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A bem da Nação

ÉTICA LUSÓFONA E SENTIDO DE ESTADO – 7

 

Eis-nos chegados a um mundo sem sonhos, completamente manipulados por um “big brother” que efectivamente comanda a vida. E o mais grave é que nós, os que sabemos do que se está a passar, não temos sido suficientes para escapar a essa manipulação.
 
Gente culta desesperada é hoje o pão nosso de cada dia porque o que está a dar é a apologia do sexo, da violência e do sensacionalismo. Voltámos ao velho pregão dos ardinas quando berravam TRAZ O DESASTRE!!!
 
Sim, também hoje os telejornais se acotovelam apregoando os maiores desastres que conseguem eleger porque «devemos oferecer às pessoas o que elas esperam».
 
Como podem dizer tal absurdo? Pelos níveis de audiência? E que opções alternativas são colocadas às pessoas? Como se comportariam os telespectadores se as alternativas o fossem efectivamente? Que leque de escolhas é dado aos telespectadores? Se esse leque fosse grande, como se comportaria o público? Mas se o leque variar entre programas sensacionalistas e violentos, o que restará como alternativa verdadeiramente construtiva? As telenovelas e o futebol? Serão estas as alternativas que se devem colocar a quem se perde num mundo sem esperança?
 
E quando a vox-populi é gerida num processo de climatização generalizada de vontades anónimas por uma mão invisível nunca identificável, então chegámos a uma situação em que até Karl Popper concluiu com tristeza ser a televisão um perigo para a democracia.
 
Como é que um espírito superior – assumido politicamente como um democrata e liberal convicto na perspectiva económica – pode concluir de modo tão chocante e surpreendente?
 
Só há uma resposta: a televisão é um perigo para a democracia por causa do mau uso que se lhe dá.
 
E, contudo, ela poderia ser um portentoso instrumento educativo. Mas não o é porque sacrifica tudo aos níveis de audiência, os que pagam a publicidade que a financia. E para atingir esses níveis de audiência os realizadores de televisão não olham a meios, argumentam com o tal sofisma de que «devemos oferecer às pessoas o que elas esperam» e abdicam mesmo dos princípios éticos sempre que estes se apresentam como escolhos aos objectivos traçados.
 
Porque não educa e frequentemente deseduca de múltiplas formas e de um modo repetitivo faz a apologia da violência e da razão da força (ganham os bons porque vence o mais forte) em vez de pugnar pela força da razão (ignorando que o vencido poderia ser o dono da razão).A televisão revela-se como uma potente inimiga da democracia cuja mais sublime vocação é a de permitir aos cidadãos que se elevem aos superiores níveis da cultura e, portanto, da dignidade. Sim, já quase nos esquecemos deste objectivo fundamental da democracia pois estamos cilindrados pelo mais badalado – e praticado – que é o relativo aos mais elevados índices de conforto material. Contudo, «nem só de pão vive o homem».
 
Mas não nos quedemos pelo diagnóstico e pela acusação: temos que encontrar uma solução para o problema. E essa solução consiste no regresso a valores éticos que condicionem o exercício da profissão de jornalista e de produtor de televisão.
 
A exploração sensacionalista dos telejornais para quem só há gatunos, corruptos e vilões expande o ódio, desilude os crédulos, vicia na denúncia.
 
Não haverá outros cenários menos trágicos? Não haverá outros temas que nos suscitem a busca de soluções construtivas?
 
O mundo da comunicação social vai ter que mudar muito até que se transforme num instrumento de desenvolvimento das populações a que se dirige.
 
Todos aqueles que participem na produção jornalística deveriam ser instruídos com nova formação específica – seguida de exame – com vista ao cabal desempenho dessa formidável função educativa. O objectivo desta formação seria levar os candidatos ao jornalismo – e em particular todos aqueles que produzam programas de televisão – a compreenderem que iriam participar num processo de educação de alcance gigantesco. Todas as pessoas que viessem a fazer televisão deveriam tomar consciência de que têm um papel de educadores pelo simples facto de a televisão ser vista por crianças e adolescentes. Nessa formação deveria ser abordado com especial atenção o risco existente para as personalidades vulneráveis de confundir realidade com ficção bem como os efeitos perversos que estas confusões podem desencadear.A autorização, licença ou carteira assim obtida poderia ser-lhes retirada definitivamente se alguma vez agissem em contradição com os princípios éticos que urge definir. A instituição com poder para retirar essa licença seria uma espécie de Ordem.
 
(continua)
 
Bragança, 2 de Outubro de 2008 – VII Encontro da Lusofonia
 
 Henrique Salles da Fonseca

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