FUSÕES E AQUISIÇÕES NA EUROPA
A propósito da OPA que a empresa espanhola Gás Natural está a fazer à empresa Endesa, toda a imprensa portuguesa, mesmo a supostamente especializada, parte do princípio de que se trata de algo semelhante ao que a EDP pretendeu fazer incorporando a Galpenergia. A conclusão, implícita ou implicitamente assumida, é que aquilo que a União Europeia não permitiu em Portugal já é admissível em Espanha.
É extraordinário o grau de ignorância que grassa em Portugal quando se abordam assuntos europeus.
A legislação comunitária sobre fusões e concentrações tem um objectivo primordial: impedir o aparecimento de posições dominantes num determinado mercado. Para esse efeito é portanto efectuada uma avaliação económica dos possíveis efeitos da pretendida concentração.
O facto de quer em Portugal (EDP e Galpenergia) e em Espanha (Endesa e Gás Natural) se tratar da concentração dos sectores de electricidade e gás não significa que as situações sejam idênticas à luz da legislação comunitária. O que conta são os possíveis efeitos sobre o mercado.
Ora, em Portugal a concentração das duas operadoras significava a concentração numa só empresa de todo o fornecimento energético aos consumidores e a maioria esmagadora à indústria. Em Espanha, a concentração significa, pelo que julgo saber, passar de três operadoras a duas. Ou seja, continua a haver concorrência. Além de que ainda ninguém ouviu a opinião da Comissão Europeia sobre a pretendida OPA da Gás Natural sobre a Endesa. É muito possível que haja uma investigação, precisamente para avaliar dos efeitos sobre o mercado de energia espanhol.
As situações são, em conclusão, completamente distintas e não me parece que haja qualquer razão para admitir que a Comissão Europeia seja tão sinistra que aquilo que apoia em Espanha, desaprova em Portugal. Além de que, caso o Governo Português, ou até qualquer empresa portuguesa (por exemplo a EDP), se admitir que pode ser prejudicada com esta concentração, pode apresentar uma queixa à Comissão acerca da OPA em Espanha.
Lisboa, Setembro de 2005
António Calado Lopes