CRÓNICA DO BRASIL
UM GRITO DE ALERTA
Era mais de meia-noite quando o telefone tocou. Sonolento, meu marido atendeu. O plantonista de um hospital da cidadezinha onde temos fazenda falou, preocupado. Um funcionário nosso, que estava em férias na cidade, passou mal e procurou o Pronto-socorro. Foi-lhe dado um diagnóstico de possível obstrução intestinal aguda. Talvez um volvo. Mas o jovem médico que o atendeu não tinha como fazer os exames adequados, pois o hospital onde ele estava não oferecia laboratório, aparelho de RX funcionando e nem vaga para internar o paciente. Depois de recorrer a outros hospitais da rede pública inutilmente e das súplicas do paciente, o plantonista informado que meu marido trabalhava em um Hospital Escola do governo, resolveu recorrer a ele.
Apesar de não estar de plantão e de saber que o hospital aonde ele trabalha também estava superlotado, mandou que trouxessem o rapaz de qualquer jeito. Ele precisava ser atendido, era uma urgência. Decisão arriscada que deixou meu marido extremamente preocupado, pois seriam duas horas de viagem cruciais para a vida do paciente. Finalmente, pelas quatro da madrugada, quando Aparecido chegou ao hospital da nossa cidade, conseguiu ser atendido, agora pelo meu marido, pois os plantonistas estavam ocupados com as vítimas de um acidente. Ali mesmo, no tumulto do corredor, sobre uma maca, foi examinado. Depois de mais espera na porta do RX, e da colecta de sangue, recebeu a medicação venosa de sustentação. Os exames foram feitos e para sorte do rapaz a suspeita diagnóstica não foi confirmada. Era uma oclusão intestinal parcial e passageira, que foi resolvida com medidas clinico-terapêuticas.
Esse é um quadro que se repete quotidianamente no serviço público de saúde: falta de hospitais, leitos, material, especialistas, vagas em UTIs, aparelhagem de RX e cardiografia funcionando adequadamente. Evasão de profissionais, salas de espera abarrotadas de gente, filas intermináveis para marcação de consultas (a longo prazo) nos ambulatórios das Unidades de Atendimento. E o governo, maquia a realidade, dizendo que o país tem falta de profissionais, colocando aonde pode, técnicos no lugar de médicos, liberando de vez enquanto verbas para algum programa de saúde populista, que não resolve nada, fazendo um atendimento de saúde barato, gerenciando mal o pouco dinheiro despendido.
No Brasil há 350 mil médicos actuantes (17/ 10 mil habitantes), segundo o Conselho Federal de Medicina, distribuídos irregularmente, de acordo com a região mais ou menos evoluída. Não há deficiência de profissionais como diz o governo. E sim salários aviltantes, condições de trabalho deficitárias, inseguras e estressantes, que afastam os novos profissionais do serviço público. Não é de estranhar que os jovens médicos, mais realistas e menos idealistas, procurem especialidades mais valorizadas, atreladas ao mercado de trabalho, que lhes dêem melhor qualidade de vida. O profissional antigo, dedicado, romântico, que ia à casa do paciente, que conhecia a família e recebia uma galinha como pagamento, quando o paciente não podia pagar, está praticamente em extinção, mesmo no interior do país.
Na área da saúde, o serviço público está falido, sucateado, sem profissionais especializados, sem hospitais suficientes e aparelhados, tudo porque os nossos governantes tratam a saúde do cidadão brasileiro de forma leviana, como moeda de troca em campanhas políticas. No final, quem fica penalizada é a população mais carente, que é a maior parte da sociedade brasileira, que morre à míngua, sem o devido atendimento, e vê o país no vergonhoso penúltimo lugar em investimento na saúde, no Continente.
Uberaba, 21/08/09
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Fonte: Internet.
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