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A bem da Nação

A FÉ E A RAZÃO

Desta vez, dedico-me a matéria de grande elevação e recorro a pensadores que me merecem todo o respeito.

Começo por colocar a tónica na formação racionalista como fundamental para a tomada de consciência e para o reconhecimento dos limites da liberdade, ou da autenticidade do sentido de democracia.

Cito Karl Popper a págs. 32 da sua autobiografia intelectual, «BUSCA INACABADA» (edição ESFERA DO CAOS, 1ª edição, Fevereiro de 2008) em que ele afirma que “a teologia (...) é devida à falta de fé”, conceito com que concordo plenamente pois quem tem fé não precisa de explicações e a quem a não tem, pode não haver explicações que bastem. Foi para estes últimos que a Teologia foi edificada.

Compreendo perfeitamente que D. Manuel Clemente, Cardeal Patriarca de Lisboa, faça prevalecer o “espiritualismo apoiado nos valores transcendentais” precisamente por ser homem de fé; eu não sou Cardeal.

Mas a Igreja há muito que se fez evoluir por caminhos complementares ao da fé com vista à ultrapassagem de erros históricos (os episódios de Galileu e de Darwin) e de resposta a movimentos políticos e sociais tão significativos como a Revolução Francesa e o cenário social da revolução industrial. Não era mais possível manter a nostalgia duma cristandade assente apenas no poder da fé; havia que atrair os adeptos da razão, atracção que não repudio liminarmente.

Foi também nesta senda complementar à da fé que se reuniu em Roma nos anos de 1869-70 o Concílio Vaticano I que foi abruptamente interrompido com a invasão do que restava dos Estados Papais pelas forças de Garibaldi. Contudo, tiveram ainda os Padres conciliares tempo para aprovarem um documento de tal modo importante que obteve a classificação mais elevada dos produzidos pela Igreja, uma Constituição. Mais: obteve a classificação de Constituição Dogmática. Recebeu o título Dei Filius a partir das primeiras palavras do seu texto “O Filho de Deus e redentor...”

A ideia central e fundamental do documento diz que há duas possibilidades de conhecimento: a razão natural e a fé divina. Mais diz que estas duas ordens do conhecimento são distintas não só no seu princípio como também no seu objecto, onde fica claro que sem fé a razão não consegue alcançar os mistérios escondidos de Deus e “jamais poderá haver verdadeira desarmonia entre a fé e a razão porque o mesmo Deus que revela os mistérios e comunica a fé, também colocou no espírito humano a luz da razão”.

E foi por caminhos assim que a Igreja evoluiu... e o Papa João Paulo II pediu desculpas pelo erro cometido contra Galileu referindo em 1998 na sua encíclica Fides et Ratio que “O homem encontra-se num caminho de busca humanamente infindável”.

Concluindo, regresso a Karl Popper quando ele afirma que na sucessão contínua de tentativa-erro-correcção-tentativa-erro-correcção-tentativa... do método científico, a verdade é um ponto no infinito.

Como muito provavelmente terá dito Santo Anselmo na formulação das premissas racionais que levaram à construção do seu argumento ontológico e antecederam a publicação do seu Prologion, “Haja Deus!”

 

 

 Henrique Salles da Fonseca

 

BIBLIOGRAFIA

Nuno Santos – Fé e Razão, um mútuo reconhecimento desde o Concílio Vaticano I – Dei Filius, BROTÉRIA, Fevereiro de 2013, pág. 125 e seg.

 

OS GRANDES FILÓSOFOS

Hoje, ouvi alguém proferir uma frase que me parece absurda: - Tento compreender os grandes filósofos.

Como os pode o personagem classificar de grandes se não os compreende? E, no entanto, bastaria que atribuísse a outrem a tal grandeza para que a afirmação deixasse de me parecer absurda. Algo como: - Tento compreender os filósofos que se diz serem grandes.

Para já, a pergunta que me ocorre é: - O que é um grande filósofo?

Mas, afinal, ainda faço outra pergunta: - O que é um filósofo?

Antes de uma resposta, avanço com a afirmação de que não reconheço qualquer relação biunívoca entre ser-se licenciado em filosofia e ser-se filósofo.

Como assim?

Exactamente assim: ser-se licenciado em filosofia é saber mais ou menos extensivamente ou mais ou menos especificamente o que outros filosofaram; doutos em filosofias alheias, não necessariamente pensadores de produção própria.

E, deste modo, já estou a avançar para a resposta sobre o que é ser-se filósofo: é ter ideias próprias sobre temas a que tradicionalmente se dá enquadramento na Filosofia. Tantas são estas áreas do pensamento que não vou aqui enumera-las. Pareceria o índice duma enciclopédia e isso está disponível à distância de poucos cliques.

Então, nesta pertença, o que é ser grande?

Considero algumas características cumulativas fundamentais:

  • Ser lógico;
  • Ser original;
  • Saber escrever;
  • Ser democrata.

Qualquer pensamento, não sendo lógico, é anedótico ou absurdo, o que exclui o seu autor da classificação de filósofo e, por maioria de razão, do direito ao epíteto «grande»

Se o raciocínio não for original, o seu autor será um papagaio plagiador mas não um filósofo e nem sequer «grande».

Um pensamento lógico e original que não seja bem descrito (escrito) pode transformar-se num enredo de compreensão difícil ou impossível o que conduzirá o seu autor à classe dos labirintistas mas não á de filósofo e muito menos à de «grande».

Se a boa escrita não for clara e simples e, daí, acessível ao comum dos mortais e só destinada aos «iniciados», o seu autor poderá ser filósofo, sim, mas seguramente sem grande utilidade para os comuns e, portanto, não «grande».

CONCLUSÃO:                                                                                   

A frase «Tento compreender os grandes filósofos» é absurda.

Março de 2021

Henrique Salles da Fonseca

DO, PELO E PARA

ou

DAS PEDRAS DA CALÇADA

A propósito do meu escrito «MOVENDO MONTANHAS», o meu Amigo Dr. …(mantenho o anonimato por que ele optou)… enviou-me o seguinte comentário que muito apreciei e me levou a pensar em Gilles Lipovetsky:

«M/ Caro Dr. Salles da Fonseca, Viver sempre foi perigoso - e hoje os perigos nem sequer são mais agudos, muito pelo contrário. Só que nos, ocidentais, nos tornámos sociedades hedonistas que se sentem perdidas quando se vêem fora das suas bolhas de segurança e de prazer. O chato é que a História nos mostra que sociedades hedonistas não têm grande futuro.»

Para mim, este comentário vale por si próprio e muito mais do que o texto comentado e, sobretudo, porque num ápice nos remete para o sumo do livro «A ERA DO VAZI do Autor que cito.

* * *

Ao estilo de duas ou três pinceladas de Picaço…

… tudo começou com a perda do medo da ira divina e com a militante laicização dos processos sociais – o Modernismo, com o Poder de inspiração divina a ser substituído pelo de génese popular. A não muita distância, a perda das normas da moral estrita em que os séculos anteriores haviam enquadrado os nossos antepassados de então - agnosticismo e ateísmo de tendência amoral a que há quem chame Pós-Modernismo, «anarcho friendly». Seja!

A partir do momento em que se deu início a um meticuloso processo de desregulamentação, a fragilidade da ética laica evidenciou-se até ao limiar do crime. Assim se criaram espaços de livre movimentação que são amiúde utilizados fora das rotas do bem-comum.

Livres de constrangimentos bélicos, desconfinadas de rígidos códigos éticos, orientadas por quadros legais de índole benigna gerados em consenso por estruturas políticas pluripartidárias, as sociedades ocidentais, depois de reinventarem a globalização, de vencerem a Guerra Fria e de esvaziarem o conteúdo da actuação sindical dos «colarinhos azuis», gerem a paz em ambiente de descontração e a seu bel-prazer - o reino do hedonismo. E porque vida só há uma, acresce o «carpe diem».

Sociedades do prazer, pelo prazer e para o prazer e, tudo, já!

Assim, a questão que se coloca é a de saber se um tal modelo é sustentável.

O primeiro abanão é este por que ora passamos, o do pandémico Covid que começou por ser 19 e já vai no 21. O prazer ruiu e a pergunta seguinte é: - E agora?

Agora vamos ter que optar entre continuarmos ou não a assentar num modelo cada vez menos produtor de bens transaccionáveis e cada vez mais assente em serviços mais ou menos transacionáveis, globalmente distantes da autossuficiência cujo défice é suprido por quem não tem um quadro jurídico benigno, não respeita os Direitos Humanos e nos destrói com os vírus que liberta; vamos ter que optar por voltar a sujar as mãos ou continuar a importar quem nos desentupa os esgotos, pinte as paredes e esquadrinhe as pedras da calçada; enfim, temos que optar entre continuarmos a consumir prazeres efémeros e autofágicos  no vazio de sonhos mobilizadores ou encontrar um rumo democrático que reponha os grandes objectivos no horizonte de sociedades livres que queremos continuar a ser. E esta última perspectiva, sem opção alternativa.

Sonho, procura-se!

Março de 2021

Henrique Salles da Fonseca

MOVENDO MONTANHAS

 

No seu livro «O mundo como vontade e representação», Schopenhauer considera que o que conhecemos através dos nossos sentidos, o conhecimento empírico, é a simples representação das coisas mas que a realidade dessas mesmas coisas é praticamente inacessível ao comum dos mortais.

Daí, Sue Prideaux, na sua biografia sobre Nietzsche intitulada «EU SOU DINAMITE» afirmar no final da pág. 69 que…

Toda a vida é anseio por um estado impossível [o da compatibilização entre a representação e a realidade] e, por conseguinte, toda a vida é sofrimento. Kant escreve de um ponto de vista cristão que tornava suportável o estado sempre imperfeito e sempre desejoso do mundo empírico porque seria possível esperar uma espécie de final feliz, caso se fizesse o esforço suficiente. A redenção era sempre possível através de Cristo.

* * *

Esta «saída» kantiana faz-me lembrar que a fé move montanhas.

Henrique Salles da Fonseca

O PREGO

Foi lá pela segunda metade do séc. XX que em Portugal se iniciou a inseminação artificial das vacas leiteiras, época a partir da qual os Veterinários de província tiveram que passar a visitar tudo quanto era estábulo leiteiro por esse país além…

Remonta a essas épocas primevas da dita técnica a história que se conta do Veterinário que foi inseminar artificialmente as vacas de um casal já velhote de agricultores minhotos. Chegado ao local, recebido pelo casal anfitrião, logo foi conduzido ao estábulo. Eram duas as vacas a beneficiar. Poisada algures a instrumentália apropriada ao acto, tomou o Veterinário a iniciativa de tirar a camisa para poder usar as mãos e os braços depois de apropriadamente ensaboados para melhor fluírem no interior das vacas sem o estorvo das mangas e sem bulir com as partes a manipular.

E o par de velhotes, nada percebendo do que se passaria de seguida e só conhecendo o método reprodutivo que consta da Natureza, esperava que o Veterinário se aprontasse para a função… Então, solícito, o agricultor logo foi dizendo que, «para pendurar as calças, o Senhor Doutor tem ali aquele prego».

* *

Foi desta história que hoje me lembrei quando me dirigi a um famoso laboratório de análises clínicas para fazer o «teste do Covid», exame prévio este que é legalmente imprescindível para a intervenção cirúrgica a realizar dentro de dois dias.

Ao entrar no gabinete em que o «teste» se realizaria, fiz a parte de procurar o cabide ou, no mínimo, o prego na parede. Vendo-me indeciso, uma das Técnicas presentes perguntou-me o que eu procurava. Respondi-lhe que procurava o prego para pendurar as calças.

- Pendurar as calças para quê?

- Para não se amarrotarem quando as tirar.

- Mas não precisa de tirar as calças.

- Como assim? Não pretendem fazer-me um «teste»?

- Sim, claro, mas não precisa de tirar as calças.

- Então?

- Qual é a dúvida que o Senhor Fonseca tem?

- A questão está em que «teste» tem a ver com testículo e, para me fazerem essa observação, vou ter que tirar as calças. Ou serão as Senhoras já tão experientes que vos basta um golpe de vista mesmo por cina das calças?

A gargalhada da Técnica da conversa foi mesmo hilariante, a outra que estava ao lado esboçou um sorriso de quem não alcançou a etimologia e a terceira manteve-se sisuda como se o seu mentor religioso, seguramente paulino, não lhe permitisse humores carnais.

Posto o que me enfiaram uma cotonete até à base frontal da consciência e me mandaram em paz.

Ao sair, a hilária ainda me agradeceu a aula de português e confirmou que naquele gabinete só se fazem exames e não testes.

E o prego não estava lá.

Lisboa, 9 de Março de 2021

Henrique Salles da Fonseca

«SYLLOGISMUL INVIDIA» - 3

Regressado à sua dimensão continental anterior à conquista de Ceuta em 1415, Portugal teve rapidamente que «lamber as feridas» integrando meio milhão de civis e militares desmobilizados do Ultramar que de lá vieram com a roupa que traziam no corpo, teve que suportar uma dolorosa tentativa de sovietização, teve que repor a ordem cívica e criar uma democracia pluripartidária.

E a vida continuou…

… na integração europeia, a tal ideia que os soviéticos não toleravam e que, morta a URSS, a orfandade leninista que há tempos usava colarinho azul teima em combater em sintonia envergonhada com os gramscianos, com os eruditos de mania trotskista e com outros filomarxistas de colarinho branco.

Eis-nos, assim, chegados a um novo cenário em que uma crescente burguesia pós-moderna, hedonista, consumista, disputa as luzes da ribalta em confronto mais ou menos aberto com a «esquerda caviar» que se diz puritana mas que, sendo adepta do silogismo da inveja, mais não consegue do que tentar destruir os Valores do Ocidente, a começar pelos padrões da sua História.

A nova parangona marxista aí está, «a dinâmica da História». Mas a História é definitivamente estática depois de ter registado os factos ocorridos. A História é registadora e qualquer outra missão que se lhe queira dar só pode ter como objectivo o apagamento da memória para uma aniquilação civilizacional e uma posterior manipulação de um novo determinismo cultural.

Mas os espectadores não são cegos e já toparam a jogada dando voz – de momento, apenas nos actos eleitorais – às forças que reagem mais abertamente a essa investida demolidora. Contudo, mais do que um putativo confronto físico que as Forças de Segurança sempre conseguirão domar, o perigo  que se perfila está na eventualidade de – por causa da inveja estaminal - a prossecução da busca do bem-comum assente nos valores do humanismo democrático e na economia social de mercado perder o pé no turbilhão que o eufemístico «politicamente correcto» vem acelerando.

E, se isto acontecer em Portugal e no resto da Europa, então, Estimados Leitores, será o

FIM

Março de 2021

Henrique Salles da Fonseca

«SYLLOGISMUS INVIDIA» - 2

Nascida a filosofia marxista, Lenine serviu-se dela para instaurar a ditadura do proletariado e aos brados de «Proletários de todo o mundo, uni-vos», preconizou a sovietização mundial.

A Lenine, seguiram-se lutas tremendas pelo protagonismo de que saiu vencedor Staline e Trotsky exilado e assassinado no México depois de algumas «faenas» com Frida Kahlo.

Não tive o interesse suficiente para tentar identificar a reunião do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética (nem sequer imagino se a informação está acessível) em que foi decidido intervir em Espanha com o claro intuito de sovietizar a Península Ibérica e ensanduichar a Europa capitalista levando-a ao colapso e ao predomínio de Moscovo sobre todo o velho continente.

No raciocínio expansionista soviético, uma vez dominada a Europa, o resto seria «trigo limpo». Não foi.

Mas os revezes são atirados para trás das costas e o desígnio fundamental de levar a Europa capitalista ao colapso continuou na «Ordem do Dia».

Falhada a «conquista de Granada», decidiram tomar África para se substituírem às potências colonialistas europeias. Mas tanto Inglaterra como França já tinham dado a independência política (não a económica) às suas colónias e à URSS mais não restou do que apoiar a criação de Movimentos de contestação à presença de Portugal em África. Assim nasceram o PAIGC (Guiné-Bissau), o MPLA (Angola) e a FRELIMO (Moçambique).  Seguiram-se 13 anos de luta armada naqueles três teatros e apenas na Guiné-Bissau é que Portugal não saiu claramente vencedor.

Então, se a URSS nada conseguia de substancial naquelas três frentes de luta, terá sido decidido «cortar o mal pela raiz» levando a cabo um golpe de Estado em Portugal colocando em Lisboa um Governo sovieto-amigável.

Apanhado pelas costas, foi no Largo do Carmo, em Lisboa, que em 25 de Abril de 1974 Portugal perdeu o Império o qual passou, mais ou menos descaradamente, para a esfera soviética.

Entretanto, em 1961 já se tinham passado para outras esferas de influência o forte de São João Baptista de Ajudá (Lomé) e o Estado Português da Índia (União Indiana).

* * *

No ínterim, uma nota que pode parecer extemporânea neste local do presente texto: durante parte substancial do consulado salazarista, o Director dos Serviços de Informações portugueses (PIDE), o Capitão Agostinho Lourenço, era homem de confiança (membro?) do britânico MI6 e, quando deixou de exercer a função em Portugal, foi para Director Geral da Interpol.

* * *

Identificado o «Espírito Santo de orelha» do Doutor Salazar, não admira que naquelas épocas predominasse em Portugal (e, pelos vistos, mãis além…) a opinião de que Bandung e os ditos «não alinhados» não passassem de uma mistificação totalmente manipulada por Moscovo. Disso dão testemunho (gatos escondidos com os rabos de fora) as políticas económicas levadas a cabo por Nehru e por Sukarno nos respectivos países.

CONCLUSÕES:

  1. Os Serviços de Informações do Doutor Salazar não estavam organizados apenas à escala doméstica;
  2. É admissível que o Doutor Salazar se considerasse (e como tal se visse reconhecido internacionalmente) o grande defensor da Europa contra a sovietização do seu «centro do mundo»;
  3. Num transe tido por global, o agredido não podia negociar sem que isso demonstrasse fraqueza;
  4. Quando estava em condições de poder negociar, Portugal capitulou nos bastidores, o Largo do Carmo.

Segue-se a continuação da História…

(continua)

Março de 2021

Henrique Salles da Fonseca

 

«SYLLOGISMUS INVIDIA» - 1

Em ordinário, a língua falada pela ordem comum, a língua vulgar, não especificamente erudita, no nosso caso, o português, o título acima é «O silogismo da inveja». E porquê o título em latim? Por três razões, a saber: porque silogismo é «coisa» que vem da Antiguidade Clássica; porque a inveja é «coisa» muito mais antiga do que a dita Antiguidade Clássica; porque eu quero fugir o mais rapidamente possível do que é ordinário e a inveja é-o, claramente.

Inveja é substantivo mas hoje refiro-me ao adjectivo invejoso que é aquele que não quer que os outros tenham aquilo que ele próprio não tem.

Com esta simplicidade se chega à razão primeira da filosofia marxista. O marxista não quer que os ricos o sejam pois os pobres não conseguem enriquecer. E na visão marxista – estava a dita filosofia a nascer no século XIX, já lá vão quase 200 anos – os ricos eram os causadores da pobreza alheia. Solução? Acabar com os ricos.

Portanto, a inveja é o que está na base da filosofia marxista e para se ser um bom militante marxista tem que se ser um refinado (no sentido de politicamente formatado) invejoso. Tudo o resto são roupagens cujo objectivo consiste em tapar a sua ominosa nudez transformando a genética ordinária em virtuosa estirpe.

Até aqui, tudo semântica mas daqui em diante, «pia mais fino».

Diabolizado o lucro, tanto Lenine como os seus pragmáticos seguidores morderam o anzol que tudo lhes levaria a perder. Sem lucro não há poupança, sem poupança não há investimento, sem investimento não há progresso, sem progresso não há esperança e sem esperança não há sistema político que vingue sustentadamente nem sequer munindo-se de Polícias políticas, de costumes ou outras… Eis o silogismo da inveja que nem as tropelias contra os Direitos Humanos conseguem perturbar eternamente por serem contrárias à essência humana.

E o silogismo conduziu ao ponto mais do que ridículo – e, contudo, dramático para milhões de vítimas – de o determinismo histórico que previa o triunfo do marxismo sobre as ruinas do capitalismo se ter revelado ao contrário da (falsa) profecia com a glória das sociedades livres e socialmente previdentes sobre as ruinas do totalitarismo soviético.

Mas, entretanto, enquanto o pau foi e voltou, em nada folgaram as costas e sobre a Guerra Fria ainda não foi tudo dito. Sem a pretensão de pôr um ponto final sobre esse período da História de que eu próprio sou «documento coevo», direi algo no próximo texto, o do imperialismo soviético.

(continua)

Março de 2021

Henrique Salles da Fonseca

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