COISAS LIDAS - 2
Perdido na tradução
O crítico do nova-iorquino IHT International Herald Tribune mostra que sabe pouco de literatura quando diz que António Lobo Antunes constrói propositadamente textos ilegíveis para confundir o leitor e não o deixar perceber que se trata de “Soap Opera”.
“Soap Opera” (ópera de sabão) era o nome dado às novelas radiofónicas dos anos 30, do século passado, que tinham por finalidade vender uma determinada marca de sabão. Como se sabe, o sabão fez as grandes fortunas dessa época, tanto nos EUA, como noutros países, incluindo Portugal. Portanto o Soap era uma variante da lengalenga do vendedor de banha de cobra: - entretinha o público e despachava o sabão.
Entende Will Blyth (International Herald Tribune, 21 de Novembro) que a técnica do novelista português se assemelha à do guia de montanhismo que faz das dificuldades da escalada o propósito do exercício, pois já sabe que a paisagem que se enxerga do cimo não tem o menor interesse. Segundo Blyth, a novela – “Que farei quando tudo arde” – divide-se em três partes: na primeira, o protagonista-narrador informa o leitor sobre o que lhe vai contar; na segunda, conta o que tem a contar e, na última, relata ao leitor aquilo que lhe contou. E assim consome 400 páginas.
Alguma coisa se deve ter perdido na tradução, pois o A. Lobo Antunes que nós lemos em português não vende sabão. Nada disso. O prémio Camões, 2007, é um criador. Como Malraux, prefere a criação à perfeição e vai mais longe, muito mais longe, do que Malraux.
Luís Soares de Oliveira