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A bem da Nação

Os transportes, Portugal e a Comunicação Social nos últimos 25 anos

  

  

Ao elaborar este texto tive dois objectivos essenciais: o primeiro dar uma ideia das circunstâncias relacionadas com os transportes que estiveram da criação desta Secção da Sociedade de Geografia de Lisboa e o segundo enfatizar a importância da Comunicação Social para a sociedade civil poder exercer a sua contribuição para democraticamente influenciar a vida do país no sentido do desenvolvimento e da sustentabilidade, tal como me foi reforçado durante a convivência com o Dr. Bettencourt Resendes.

 

Assim começo por uma curta introdução à essência dos transportes.

 

As movimentações das mercadorias e das pessoas têm para a vida humana, papel idêntico ao que tem o sangue no corpo humano: qualquer deficiência provoca quebras da saúde nos humanos e diminuição na competitividade numa população.

 

Só por esta razão, além de outras, os transportes, ou melhor, o sistema de transportes a utilizar tem que ser muito bem estruturado e gerido sem o que jamais se atingirá um nível de competitividade aceitável.

 

As pessoas movem-se a pé, em elevadores e escadas rolantes, em bicicletas e em viaturas individuais (que podem levar mais algumas), em viaturas de transporte colectivo, em comboios, em barcos (seja nos rios ou no mar), em aviões e helicópteros. Por sua vez as mercadorias podem ser transportadas por meios rodoviários, ferroviários, fluviais e marítimos e aeronáuticos.

 

A escolha dos meios a utilizar depende das distâncias, das dimensões, dos caudais e do tipo da mercadoria.

 

Uma coisa é certa, e tem que ser tomada em consideração: sempre que há uma mudança de meio a utilizar para se atingir o destino final, isso tem custos e incómodos que pesam quando se estabelece um sistema de transportes.

 

Outros condicionamentos essenciais são: o consumo energético e os impactos ambientais. No primeiro basta recordar que o mais económico é o que utiliza como meio de suporte a água, a seguir o ferroviário, depois o rodoviário e por último o aeronáutico.

 

E convém ainda recordar também que os custos optimizados implicam velocidades razoáveis mas quando estas são muito elevadas a subida dos custos só pode ser justificada se a quantidade transportada for suficientemente alta.

 

Todos estes condicionamentos somados à componente geográfica da distribuição das origens e destinos implicam a necessidade de um sistema de transportes estar intimamente ligado com o ordenamento territorial em geral e com o urbano em particular, pois todas as indústrias que manipulem grandes quantidades de matérias primas e produtos devem estar situadas em locais com acesso aos meios de transporte mais eficientes para não comprometerem a sua competitividade.

 

Após esta resumida introdução, que a realidade aconselhou a fazer, aqui inicio agora a análise dos últimos 25 anos, tentando não ser excessivamente negativo, apenas seguindo o princípio de que só se consegue melhorar quando se tem consciência dos erros cometidos. Na verdade só ver erros é doentio, mas não querer analizá-los é rematada tolice. 

 

Quando, entre 82 e 83 cheguei à Soponata, depois de oito anos de ausência desta actividade em Portugal, constatei o seguinte:

 

A competitividade desceu em parte importante por causa dos nossos transportes. Porque:

 

1º Não tínhamos um sistema integrado de transportes, e continuamos a não o ter.

 

2º Desde o período da revolução industrial não tivemos e continuávamos, e continuamos, a não ter uma conjugação minimamente efectiva entre os responsáveis pelos transportes e pelo ordenamento com especial relevo para o urbano, ficando-se com a sensação de que o critério principal tem sido a componente de optimização imediata do negócio imobiliário, o que onera a construção das infraestruturas dos transportes, reduz a sua eficiência e baixa a qualidade do serviço prestado. Incluindo o mau funcionamento da rede ferroviária, o desprezo pelo transporte fluvial, a deficiente coordenação dos portos e das suas ligações aos hinterlandes potenciais respectivos e outros problemas deste tipo. Embora, apesar destas dificuldades, alguns portos têm progredido de forma assinalável, com excepção do de Lisboa que continua com várias indefinições e mau aproveitamento de iniciativas com grande potencial de desenvolvimento económico e social.

 

3º Deficiente alocação dos investimentos e dos objectivos a atingir o que levava, e leva, a discutir assuntos com baixo interesse nacional relegando para segundo plano os assuntos essenciais para elevar a competitividade, exemplo: o TGV (designação infeliz porque se trata de uma marca francesa), que é mais importante para os espanhóis, que ambicionam ter todas as capitais das regiões ligadas a Madrid por comboios rápidos, mas para nós o que é de facto importante é termos uma rede em bitola europeia a trabalhar bem (isto é incluindo os indispensáveis centros logísticos), obviamente ligada a Espanha que é dos mais importantes clientes das nossas exportações e isto, é que de facto nos pode ajudar a criar postos de trabalho permanentes.

 

4º Enquadramento da actividade do transportador marítimo desajustado em quase todos os sectores da sua gestão: pessoal, registo, financeiro, jurídico, etc..

 

Destruição da Marinha Mercante, logo nos anos a seguir, que aliás põe em risco a segurança das movimentações respectivas que interessam ao País, estando agora ao nível de 1939, bem como a proibição da empresa desenvolver negócios em Macau e na China, o que finalmente está a ser feito com 20 anos de atraso e com oportunidades perdidas que naturalmente não se repetirão. 

 

6º Haver uma Federação Portuguesa de Transportes, fundada se me não falha a memória pelo Eng. Silva Carvalho, que tentava bater-se por coordenar e melhorar o estado dos transportes em Portugal mas que ao findar a década de 80 foi eliminada pela decisão do então ministro do sector ter proibido as empresas públicas de a ela pertencerem.

 

7º Não haver qualquer iniciativa concreta por parte das entidades responsáveis pelas actividades marítimas, principalmente o IPTM, no sentido de promover as actividades náuticas para a juventude cujo empenho no interesse concreto pelo Mar é essencial para o futuro deste País.

 

Esta situação teve obviamente grande influência na criação da Secção de Transportes da Sociedade de Geografia, e foi-se mantendo, e em comparação com os restantes países europeus até se degradando, apenas aumentando as conferências, os congressos, actualmente os fóruns vários, as muitas cerimónias comemorativas do passado, e a produção de inúmeros livros de cores diversas, mas concretamente nada!

 

No entanto logo no início destes 25 anos houve duas entidades, agora algo esquecidas pelos novos arautos da renovação do Mar Português, onde se tratou com bastante profundidade todo este assunto dos transportes e da Marinha de Portugal. Refiro-me em particular à Sociedade de Geografia de Lisboa porque a Academia de Marinha sempre esteve mais focada, como é lógico, na Marinha.

 

Com uma dificuldade enorme causada pelo pouco interesse da comunicação social o que diminuiu muito o desejável impacto na população que naturalmente foi recebendo pouca informação e por vezes além de pouca, deformada, só esporadicamente isto não acontecendo como foi o caso do Dr. Bettencourt Resendes hoje aqui homenageado.

 

A crise actual que para além da sua componente internacional tem outra, de muito maior peso, de carácter interno e de natureza estrutural e cultural que urge resolver, apresenta, para lá das tremendas penalizações a grande parte da população principalmente aos mais carenciados, uma oportunidade do tipo daquelas que só ocorrem quando um país atinge um nível muito baixo, como é infelizmente agora o nosso caso.

 

Assim a reestruturação do Estado, actualmente minado por erros resultantes dos rumos excessivamente estatizantes verificados durante todo este período e por conceitos de gestão pouco ou nada concordantes com os de uma gestão eficiente e transparente só será possível e rápida se houver efectiva colaboração por parte da Comunicação Social que é essencial para informar correcta e oportunamente a opinião pública pois os políticos só são sensíveis a duas forças: o voto e o dinheiro, e destas só a primeira depende dos cidadãos e é a única que pode travar a segunda.

 

Como sempre o Futuro depende em grande parte das nossas acções e por isso é tão importante haver uma Secção de Transportes, como esta da Sociedade de Geografia e a colaboração de um Diário de Notícias como aconteceu com o Dr. Bettencourt Resendes.

 

Bem hajam pela vossa atenção.

 

  José Carlos Gonçalves Viana

 

11 de Novembro de 2010

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