmente de acordo. Se, ao longo das últimas décadas, em vez de destruírem a agricultura, a tivessem desenvolvido, aproveitando as suas boas potencialidades, a economia portuguesa seria totalmente diferente e, como consequência, a situação financeira seria bem diferente. Se não tivéssemos de importar alguns milhares de milhões de euros de produtos agrícolas que aqui devíamos ser capazes de produzir - e, às vezes, de melhor qualidade - não teríamos o enorme défice que governos incompetentes conseguiram e talvez até houvesse um superavit.
Como repetidamente tenho indicado, se é normal importar mangas, bananas ou papaias, só a enorme incapacidade dos governantes - e alguma, também, da parte dos agricultores e principalmente das suas organizações - é que importamos batatas, cebolas, cenouras, alhos, alfaces, tomates, pimentos, feijão verde, melões, melancias, laranjas, limões, ameixas, pêssegos, nêsperas, maçãs, peras, uvas, morangos, etc. etc. etc. vindos, à vezes de bem distantes terras? De alguns destes produtos até devíamos exportar mais do que exportamos. E note-se que a agricultura portuguesa ainda exporta mais do que a maioria das pessoas pensa.
O aumento da nossa produção agrícola - bem possível - teria efeitos benéficos no PIB, no défice orçamental, no desemprego, na inflação, na balança comercial e até na indústria e no comércio, a montante e a jusante.
A destruição da agricultura, iniciada com o PREC e continuada pelos governos do PSD e do PS, atingiu o máximo de intensidade com o ministro do anterior governo, que chegou ao cúmulo de devolver centos de milhões de euros a Bruxelas, euros que deviam ter entrado na agricultura e, portanto, na nossa economia. Com o actual ministro parece terem parado as acções de destruição. Mas, que eu visse, nada se fez para recuperar as acções de desenvolvimento necessárias. Como já há muito sugeri, a recuperação do desenvolvimento da agricultura exigirá, no Ministério da Agricultura, um Programa Intensivo de Investigação Agronómica e de Extensão Agrícola que, com os volumes de despesa que vejo em diversos sectores, nem se pode considerar caro. Como ainda há um ano mostrei, numa conferência na Universidade de Évora, essa acção é um investimento que rende juros que os nossos economistas não pensam que existem, mas são reais e até um bom negócio para o orçamento do estado. Porque muitos dos produtos importados são de culturas anuais - e lembro o símbolo vergonhoso dos rabanetes vindos da Holanda e dos alhos vindos da China - o Programa que propus dará resultados a muito curto prazo, certamente dentro dos quatro anos duma legislatura. Se continuarmos a ignorar essa parte importante da economia que é a agricultura (que há anos um economista declarou ser "residual" e os governos de Guterres para cá não sabem o que é, como se vê pelo errado nome que dão ao Ministro do Comércio e Indústria), o afundamento do país vai certamente continuar. E nem mesmo com a intervenção do FMI essa faceta vai ser alterada e a grande maioria dos portugueses vai continuar a ver o seu nível de vida a descer vertiginosamente em cada ano que passa, em continuação do que viram nestes últimos cinco anos.
Os meus cumprimentos.
Miguel Mota
Publicado no Linhas de Elvas de 28 de Outubro de 2010