OS FOGOS FLORESTAIS NA ECONOMIA DO PAÍS
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Aprendia qualquer engenheiro silvicultor ou qualquer engenheiro agrónomo que o combate aos fogos florestais se faz principalmente (talvez 90 a 95 %) por prevenção e, seguidamente, por detecção precoce.
A razão do facto é que, depois de desencadeados e de terem tomado alguma amplitude, o combate a esses fogos é muito difícil, relativamente pouco eficiente e muitíssimo dispendioso. Aos custos dos meios de combate há a somar o valor do material vegetal ardido, os prejuízos de natureza ecológica, às vezes casas destruídas pelo fogo e, não raramente, a perda de algumas vidas.
A prevenção faz-se de várias formas. A primeira é um bom ordenamento florestal, evitando um contínuo vegetal da mesma espécie, com dimensão exagerada. Na implantação (ou posteriormente, se se está perante uma qualquer mancha florestal já instalada) é necessário deixar suficientes aceiros, orientados conforme a orografia e os ventos dominantes na época estival. A área de floresta “perdida” nestes aceiros é compensada, não só pela defesa contra os fogos, mas por facilitarem os acessos aos diferentes pontos da floresta, importantes para as diferentes operações e transporte dos produtos. Podem ter ainda outras utilizações, como para pastagens, para a instalação de apiários e para o turismo.
A “limpeza” das florestas, de que tanto se falou recentemente, só raramente é viável, dado o seu elevado custo e outros inconvenientes. Era normal quando os matos eram usados em camas de gado, por exemplo. Mas sob coberto é possível ter uma boa flora melífera, plantas aromáticas e medicinais ou de pequenos frutos, assim aumentando muito o valor da produção da área ocupada. Os cogumelos podem ser, em muitos casos, outra excelente fonte de rendimento.
A detecção precoce era, no passado, feita essencialmente com postos de vigia, localizados em pontos altos. Pelo menos nalguns casos, penso que continuam a ser usados.
Em tempos recentes, um novo processo veio a ser adicionado aos existentes: a vigia feita do ar por aviões ligeiros ou mesmo ultra-ligeiros que patrulham uma área bastante vasta e assinalam qualquer fumo ou chama que avistem desse excelente ponto de observação. Nos aeroclubes há normalmente pilotos desejosos de voar, sem qualquer remuneração; apenas há o encargo da hora de voo, relativamente barata nesses aparelhos e infinitamente mais barata que a de helicópteros comerciais ou grandes aviões. A existência do GPS tornou fácil e de grande precisão a localização de qualquer ponto a assinalar.
Quando o fogo já tomou grandes proporções, apagá-lo é quase impossível, como temos visto. Chamas intensas progredindo numa extensa frente, só são eficazmente combatidas com o contra-fogo. Para isso faz-se arder, controladamente, uma parte da floresta onde o fogo iria certamente chegar, normalmente junto a um aceiro, de forma a criar, na frente, uma área já ardida. Com a detecção precoce e a rápida intervenção, é geralmente possível apagar o fogo antes que ele tome grandes proporções.
Porque as características dos fogos florestais são diferente das de todos os outros, o seu combate deve ser da competência do sector florestal do Ministério da Agricultura.
As prestimosas e valiosíssimas corporações de bombeiros não podem sentir-se diminuídas por esse facto e são de preciosa actuação sempre que o fogo se encontra perto de áreas urbanas, para imediata protecção destas, de forma a evitar os prejuízos materiais e a perda de vidas que temos visto nos últimos anos.
A acção no solo é também importante, especialmente o patrulhamento pelos guardas florestais, a pé, a cavalo ou em veículos motorizados, conforme as condições locais. Eles são factor particularmente relevante no combate aos casos de fogo posto, pois são entidade oficial armada.
Remonta a muitos anos atrás a criação do corpo de “guardas florestais”, os homens a quem sempre coube a fiscalização e a preservação da natureza, especialmente nas zonas de floresta. Os serviços que prestaram, ao longo dos tempos foram de grande valor e justificam plenamente a sua existência. Fardados e armados, os zelosos guardas florestais são, no Ministério da Agricultura, quem tem a seu cargo as funções que agora alguns, desconhecendo o que existe no País, declaram - como já li nos jornais - ser Portugal o único país da União Europeia que não possuía tais agentes. E, em vez de reforçar muito esse corpo de guardas florestais, vá de criar outros corpos paralelos!
A corporação dos guardas florestais (polícia florestal), que por legislação de 1901 já tinha tido uma reorganização, teve diversas outras, como a do Decreto nº 12.625, de 3 de Novembro de 1926, revogada pelo Decreto-Lei nº 39.931, de 24 de Novembro de 1954. Em tempos mais recentes, pela Portaria nº 1.269/93, de 15 de Dezembro, do Ministério da Agricultura, entrou em vigor o "Regulamento de uniformes dos mestres e guardas florestais - policia florestal", onde se definem os uniformes, distintivos e armamento a usar pelos guardas florestais. O armamento, aliás, já tinha sido actualizado em 1986, pelo Decreto Regulamentar nº 20/86, de 1 de Julho, por se considerar necessário alterar o que estava em vigor desde 25 de Novembro de 1959, pelo Decreto nº 42.683.
É assim que, ignorar a existência e funções dos guardas florestais e, em vez de se ampliar e reforçar o seu conjunto, criar outros corpos paralelos, constitui mais uma machadada - aliás no seguimento de outras recentes – no importante sector da Economia Portuguesa que é a sua Agricultura.
O enorme e anormal volume que nos últimos anos os fogos florestais tomaram em Portugal fez com que o seu combate se tornasse um negócio de muitos milhões. Será conveniente estar atento porque, como é sabido, sempre que há interesses de grande vulto, é possível que alguém tudo faça para que tão bela fonte de receita não desapareça, não diminua e, quiçá, que ela aumente.
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É o que aqui, duma forma simples, descrevi, que julgo ser importante fazer para combater os fogos florestais. O Ministério da Agricultura faz hoje menos destas acções do que fazia. Mas isso não surpreende quem tenha acompanhado o que se tem passado nas últimas décadas, com uma evidente e descarada destruição da agricultura portuguesa - e, consequentemente, destruição da natureza e do ambiente - com o respectivo ministério, com diferentes governos, a cometer uma sucessão de erros e a ignorar pontos fundamentais. É bem claro que estes actos são apenas mais alguns passos nesse sentido.
Acontece que não é só a agricultura que sofre. Toda a economia – e, portanto, o bolso de todos os portugueses – está a pagar caríssimo essa acção governamental destruidora. Não surpreendem esses erros em governos que, desde 1995, pelo menos, “não sabem”, sequer, que a agricultura é parte e muito importante da economia, não só por ela própria - o que já é muito – mas também pelos sectores, nomeadamente comércio e indústria, que dela dependem, a montante e a jusante.
Os governos mostram essa “ignorância” dando ao simples Ministro do Comércio e Indústria, pomposa e erradamente, a designação de “Ministro da Economia”. Os únicos beneficiários dum tal sistema são os importadores de produtos agrícolas, que ganham milhões à custa da destruição da economia nacional.
Com o Ministério da Agricultura a funcionar eficientemente – e ainda possui recursos materiais e humanos para fazer muito melhor - a economia portuguesa muito beneficiaria, no aumento do PIB (pelo aumento do PAB e seus reflexos, a montante e a jusante), na redução do défice comercial (pela redução das importações e aumento das exportações), no desemprego e na inflação. Nem o exemplo de alguns outros países da União Europeia, como a Holanda, a Dinamarca e mesmo a França e até a Espanha, chega para ensinar aos governos o que eles devem fazer para, em vez de destruir, aproveitar cabalmente as grandes potencialidades da agricultura portuguesa como, ao longo dos anos, em tantos escritos tenho demonstrado. Ainda há poucos anos (em 2001) o Presidente do prestigiado Institut National de la Recherche Agronomique, que tanto tem contribuído para o desenvolvimento da agricultura da França, declarou o mesmo numa excelente conferência que proferiu na Estação Agronómica Nacional, em Oeiras.
O resultado da inépcia está à vista de todos. Basta ir a qualquer super ou hipermercado para ver os produtos agrícolas que aí se encontram, provenientes de países estrangeiros, alguns bem longínquos. É natural que isso aconteça com bananas, abacaxis, mangas e variados outros frutos que aqui não produzimos. Mas como se explica a presença de tantas batatas, cebolas, cenouras, alhos, alfaces, tomates, pimentos, feijão verde, melões, melancias, laranjas, limões, ameixas, pêssegos, nêsperas, maçãs, peras, uvas, morangos, etc. etc. etc. vindos, à vezes de bem distantes terras? O que considero o cúmulo dos cúmulos é encontrar à venda, nos nossos mercados rabanetes vindos da Holanda, algo para que já chamei a atenção. Para todos aqueles produtos não há desculpa para a nossa agricultura não ser capaz de os produzir melhor e mais barato.
Ainda sobre os fogos florestais, não tenho visto indicados os valores das muitas toneladas de CO2 e de alguns produtos nocivos - especialmente de resinosas - que são lançadas na atmosfera e que constituem enorme poluição.
Para terminar, um pormenor curioso. Julgo que, no cálculo do PIB não entram, como factores negativos, as perdas consequentes do valor ardido embora entrem os ordenados e outros custos do combate aos fogos. Assim, quanto mais e maiores forem os fogos… mais aumenta o PIB!
Publicado na "Floresta e Ambiente" Nº 65, Αnο 16, Abril/Junho, 2004