A QUESTÃO DE OLIVENÇA (3)
UMA VISÃO PORTUGUESA
por Carlos Luna
Voltando às tentativas de recuperação por parte de Portugal...
O que choca é vê-las classificar como demagógicas, isoladas, loucas, esquerdistas, fascistas... esquecendo sempre que o próprio Estado Português mantém essa reivindicação!
Aliás, usa-se uma técnica de estigma pela classificação política em pólos diferentes. Assim, e só para nos ficarmos pelos tempos mais recentes, as autoridades espanholas franquistas classificavam como esquerdistas as posições dos grupos portugueses que reclamavam Olivença, nomeadamente o Grupo dos Amigos de Olivença. E, de facto, em alguns movimentos, estavam opositores ao salazarismo; noutros, estavam alguns salazaristas.
Muito honestamente, pode-se dizer que tais movimentações tinham pessoas de vários quadrantes.
Em 1975, os portugueses que reclamavam Olivença eram de extrema-esquerda, dizia-se em Espanha. Já em 1976 e 1977, eram classificados de salazaristas e saudosistas.
Grandes contradições, na verdade!
Concretamente, o preconceito e o desprezo eram a nota dominante. Por preconceito, chegou-se a classificar o Presidente do Grupo dos Amigos de Olivença em 1977 como salazarista, num livro publicado na década de 1990, a partir duma informação de uma revista de 1975 ou 1976. O ridículo disto é que se tratava do Professor Hernâni Cidade, um dos maiores e mais populares opositores a Salazar, que, pelo seu prestígio internacional e nacional português também, o ditador sempre teve de libertar logo após tê-lo mandado prender (deter).
Assim, neste tipo de argumentação, chega-se ao grotesco, à difamação.
A Guerra Civil de Espanha tem sido também usada para denegrir Portugal na Questão de Olivença.
É evidente que o papel de Salazar no conflito, ao entregar aos franquistas os refugiados espanhóis que sabia irem quase todos serem fuzilados e o apoio que deu ao ditador espanhol, são uma vergonha para Portugal e para os portugueses.
Não tenho pejo em afirmar que assumo como reprovável uma tal actuação, e que certamente os modernos democratas portugueses (porque os de então pouco puderam fazer) estão comigo, bem como o Povo Português em geral. E, todavia, as autoridades portuguesas, no meio da barbárie, tinham instruções para protegerem aqueles que provassem ser oliventinos, através da correcta pronúncia de algumas palavras em português. Com excepções pontuais, isso foi feito.
Claro, o regresso de muitos oliventinos a casa foi cruel, já que as autoridades franquistas, receosas que alguns "comunistas" tivessem escapado graças à tolerância portuguesa, os perseguiram sem piedade. E o ditador Salazar nada fez contra isso, já que ele próprio era ferozmente anti-comunista, e a Polícia Política Portuguesa também não conhecia a palavra piedade. Todavia, e criticando sempre e sem perdão o ditador português, há que dizer muito claramente que quem desencadeou a Guerra Civil, quem praticou massacres, quem matou e perseguiu, foram as autoridades espanholas, que, neste caso, foram mais carrascos que autoridades... como o povo espanhol deve saber muito melhor do que eu! E digo tudo isto porque, na crítica que se faz a Portugal relativa à Guerra e a Olivença, por vezes, julgar-se-ia que Salazar teve mais culpas que Franco! Ora, sem esconder responsabilidades, o que é de assinalar é que tanto Portugal como Espanha estiveram sob o domínio de ferozes ditaduras, que não podem ser esquecidas nem, muito menos, repetidas. O caso espanhol foi mais grave, pois o totalitarismo nasceu após uma Guerra, situação em que o humanitarismo, muito mais do que em outras situações, é esquecido.
Talvez o argumento mais traiçoeiro utilizado seja o de que Portugal não deve reclamar Olivença porque agora, na União Europeia, "já não há fronteiras"!
Antes de ser traiçoeiro, é falso: não há fronteiras enquanto barreiras, mas elas existem administrativamente. Um espanhol paga impostos a Madrid, um Português a Lisboa. Vive-se dentro dos limites de um País, de um Distrito, de um Concelho.
Mas... e voltando ao argumento de que agora "já não há fronteiras", ... se, de facto, as fronteiras já não têm o antigo significado e o peso nacionalista de outros tempos... por que diabo se insiste em colocá-la no Guadiana, diante de Olivença? Por que não colocá-la nas ribeiras de Olivença, Táliga, e Alcarrache? Aliás, a integração na União Europeia é até uma garantia para as populações de que o seu nível de vida, direitos, leis, não serão afectados. Nem sequer haverá problemas com trocas de nacionalidades, ou outras burocracias! Tudo mais fácil! A fronteira não tem importância? Tudo bem! Vamos colocá-la onde legalmente Portugal acha que ela se situa!
... e o Almirante Pinheiro de Azevedo (1917-1983) se bateram pelo causa de Olivença. Estariam todos errados ou é Espanha que, como os cães, quando abocanham só largam quando levam com um balde de água fria?
A dizer-se não a isto, qualquer português pode pensar que, para Espanha, só lhe interessa desprezar a fronteira quando isso lhe é favorável...
Creio já me ter alongado muito, mas espero ter dado uma ideia dos argumentos que mais causam alguma indignação em Portugal a propósito da Questão de Olivença.
O que magoa, mais do que tudo, é talvez o preconceito.
Olivença é um assunto "tabu". Informação minimamente objectiva, é quase inexistente. Em compensação (?), demagogia, frases grandiosas, propaganda, indignação, xenofobia, chauvinismo, não faltam.
Não será tempo de se poder discutir este assunto, mesmo apaixonadamente, sem se cair em histerias nem atitudes ofensivas? Não se poderá dialogar, mesmo discordando?
FIM