CURTINHAS Nº 80
AI, QUE DESGRAÇA! NÃO HÁ QUEM NOS VALHA!
Se faltasse ainda uma última prova de que para nós, portugueses, não há risco, há fatalidade, os incêndios que, ano após ano, recorrentemente, abrasam os nossos campos aí estariam para a fornecer.
Se houvesse por cá a consciência do risco:
- Não se chegaria ao Verão com massas combustíveis contínuas, do solo às copas e das copas às casas, por toda a parte;
- Não seria só a caminho do fogo que se descobriria que os estradões, afinal, estão intransitáveis ou, simplesmente, desapareceram (se é que alguma vez existiram);
- Não se choraria de impotência perante manchas florestais extensas e homogéneas, onde travar a propagação das chamas é praticamente impossível sem o concurso benigno da meteorologia;
- Não se salpicariam as chamas com uns pingos de água que custam oiro, mas era-se capaz de encharcar as linhas de corta-fogo, as quais estariam certamente mantidas em boas condições, a preços módicos;
- Não se gastariam esforços e meios para apagar os incêndios, porque os incêndios apagam-se por eles próprios, mas agir-se-ia segundo esquemas bem treinados, no sentido de defender aquelas linhas de propagação susceptíveis de causar os maiores danos;
- Não se improvisaria com grande generosidade, mas praticar-se-ia o que se sabe de antemão dar certo.
Helás! Como só conhecemos a fatalidade rezamos para que nada de mal nos atinja.
Mas, se nos atingir, uns quantos sacrifícios expiatórios deixam-nos a alma como nova - até ao ano seguinte (rezar, neste contexto, pode muito bem ser qualquer ritual propiciatório - por exemplo, a publicação no DR de diplomas que ninguém parece ter o dever de fazer cumprir, lá, naquele terreno que amanhã arderá).
É certo que há mais "notícia" na tragédia dos grandes incêndios, que na análise do que esteja pensado para os prevenir.
Tal como é mais apelativo acompanhar bombeiros e populares em combate desigual com as chamas, que acompanhar a acção de quem tem o dever de, a tempo e horas, prevenir a ignição e conter a propagação dos fogos.
Outras sedes têm uma tal obrigação. Mas como já todos sabemos "o que essas casas gastam", peço-lhes, Senhores “Fazedores de Opinião”, que não esqueçam os incêndios na época em que eles ainda não ardem.
Quando estão, apenas, a ser "viabilizados" pelo desleixo de todos nós.