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A bem da Nação

PRODUZIR RIQUEZA

 

 
 
Não é fácil falar de certos assuntos, mas é necessário. Quanto mais não seja, porque é preciso compreender a causa de certos fenómenos. Ou, pelo menos, procurar explicações. E nada parece ter sido tão falado, nos últimos tempos, como a crise "psicológica" que se vive em Portugal.
 
Há muitas explicações, e talvez poucas soluções. E, todavia, estas têm que ser encontradas. Uma análise correcta de algumas causas pode ajudar.
   
Portugal é um País com um estranho "azar". Apesar da sua dimensão, criou impérios que lhe foram dando riqueza sem que tivesse, internamente, de produzir o que necessitava. Foi a África, a Índia, o Brasil, e de novo a África. As riquezas entradas foram basicamente exportadas, sem valor acrescentado. Um aproveitamento pobre da grandeza adquirida. Tudo, ou quase, do que era manufacturado, era importado com os lucros de tais riquezas. A produção regrediu, até, em certos aspectos, em relação à época anterior à Expansão.
   
Quando os Impérios desapareciam, um outro surgia, e o ciclo repetia-se. Até que desapareceu o último. E, ao fim e ao cabo, o que ficou de material? Pouco, muito pouco. Quase nada.
   
Como referiu, e muitíssimo bem, numa carta publicada na Imprensa um cidadão de Esposende chamado Carlos Sampaio, com quem adoraria trocar impressões, o que ficou, em Portugal, foi uma mentalidade negativa, concretamente "a noção de que não é fundamental contribuir para a criação de riqueza, de que basta estar estrategicamente colocado por onde ela passa".
   
Para as elites associadas a este modelo de "desenvolvimento", produzir valor acrescentado nacional era inútil, já que bastava ter lucros a exportar matérias-prima e "ganhar dinheiro a importar os produtos de qualidade acabados". A esta burguesia vendedora-compradora não-produtiva, não interessava uma indústria portuguesa autêntica, que lhe faria concorrência. Daí que algumas tentativas industrializadoras portuguesas tenham sido por ela combatidas, e até aniquiladas.
   
A pouca indústria que se foi desenvolvendo, contra ventos e marés, "foi sempre considerada de segunda classe". Ainda hoje se nota uma mentalidade, que não é nova, de considerar fraco e fora de moda o que se produz em Portugal, e considerar bom tudo o que vem de fora. Este desprezo pelo que por cá se faz "é um dos maiores problemas culturais" no País. Não se motiva o aperfeiçoamento, nem o fazer diferente. A inovação não é recompensada. E, sem inovação, dificilmente há exportação... salvo através de empresas, muitas estrangeiras, que se servem de baixos custos de mão-de-obra... e que "fogem" mal encontram outra de custos ainda mais baixos. Encontrar uma marca portuguesa no estrangeiro é difícil. Algumas "disfarçam-se" atrás de rótulos em inglês, francês, castelhano... para assim conseguirem entrar em vários mercados, incluindo (ironia das ironias!) o Português!!!
   
É evidente que, em tudo isto, está instalada uma indefinição da imagem do próprio País. "Uma internacionalização estará condenada se por detrás dela tiver uma crise existencialista de valores".
   
O nosso futuro depende de vários factores. Não nos podemos limitar "a arranjar um bom lugar na margem do rio e esperar ir apanhando uns bons peixes que passem". A qualquer momento alguém pode deixar de fornecer o rio, ou poderá desviá-lo. É preciso "escolher que peixes temos condições para desenvolver, proporcionar condições para os desenvolver, criá-los com base em conhecimentos", e nunca ficar sentados à espera.
   
Isto implica pensar ou repensar um país. Mais do que chorar, interessa meditar, e encontrar soluções. É a única alternativa à morte por inacção. É a única forma de justificar uma atitude optimista. Ao menos uma vez, veja-se o exemplo espanhol. Não ficam os nossos vizinhos sentados, à espera. Não! Reclamam, protestam, lutam pelo que julgam ser justo. Sobre Gibraltar, por exemplo. E compare-se com a atitude portuguesa sobre Olivença. Mas, aqui, detenhamo-nos essencialmente sobre aspectos de organização interna da sociedade. O que há a fazer?
   
Há que pensar na formação, e não tratar o Ensino como parente pobre. Há que incentivar o trabalho, e valorizá-lo. E dar o exemplo. Como esperam algumas elites que se trabalhe, se o exemplo que fornecem é negativo? E, claro, há que recompensar de facto quem trabalha, principalmente quem produz valor acrescentado.
   
Tem de se dividir melhor a riqueza, um dos maiores males que afectam, desde há séculos, o nosso País. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, os 20% da população portuguesa mais pobre recebe 5 % do Rendimento Líquido Nacional, e os 20% da população mais rica recebe 7,6 mais do que os 20% mais pobres. Esta diferença é o dobro da verificada nos outros países da União Europeia. Este quadro fica mais negativo se acrescentarmos que os 10% mais pobres recebem 2,2% e que os 10% mais ricos recebem 29%. Isto significa... 13 vezes mais!!!
   
Há que incentivar causas, e não prometer ou procurar riqueza imediata, pois esta só se consegue com objectivos mobilizadores que expliquem sem margem para dúvidas os benefícios de alguns sacrifícios.
   
Muito mais haverá a dizer sobre todas estas problemáticas, mas, de momento, parece-me preferível terminar aqui mesmo, esperando apenas estar a dar o meu contributo para uma reflexão geral em torno dos problemas que afectam Portugal neste início de 2006.
       
Estremoz, 17 de Janeiro de 2006
 
Carlos Eduardo da Cruz Luna     
 

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