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A bem da Nação

CURTINHAS Nº CXLVI

 

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MIOPIA FATAL

 

  • Não, prezado Leitor. Desta vez os Bancos portugueses não foram abrangidos pelo teste de stress que EBA/BCE levaram a efeito durante o 1º semestre de 2016 (resultados publicados agora em 29JUL2016).

 

  • À luz de um cenário pessimista, foi examinada, sim, a resiliência de 51 grandes Bancos europeus: os 37 maiores Bancos da Zona Euro mais 14 de outros países (Dinamarca, Hungria, Noruega, Polónia, Suécia e Reino Unido). Bancos portugueses, nem um para amostra. Ainda que estejam sob observação constante do BCE, como é sabido, desde de 2015 que, excepção feita ao caso BANIF, nada mais dali veio a público.

 

  • É interessante notar que, neste teste de stress, as condições de partida eram: (i) um rácio de capitalização estrito de 13.2%; (ii) um rácio de autonomia financeira de 5.2%. No cenário pessimista (bastante pessimista, diga-se), estes dois rácios chegam a 2018 com as seguintes médias: 9.4% e 4.2%, respectivamente (Monti di Paschi di Siena - o Banco mais antigo ainda em funcionamento - chumbou, por apresentar Capitais Próprios negativos).

 

  • Não é menos interessante recordar que a CGD fechou 2015 com um rácio de autonomia financeira de 4.5% - o que apontava, já então, para uma insuficiência de Capitais Próprios (para 5.2%) de, pelo menos, € 0.7 mM, dada a dimensão do seu Balanço.

 

  • No anterior teste de stress (em 2014), EBA/BCE haviam projectado para a CGD, também num cenário pessimista, um rácio de capitalização estrito de 4.9%, em 2016. Se esta projecção for certeira, a CGD, dado o Balanço actual, estaria a necessitar de um reforço de capital de € 4.0 mM (aprox.) só para ficar alinhada com a média dos grandes Bancos europeus, em circunstâncias comparáveis.

 

  • Repare, Leitor, que nada disto faz apelo a raciocínios complicados – é só aritmética simples.

 

  • Mas verdadeiramente interessante é a razão por cá aduzida para justificar o aumento de capital da CGD: a imperiosa necessidade de financiar a economia.

 

  • E é aqui que começa a revelar-se a miopía que nos tem levado à ruína: para quem assim crê (e muitos são), financiamento com endividamento e financiamento sem endividamento é tudo a mesma coisa. Haja é dinheiro para gastar, o resto não interessa.

 

  • Ora, o resto interessa - e muito. É mesmo um dos “fundamentais”, porque esta visão míope tem sempre consequências terríveis, quer a nível da economia como um todo (macro), quer quanto ao futuro da CGD (micro).

 

  • Nenhuma economia pode funcionar, muito menos crescer e prosperar, assente predominantemente no endividamento – e é isso que tem acontecido na economia portuguesa desde há quatro décadas (diria, sem medo de exagerar, desde sempre).

 

  • Basta recordar como Governos de todas as cores tentam solucionar as crises com que se confrontam endividando o Estado para emprestar dinheiro aos afectados. O que é dizer: atirando para cima dos problemas o dinheiro que não têm - na esperança de alguma vez o reaver para conseguirem pagar o que o Estado ficou a dever.

 

  • Em abstracto, quanto maior for o grau de endividamento (interno ou externo) de empresas e famílias, maior é o risco de crédito que eles representam – logo, maior será o custo dos capitais de que a economia carece para funcionar, crescer e prosperar. Em curtas palavras: sendo tudo o mais constante, quanto mais endividada uma economia estiver, menos competitiva será na oferta de bens (e serviços) transaccionáveis.

 

  • Pior, quando esse endividamento repousa (como por cá) nos Balanços da Banca nacional: (i) o crescimento económico fica totalmente limitado pelo nível de capitalização dos Bancos; (ii) o estado do sistema bancário torna-se uma variável fulcral, não só da política monetária, mas de toda a política económica; (iii) os Bancos, esses, façam o que fizerem, verão os seus Capitais Próprios desaparecer aos poucos, “consumidos” pela elevada sinistralidade nos empréstimos que concedem à economia.

 

  • E pior ainda, quando a economia em causa (como a portuguesa, que depende estruturalmente das importações de matérias primas alimentares e de crude) está muito exposta ao exterior. Porque ver-se-á, então, permanentemente aperreada por três espartilhos: (i) a capacidade de financiamento da Banca nacional, condicionada pelo seu nível de capitalização; (ii) a capacidade de endividamento da Banca nacional nos mercados financeiros internacionais; (iii) enfim, os altos e baixos das Reservas Cambiais.

 

  • Nada disto parece comover o nosso legislador fiscal que, inspirado por umas teorias algo bacocas, persiste em premiar o endividamento das empresas (cujo custos são dedutíveis por inteiro à matéria colectável) e certos tipos de endividamento das famílias – penalizando, em contrapartida, as entradas de capital (ao tributar duplamente os lucros distribuídos).

 

  • O modelo fiscal que entre nós prevalece não se limita a incentivar o endividamento da economia. Vai mais fundo e deforma todo o ambiente que rodeia a actividade económica: (i) agrava o risco de crédito - logo, a incerteza sobre emprego e rendimentos nominais futuros; (ii) aumenta o custo do capital; (iii) favorece as “empresas de patrão” (aquelas em que a gestão está concentrada numa única pessoa), mais os vícios que as caracterizam; (iv) prejudica a qualidade da informação económica disponível; (v) e, o que não deixa de ter graça, ao facilitar a evasão fiscal, dificulta a tarefa do Fisco. Abençoado legislador!

 

  • Esta tónica no endividamento como motor do crescimento económico até poderia ter um módico de coerência se as soluções preparadas para lidar com o incumprimento (o não pagamento espontâneo e pontual das dívidas) fossem seguras e expeditas.

 

  • Qual quê? O legislador na matéria (certamente outro que não o legislador fiscal, mas não menos fascinado por teorias igualmente bacocas), presume que todo o incumprimento de uma obrigação de pagar é um ilícito penal que compete a um tribunal apreciar e julgar em termos quase idênticos aos de um processo crime.

 

  • A crença, aqui, é a de que o devedor em incumprimento (inadimplente, em “jurisdiquês” corrente), ao contraír a dívida, fê-lo já com a intenção escondida de não pagar. E assim é porque o conceito de “risco” que vá para além da teoria do risco criado (como na condução automóvel, por exemplo) é completamente estranho à cultura jurídica cá da terra.

 

  • Temos assim uma economia assente em dívida em que os processos de insolvência se arrastam pelos tribunais anos sem fim, sem que ninguém cuide de preservar o potencial produtivo do insolvente, seja ele empresa ou pessoa singular.

 

  • Nada disto esclarece se o financiamento com endividamento tem alternativa – ou se é uma fatalidade a que nunca conseguiremos escapar.

 

  •  E nada disto parece ter a ver grande coisa com o problema da CGD. Mas é tudo isto que tem de estar bem presente quando se puxa pelas meninges para lhe dar solução.

 

(cont.)

 

Agosto de 2016

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 A. Palhinha Machado

 

JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE 2016 NA POLÓNIA

 

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Francisco pede à juventude para interferir

 

na vida

 

A Jornada Mundial da Juventude 2016, de 26 a 31 de julho na Polónia, terminou com uma missa campal onde participaram 2 milhões de pessoas. Os habitantes de Cracóvia hospedaram em suas casas e em escolas, durante seis dias, mais de meio milhão de jovens peregrinos vindos de mais de 180 países.

 

As cinco mensagens do Papa em Cracóvia

 

Mensagem da mobilização: Os jovens aclamavam o papa como se fosse uma estrela pop. O Pontífice convidou-os a deixarem o “sofá da felicidade”. “A verdade é outra: queridos jovens, não viemos a este mundo para vegetar, para passá-la comodamente, para fazer da vida um sofá no qual adormecemos. Ao contrário, viemos para deixar uma marca”.

 

Mensagem da solidariedade com os refugiados: O Pontífice apelou aos Estados para “a prontidão para receber aqueles que fogem à guerra e à fome” e cujos direitos fundamentais foram roubados e como tal precisam da nossa solidariedade. O governo de Cracóvia não terá gostado muito destas palavras do Papa, dado, até agora, com medo a importar terrorismo, só estar disposto a receber perseguidos cristãos.

 

Mensagem do silêncio: A sua atitude de silêncio na visita ao campo de concentração de Auschwitz-Birkenau tornou o mundo atónito. As imagens do seu andar através dos areais da morte calam fundo; nele o silêncio do sofrimento peregrinava com ele como que num eco de tanta violência e injustica ainda hoje continuada. Em Auschwitz o silêncio grita! No fim do seu deambular, Francisco I escreveu no livro de visitas: “Senhor, perdoai-nos tanta crueldade”.

 

Mensagem da rebelião:Queridos jovens, não viemos ao mundo para entrar em vegetação, para nos tornar confortáveis, para fazer da vida um sofá que nos embala”.” Interferi, levantai a vossa voz, não sejais enfadonhos, nenhuns Couch-Potatoes”. “Eleitos são todos aqueles que estão dispostos a partilhar a sua vida com os outros”.

 

Mensagem de Paz:Não queremos vencer o ódio com mais ódio, vencer a violência com mais violência, vencer o terror com mais terror. A nossa resposta a este mundo em guerra tem um nome: chama-se fraternidade, chama-se irmandade, chama-se comunhão, chama-se família.” Deus sonha na nossa vida, em nós e connosco”. “Provavelmente, o sofá-felicidade é a paralisia silenciosa que mais nos pode arruinar; porque pouco a pouco, sem nos darmos conta, encontramo-nos adormecidos, encontramo-nos pasmados e entontecidos enquanto outros – talvez os mais vivos, mas não os melhores – decidem o futuro por nós.”

 

Um desafio à juventude: construir uma

 

“nova humanidade”

 

Numa linguagem adaptada aos jovens disse: “Confiem na memória de Deus: a sua memória não é um disco rígido que grava e arquiva todos os nossos dados, mas um coração cheio de compaixão, um que encontra alegria em apagar em nós cada traço de maldade”. “Façam download de um bom coração”. O pessimismo é “um vírus que infeta e bloqueia tudo”. O roteiro é o evangelho um verdadeiro “browser para as estradas da vida.”

 

Esta é a guerra! Não tenhamos medo de dizer esta verdade: o mundo está em guerra, porque perdeu a paz”.  “Uma só palavra gostaria de dizer para esclarecer. Quando falo de ‘guerra’, falo de guerra seriamente, não de ‘guerra de religiões’. Existe guerra de interesses, existe guerra pelo dinheiro, existe guerra pelos recursos da natureza, existe guerra pelo domínio”.

 

As pessoas podem apelidar-vos de sonhadores, porque acreditais numa nova humanidade, uma que rejeita o ódio entre povos, uma que recusa olhar para as fronteiras como barreiras e preserva as suas tradições sem ser egocêntrico ou tacanho.”

 

Enquanto uns trabalham na construção de muros os melhores trabalham na construção de pontes. A próxima Jornada Mundial da Juventude realizar-se-á no Panamá em 2019.

 

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António da Cunha Duarte Justo

 

VOLTANDO A MOÇAMBIQUE

 

A aventura dos Optimist

1973

 

Por enquanto, história mais antiga de Moçambique, fica... de férias. Os últimos oito textos foram rebuscados em revistas moçambicanas, ali publicadas entre os anos 30 e 60, mas parece que só interessaram a quem conhece aquele país.

 

Escrevi ainda, e está neste blog, sobre uma visita a Maputo em 1991, sobre a estadia na Casa do Gaiato em 2001, alguma coisa sobre a confusa época anterior à independência, mas nada sobre o tempo tranquilo da estadia naquele país, de 1971 a 74.

 

Está na altura de relembrar alguns episódios ali vividos.

 

1973, sem lembrar já em qual o mês.

 

O BCCI – Banco de Crédito Comercial e Industrial (filho do defunto português Borges & Irmão que foi um grande banco e mal administrado no seu final) procurava, através de ações de Relações Públicas, cada vez mais expandir a sua influência nos meios financeiros locais, apesar de ser “obrigado” a fazer nos jornais uns anúncios institucionais que não tinham outro objetivo além de adoçar as boquinhas, sempre famintas, de uns quantos jornalistas, mas sem efeito prático algum.

 

Surgiu uma ideia.

 

Aquela linda baía de Lourenço Marques, a Delagoa Bay, tinha poucos barcos à vela, talvez não tivesse nenhum veleiro grande, e só o Club Marítimo era o lugar duns quantos apaixonados, talvez só com os pequenos “Vaurien”. Quarenta e três anos depois a memória não vai ao detalhe para saber quantos barcos havia e que tipo, mas vamos em frente.

 

Já não lembra como se soube que havia alguém habilitado em construir os ainda hoje famosos Optimist, o melhor barco já concebido para a iniciação à vela, e destinado a “atletas” até aos doze anos!

 

O banco gostou da ideia. Procurou o apoio do Fundo de Fomento Desportivo que abraçou o projeto. Mandou fazer uma dúzia daqueles barquinhos e anunciou pelos seus clientes que seriam vendidos em 6 ou 12 parcelas, sem juros.

 

Tudo combinado para o lançamento, com a presença do Secretário Provincial de Educação Física. Mesa de “honra”: o Diretor do Club Marítimo, o mencionado Secretário e o Administrador do banco.

 

E assim se fez a festa. Doze ou catorze atletas, dos nove aos doze anos, os pais, a maioria sem saber nada de vela, a ajudarem os jovens a aparelhar o “navio” e lá vai a grande regata, de que saiu vencer, um garoto, lourinho, promessa de marinheiro, já com doze anos que as meninas concorrentes achavam que era (era!) lindo: o Carlos Prista. A nossa Joana tinha nove anos e, sempre a rir, porque nunca tinha “governado” um barco, ficou brilhantemente em última. Mas adorou!

 

A seguir alguns pais, mais destemidos quiseram experimentar os veleiros.

 

Ficou na memória a figura de um deles, grande, pesado, que uma vez dentro do barco este ficou com o casco todo dentro de água! O “navegador” sorria mas só se via um meio corpo, um mastro e uma vela que mal se mexiam no mar. Fez enorme sucesso.

 

As fotos abaixo, recuperadas ao fim de todos estes anos de imagens do filme de 35 mmm que um jornalista filmou para ser passado nos cinemas, como um notável acontecimento desportiva para a então Lourenço Marques, têm uma qualidade muito fraca, mas quem as vir pode ser que se recorde de alguma coisa ou de alguém.

 

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 De cima para baixo: o cartaz de propaganda, o preparo dos barcos, “quase” prontos para a regata, o vencedor e algumas mães “nervosas” com a aventura.

 

Foi uma festa bonita, sobretudo para os “grandes atletas” que nela participaram. Há 43 anos!

 

Mas ainda há muito para contar sobre Moçambique. Atravessa agora uma fase difícil. Também o Brasil, toda a América Latina, Portugal, Espanha, Grécia e tantos outros.

 

Agosto de 2016

 

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Francisco Gomes de Amorim

O SAL NA COMIDA

 

 

 

D. António Alves Martins (1), bispo de Viseu de 1862 a 1882, dizia que A religião deve ser como o sal na comida: nem muito nem pouco, só o preciso.

 

Cerca de um século e meio depois, Bento XVI afirma na sua encíclica Caritas in Veritate:

 

«A exclusão da religião do âmbito político e, na vertente oposta, o fundamentalismo religioso, impedem o encontro entre as pessoas e a sua colaboração para o progresso da Humanidade. A vida pública torna-se pobre de motivações e a política assume um rosto oprimente e agressivo. Os direitos humanos correm o risco de não serem respeitados, ou porque ficam privados do seu fundamento transcendente ou porque não é reconhecida a liberdade pessoal.

 

No laicismo e no fundamentalismo, perde-se a possibilidade de um diálogo fecundo e de uma profícua colaboração entre a razão e a fé religiosa. A razão tem sempre necessidade de ser purificada pela fé e isto vale também para a razão política que não se deve crer omnipotente. A religião, por sua vez, precisa sempre de ser purificada pela razão, para mostrar o seu autêntico rosto humano. A ruptura deste diálogo implica um custo muito gravoso para o desenvolvimento da Humanidade.» (2)

 

Imagem figurada em termos prosaicos ou análise erudita, eis que em século e meio a Humanidade continua extremada entre o laicismo mais ou menos radical e o fundamentalismo da leitura à letra de textos sagrados.

 

Progresso?

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HSF-AGO16-Tavira

Henrique Salles da Fonseca

 

(1) - António Alves Martins, membro da Ordem dos Frades Menores (franciscano) (Alijó, 18 de Fevereiro de 1808 — 5 de Fevereiro de 1882) foi Bispo de Viseu desde Julho de 1862. Foi eleito deputado em 1842 e nomeado enfermeiro-mor no Hospital de São José em 1881. Iria viver para Viseu, Portugal, a 29 de Janeiro de 1868 e aclamado ministro do Reino quer no mesmo ano, quer em 1870. Viria a falecer pobre, no entanto, no Paço do Fontelo.

Para saber mais, v. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Alves_Martins

(2) in “Porquê e para quê – Pensar com esperança o Portugal de hoje”, D. Manuel Clemente, pág. 39 – Assírio & Alvim, ed. Novembro de 2010

 

TRAVÃO DA DÍVIDA

 

RECEITAS E DESPESAS DO ORÇAMENTO DA

ALEMANHA PARA 2017

 

Receitas 328,7 mil milhões e despesas

328,7 mil milhões €

 

Schäuble, ministro das finanças, conta com 328,7 mil milhões de euros de entradas nos cofres do Estado e pretende também em 2017 um orçamento federal equilibrado, sem recorrer a dívidas.

 

Receitas provenientes de impostos 301,8 mil milhões, outras entradas 26,9 mil milhões.

 

As despesas previstas distribuem-se 138,6 mil milhões para os departamentos “Trabalho e Social” (reformas, desemprego, etc); 36,6 mil milhões para “Defesa”; 26,8 mil milhões para “Transportes e infra-estrutura digital”; 20,1 mil milhões para a “Dívida” (juros); 17,6 mil milhões para “Educação e pesquisa”. Estes dados encontram-se mais detalhados no site do governo www.bundeshaushalt-info.de

 

 

 

Schäuble quer manter um orçamento de estado equilibrado em que o Estado só pode gastar tanto como o que recebe. Desde 2012 há na Alemanha a chamado “travão da dívida” que obriga os estados federais a não recorrerem a novas dívidas para o orçamento (excepção em caso de catástrofes da natureza e de situações de especial necessidade). Novas dívidas são tabus.

 

Para despesas com refugiados estão previstos 19 mil milhões. Foram também previstos 2,6 mil milhões para apoio da segurança em medidas de fomento da polícia como resposta à nova situação criada pelo terrorismo internacional que quer fazer da Europa um lugar do medo e do alarme. De facto, na Alemanha notam-se menos turistas dos USA e da Ásia devido ao medo do terrorismo.

 

Uma das razões porque a Alemanha anda sempre à frente

 

Os Estados federados mais ricos pagam todos para um Fundo de Compensação Financeira do qual são distribuídas determinadas quantias para os Estados alemães mais pobres.

 

Com o travão da dívida a Alemanha toma medidas de precaução em relação ao futuro para então conseguir encontrar-se em posição vantajosa aos outros Estados. Já fez o mesmo com a agenda 10, que a colocou a Alemanha em situação de concorrência a nível de produtos e de salários com outros países. A Agenda 2010 foi um programa de reforma do sistema de previdência alemão e do mercado de trabalho, criado e amplamente implementado de 2003 a 2005 pelo governo federal de esquerda que era então formado pelo SPD e pelos Verdes. Fizeram legislação muito incidente nos sectores da política económica, da política de educação, do mercado de trabalho, do seguro de saúde, das pensões e da política familiar.

 

Na Alemanha, também os partidos de Esquerda e os sindicatos são reivindicativos mas, quando se trata do bem da Alemanha e do povo alemão, todos se unem na defesa dos interesses nacionais. Embora de esquerda, aquele governo, foi o que elaborou mais medidas restritivas, em relação aos trabalhadores e aos contribuintes em geral. Independentemente de uma análise a favor ou contra diferentes políticas, refiro isto, no sentido de cada país tentar resolver os próprios problemas com diferentes políticas para não terem de andar sempre a lamentar-se atrás dos outros. Portugal e o Brasil precisam de desenvolver uma nova mentalidade política e social em que os interesses partidários, patronais e sindicais se subordinem aos interesses reais do país e da sua população.

 

Na Alemanha, a discussão séria pública circula toda ela em torno dos problemas reais da sociedade alemã no contexto internacional e nela tanto esquerda como direita se sentem comprometidos; ao contrário do que acontece noutros países em que se assiste mais a uma esquerda do “eu boto abaixo para poder arribar para cima”.

 

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António da Cunha Duarte Justo

 

RAZÃO TINHA HAMLET

 

 

Dizem as estatísticas do Banco de Portugal que em Junho de 2016, o valor total dos novos empréstimos concedidos pela banca às empresas e às famílias foi de Euros 3.696 milhões, ou seja, -5,7% do que no período homólogo. Mais dizem que o crédito vencido (e não pago) foi de 9,11% do total concedido.

 

Dessas afirmações nos dão conta os dois gráficos seguintes:

 

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Creio haver conclusões fáceis de extrair sobretudo se soubermos que a grande fatia do crédito às famílias é «crédito à habitação» sendo o remanescente para o consumo, em especial o de bens duradouros: o carrinho, a viagem, o casamento da afilhada (nem sempre duradouro), …

 

Mas para haver crédito à habitação, é necessário que habitação exista para ser transaccionada e, das duas, uma: ou se trata de habitação nova (e lá vem mais crédito às empresas construtoras num «remake» da bolha anterior como se ela não tivesse existido e rebentado) ou se trata de colocar aquelas casas com que ela, a banca, ficou depois de ter executado as penhoras dos clientes anteriores que tinham entrado em incumprimento (linguagem técnica pseudo-erudita) ou ferrado o calote (linguagem vernácula).

 

Da comparação dos dois gráficos sempre parece menos perigoso emprestar às famílias do que às empresas mas convenhamos que a inexistência de projectos relacionados com a produção de bens transaccionáveis parece continuar a ser a grande pecha do nosso desenvolvimento.

 

Mas como é que pode haver projectos efectivamente produtivos se tudo está virado para o hedonismo consumista?

 

Sim, cada vez mais me convenço de que, passado o curto período de verdade que experimentámos entre 2011 e 2015, Hamlet regressou cheio de razão com o seu famoso lamento de que «Algo está mal no Reino da Dinamarca».

 

Tavira, 10 de Agosto de 2016

 

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 Henrique Salles da Fonseca

ESTUDAR NO CAFÉ?

 

 

Foi em Cascais, na praia do «Palm Beach» (oficialmente chamada «da Duquesa»), que certa manhã a minha mãe me disse que o João Gaspar Simões tinha ido para um toldo lá na outra ponta porque ali havia muitas crianças barulhentas. Eu nunca me tive por barulhento e ainda hoje faço um esforço para identificar as outras crianças que, comigo, poderiam incomodá-lo.

Passados mais de 60 anos sobre a ocorrência, confesso finalmente que fiquei ofendido com a atitude do «velho safado» (que à época era certamente mais novo do que eu sou hoje). Admito que fosse uma prima minha que fazia uma ou outra birra mas fica a dúvida para esclarecimento no além pois tanto a possível origem do incómodo (é claro que, estando uma prima envolvida na situação, evitei o adjectivo «putativa») como o incomodado já lá estão na eternidade. Eles que se esclareçam por lá.

E foi na minha ofensa que passou a haver outra coisa a dar-me voltas na cabeça como enigma indecifrável e que ainda hoje tem alguns resquícios por explicar: como é que um homem podia estar ali, na praia, em vez de a trabalhar?

Licenciado em Direito, nunca exerceu a profissão jurídica e sempre se dedicou às letras. Ficou conhecido como crítico literário mais do que como autor. E para se ser crítico literário, há que ler as obras a criticar. Fica explicado o meu mistério se admitirmos que a praia até nem é mau sítio para se ler um livro. E se o livro for mesmo bom, a praia até pode não ser grande «coisa» - como a do «Palm Beach» - e serve na mesma para a boa leitura.

Os resquícios que ainda hoje tenho por explicar têm apenas a ver com a questão de saber como se consegue sobreviver em Portugal como profissional de crítica literária. Mas como essa perspectiva na vida de João Gaspar Simões nunca foi «conta do meu rosário», posso deixar a questão na situação inexplicada em que actualmente se mantém e dormir sossegadamente.

Mas ler um livro por prazer na praia é coisa bem diferente de ler obra que se tenciona criticar profissionalmente. E aí, então, entra uma outra questão para mim totalmente inexplicável que é idêntica à daqueles que estudam nos cafés e que, de tão habituados, já não se conseguem concentrar sem o ruído de fundo típico duma pastelaria ou estabelecimento equivalente.

Posso admitir que frequentem aqueles cursos que dão passagem directa para o desemprego mas duvido que cursos a sério possam ser estudados nos cafés, pastelarias, bordéis ou estádios de futebol.

Portanto, também a crítica literária me parece «coisa» séria de mais para se poder fundamentar em leituras de praia com a minha prima a fazer ou não birras nas cercanias. Fica João Gaspar Simões perdoado da ofensa que me infligiu mas eu fico com sérias dúvidas que a praia do «Palm Beach» possa servir de cenário a trabalho intelectual de monta. A menos que ele estivesse de férias e a ler «Tios Patinhas». Estaria? Duvido.

Foi muitos anos mais tarde que li trabalhos de João Gaspar Simões e também ele me ajudou numa faceta para que o meu Avô já me alertara: na literatura, o estilo é bem mais interessante do que a história contada. Por outras palavras: a forma literária é que conta!

É fantástico que alguém dedique a vida inteira à análise da forma literária de obras alheias esquecendo-se de si próprio como potencial autor. Tenho a certeza de que ele próprio se consideraria «mais um escritor» enquanto todos nós sabemos que João Gaspar Simões foi o grande crítico literário português do século XX e que dos seus trabalhos, diz quem sabe, se extrai doutrina.

Mas continuo na minha: nos locais de veraneio ou devaneio não se estuda!

 

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Henrique Salles da Fonseca

(Tavira, AGO16)

 

 

AS MULTAS DA UE

  

NÃO HAVERÁ CASTIGOS PARA OS ESTADOS

 

DEFICITÁRIOS ESPANHA E PORTUGAL

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A UE-Comissão nunca aplicará penas reais

 

por violação do Pacto de Estabilidade

 

Como previa a imprensa alemã há meses atrás, Portugal e Espanha não poderiam ser castigados por terem um défice superior a 3% como determina o Pacto de Estabilidade do Euro; no caso, Portugal 4,4% e Espanha 5,1% em 2015. A argumentação era lógica, dado a Itália, a França e a Alemanha já terem infringido e não terem sido castigadas; de facto o castigo ameaçado nunca foi aplicado. Falava-se então que a Comissão poderia declarar uma pena de 0% para efeito de intimidação dos infractores.

 

A UE-Comissão decidiu, agora, não aplicar multa em dinheiro aos infractores. Em teoria poderiam ser aplicadas multas no valor de 0,2% da produção económica de um país o que corresponderia para Portugal uma multa de 200 milhões de euros e para Espanha dois mil milhões.

 

Portugal e Espanha têm um prazo de tempo até 15 de outubro para apresentarem planos em que ponham os orçamentos de Estado em ordem. A UE quer que Portugal reduza a dívida do orçamento para 2,5% até ao fim do ano e a Espanha deve reduzi-lo até 2016 para 2,2%.

 

Ultimamente muita tinta correu na opinião pública com ameaças de um lado e ameaças do outro, tudo lenha para a fogueira de um público que precisa de ser distraído e de ser melhor ordenado em fileiras de opinião.

 

Sanções económicas aplicadas a países de economia fraca ainda mais os enfraqueceria porque mais dívidas fariam para pagar a sanção.

 

Portugal só saiu em 2014 do Resgate da Troica. Na Europa a economia tem que se submeter ao politicamente possível.

 

O discurso sobre a sanções ou não sanções da UE-Comissão a Portugal, que nos últimos tempos tem incendiado os ânimos entre os diferentes clubes políticos em Portugal, foi apenas uma conversa de trazer por casa, para uns poderem cantar de galo e outros de galinha, quando no estrangeiro já há muito havia consenso de que era impossível aplicar sanções a Portugal e a Espanha (O resultado já era propriamente conhecido em Junho, embora a conversa fosse precisa para impressionar um pouco Portugal.

 

A UE-Comissão, mesmo no próximo Outubro não aplicará penas por violação do Pacto de Estabilidade do Euro. Não será fácil para o primeiro-ministro António Costa corresponder às exigências da Comissão. A melhor estratégia em benefício do partido socialista seria que António Costa conseguisse a queda do Governo antes do 15 de Outubro ou que conseguisse da Comissão o adiamento.

 

Então, os votantes portugueses poderiam continuar a ser iludidos com discussões ideológicas sem planos concretos para solucionar os problemas do Estado português.

 

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António da Cunha Duarte Justo

O ERRO DA EUROPA É…

 

... PENSAR O ISLÃO PELO MODELO DO CRISTIANISMO

 

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 20 de Julho de 2016

 

ENTREVISTA - Filósofo, especialista da filosofia medieval árabe, Rémi Brague explica as fontes teológicas nas quais o Estado Islâmico poisa e admira-se que se continue a apreender a religião muçulmana através do prisma do cristianismo.

 

LE FIGARO - Mohamed Lahouaiej Bouhel, a crer nos que lhes são próximos, não tinha o perfil de um jihadista. O ministro do Interior falou de um “radicalismo expresso”. O que lhe inspira esta reflexão?

 

Rémi Brague.jpg Não está mal como perplexidade. No caso do matador de Nice, nós não temos ainda totalmente claras as suas motivações. E qualquer que seja o ritmo ao qual se opera, a “radicalização” não é uma noção clara. Faltaria em primeiro lugar pormo-nos de acordo sobre as suas “raízes”, às quais a palavra remete. Porque é que regressar às raízes deverá conduzir ao crime?

 

A vida do indivíduo (bon-vivant, bebedor de álcool, dançarino de salsa) testemunham o seu afastamento do Islão. Os homens do 11 de Setembro eram também, aparentemente, “ocidentais” no seu modo de vida. Como explicar esta esquizofrenia?

 

Seria preciso, em primeiro lugar, verificar as declarações daqueles que falam deste indivíduo. Um bom número dos que se fizeram explodir ou matar são apresentados como rapazes gentis, prestáveis e sem problemas, e, supremo cumprimento, até jogavam futebol… Esquizofrenia? Talvez não… Pode-se admitir que a prática dum jihadista violento seja também, para alguns, uma maneira de « se fazer perdoar » por uma adaptação demasiado fácil a modas ocidentais consideradas corrompidas, para se auto-castigarem pelas suas cedências. Fazer-se explodir é mais rápido que entrar num processo longo e penoso de conversão.

 

O Daesh parece exercer uma atracção violenta sobre os delinquentes. Como se faz a passagem da delinquência à guerra santa?

 

Seria preciso, para explicar esta passagem e simplesmente para a analisar, competências em psicologia e em sociologia que eu não possuo. Mas deter-me-ei nesta noção de «guerra santa». Muitos muçulmanos querem hoje evitar esta expressão e usar o árabe jihâd, muitas vezes concebido como um esforço puramente espiritual de luta contras as próprias paixões. Porém, encontramo-la frequentemente num sentido muito concreto, por exemplo nos tratados de direito (fiqh), onde o capítulo intitulado «jihâd» trata de hostilidades claramente materiais. Estabelece-se aí que se trata de uma obrigação dita de «suficiência»: não incumbe a todos os muçulmanos, mas basta que um certo número deles se encarregue para que o dever seja cumprido. Trata-se aí de convocações prévias, pergunta-se se é permito abater palmeiras do inimigo ou de o bombardear, se é preciso para isso matar as mulheres e as crianças, usando-as como escudo; explica-se o que fazer dos prisioneiros, como repartir o espólio, etc. E, no sentido místico, emprega-se mais frequentemente outro nome verbal da mesma forma da mesma raiz, a saber mujâhada. Vale em todo o caso a pena parar sobre o paradoxo que constitui esta aliança de palavras: «guerra santa». Comporta um ensinamento precioso: o Islão tem sobre as outras religiões vivas esta imensa vantagem que permite pôr directamente em equação o que há de pior e o que há de melhor, os instintos mais vivos e o ser mais santo, o assassino e Deus. As cruzadas e os inquisidores não podiam fazê-lo a não ser com o custo de mil desvios: tomar os relatos de conquista do antigo Testamento ou as fulminações contra as bruxas como recomendações actuais, etc., e, extremosamente, contornar o Sermão da Montanha. Certas religiões desaparecidas, como a dos Cartagineses ou dos Astecas - e dos Gauleses - arriscavam esta junção com sacrifícios humanos.  Para o Estado Islâmico, Deus ordena o auto-sacrifício, matando o maior número possível de outros homens. Este Islão permite também fazer crer às pessoas que não foram muito bem sucedidas na vida que tudo é culpa dos outros, que são malvados e que é preciso, portanto, eliminá-los. Sentir-se do «partido de Deus» (Corão, V, 56) em luta contra os «piores dos animais» que são os não crentes (Corão, VIII, 22) pode dar um certa exaltação. E ao mesmo tempo, a culpabilidade é eliminada, já que é o próprio Deus que mata os Seus inimigos (Corão, VIII, 17).

 

Segundo Giles Kepel, o objectivo do Estado Islâmico é provocar a guerra civil no nosso território e assim tomar partido pela causa da integridade dos muçulmanos em França. Partilha deste ponto de vista?

 

Não tenho sequer autoridade para me pronunciar, mas parece-me muito possível. Se for esse o caso, estaríamos perante a táctica empregue nos anos 1979 pelos grupos de extrema esquerda: provocar uma repressão cujos excessos levariam a uma reacção de solidariedade. Isso não funcionou com as Brigadas Vermelhas ou o bando de Baader que visavam a população inteira de grandes países como a Itália e a Alemanha. O Estado Islâmico poderia ter um pouco mais de possibilidades de sucesso porque o grupo visado, os muçulmanos que vivem em França, possui já uma certa forma de unidade, bastante laça noutros lugares, que poderia fazer “agarrar a mayonnaise” mais facilmente. Esta unidade tem vários factores: o sentimento de ser ainda uma minoria que deve «cerrar fileiras», o de ter de frequentemente se contentar com os trabalhos que os outros não querem e portanto ficar no fundo da escala, por vezes uma mesma cidadania de origem, a prática duma língua idêntica ou o facto muito simples de morar nos mesmos bairros e enfim, bem entendido, a referência mais ou menos acentuada à religião.

 

Numerosos políticos e intelectuais dissociam absolutamente a religião muçulmana do Estado Islâmico ou da Al Qaeda que eles consideram mesmo uma inversão do Islão. O Daesh não tem nada a ver com o Islão?

 

A «religião muçulmana» é já uma expressão enganosa. É claro que, se quisermos classificar o Islão numa das grandes categorias da actividade humana, é melhor arrumá-lo na rubrica «religião». Mas esta rubrica é muito larga. E, sobretudo os Europeus, desde os mais piedosos praticantes ao mais inveterado mata-frades, pensam todos a religião através do modelo insconsciente do cristianismo. Reduzem, portanto, a religião àquilo que eles observam nas diversas confissões cristãs: actos de cultor, oração, eventualmente jejuns e peregrinações. Aquilo que não é importante é sentido como exterior à religião. Ora, para o Islão, a religião consiste essencialmente em aplicar a lei divina. É porque ela o ordena que é preciso rezar, jejuar, etc. e ela comanda também o véu, a alimentação halal, etc. O Estado islâmico pretende ser fiel ao adjectivo. Qual e o direito de o contestar? Os seus propagandistas consideram aqueles que nós chamamos «moderados» como tíbios ou mesmo traidores. Quem sou eu para distribuir certificados de ortodoxia islâmica? Direi que, se o Estado Islâmico não coincide totalmente com o Islão, e, portanto, se ele não é o Islão é, mesmo assim, um Islão entre os outros. Representa uma tentativa para ressuscitar, com os meios de hoje, as práticas que as biografias mais antigas atribuem ao próprio Maomé, o «belo exemplo» (Corão, XXXIII, 21).

 

Considera-se que a Internet, mais ainda que as mesquitas, conduz os jovens para a jihad. A que fonte reportam estes sítios da Internet?

 

É-me difícil responder em detalhe, por falta de uma frequência suficientemente assídua dos sites que promovem a jihad. E que são de tendências muito variadas. De um modo geral a Internet permite um máximo de impunidade. A coberto do anonimato, ou melhor, do pseudo- anonimato, qualquer um se pode permitir contar o que quer que seja, mentir, difamar, insultar, apelar ao martírio. Isto não vale só para os sites islamitas. Nesse caso torna-se muito fácil construir um paraíso imaginário na terra.

 

Compara-se muitas vezes, o Islão à Igreja Católica insistindo sobre o facto que a religião muçulmana deve fazer o seu Vaticano II. Este paralelo é pertinente?

 

Parece-me totalmente coxo, por muitas razões. Em primeiro lugar a Igreja católica é uma organização com dogmas bem definidos e com uma hierarquia perfeitamente clara; tem um catecismo e bispos e o bispo de Roma que é o Papa. Foi um destes, João XXIII, que decidiu reunir um segundo concílio no Vaticano. Quem, no Islão, poderia lançar um apelo deste género, fazer-se escutar e fazer aplicar as decisões tomadas? Por outro lado, o Vaticano II procurava um retorno às fontes, passando as incrustações posteriores, um pouco no espírito de Francisco de Assis que queria retornar ao Evangelho sem as interpretações que o atenuam. Ora, no Islão, o pior está no princípio. É no período de Medina (622-632) que se inspiram as pessoas do Estado Islâmico. Eles idealizam-no, mas sem retirar os massacres, os assassinatos e as torturas. Os Evangelhos não contêm qualquer apelo à violência. O Corão e o Hadith, lidos literalmente, sim…

 

O que é o «Islão das luzes»?

 

Esta expressão emprega-se desde há algum tempo. Pergunto-me se o primeiro a lançá-la não seria Malek Chebel no seu Manifesto por um Islão das luzes, de 2004. Certamente, o que ele entende por isso seria uma excelente ideia. Farei porém, duas observações. Por um lado, é preciso não procurar no passado realizações dum tal Islão a não ser com muita prudência. Se quisermos falar de realizações intelectuais e artísticas, não há problema. Mas se se trata de «tolerancia»... Averroès? Ele conclui um raciocínio filosófico por «e é por isso que é obrigatório matar os heréticos» (Tahafut at-Tahafut, XVII, 17). A Andaluzia? Leiamos de preferência os historiadores, não os romancistas… Por outro lado, «as luzes» são uma das nossas «vacas sagradas» e seria bom fazer um pouco de arrumação no nosso próprio passado ocidental e de ver que elas têm bastantes sombras, antes de as propormos ao resto do mundo, Islão incluído…

TURCOS SOLIDÁRIOS COM ERDOĞAN

 

Turcos em Colónia.png

 

DEMONSTRAÇÕES TURCAS NA ALEMANHA

 

 

REVELAM 2 SOCIEDADES PARALELAS

 

Multicultura contra a Intercultura

 

 

Em Colónia (31.07) quase 40.000 turcos participaram numa manifestação organizada pelas organizações DITIB e UETD (Organização lobby do AKP da Turquia), para apoiarem o presidente da Turquia (Erdoğan). 2.700 Polícias acompanharam a chuvosa manifestação que decorreu pacífica. Na Alemanha já tinha havido em diversas cidades manifestações pró- Erdoğan. A pretexto da multicultura afirmam-se guetos nacionalistas adversos à construcção de uma sociedade intercultural. Esta é a plataforma para conflitos de maior envergadura no futuro.

 

A Alemanha está chocada ao presenciar tantos turcos nascidos na Alemanha a apoiarem um déspota que pretende transformar a Turquia num califado. A Alemanha já tem a experiência de um ditador de eleição democrática (Hitler) que se aproveitou da população mais simples para conduzir a nação à perdição; por isso é tão sensível ao que se passa na Turquia de Erdoğan e ao facto de associações turcas importarem para a Alemanha os problemas da Turquia.

 

Isto mais que a amostra dos turcos na Alemanha é a amostra da força das suas organizações e o fracasso dos esforços de integração (os valores de cunho árabe mostram-se resistentes aos valores da Constituição alemã). O comício deu-se sob o título de "Sim à democracia - Não ao golpe de Estado"! As associações DITIB e UETD (Organização lobby do AKP da Turquia), organizadoras da manifestação, no dizer de observadores críticos, entendem a luta e a denúncia como “um serviço à religião e ao país”. Levam em conta uma sociedade a preto e branco feita só de amigos e de inimigos. O Tribunal Constitucional Alemão não permitiu a transmissão em ecrã gigante de um discurso televisivo de Erdogan aos seus apoiantes em Colónia.

 

Um país onde “curdos, arménios e outras minorias e religiões são oprimidos”; um país onde os cristãos têm um número próprio que os identifica para serem discriminados; um país onde, depois da tentativa de golpe de 15 de Julho foram despedidos mais de 3.000 juízes e procuradores da justiça, mais de 3.000 oficiais das forças armadas, 1.389 soldados, 50.000 funcionários públicos e dezenas de jornalistas; um país onde em poucos dias também foram aprisionadas mais de 18 mil pessoas, grande parte delas por razão de suspeita e em que a denúncia e saneamento se tornaram desporto popular não pode ser suportado pela UE.

 

O que moverá tantos turcos a sair para a rua em manifestação Pro-Erdoğan e a apoiar quem está disposto a institucionalizar a pena de morte e se aproveita do “golpe” como pretexto para fazer o seu golpe de Estado? Porque será que, nas últimas eleições parlamentares da Turquia, o partido de Erdogan (AKP) teve maior percentagem de votantes turcos na Alemanha (60%) do que na própria Turquia?

 

Será este o resultado de 60 anos de integração? Erdoğan em anos anteriores já tinha dado a palavra de ordem à comunidade turca na Alemanha: “não se assimilem aqui”; a tática do poder é organizar sociedades paralelas numa esquizofrenia de lealdades. A lealdade à Turquia é mais forte que à Democracia. Isto torna-se compreensível num Estado islâmico que controla a religião e grande parte dos seus fiéis através de 600 imames (chefes de mesquitas) que envia todos os anos para a Alemanha e onde ficam, por cinco anos, ao serviço do governo turco.

 

A Turquia exige a livre circulação dos turcos na Europa e ameaça a EU a ter de permitir a isenção de vistos para turcos num prazo de três meses (o que significaria uma carta aberta também para refugiados turcos)! Resultado: A UE verá rescindido, mais cedo ou mais tarde, o acordo com a Turquia sobre os refugiados. O Estado turco não oferece confiança.

 

Há 24 anos houve na Alemanha ataques a residências de refugiados e em Mölln morreram 3 turcos numa casa incendiada por extremistas. Em Munique o povo alemão solidarizou-se com os turcos organizando uma cadeia de velas em que participaram 400.000 habitantes de Munique. A Alemanha ainda se encontra à espera da reacção muçulmana aos atentados efectuados por muçulmanos e sinais públicos de solidariedade com as vítimas. As comunidades muçulmanas ligadas a associações e mesquitas deveriam também manifestar-se publicamente para se distanciarem também com manifestações contra os atentados terroristas em nome do islão e para mostrar solidariedade com os cidadãos não muçulmanos. Doutro modo o matar inocentes em nome do islão não é compreendido como insulto ao Islão pelas organizações muçulmanas.

 

A questão consequente que se coloca: onde vivem as associações muçulmanas, como reagem à violência que surge do seu meio?

 

Embora 30-40 mil turcos tenham demonstrado em Colónia entre os três milhões de turcos há muita gente turca que é moderada. Um outro aspecto a ter em conta é que Erdogan é fruto da democracia e pelos vistos os turcos querem uma democracia autoritária e problemática pelo facto de os três poderes não serem independentes. Actualmente, na Turquia, como em tempos de revoluções, facilmente se é herói ou traidor!

 

O secretário-geral da CDU Peter Tauber disse no Die Welt: "Quem aplaudiu a liquidação da democracia turca, não se encontra na plataforma da nossa Constituição".

(http://www.welt.de/debatte/kommentare/article157395025/Tuerken-in-Deutschland-muessen-ihre-Loyalitaet-klaeren.html)

 

Surgiu na discussão pública a ideia esporádica de se introduzir a opção de jovens turcos, em vez de serem possuidores da nacionalidade turca e da nacionalidade alemã, terem de se decidir aos 23 anos por uma ou por outra.

 

A desaprovação da violência terá de ser manifesta e combatida tanto por alemães como por muçulmanos; só assim se cria confiança, porque para se construir a paz e evitar violência e guerra não pode haver uma solidariedade só para os de dentro.

 

A sociedade tem uma vida colorida mas o problema é que cada grupo pinta com a sua cor. Não é conhecida a mistura das cores e por isso temos um quadro de sociedade berrante. Vivemos, cada um no seu mundo, uns ao lado dos outros, em vez de vivermos uns com os outros.

 

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António da Cunha Duarte Justo

 

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