REVOLUÇÃO VERDE À produtividade passada pelo crivo da concorrência em mercados transparentes chama-se competitividade. Na sua maior generalidade, o mercado alimentar – que é o que mais interessa ao cidadão comum - compõe-se de três classes de agentes: os da Oferta (tipicamente grossistas), os da Procura (compram por grosso e vendem a retalho), o consumidor final que compra a retalho. A melhor forma de defender os interesses do consumidor final passa pela promoção da competitividade dos agentes da Oferta (v.g. redução de custos de contexto) e promovendo a concorrência entre os agentes da Procura. Ou seja, tudo assenta na competitividade da produção, e da concorrência entre os diferentes agentes da mesma classe. Assim se consegue introduzir a lógica na formação dos preços. Depois de termos mercados transparentes com a Bolsa de Mercadorias a funcionar normalmente, será a hora de conquistarmos a soberania hídrica pela dessalinização da água (processo dos alambiques solares-eólicos) esticando a irrigação até aos limites do razoável da marginalidade ricardiana. E quando David Ricardo disser que a nossa marginalidade já não pode ser mais esticada, teremos que negociar muito amigavelmente a instalação de mais alambiques no Magreb transformando o deserto do Sahara em terra arável, fixando populações, evitando que Vanuatu seja engolida pelas marés e fazendo de Portugal um importante operador no mercado mundial dos cereais. CONCLUSÃO Ressuscitada D. Filipa de Lencastre, se não tivermos preços lógicos (bolsa de mercadorias) não haverá PRRs que nos valham e tudo serão «pulus ad margaritam».
Durante 560 anos, de 1415 a 1975, a nossa Soberania Nacional assentou nas possessões ultramarinas e numa população escassamente instruída e, daí, ordeira, mas com mastins «à perna». Abandonado o Ultramar, restou o povo com baixo nível médio cultural.
E, apesar do que foi feito nestas últimas décadas os resultados são tímidos e continua a justificar-se uma revolução cultural.
REVOLUÇÃO CULTURAL
Erradicação do analfabetismo - Criação pelo IEFP da função «Alfabetizador» destinado a todas as pessoas que possuam o ensino obrigatório queiram obter essa valência e a funcionários escolhidos adrede nas Autarquias, Misericórdias, estabelecimentos prisionais;
Combate ao abandono escolar precoce - Alargamento a todos os Distritos da actualmente minúscula rede de vias alternativas ao ensino clássico, por exemplo Escolas Práticas de Agricultura e Escolas Práticas do Mar; autorização para que os maiores de 18 anos com o 2º ciclo completo se possam auto-propôr a exames nacionais do 12º ano a uma disciplina por ano; (re)lançamento da Telescola em sinal aberto, autorização para que civis usufruam da formação ministrada nos cursos técnicos ministrados nos estabelecimentos militares;
Ampliação da oferta de ensino público pós-secundário de cariz técnico – Criação do «ano zero» equivalente ao 12º ano do ensino obrigatório e acesso específico ao(s) curso(s) ministrado(s) na instituição em apreço; instituição do curso de Medicina Militar a ministrar pelas próprias Forças Armadas.
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Ao outro grande «boosting» da economia portuguesa a que, chamo de revolução verde, tratarei no texto seguinte.
As expedições marítimas portuguesas eram sempre atribuídas pelo Rei à responsabilidade de alguém da sua confiança, um Senhor, que se fazia assessorar por cientistas, cronistas e profissionais da marinhagem. O resto da tripulação era composto por soldados, marinheiros e carregadores, gente rude e disciplinada a chicote. Havia também alguns religiosos que encomendavam as almas e, como médicos e enfermeiros, por amor a Deus, tratavam das moléstias físicas de enfermos e moribundos. O método disciplinar do chicote manteve-se pelos séculos aquém enquanto as condições permitiam. A rudeza das tripulações era essencial ao cumprimento das funções e isso era incompatível com finuras da educação. Rudeza, sim; educação, não. A educação seria ministrada apenas a alguns, quase sempre homens da Igreja. Ler e escrever eram «coisas» da maior raridade, incompatíveis com o chicote. Assim era nos mares porque nos campos a rima era entre ruralidade e boçalidade.
Não foi por acaso que chegámos à República com quase 90% de analfabetos.
A calamidade ainda era de 25% em 1974 e em 2021 ainda eram uns vergonhosos 3,08%.
De acordo com a mais recente informação do PNUD, a maioria absoluta da nossa população em idade activa (18< < 70 anos), não completou o ensino obrigatório e só ~20% dos maiores de 25 anos possui alguma formação pós-secundária.
Este, pois, o resultado do longuíssimo período de oito séculos de desprezo pelo mais valioso recurso de qualquer país, o factor humano.
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Comparem-se os níveis de desenvolvimento global de países sem riquezas naturais como a Suíça e o Japão com países ubérrimos como a Guiné Equatorial e o Congo ex-belga.
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CONCLUSÃO PRÉVIA
* A essência do desenvolvimento reside nas pessoas; Planos de Fomento e PRRs são necessários, sim, mas claramente insuficientes.
NOTA INTERCALAR
Se com recursos humanos tão desprezados temos no curriculun nacional um Presidente da Comissão Europeia, um Secretário Geral da ONU e um Presidente do Conselho Europeu, imagine-se o que seria(mos) caso não tivesse havido desprezo humano. Se todos soubéssemos ler e escrever, se a maioria absoluta dos portugueses em idade activa tivesse concluído o ensino obrigatório e se os licenciados fossem, pelo menos, o dobro dos actuais.
Há séculos que Portugal se debate com problemas de desenvolvimento; há séculos que o diagnóstico é a escassez de recursos internos; há séculos que a terapêutica aponta para a mobilização de recursos externos.
E os problemas continuam…
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Tudo começou com a forasteira D. Filipa de Lencastre que se viu Rainha de um país pobre, mas com nobreza de pergaminho e de uma Nação aguerrida, mas boçal. Depois do susto Aljubarrota, convenceu o marido, D. João I, de que seria necessário avançar para conquistas ultramarinas a fim de ganhar corpo lá fora para poder resistir cá dentro à cobiça castelhana. Contrariando a boçalidade geral, deu o exemplo educando os próprios filhos – a Ínclita Geração.
Por ironia do destino, a «Mãe do Império» morreu nas vésperas da conquista de Ceuta.
Mas a ideia ultramarina frutificou, a da educação murchou. E, com virtudes e defeitos como em toda a obra humana, inaugurámos o eurocentrismo global. Foi disso personalidade principal o Infante D. Henrique deixando para trás a integração europeia que era a preferida do Infante D. Pedro. O europeísmo definhou na batalha de Alfarrobeira; o Império foi o modelo da nossa sustentação até 1975.
Da Ínclita Geração constou também o melancólico D. Duarte que ficou agarrado ao trono, mas foi determinante na opção expansionista enquanto o Infante D. Fernando que ficando cativo em Marrocos, tanto pode ter sido mártir como não, eventualmente com outro nome e rodeado de odaliscas.
A opção europeia de D. Pedro teve expressão poética no Velho do Restelo e acabou por tomar corpo com a nossa entrada para a CEE.
Assim acabou o modelo mercantilista e entrou em funcionamento o da permissividade, ou seja, aquele em que nos é permitido o que os demais europeus autorizam.
Do Império resta a TAP enquanto não for liquidada por mais que sejam as declarações e juras em contrário.
Fartos de tanto chumbo, os liberais bateram com a porta da Assembleia e desligaram-se do «velho amigo» deixando-o desamparado. Marcelo recusou, entretanto, assumir a substituição de Américo Tomás na Presidência da República. Passados alguns dias, os mastins «convidaram-no» a ir passar uns tempos ao Palácio de Queluz donde só sairia quando Américo Tomás dissesse. Caetano teve que negociar a sua própria liberdade e remodelou o Governo substituindo tecnocratas por burocratas inqualificáveis. Pediu ajuda à «Brigada do Reumático» em vez de falar com os Capitães já em movimento e o caldo ferveu. Então, quando a corda estava já tão emaranhada que não havia ponta por onde pegar, os «militares de Abril» saíram à rua, cometeram a injustiça de tratarem Marcelo e Tomás por igual e deitaram o Ultramar para o caixote do lixo no Largo do Carmo. Passados 50 anos, a maior parte desses militares de Abril, ainda não acredita que foi manipulada por Moscovo.
Cada acção governativa de Marcelo foi um dedo apontado a cada defeito político de Salazar; dos defeitos de Marcelo é este texto fértil.
E agora? «Agora é tarde e Inês é morta» como disse Pedro I, Rei de Portugal. Será? Creio que a Democracia arranja solução.
Com Marcelo Caetano na liderança do Governo, a polarização política deixou de ser bi entre «regimistas» em torno de Salazar e o «reviralho» (PCP + nuvem quântica de oposicionistas) para passar a tripolar entre «marcelistas», «ultras» em torno de Américo Tomás e reviralho. Dois grandes temas em debate na Assembleia Nacional e fora dela: a legalização de Partidos políticos; a evolução política das parcelas ultramarinas.
Marcelo preconizava a «evolução na continuidade», e os seus «jovens amigos» - como se referia aos membros da «Ala Liberal» - queriam a evolução acelerada rumo à democracia e os «ultras» queriam o imobilismo, mais do que a continuidade.
PARTIDOS POLÌTICOS – Depois de breve discussão doutrinária, o assunto reduziu-se à eventualidade da legalização do PCP com os «liberais» a argumentarem que a melhor forma de liquidar o comunismo seria traze-los à critica geral, em vez de continuarem na clandestinidade a engordar aura que não mereciam. Mas os «ultra» não quiseram e o máximo que permitiram foi a criação de Associações Cívicas – SEDES como único «think tank»
que continua a existir.
ULTRAMAR – Foi o livro do General Spínola «Portugal e o Futuro» que trouxe para a praça pública a discussão sobre o Ultramar. Grande sucesso editorial, gerou amplo consenso, com excepção dos radicais: à direita, os «ultras» que queriam o «statu quo» e à esquerda, os russófilos queriam que as Colónias Portuguesas passassem para o domínio soviético (o que viriam a conseguir em 1975 pela mão do «camarada Vasco».
E a corda, em vez de esticar e partir, começou a enrodilhar-se…
Pedagogo de excelência, Marcelo Caetano dirigia-se a qualquer audiência com a maior facilidade. Assim foi que fez um programa na TV e nas Rádios a que chamou «conversas em família». Eram monólogos e não conversas nos quais abordava temas da actualidade política que cativavam quem o ouvia. Neste encurtamento da distância entre a população e o Governo, consta que alguém lhe disse algo como «quando Salazar falava ninguém percebia o que ele dizia, mas toda a gente entendia o que ele significava; quando o Senhor fala, toda a gente percebe o que diz, mas ninguém entende o que significa». Eis a diferença entre quem se sente dono da casa e quem se sente convidado; um, anda em frente, mas o outro tem que se acautelar e fazer jogos de cintura, ser cerimonioso. Salazar contava com a lealdade cega dos mastins, enquanto Marcelo tinha que acautelar as próprias canelas. Mas, apesar dos perigos muita coisa tinha que mudar. O Regime cheirava a mofo, era fundamental recuperar o tempo perdido sem que os anéis e, muito menos, os dedos fossem perdidos. Então começou pelo mais fácil mudando os nomes da «União Nacional» para «Acção Nacional Popular e da PIDE para DGS. Se nos mastins apenas mexeu no nome, na ANP conseguiu introduzir um grupo reformador que na Assembleia Nacional ficou conhecido por «Ala Liberal» cuja missão foi a do debate dos temas que (também) Marcelo queria fazer aprovar, mas que acabavam chumbados ou desvirtuados pela maioria dos ultras. Entretanto, naquilo que não dependia da Assembleia, o Governo foi fazendo obra nova criando o «Banco de Fomento Nacional», o «Fundo de Fomento e Exportação», a «COSEC», o Porto e Complexo industrial de Sines, integração de rurais e de pescadores na segurança social (assim deixando de terem que trabalhar até à morte), constituição em ritmo acelerado de Caixas Profissionais de Previdência e “last but not least”, abriu o ensino superior à iniciativa privada.
O PIB crescia, crescia…, mas os «ultras» não terão reparado nisso e esticaram a corda…….
Com a sua típica e estonteante destreza verbal, Américo Tomás falou à Nação informando que os relatórios clínicos referiam a irreversibilidade da invalidez do Doutor Salazar. Com grande pesar, sentia-se na obrigação de o substituir no cargo de Presidente do Concelho de Ministros pelo que nomeara o Professor Doutor Marcelo José das Neves Alves Caetano a quem encarregara de formar Governo.
Cumpridas as formalidades constitucionais, Marcelo Caetano decidiu proferir o discurso inaugural do seu novo mandato com toda a pompa. No hemiciclo da (então) Assembleia Nacional, com transmissão em directo pela TV e rádios, espaço completamente cheio pelos próceres do Regime. E eram tantos nas imagens da RTP…! Mas não vi Régulos da Guiné nem Liurais de Timor. Discurso formidável, a fazer História, mas destinado a acalmar os que ali estavam e que se acotovelavam para aparecer nas imagens. O discurso da continuidade, com a diferença de passarem a ser governados por gente comum e não mais por um génio da Humanidade.
Peça notável, sem dúvida, de grande erudição e que, pontuada pelos «muito bem», típicos dos louvaminheiros de então, também deu esperanças aos evolucionistas. Começava a «Primavera Marcelista».
Após o discurso no Hemiciclo seguiu-se a cerimónia de cumprimentos no Salão Nobre onde Marcelo e seus Ministros se puseram a jeito para serem cumprimentados pela longuíssima fila de «regimistas». Chegada a vez do sucessor de «Jimmy» como mastim alfa, Marcelo terá dito algo como «O Senhor deve agora ir cumprimentar o Ministro do Interior que é o seu superior hierárquico». E com estas brevíssimas palavras perdeu a fidelidade cega e absoluta que os mastins prestavam ao fundador do Estado Novo, Salazar. Assim se escreve o futuro.
Foi durante a guerra civil espanhola que os italianos tiveram as mais amplas oportunidades para exibirem a sua prodigiosa inutilidade militar, a ponto de Franco se ter visto obrigado a inventar um pretexto qualquer para os devolver à origem sem que Mussolini se ofendesse.
Perante tal escândalo, Salazar ficou desconfiado do modelo político italiano e pediu a Marcelo Caetano que fosse presidir (?) à cerimónia de inauguração da Cátedra de Estudos Portugueses da Universidade de Roma e que, discretamente, tentasse averiguar da credibilidade do Regime de Mussolini. Corria o ano de 1938.
Como era de esperar, Marcelo saiu-se bem da missão que lhe fora confiada. Sobre a parte oficial da missão terá produzido documento que se encontra nalgum arquivo e sobre a parte não oficial terá, presumivelmente, feito relato verbal a Salazar e o que dessa conversa transpareceu foi apenas que Marcelo achou que o Regime de Mussolini era apenas uma comédia teatral (a Salazar não era necessário nem conveniente empregar a palavra mais apropriada, a de «Fantochada»).
Salazar decidiu despegar-se do modelo italiano não mexendo, contudo, no corporativismo e só mexendo em alguma coisa pra que tudo continuasse na mesma. Mas só depois de Espanha acalmar-se.
Esperou por 1940 para nomear Marcelo Comissário Nacional da Mocidade Portuguesa. O «S» na fivela do cinto das fardas deixava de significar «Salazar» para passar a significar «Servir», o exacerbamento do patriotismo passava a ser feito apenas pelos cânticos e pelo desfile no 1º de Dezembro enquanto a grande actividade passou a ser desportiva na ginástica, hipismo e vela; nas horas vagas, alguma Ordem Unida para induzir a disciplina e o «espírito de unidade» - mas isto era só para quem não estava inscrito num desporto.
Estava na hora de dizer aos remanescentes do Integralismo Lusitano que ou se integravam ou zarpavam e que o Direito Canónico era «coisa» da igreja e não do Estado Português. Pedro Teotónio Pereira integrou-se no Regime e serviu como Embaixador de Portugal em vários postos, nomeadamente em Madrid e em Washington, enquanto Francisco Rolão Preto optou pelo exílio só regressando depois do 25 de Abril de 1974.
Sem prejuízo da sua docência na Faculdade de Direito na Universidade de Lisboa, Marcelo despolitizou o mais possível a Mocidade Portuguesa, mas em 1944 deu a missão por fastidiosa.
Dedicou-se plenamente à Universidade até Salazar o convidar para seu Delfim como Ministro da Presidência.
Das muitas iniciativas que tomou, duas ficaram para a memória: uma campanha de alfabetização de adultos e a criação da RTP.
Seguiu-se a Reitoria da Universidade e todas as convulsões das greves académicas que tanto incomodaram o Regime… até que a cadeira de Salazar se partiu.