São 599 páginas de texto pois começa na 21 e acaba na 620. Antes do início, há todos aqueles prolegómenos tais como o título e a ficha técnica, por que habitualmente passo os olhos, mas esta edição conta também com um prefácio que não li. Mas se um dia...
... então, em desespero, poderá ser que me abalance para essa leitura que por certo nos quer dizer o que devemos pensar quando começarmos a ler. Ainda não totalmente munido de «capito diminutia», não li. E se um improvável dia o fizer, será apenas com o intuito de comparar a opinião do prefaciador com a minha própria opinião.
Independente da opinião do autor do prefácio e tendo apenas lido metade do que se apresenta na contra-capa (a outra metade é um extracto do prefácio já referido), atirei-me à leitura com todo o interesse por se tratar da minha estreia em Mário Vargas Llosa e por já saber que se tratava de um romance histórico sobre um episódio que eu desconhecia totalmente, a Guerra de Canudos.
Da contra-capa extraio que em finais do século XIX, no Brasil, no sertão da Baía, um vasto movimento popular formado em torno de um místico – António Conselheiro – funda uma sociedade à margem do mundo oficial. O Governo do Rio de Janeiro (onde então era a capital federal) reage enviando uma pequena força militar para “repor a ordem”. Mas a resistência foi imediata e eficaz obrigando a tropa a fugir. E com isto se dá início à Guerra de Canudos para a qual foram mobilizados milhares de soldados que, depois de muitos mortos, os sublevados são, enfim, esmagados a ferro e fogo.
Mas não nos esqueçamos de que se trata de um romance histórico. E o mais fantástico é ver o Autor a misturar a realidade com a fantasia com tanta plausibilidade que por vezes tive que recorrer à Internet para saber quais eram os personagens reais e os fictícios. E a certa altura adiantei-me na consulta e fiquei a saber antecipadamente o que ia acontecer no livro. Mas em vez de me estragar a leitura, deu-me margem para saborear a trama romanesca, a qualidade literária e um aplauso ao trabalho de investigação a que Vargas Llosa deve ter sido obrigado.
O texto português é muito bom e considero da mais elementar justiça um louvor ao Tradutor. Quase me apetecia dizer que se o original for tão bom quanto é a tradução, Vargas Llosa é mesmo um Autor formidável, muito superior ao nasalado Bob Dylan[2].
Novembro de 2016
Henrique Salles da Fonseca
[1] In «Vou-me embora p’ra Passárgada», Manuel Bandeira
[2] Cuja obra literária desconheço por completo; apenas o conheço como nasalado.
Donald Trump, o candidato incorrecto, que é alérgico à imprensa da capital e se apresenta como o salvador dos prejudicados pela globalização, mete medo à Alemanha. Por isso a imprensa tem-no muitas vezes apresentado como um monstro.
A vitória desejada para Clinton significaria para a Alemanha a afirmação da necessária presença feminina no poder mundial e ao mesmo tempo a continuidade na harmonia concordante no estilo democrático do SPD. Segundo sondagens na Alemanha 75% deseja a vitória a Hillary Clinton e 4% a Donald Trump, 20% a nenhum dos dois e 6% abstêm-se (Statista, Novembro).
Parte dos alemães têm medo de se afirmar mais na Alemanha o grupo dos “Putin-verstehern” (Compreendedores de Putin) na eventualidade de Trump ser eleito.
A opinião pública e a classe política alemã sentiam-se entusiasmadas com o derrapar de Donald Trump. Desde que FBI se debruçou sobre os emails de Hillary Clinton e a sua popularidade começou a descer para o nível das sondagens de Trump a preocupação pública aumentou.
O trauma do medo nacionalista paira sobre a alma alemã como uma espada de Damocles. Trump é o melhor gancho para tais receios de que os autocratas movidos pelo nacionalismo se afirmem. Naturalmente um medo comum a grande parte da classe política europeia estabelecida.
A Alemanha, com uma mulher no topo da política e da governação e talvez como compensação contra uma certa masculinidade da economia e da forma de governo, deseja ver Clinton como mais um luzeiro feminino no horizonte das nações poderosas.
A vitória de Clinton seria vista como mais um passo em frente no sentido do equilíbrio dos pratos da balança do domínio masculino e feminino na arena política. Muitos sentem a democracia ameaçada com homens machistas como é o caso da Turquia, Rússia, China, Filipinas, Coreia do Norte, etc...
Além disso, uma Alemanha que se considera como um motor da UEE e como representante do sistema da UE não suporta um candidato à presidência como Trump, que coloca na ordem do dia temas escandalosos, muito embora ele não esteja isento de escândalos sexistas e de fraude fiscal.
Na sociedade pensante alemã, porém, domina a convicção que a democracia dos USA é estável e também seria capaz de aguentar um Donald Trump sem sofrer danos porque ele não poderia governar sozinho. Ele consegue movimentar o sonho de uma América que deseja voltar a ser grande.
A eleição de Clinton significaria para a Alemanha a afirmação da necessária feminilidade acrescentada da sintonia com o ideário político do SPD. Por isso o poder estabelecido alemão deseja, de coração a vitória de Clinton. Preferem o poder da economia ao da testosterona. Além disso os alemães não gostam de experiências arriscadas na política, preferem a normalidade do trabalho político em benefício do cidadão normal; o que não quer dizer que estejam de acordo com alguns aspectos da política de Clinton.
DONALD TRUMP SIMBOLIZA A HÍPER- REACÇÃO DE UM SISTEMA EM RETIRADA
Numa população em franca transformação demográfica e cada vez mais multifacetada, a tonalidade branca dominante cada vez marcará menos a sua presença.
Nos USA, muito provavelmente assumirá o poder, pela primeira vez, uma mulher. Segundo sondagens americanas 90% dos “Afro-Americanos” e 75% dos hispânicos (67 milhões) tencionam votar em Clinton. A vitória poderá depender também da maior ou menor afluência destes às urnas.
Obama ganhou as eleições devido à abstenção de 47 milhões de brancos nas últimas eleições. Se Donald Trump conseguisse movimentar parte destes para as urnas então a vitória de Clinton estaria mais em perigo. Na realidade a última declaração do FBI, de que Clinton não terá cometido crime com os e-mails, virá ajudá-la. Numa sondagem o „Washington Post” prevê 48% dos votos para Clinton e 43 para Trump.
Assistimos a um sofrimento passageiro onde o fenómeno Trump simboliza a híper-reacção de um sistema cultural, e de uma classe política, homogéneo, agora em retirada, numa sociedade em transformação. Trump abanou o sistema mas não irá além do sofrimento de uma classe política que se recusa a aceitar a mudança que se tem verificado nos USA étnica e ideologicamente. A taxa de natalidade dos imigrantes e dos hispânicos cada vez influenciará mais a política americana.
Os USA dão a impressão de estarem um pouco adoentados mas é uma sociedade viva com imensas potencialidades. Não haverá nada a recear; os americanos têm, apesar de tudo, mostrado responsabilidade em relação ao mundo.
Na Alemanha, nem Clinton nem Trump teriam oportunidade de serem eleitos.
Trump também não teria hipótese de vencer na UE. Mas a maneira como Bruxelas configura a política fomenta o processo de concretização do fenómeno Trump. Nos USA como na UE um globalismo extremo fomenta o nacionalismo como contraponto.
ELEIÇÕES NOS ESTADOS UNIDOS – PONTO DE VISTA
A nova forma do discurso político
Na Alemanha dá-se muita importância ao que se passa politicamente nos USA. A posição de Trump com o apoio do Brexit, uma mudança de política mais complacente com a Rússia, bem como a anunciada política de restrição aos imigrantes e maior controlo dos muçulmanos assusta uma Europa que segue uma política da cultura das portas abertas.
A Europa social-democrata receia que com Trump, se intensifique na opinião pública europeia o processo de fortalecimento dos conservadores e dos países membros da UE que advogam uma política restritiva em relação aos refugiados recebam ventos favoráveis.
Clinton é vista como a garante do sistema democrático e Trump com a sua intenção de diminuir os impostos favorece uma economia capitalista liberal pura e deste modo a USA distanciar-se-ia mais da UE porque tal política implicaria o favorecimento das empresas, distorções de concorrência e mais dessolidarização com os desprotegidos do sistema. Há muitos medos porque está muito em jogo, no aspecto económico, social e estratégico.
A política externa, independentemente de quem assuma o poder como presidente, continuará a servir orientada sobretudo pelos interesses estratégicos americanos. A política interna continuará a ser mitigada. Quer Clinton quer Trump são patriotas.
Em política tornam-se difíceis previsões. Muitos viam em Obama o salvador do mundo e na realidade, sob a sua administração, a paz no mundo ainda piorou.
O menor empenho dos USA na Europa, como quer Trump, significaria maiores sobrecargas económicas da EU em benefício da NATO. Na qualidade de potência europeia a Alemanha teria de apressar o seu papel de braço forte de uma Europa mais militarizada.
Já na regência de Obama, a Alemanha e com ela a UE começaram a impulsionar o orçamento militar para irem assumindo mais “responsabilidade” nos conflitos mundiais através da NATO e assim aliviar os USA no assumir de novas tarefas para que os USA se ocupem mais da Ásia. Daqui é que soprarão os ventos e ventanias que determinarão o futuro e não da Europa. A Europa independentemente do inquilino da Casa Branca assumirá mais responsabilidade militar na NATO e no mundo.
Tacitamente, sem que a opinião pública note, os governos já aumentam os orçamentos militares. Para se preparar o povo para a militarização da Europa, já se fala da necessidade de introduzir o serviço militar obrigatório.
A campanha eleitoral americana revela a introdução de uma nova forma do discurso político (saber secreto e Internet) como se vê na intervenção do FBI na campanha eleitoral. O discurso americano revela a era Facebook, de expressão mais popular. As intervenções do FBI, do WikiLeaks (Assange) e o novo estilo da retórica de Trump obrigam a estratégias mais populares das controvérsias que questionam fundamentalmente os poderes estabelecidos e a sua correspondente estratégia do politicamente correcto que tem levado os fazedores da opinião pública a trazer uma tesoura na cabeça que sanciona já na origem a produção do texto gerando no público uma consequente censura automática que leva as pessoas, por decência do oportuno, a não poderem dizer o que pensam (isto cria raiva na barriga!…). Até agora só os chicos espertos da política se afirmavam, agora parece que qualquer chico esperto pode ter chance de ser ouvido e de intervir na sociedade.
Na opinião pública foi muito criticada a maneira privada sexista de Trump em relação a mulheres mas não foi discutida com a mesma intensidade a gravidade de Clinton como pessoa pública no seu ‘emailgate’.
Em política uma coisa é a conversa e outra é a prática!
O republicanismo americano é estável podendo permitir-se mesmo derrapagens graves como as do seu candidato.
Aí por 1973, em Lourenço Marques. Apareceu no banco onde eu trabalhava, o BCCI, um professor, cujo nome há muito esqueci, infelizmente, que há anos andava a estudar um método de alfabetização das massas populares, sem que estas tivessem necessidade de frequentar escolas. O ensino seria feito através da rádio!
Pela explicação que o professor deu, o método parecia extremamente bem arquitectado, o assunto mereceu o maior interesse do banco e começámos a discuti-lo com mais profundidade, para ver da possibilidade de pôr o plano em funcionamento.
Não me lembro que técnica o professor usaria, mas alguma coisa estaria baseada no que o missionário americano Franck C. Laubach (1884 – 1970), um missionário protestante conhecido nos EUA e nas Filipinas como "O apóstolo dos analfabetos", ensaiara com grande sucesso e o educador brasileiro Paulo Freire havia experimentado com muito êxito no Brasil, de onde, após a instalação da ditadura militar teve que sair para se exilar no exterior, por considerarem que o método era politicamente revolucionário. Também era, como é qualquer método que leve as populações a terem acesso à informação, ao conhecimento, à cultura, e saibam assim exigir aquilo a que têm direito.
Franck C. Laubach
Aprovado o projecto, que se deveria circunscrever inicialmente à capital e sua cintura populacional, para que se pudesse acompanhar a evolução do ensino e, eventualmente introduzir as necessárias alterações ou correcções, partimos para a sua execução.
Ficou bem assente que se os textos envolvessem tendências políticas, logo a PIDE, além de proibir a sua utilização, ainda nos trancafiava a todos atrás das grades. Tipo Inquisição perfeita e sofisticada, que lá mais nos antigamentes chegou até a querer destruir Luís de Camões, que esteve em risco de ser proibido de editar “Os Lusíadas”!
O sistema, ou método, compunha-se basicamente de três pontos:
- Impressão de um livro/caderno, e sua distribuição gratuita entre a população interessada;
- Programa de rádio, diário, que explicaria aos alunos como associar o que viam escrito nos cadernos a letras do alfabeto;
- Exames periódicos, sem a necessidade da presença do interessado, através de uma ou mais folhas destacáveis do caderno a serem entregues em locais pré-estabelecidos, as quais depois de analisadas informariam o aluno do seu aproveitamento.
Pelos cálculos do professor, cada turma não demoraria mais do que três meses a aprender a ler e começar a escrever. Era um método surpreendente! Num instante a grande maioria da população poderia estar, no mínimo, a ler!
Previa-se, para a primeira rodada a distribuição de uma ou duas dezenas de milhares de cadernos, calculando-se que de início o aproveitamento final seria de trinta a quarenta por cento.
As rádios contactadas puseram os seus microfones à disposição do programa, sem qualquer custo, o que não era nenhuma gentileza porque se previa que a grande maioria da população, pobre e/ou analfabeta, com uma imensa fome de aprender, ia sintonizar, de manhã bem cedo, os seus rádios na emissora escolhida!
Orçamentos de impressão e divulgação do programa, prontos. Os interessados só teriam que ir a uma das agências do nosso banco solicitar a entrega de um caderno, oferecido, como é óbvio, e deixar o seu nome inscrito para controle dos resultados. Podiam até dar nome falso que ninguém iria conferir.
O professor revisava os textos a serem entregues na gráfica, para não cair ingenuamente, ou quem sabe, deliberadamente, nas garras dos pides, e nós, no banco, entusiasmados com o resultado social que esperávamos alcançar.
Chegou a revolução dos cravos, e como se está mesmo a ver ficou tudo encravado! Suspendeu-se o programa até se poder ver um pouco do que estava à frente para vir. Não demorou que o governo, português, anunciasse que ia entrar um novo governo de transição, até à entrega definitiva do país após a sua independência.
Logo que assentou um pouco a poeira dos novos sovietizados governantes provisórios/transitórios, pedimos uma audiência ao provisório ministro da educação. Jovem, alto, quase não falava português, formado numa universidade de non whites em Durban, na África do Sul, compreensivelmente racista, encarando os brancos, todos, como inimigos, recebeu-me com uma frieza polar. A seu lado uma directora de serviços, moçambicana, formada na Universidade de Coimbra, cultura com que podíamos dialogar, jovem, bonita (já tinha marcado a sua bela presença na cidade!) e simpática. Mas o ministro não era ela.
Expus, detalhadamente o programa que tínhamos levado quase um ano a montar, e que estava pronto a ser posto em funcionamento.
Como era evidente o novo governo deveria rever os textos e dar-lhe o sentido que entendesse. O professor estava pronto a fazer as necessárias alterações. Tudo quanto faltava era mandar imprimir os cadernos, o que o banco continuava disposto a fazer a seu cargo, distribui-los e começar.
O ministro, ouviu, ouviu, sua cara imóvel como uma máscara maconde.
- Porque é que o banco, sendo uma empresa capitalista, quer alfabetizar as populações?
Já faltava mesmo uma perguntinha de caráter vermelhusco!
- O senhor sabe que em qualquer parte do mundo todas as empresas visam um lucro. Mesmo no bloco soviético. Se não tiverem lucro quem arca com as despesas é o povo! No mundo ocidental é o mesmo. A única coisa que há a fazer é controlar as margens para que não sejam abusivas. Além disso o banco ao pensar neste projecto, olhou para o futuro, e como tudo quanto um banco tem para oferecer, qualquer outro banco também tem, aos mesmos custos, imaginámos que este investimento nos poderia trazer um dia, bem mais tarde, a simpatia da população e assim termos mais facilidade em cativar clientes.
- Mas porque é que o banco, sendo uma empresa capitalista quer alfabetizar as populações?
A mesma pergunta! Ou estava a gozar comigo ou algo novo estava a aparecer-lhe pela frente, coisa que ele nem imaginava que pudesse existir.
Respondi dentro da mesma tónica e rebuscava no fundo das minhas capacidades, argumentos que o convencessem que, da parte do banco, não havia jogo escondido, político, de branco contra negro, ou anti independência, sei lá! Sei que suei para tentar arrancar daquela cara fechada a sete chaves algo que pudesse permitir uma troca de ideias mais normal.
A mocinha, lindona, de vez em quando, sem que o chefe visse, ia assentindo, naturalmente, com a cabeça, parecendo concordar que o programa só poderia trazer vantagens até para o novo governo, dentro da medida em que a revisão dos textos levasse a introduzir frases de nova mentalização, o que era fácil. Tudo isto expus ao ministro. Ao fim de uma hora de muita luta verbal aquela máscara moveu um pequeno músculo! Aleluia! Começava a sair detrás de todo aquele gelo e a ser só gente.
Nessa altura descontraí um pouco a conversa e, glória minha, desculpem a imodéstia, consegui fazer sorrir aquele homem, inteligente, mas certamente também traumatizado, o que permitiu que a troca de ideias fluísse mais naturalmente.
Saí de lá com a certeza de que o diálogo estava estabelecido. A primeira hora tinha sido unicamente um extenuante monólogo. À despedida disse-me que tinha pela frente uma tarefa imensa e dificílima, o que eu sabia ser verdade, ia pensar nisso e na próxima semana voltaríamos a falar.
- A doutora... lhe telefonará.
Aguardei, e lá veio um dia o telefonema marcando outra reunião. O ministro já não trouxe a máscara. Vinha com cara de gente. Infelizmente tantas eram as suas preocupações, e tão pouca a gente disponível para montar toda uma nova estrutura educacional, num país novo, não podiam comprometer-se em lançar esse programa durante os primeiros tempos.
- Talvez mais tarde.
Não houve, nunca mais, esse mais tarde. Tive muita pena que não tivessem aceite. Estava tudo feito, pronto, e teria sido uma tremenda ajuda ao novo país, totalmente desinteressada. O trabalho deve ter-se perdido, mas quem mais perdeu foram aqueles que não se alfabetizaram.
Uma boa Ideia de António Costa que se desejaria ver Programa
Tornou-se público que no encontro da Cimeira da CPLP, o chefe do governo português defende a ideia da liberalização da residência dos cidadãos dos países de língua lusófona.
A ideia de que a CPLP é “uma comunidade de povos mais que uma comunidade de países” numa altura em que se elaboram contratos CEPA com o Canadá e TTIP com os USA, seria oportuno que Portugal também fizesse valer os seus interesses estratégicos, como membro da CPLP na União Europeia. Vai sendo tempo de se colocarem os laços dos cidadãos acima dos laços comerciais. Os moinhos da política são vagarosos mas as ideias vão transformando o mundo.
Nestes e outros artigos defendi sempre a Ideia que agora o Primeiro-Ministro tão bem expressa: a comunidade lusófona é “uma comunidade de povos mais que uma comunidade de países”, uma comunidade de pessoas e povos.
Goldman and Sachs, o Citygroup, o Wells Fargo formam verdadeiros Estados de predadores com uma grande rede de assessores e consultores espalhados por todos os países e supra-organizações regionais e globais. Comportam-se, em relação aos países, na defesa dos seus interesses usurários, de maneira semelhante à dos partidos em relação ao Estado com os seus representantes nos Conselhos e administrações das empresas nacionais.
Não gostam da Europa e declararam guerra ao Euro conseguindo abanar com os fundamentos da UE. Segundo o investigador Domingos Ferreira “o Senado norte-americano levantou um inquérito que resultou na condenação destes gestores que apostaram em tombar a Europa… Mas tudo ficou na mesma... Goldman and Sachs tem armazenado milhares de toneladas de zinco, alumínio, vários outros metais, petróleo, e até cereais, etc., com o objectivo de provocar a subida dos preços e assim obter lucros astronómicos, manipulando o mercado”. Levam os países à insolvência e “de seguida, em nome do aumento da competitividade e da modernização, obriga-os a vender os sectores económicos estratégicos (energia, águas, saúde, banca, seguros, etc.) às corporações internacionais por preços abaixo do que valem”.
Com a cumplicidade das agências de “rating” e dos governos enriquecem enormemente à custa da crise das nações que provocam através das manipulações da economia mundial e dos mercados.
Nas políticas nacionais, os partidos discutem atacando-se uns aos outros e, deste modo, melhor servem o terrorismo económico internacional. Cada partido, se encerra nos seus interesses, esquecendo que os predadores Globais se servem deles para desestabilizar os respectivos países tal como eles se servem do Estado para desestabilizarem o povo.
No parlamento deitam-se à caça dos impostos sobre quem trabalhou ou trabalha e reservam-se para si subvenções vitalícias e enriquecimento ilícito.
Enquanto grupos ou partidos se apresentarem como a solução para os problemas da nação, o povo continuará a ser defraudado não só na sua economia mas também na sua honra pessoal. Ninguém tem a solução, no máximo haverá soluções parciais e estas, para serem democráticas, efectuam-se de baixo para cima na perspectiva de inclusão de uns nos outros.
Os monopolistas da economia e com eles as ideologias com assento nos parlamentos, começam por nos defraudar nos bens necessários essenciais e nos bens elaborados pela classe média, para depois nos destruírem a dignidade e a alma. Um exemplo da atitude predatória, vemo-lo no parlamento. Cada um exige categoricamente para si ou para o seu grupo o que também pertence aos outros! Resultado: uma nação depauperada sempre em fuga, como um frango depenado a cacarejar movido pelo medo de até as restantes penas lhe tirarem!
Lá compareci na Faculdade de Letras da UL - estupendo edifício escolar salazarino (o tal período em que "nada de bom aconteceu ") que eu não conhecia - em obediência ao convite para participar na sessão comemorativa do 150 anos do TRATADO DOS LIMITES ENTRE PORTUGAL E ESPANHA DE 1864. Ouvi vários oradores que relataram as suas descobertas históricas em matéria fronteiriça, entre eles, o Prof. Doutor Hermenegildo Fernandes, Director do Centro de História da dita Faculdade, o qual, embora falando sobre um período histórico anterior ao Tratado, disse algo que me pareceu altamente esclarecedor. Segundo ele, um dos critérios a que obedeceu o traçado da fronteira estabelecido no Tratado de Badajoz de 16 de Fevereiro de 1267, celebrado pelos Reis de Portugal e de Leão (Espanha ainda não tinha sido inventada), e que definiu quase toda a fronteira como ele se encontra hoje, foi o respeito pelos marcos dos castelos dos senhores feudais suseranos de um e outro Rei e os termos das dioceses criadas pela Igreja, ou seja, o respeito pela autoridade estabelecida. Aqui temos o uti possidetis característico da ordem pontifícia, a Pax Christiana, na sua pura forma. (Em termos correntes, o princípio estabelecia que "já que conseguiste estabelecer aí o teu domínio, fica teu e a ti cabe manter aí a ordem").
E isto ajuda a compreender mais um dilema histórico do tipo ovo/galinha. No caso, trata-se de saber se foi a nação que fez a fronteira ou foi a fronteira que fez a nação.
Temos vários exemplos históricos. A nação judaica sobreviveu apesar da perda do território e suas fronteiras (a religião unia-os); os Vikings escandinavos já eram nação muito antes de fixarem fronteiras (o frio e o sangue unia-os), mas na Península ibérica (mais ainda do que no resto da Europa) antes da fronteira de Badajoz, a população compunha-se de uma salada de etnias e religiões. O que aqui fez a nação, o que nos deu homogeneidade e nos fez diferente dos espanhóis foi a fronteira, ou seja, o rei, seus suseranos e bispos e a religião destes. Antecipamos de quatro séculos o princípio Cujus regio, ejus religio, que viria a ser adoptado em Westefália, (início da paz laica) e isso permitiu-nos sossego interno enquanto os outros entre si se digladiavam.
Somos pois o produto de um processo top-down, (imposto de cima para baixo). E nos processos top-down, quando o topo fraqueja fica tudo estragado.