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A bem da Nação

A CORTIÇA E O VINHO

 

 

O número 148 da "Ingenium", a revista da Ordem dos Engenheiros, referente aos meses de Julho e Agosto de 2015, tem como tema os Clusters do vinho e da cortiça.

 

Além do Editorial, assinado pelo Bastonário, Eng.º Carlos Matias Ramos, um lote de excelentes artigos, da autoria de engenheiros agrónomos e outros técnicos, dá-nos um excelente panorama da situação actual desses dois sectores da economia em que Portugal está na linha da frente a nível mundial.

 

De cortiça, como já se aprendia na escola, somos o maior produtor mundial. Produzimos tanto como todos os outros países juntos. E a cortiça é a da melhor qualidade. De vinho, além do incomparável vinho do Porto, sempre tivemos bons vinhos, que nas últimas décadas, ainda sofreram notáveis melhorias.

 

Rolhas de cortiça.jpg

 

Em termos económicos, o valor da cortiça exportada em 2014 foi de 840 milhões de euros. Desse total, 70% foi em rolhas que, apesar de variados ataques, continuam a ser um vedante imbatível.   De vinho exportámos 731 milhões de euros em 2014. E os nossos vinhos classificam-se entre os melhores, ganhando prémios em todo o mundo.

 

Vinho tinto.jpg

 

Em relação à cortiça, além do muito que tem sido feito ultimamente, admito ser possível melhoria. A maior parte dos nossos montados não é o que podia ser. No artigo “O montado português” (Linhas de Elvas de 25-3-2010), cito um vídeo, produzido poucos anos antes pela Fundação João Lopes Fernandes, em que se mostram imagens de um montado plantado em 1957 em Montargil por aquele agricultor, com aconselhamento de dois muito ilustres agrónomos, o Prof. Vieira Natividade e o Eng.º Sardinha de Oliveira. Do artigo transcrevo:

 

“Que diferença em relação à enorme maioria dos montados que vemos em Portugal! Árvores bem alinhadas e com o espaçamento certo. Cada uma com um tronco direito e alto, só então ramificado, ainda jovens (para a normal longevidade do sobreiro) mas já a darem longas e perfeitas pranchas de cortiça. Valia a pena que alguém medisse a produtividade de cada hectare daquele montado e a comparasse com a dum hectare de qualidade média, com árvores mais ou menos irregularmente implantadas, muitas delas de tronco tortuoso, ramificado a baixa altura e dando certamente menos e pior cortiça.”

 

Não pode ignorar-se a magnífica actuação da grande empresa Corticeira Amorim, que tem tido uma notável actividade. Além de exportar para mais de 100 países, com um volume de negócios de mais de 500 milhões de euros, tem realizado investigação, com novas utilizações da cortiça e dando aconselhamento – gratuito – aos agricultores. Recentemente, promoveu a plantação de 2700 sobreiros na Serra da Peneda.

 

É consolador, no país em estado miserável, ver que há sectores em que estamos entre os melhores, no caso da cortiça o melhor – e a grande distância de todos os outros.

 

Publicado no "Linhas de Elvas" de 29 de Outubro de 2015

 

Prof. Miguel Mota.jpg

 

 Miguel Mota

MUITAS E DESVAIRADAS GENTES – 2

 Boticcelli- inferno de Dante.jpg

 

Foi Dante Alighieri que nos ensinou que o Inferno é formado por Nove Círculos, Três Vales, Dez Fossos e Quatro Esferas em conformidade com a teoria de que o Universo era formado por círculos concêntricos. O Inferno foi criado na queda de Lúcifer do Céu e torna-se mais profundo a cada círculo pois os pecados são mais graves. Portanto os pecados menos graves estão logo no início e os mais graves no final.

 

“Deixai toda a esperança, ó vós que entrais!”

 

Portal do Inferno.png

 Dante e Virgílio às portas do Inferno

 

O Portal do Inferno não tem portas ou cadeados, somente um aviso que adverte que, uma vez dentro, se deve abandonar toda a esperança de rever o Céu pois de lá não se pode voltar. A alma só tem livre arbítrio enquanto viva. É em vida que se decide pelo Céu ou pelo Inferno. Depois de morta, perde a capacidade de raciocinar e tomar decisões.

 

Os Nove Círculos do Inferno:

1- Primeiro Círculo, o Limbo (virtuosos pagãos)

2- Segundo Círculo, Vale dos Ventos (luxúria)

3- Terceiro Círculo, Lago de Lama (gula)

4- Quarto Círculo – Colinas de Rocha (ganância)

5- Quinto Círculo – Rio Estige (ira)

6- Sexto Círculo, Cemitério de Fogo (heresia)

7- Sétimo círculo, Vale do Flegetonte (violência)

8- Oitavo círculo, o Malebolge (fraude)

9- Nono Círculo, lago Cocite (traição)

 

Deixo ao critério do Leitor a escolha do local em que devem penar os políticos do Tamil Nadu por deixarem as suas gentes a chafurdar num verdadeiro caldeirão de imundície em que as pessoas não passam de mais uma parcela do esterco omnipresente.

Tamil Nadu (velha 1) - 1.jpg Raniamma, 80 – abandonada pela filha e pela neta porque deixou de receber a pensão de velhice que os políticos lhe cortaram. Vive actualmente numa casa degradada. Recentemente, esbarrou com um portão de ferro e cegou do olho direito.

 

Num mundo justo, já se teria constituído um Tribunal Internacional para julgar severamente os responsáveis por uma situação indescritível de miséria, sujidade, ignorância, abandono e morte. A verdadeira negação da Democracia, a ausência de quaisquer princípios do Direito Natural, um Direito positivo certamente distorcido pela corrupção, pela ganância, pela violência, pela fraude. Na pior palavra, traição. Traição à humanidade.

 

Tamil Nadu (remédios da morte) - 3.jpg Em aldeias como Kariapatti, Ennam Reddiapatti e Vellore, os pesticidas e raticidas são usados para matar os mais velhos.

 

E não contentes com tudo o que se vê, matam os velhos e há quem divulgue o método mais eficaz para que os mais novos se libertem do encargo de quem já não produz. Li a reportagem na edição de 22 de Novembro da revista «The week», (págs. 20 e segs.): juntam-se os produtos A, B e C nas quantidades q1, q2 e q3; dá-se essa beberagem ao velho e de seguida um banho de água tépida; unta-se-lhe o corpo com óleos odoríferos, metem-no na cama e dão-lhe um sumo de... Em poucas horas os rins deixam de funcionar e todos os demais órgãos entram em colapso. Caso a falência não ocorra, então há ministrar raticida ou outras mistelas cujas imagens comerciais também divulgam para que não haja enganos.

Tamil Nadu (velha 2) - 4.jpg Janaki, 70 – Ela sabe que a sua filha não tem tempo para tratar dela depois de ter ficado paralítica do lado direito.

 

Isto passa-se no século XXI num país que se apresenta como a potência mais importante do mundo.

 

Tamil Nadu (velha 3) - 5.jpg Seeniamma, 97 – Sobreviveu duas vezes ao pesticida Thalaikoothal bem como a dez comprimidos soporíferos. Tendo perdido a vista e a voz, aguarda pela suprema libertação.

 

E nós ficamos quietos? Se sim, então seremos coniventes.

 

Lisboa, 30 de Novembro de 2015

 

Tamil Nadu, NOV15.JPG

Henrique Salles da Fonseca

(Apesar de encharcada pela monção, a pequena égua não foi abandonada pelos donos e está bem nutrida; do mesmo não se podem gabar os velhos humanos)

CHEIRO A MAR – 1

 

Um mergulho nas profundezas da memória

 

E nunca que ouvimos a nossa vida em nós,

Só ouvimos é quando chega o seu silêncio...

José Luandino Vieira, in “Águas do Mar, o Guerrilheiro”

 

 

De Portugal até Angola

 

 

Um mergulho nas profundezas da memória, sem óculos nem “snorkel”, o coração cheio de vontade de reviver alguns momentos que as águas proporcionaram.

 

A água é, como sabemos, o mais precioso dom que a natureza, com toda a sapiência do Criador, nos legou. E está a tornar-se um dos mais raros, poluído pelos resíduos industriais dos grandes potentados financeiros, em fase de destruição total do planeta. Rios e mares.

 

Creio que todos começamos a nossa vida por beber, além do maravilhoso leite materno, água.

 

FGA-vovo memino marujo (mar-1).jpg Em pequeno, o quanto era chic aquelas roupinhas “à marujo”, que se usavam em dias de festas! Um chamado às águas, há tantos anos, que esqueci quando foi, mas ficou para sempre! Quem lembra destas elegâncias???

 

As brincadeiras nas praias, no tempo em que as ondas eram perigosas, um ou outro mergulho meio a medo, porque as ondas grandes ninguém as enfrentava e hoje são brincadeira de surfistas. Nas marés baixas, o mar afastava-se de mansinho, afloravam rochas pequenas, cobertas de rasas algas, onde brincávamos com minúsculos caranguejos e anémonas, e nas grandes marés apanhávamos mexilhões, lapas e percebes (que delícia!). Comendo-os, muitas vezes ali mesmo, come-se e bebe-se mar, tal como disse Tomaz de Figueiredo: Aquele gosto e o cheiro a mar nunca mais saíram das papilas sensoriais, do coração, do pensamento, da vontade de o ter sempre por perto.

 

E tê-lo sempre por perto nem que seja para sentar em qualquer lugar e ficar olhando, olhando, sonhando.

Andar pelas margens do Tejo, ver aquelas lindas asas brancas como cisnes, dos pequeninos “Lusitos” de instrução a futuros mareantes, passeando em cima das águas...

 

Talvez 1940 e tal. Criança, foi para mim um espectáculo “quase grandioso” atravessar o rio Tejo, em Vila Franca de Xira, numa jangada. Ainda nem projectada estava a ponte que continua a chamar-se “Marechal Carmona” e que, por ter em cada lado, nas entradas, uma esfinge do então simpático Presidente da República, ficou conhecida como a "Ponte Bi-Carmonato de Pontássio”. Genial.

 

Inaugurada em 1951, já pelo Presidente Craveiro Lopes e Salazar que chegaram a Vila Franca, imponentes, numa viatura espectacular: um “Landau de Cinco Vidros”,carro lindíssimo que se encontra hoje no Museu de Carros de Cavalos na Quinta da Bouça perto de Viana do Castelo

 

FGA-Landau (mar-1)

 

A travessia, com os carros a balouçarem a jangada quando entravam, era emocionante!

 

Outras travessias, por vezes com o Tejo mal-humorado, muitas de Lisboa para o Barreiro, onde apanhava o comboio da linha “Sul e Sueste” para Évora. Na Casa Branca, quilómetros antes de ali parar, à nossa espera já nos invadia o fumo e o cheirinho maravilhoso, uummm... das bifanas incomparáveis que estavam a fritar no cais, e o copo dum tinto mais que alentejano que se bebia no bar da estação tirado directamente do pipo, um candeeiro de petróleo dando a todo o ambiente um misto de paz e verdade, o comboio separava-se: parte seguia para o Algarve e outra para Évora e audiante. Os que íamos para a famosa e saudosa Escola de Regentes Agrícolas, a Herdade da Mitra, saíamos no apeadeiro do Tojal, hoje desactivado, onde nos aguardava uma carroça da Mitra para nos levar as malas! Os seis ou oito quilómetros que nos separavam da Escola eram galgados a pé. E à noite.

 

Deixemos o sequêro e voltemos às águas.

 

Saudade da calma e linda baía de Cascais, algumas velejadas no Sharpie 9 do meu querido irmão, compadre e padrinho Luis Quintella, e ser projectado para fora pelas suas “traiçoeiras” brincadeiras ao cambar quando eu estava distraído e a retranca me obrigava a banho forçado!

 

Lembro bem as primeiras águas que cruzei. Doces.

 

Por cima das águas, não esqueço duas visitas importantes: uma ao Navio Escola do Brasil, “Almirante Saldanha”, em 1946 (?) na primeira viagem que este belíssimo navio fez à Europa, instruindo os Guarda Marinha, os “Espadinhas”, entre os quais um primo que nos deu um prazer imenso ter conhecido.

 

FGA-Alm Saldanha (mar-1).jpg

 

Em 1950 a primeira “Grande Viagem Oceânica”! Ano Santo, excursão a Roma de rapazes da Acção Católica, no “Mouzinho”, navio comprado em 1929 e que morreu em 1954. Enjoo de começo e muita alegria a seguir, com amigos que muitos já se foram e outros ainda por cá estão e preenchem o nosso coração. Os que tinham dinheiro viajavam nas cabines. O maralhal, nos porões transformados em caserna de combate. Uma maravilha! Vimos Roma, alugámos uma Vespa e fomos recebidos pelo Papa Pio XII em Castel Gandolfo.

 

Ficaria mal se não dissesse que ficámos hospedados num colégio de freiras – era verão e não havia aulas – e as boas das freirinhas não tinham mãos a medir à voracidade com que aquela rapaziada devorava as espantosamente boas “paste cotta con salsa di pomodoro e formaggio”. Vão 65 anos e ainda hoje me abrem o apetite!

 

Mais tarde, já nos anos 50 e qualquer coisa, a visita a Portugal do porta-aviões americano “Coral Sea”, um imenso gigantão dos mares. Impressionou, sobretudo por dentro, o tamanho do elevador para os aviões que lhe estacionavam no porão (130!); parecia que todo o cais lhe caberia dentro. 295 metros de comprimento e 230.000 HP de força dos motores, 33 nós de velocidade! Um monstro dos mares.

 

FGA-Coral_Sea (mar-1).jpg

 “Coral Sea”fotografado em 1986 já com novos aviões a bordo

 

Depois começaram as águas a “sério”.

 

1954 - Primeiro de Agosto. Casado há pouco mais de duas semanas, embarcava no “Moçambique”, sozinho, a caminho de Angola. Deixava no Cais da Rocha, em Lisboa, mãe, irmãos, tias, sogros e a noiva que só iria ter comigo dois meses e meio mais tarde. O navio a afastar-se, do cais uns lenços brancos em acenos tristes e eu, coração apertado, apertadíssimo, levantava tristemente a mão para que me vissem entre as serpentinas que atiravam os emigrantes para fingirem que era uma festa. A maioria com os olhos lacrimejando!

 

Meio enjoado nos primeiros dias, a escala na Madeira, com toda a sua beleza natural e um casual encontro com um amigo de infância, o querido Zé Perestrello, retemperou-me as forças e um pouco do espírito. Depois, uma semana mais de mar, com peixes voadores e golfinhos alegrando a monotonia, a disposição já refeita, boa comida – na mesa do comissário – sem que as saudades abrandassem, uma manhã, bem cedo, surge no horizonte um “chapéu mexicano com algodão envolvendo a parte média do cone”. São Tomé.

 

Ainda cedo o navio lança âncora na bela baía Ana Chaves, pouco afastado do cais.

 

As minhas tias sabiam que ali vivia um afastado parente, Humberto Gomes de Amorim, administrador das roças do Banco Ultramarino; mandaram-lhe um telegrama avisando da passagem do “parente-emigrante”.

 

Homem influente na ilha, lá estava em terra, brilhante careca à mostra. Entrou na primeira lancha que se dirigiu ao navio e foi a bordo buscar-me. Simpático, levou-me para tomar o “mata-bicho” cheio de frutas tropicais e um belo café na varanda da sua casa – quase um palácio – e depois dar uma volta por aquela ilha das maravilhas. Tivemos dificuldade em saber qual era o nosso antepassado comum, mas ao fim de muito procurarmos lá estava: o bisavô dele, Francisco Gomes de Amorim, tio e padrinho do meu também bisavô e homónimo! Bingo.

 

Mais um dia e meio de mar entrámos finalmente na baía de Luanda, à noite. Dez dias de mar e toda uma nova vida pela frente.

 

 

05/04/2015

 

FGA-2OUT15.jpg Francisco Gomes de Amorim

MUITAS E DESVAIRADAS GENTES – 1

 

 

 

Sim, o título é de inspiração medieval no sentido de que então se considerava desvairado todo aquele que agia segundo padrões diferentes dos do observador. E nesta viagem, para além de muita, vi gentes desvairadas.

 

Saídos de Lisboa rumo ao Dubai (nesta que era então a minha terceira passagem pelos Emiratos Árabes Unidos), logo vimos homens de bibes brancos compridos até aos pés e mulheres completamente tapadas de vestes negras que nem os olhos mostravam. Não me preocupam os bibes brancos dos homens. Se gostam de se apresentar em tais preparos, o problema é deles mas os resultados são penosos à nossa vista desprevenida quando saem dos locais em que se aliviaram e, não sabendo utilizar os apetrechos ocidentalizados que as casas de banho disponibilizam, encharcam as ditas vestes e exibem particularidades que qualquer um de nós, homens, dispensaria testemunhar. Quanto às vestes femininas – suponhamos que estão mulheres sob tanta negritude – essas, sim, preocupam-me. E, para além de me preocuparem relativamente à comodidade de quem assim é coberta, revoltam-me a ponto de afirmar que só farei as pazes com o Islão quando os seus crentes reconhecerem à mulher um estatuto de dignidade semelhante à do homem. Não perco tempo com argumentos teológicos (que sei serem infundados com base mesmo na interpretação literal do Corão), apenas peço que esses boçais deixem as mulheres respirar livremente. Só isso e nada mais, por enquanto, antes de esperar pelos resultados da exegese da Escritura Sagrada islâmica actualmente em curso apenas na diáspora sob pena de perigo de vida a quem a realize localmente.

 

Quanto às gentes ocidentalizadas, por naturais à nossa vista, não dá para tecer reparos. E já são a maioria. Mas isso é pelo lado de fora; não falei com ninguém o suficiente para descortinar o que lhes vai por dentro. Mas adivinho: os homens, indiferentes; as mulheres, em campanha «pro dignitate».

 

E dali rumámos a Chennai, na Costa do Coromandel, ou seja, a costa oriental da Índia. Voo sem história durante cerca de quatro horas, o que parece salto de pulga perante as oito horas bem esmifradas amiúde a mais de mil quilómetros à hora de Lisboa ao Dubai.

 

 

 

Bem preveniam os Serviços Meteorológicos de que por aquelas bandas chovia. Mas nós achávamos que era engano pois a época das monções já acabara. Pois! Naquela zona há a chamada «pequena monção» durante os meses de Outubro e Novembro em resultado de os ventos da monção normal esbarrarem já secos nos Himalaias, fazerem ricochete voltando para Sul e humedecendo-se progressivamente enquanto percorrem o Golfo de Bengala até ao Sri Lanka encharcando então quase todo o Tamil Nadu. E nós estávamos lá para levar com todo aquele chuveiro a bem mais de 30º centígrados.

Monção do Nordeste.jpg

Monção em Chennai.jpg

 

A nossa viagem começou em Chennai, atravessámos durante uma semana todo o Tamil Nadu, entrámos no Kerala e fomos até Cochim. Daí, voámos para Colombo, no Sri Lanka, viajámos até Kandy, o grupo voou de Colombo ao Dubai e daí a Lisboa mas nós prolongámos a viagem até Goa, a Dourada.

Viagem.jpg

 

(continua)

 

Lisboa, 30 de Novembro de 2015

 

Henrique-Arco dos Vice-Reis, Velha Goa-NOV15 (2).j 

Henrique Salles da Fonseca

(Velha Goa, Arco dos Vice-Reis, Novembro de 2015)

VAMOS DE CAVALO A BURRO, COMENDO PIZZA...!

 

falta de ar.jpg

 

 

Estamos vivendo um retrocesso no processo de desenvolvimento humano.

 

Ao contrário das políticas públicas de países mais desenvolvidos, que priorizam o financiamento da assistência à saúde e o bem-estar do cidadão gastando em média 6,08 % do PIB, o governo brasileiro, apesar das galopantes carências nessa área, gasta apenas 4,32%. Assim não é de se estranhar que a média da expectativa de vida do brasileiro seja actualmente 73,62 anos, enquanto a dos ingleses é de 82,62 anos. E para agravar a situação, quando o governo resolve investir, investe mal, sem prioridades e distorcidamente, sem julgar as reais e urgentes necessidades da população. Ignora o que todos sabem, falta-nos, principalmente, o básico; remédios e hospitais suficientes e aparelhados!

 

Sensação de indignação nos toma quando vemos na TV gastos absurdos em propagandas populistas de Programas de Saúde, enquanto pessoas morrem em filas de espera para conseguir uma internação ou ganhar algum medicamento. É revoltante ver nos hospitais das Faculdades Federais de Medicina prateleiras de medicamentos vazias, aparelhos hospitalares encostados por falta de manutenção, tetos de salas de Pronto Socorro com fungos, cheios de infiltrações, carências de leitos e UTIs, para os mais prementes atendimentos. É inacreditável que médicos do Estado sejam obrigados, por ordem superior, a suspender internações e cirurgias electivas, por falta de luvas...! Os Pronto-Socorros não atendem, por ordem superior, sem antes o paciente passar pelas UPAs, o que pode ser uma importante perda de tempo para garantir a sobrevivência em casos graves que demandam serviços hospitalares de emergência! É a burocracia aliviando os hospitais artificialmente e emperrando o salvamento de um possível paciente! Onde estão as prioridades? Onde está o bom-senso? Onde está o honesto e bom gerenciamento dos escassos recursos que chegam espoliados e desfasados às entidades da Saúde e Educação?

 

Enquanto esse degradante quadro da saúde pública nos é oferecido, proliferam, com o aval do governo, escolas médicas sem hospitais e professores suficientes para um honesto e verdadeiro ensino. Para quê mais Postinhos de Atendimento Ambulatorial, com salas ociosas e até desactivadas, se não há escoamento dos doentes que lá chegam precisando de internação ou tratamento hospitalar especializado? Problemas de pequena complexidade são fáceis de resolver, programas preventivos são desejáveis, são medidas de economia e de poucos gastos! Mas o que urge é resolver os problemas de saúde que uma receita comum não trata; o país precisa de vagas hospitalares, de oferecer exames e tratamentos de média e grande complexidade, coisas que não cabem no bolso da grande maioria da população.

 

Mas o governo que só vê o que lhe interessa, finge que não conhece as estatísticas alarmantes que se apresentam: só 6,5% das cidades brasileiras têm UTIs! Só 49,6 % dos nossos municípios têm condições hospitalares de atender parturientes e recém-nascidos NORMAIS! Com estes números dá para entender porque o governo actual se empenha em fazer propaganda para estimular os partos naturais, com parteiras em casa... A explicação simplista é que somos recordistas mundiais em cesarianas, o que é uma realidade. Mas a solução propalada não é uma tentativa honesta de protecção à mulher, mas uma saída oportunista encontrada para a falta de hospitais públicos ou conveniados, que possam disponibilizar vagas suficientes para o atendimento profissional integral e permanente às pacientes e seus rebentos, que precisam ao nascer de avaliações de vitalidade e testes preliminares para diagnósticos precoces de doenças. Em casa não vão ter esse atendimento, e talvez os pais só consigam marcar uma consulta pra o bebe daqui alguns meses, ou talvez nem o façam...

 

Para acompanhar uma gestante em trabalho de parto, o indicado é ter-se no Hospital ou Maternidade uma equipe de plantão 24 horas/por dia, com enfermagem, médicos obstetras, pediatras e anestesistas disponíveis para assistir as pacientes e intervir quando necessário em qualquer dificuldade intercorrente (um descolamento prematuro de placenta, um sofrimento fetal, uma discinesia ou atonia uterina por estafa muscular, uma desproporção cefalo-pélvica,...) no trabalho de parto que ponha em risco a vida da parturiente e seu rebento. E após o parto, o hospital deve estar preparado para oferecer leito para a mãe e o recém-nato, o que pelas estatísticas levantadas não se tem a contento...!

 

É triste ver os hospitais da rede federal (Hospitais Escola) que no passado foram referência em qualidade de formação profissional atendendo precariamente. Falta tudo, de professores a todo tipo de material e medicamento, enquanto o dinheiro dos impostos, que deveria reverter para o bem-estar da sociedade, escorre para esgoto da corrupção político-governamental.

 

E para concluir, uma nota que é de rir, para não chorar; recentemente, em instituição pública hospitalar regional, os funcionários que ficavam no Pronto Socorro, além de terem que improvisar nas deficiências, não tinham alternativa para se alimentar durante o plantão; ou traziam marmita de casa ou comiam o que havia na despensa: ovo.

 

Azar para quem não pudesse ingerir o saboroso produto da galinha, seja por alergia, problemas metabólicos ou intolerância gustativa! Acredito que para matar a fome houve quem pedisse pizza..., pelo celular!

 

Uberaba, 10/11/15

Maria Eduarda Fagundes Maria Eduarda Fagundes

O CENTRO É PRECISO

 

Houve tempos em que a Terra ocupava o centro do Universo e este girava à volta dela, mas o Copérnico e o Galileu mostraram, através das mudanças ou fases de Vénus, em relação à Terra, e os seus diferentes tamanho aparente e brilho, que Vénus se movia em volta do Sol, e daí que também a Terra fazia o mesmo, que era, como aquela, um planeta, perdendo esta o seu protagonismo geocêntrico. Ou direi antes, antropocêntrico, que ainda se não descobriram outros exemplares habitacionais nas esferas do mundo, apesar dos selenitas e marcianos de que se chegou a falar, antes desta revolução tecnológica que cada vez nos tira mais do sério, na questão dos conceitos, e bem fez o Einstein em lhes chamar relativos, embora tudo isso nos deixe muito desconcertados.

 

Já não há certezas de nada, a não ser dos ódios que opõem os seres e dos amores que os unem momentaneamente. É certo que quando recebo e-mails com fotos das maravilhas da Terra, não só as naturais como as construídas pelo Homem, a minha gratidão a um centro criador disso, porque um centro deve haver criador disso, encrusta-se-me, suponho, no coração, que é um órgão, ao que dizem, central da vida, e aí estou eu a agradecer a esse centro criador. Por outro lado, cada ser da natureza é ele próprio criador, não só de filhos como de tantas outras coisas, e também isso é milagre que nos arrebata, se for bom, ou irrita, se for mau.

 

Não tinha reparado que o centro desaparecera, como explica Vasco Pulido Valente no seu artigo de 13/11, para mim o centro polarizador do melhor possível na questão política sendo os defensores do que eu própria achava justo, ainda que tivesse que pagar por isso.

 

Mas realmente, desde que se tentou aplainar a sociedade, segundo o falso conceito da igualdade, encontramo-nos mais perdidos e entregues às disputas e ódios e atropelos.

 

E retomamos Sá de Miranda, que observou como se fazia no mundo animal, o que os programas do National Geographic explicitam ainda melhor:

 Sá de Miranda.png

A cabeça os membros manda;

Seu rei seguem as abelhas.

A seu tempo o rei perdoa;

A tempo o ferro é mezinha:

Forças e condição boa

Deram ao leão coroa

De sua grei montesinha.

Às aves, tamanho bando,

Doutra liga e doutra lei,

Por vencer todas voando,

A águia foi dada por rei,

Que o Sol claro atura olhando.

 

Essas normas do bom convívio entre os homens são interpretadas como de carneirada, mais indisciplinados e pretensiosos aqueles do que os animais ditos irracionais. Até se falava de rebanho, no tempo de Salazar. E no entanto, não era assim. As pessoas cumpriam – melhor ou pior – mas dentro de regras que as valorizavam como seres humanos. Os excessos de liberdade, que não se praticam assim, noutros países mais cumpridores e ordeiros, conduzem uma juventude universitária, por exemplo, entre nós, a puras desvergonhas que raiam o grotesco e a infâmia e o próprio crime. E as Universidades permitem e os Governos não actuam e a justiça ignora.

 

Era mesmo preciso um centro.

 

Berta Brás.jpg Berta Brás

 

A misteriosa desaparição do centro

Vasco Pulido Valente.png Vasco Pulido Valente

Público, 13/11/2015

 

Lamento dizer, mas não me preocupa muito a desaparição do “centro”. As forças muito bem arrumadinhas na Assembleia da República entre a esquerda e a direita são um bom retrato do que Portugal sempre foi, desde 1820 e principalmente desde a lamentada morte do Senhor D. João VI, em que a legitimidade (hoje tão discutida) se perdeu para sempre. Em França, nosso exemplo e guia, aconteceu o mesmo. Depois de 1789, esteve perpetuamente dividida em vários corrilhos que se queriam matar (e muitas vezes se mataram). O que nunca conseguiu foi criar um “consenso” sobre o que era indispensável e básico, ou seja, um regime liberal digno desse nome. Apesar de Tocqueville ou de Guizot, os franceses continuam a achar o “liberalismo” uma ideia inglesa e uma palavra porca. Tal qual como cá.

 

Entre 1829 e 1910, a Monarquia não passou de uma sucessão de guerras civis, insurreições, pronunciamentos, golpes de Estado ou golpes de palácio. Verdade que a partir de 1851-52 houve uma certa tranquilidade, embora descontínua e precária. A crise de 1890-1893 acabou com esse efémero intervalo de civilização. Dali em diante, o rei, os partidos do regime e o partido republicano entraram num conflito aberto que levou, como devia levar, ao assassinato do rei e à revolução. Da I República quase não vale a pena falar. Excepto para especialistas, as balbúrdias de um regime terrorista, em que um décimo de Portugal insistia em sufocar os nove décimos que sobravam, não merece nem grande atenção, nem grande interesse. No fim do “regabofe”, como lhe chamavam, veio Salazar. Os portugueses, como os franceses, não gostam de liberalismo, mas suportam bem uma boa dose de despotismo.

 

O partido comunista inaugurou a III República com a tentativa de transformar Portugal numa espécie de Cuba da Europa. Perdeu, mas nunca se arrependeu e não deixou ainda de intimidar a direita, que se proclama muito “social-democrata” e amiga dos pobres; por interesse, claro, e também por medo. No meio desta “hipocrisia institucional”, como dizia Sá Carneiro, o ódio persistiu e, agora, com a “austeridade” e a corrupção, voltou à superfície. Nada sairá daqui, a não ser uma tirania qualquer, com o nome ou sem ele. O Dr. Cavaco não percebeu um ponto básico: em Portugal não é o consenso que produz prosperidade; é a prosperidade que produz consenso. Se houver evidentemente quem nos dê dinheiro.

AS RAÍZES DO MAL SOCIAL

 

Boko Haram.png

 

Porquê de tanta violência? Porquê de tanto fanatismo, pergunto-me quando vejo jovens e até crianças de armas em punho, aliciadas por gente que se diz religiosa, mas que no fundo quer é dominar o Homem através do medo e do terror à sua presença. O que faz essa juventude transviada se bandear para o lado escuro da alma humana?

 

Em geral, o que se percebe ao se ouvir os noticiários sobre o terrorismo que atinge actualmente Europa e África, é que quem executa esses actos bárbaros de violência são jovens potencialmente agressivos emergidos de ambiente ou história conflituantes, onde a sociedade de alguma maneira lhes bloqueia oportunidades ou desempenhos.

 

Procuramos entender; será que toda essa insatisfação pessoal/social encontra na violência das acções terroristas a válvula de escape, visível e contundente, que todos os dias nos jogam na cara? Será que essas criaturas encontram nas drogas ou nas promessas religiosas a recompensa de um mundo quimérico, após a morte, de sensações compensatórias que as impedem de se comunicar de uma maneira real e normal com o mundo que as cercam? Ou será que são pessoas portadoras de um desequilíbrio da função psíquica entre o ego-superego-id, onde o instinto não encontra repressão e o comportamento moral é tolhido ou simplesmente ignorado? Ou ainda será que existe nessas gentes uma conjugação de factores que, mentalmente trabalhados, se tornam veículo de manobras intimidatórias de poder de mentes doentias? Não é simples responder a tanta loucura que destrói e mata sem sentimento culpa.

 

Combater o terrorismo é uma luta inglória, pois mesmo que se acabe com este grupo que agora nos assombra, à força de armas e de retaliação responsiva, outro virá como outros no passado.

 

Combater o mal não é apenas fazer repressão à violência, com violência, é um acto diário de paciência e tolerância, diálogo, acordo e inclusão social.

 

Combater o mal social é acima de tudo respeitar o Homem nas suas múltiplas diferenças.

 

Maria Eduarda Fagundes Maria Eduarda Fagundes

«COITADO DO ÁLVARO DE CAMPOS!»

 Álvaro de Campos.png

 Álvaro de Campos (pormenor)

Mural da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Almada Negreiros (1893-1970), 1958

 

Três artigos da revista do Expresso – E – “O Inimigo Maior”, de Clara Ferreira Alves: “Liberdade ou irritação» sobre Salman Rushdie, – “As 1001 mortes de Salman Rushdie, como se lê na capa, com o rosto do escritor - uma Entrevista de Luís M. Faria; “Sem direito a humanidade”, julgo que tradução de uma Entrevista de Katya Delimbeuf em Londres (O Expresso tendo viajado a convite da Penguin Random House, segundo a informação final – são, entre muitos outros de muito interesse, suficientes para comprovar a qualidade do semanário Expresso, na busca de temas de grande dimensão e de jornalistas de grande qualidade.

 

Textos que nos trazem casos de horror e de monstruosidade deste nosso século que nos fazem de novo arremessar, em paralelo, para os extermínios nas guerras do século passado, e os comboios a abarrotar de gente, como gado, para um destino desconhecido, que encaramos sempre como pesadelo, e que comprovam que o mundo mexe e remexe, no medonho dos casos ou das mentes ou dos cataclismos de uma Terra ela própria enfurecida, e sempre na previsão de que amanhã será pior, mau grado o progresso ou talvez por causa dele.

 

É o artigo sonoro de Clara Ferreira Alves que, nos seus sarcasmos e contundências verbais, apaixonadas por um ideal de justiça, aponta os casos da gente aterrorizada que invade a Europa, por esta em grande parte repelida e agora pelos próprios elementos climáticos– “O Inimigo Maior”. Transcrevo a parte final do seu texto, o Expresso não me permitindo que o faça por transposição imediata:

 

Os migrantes beneficiados, os que a Europa adotou como força de trabalho a incorporar nas máquinas industriais e agrícolas (até os nossos socialistas sugeriram pôr os sírios a limpar as matas), gastaram os bens a penetrar na fortaleza. A sua integração será difícil, na Alemanha crescem já os movimentos xenófobos e as manifestações pela perda dos “valores alemães”. Nas águas do Mar Egeu, as brigadas do partido Aurora Dourada, vestidas de negro e com caras tapadas, atacam os barcos do tráfico. Ninguém sabe quantos afogados esta guerrilha já provocou. O jornalismo só se deteve no cadáver da criança na praia e na estação de Budapeste. Nas fronteiras da Croácia e da Sérvia com a Hungria, estão milhares de pessoas afogadas em lama, estão crianças a chorar e a tiritar, estão os que não conseguiram entrar e não têm para onde recuar. Vamos deixá-los apodrecer nos Balcãs Ocidentais quando vierem as neves? A matilha debandou. A história morreu. Vamos deixá-los ao frio, embrulhados em sacos de plástico, até morrer outra criança que comova os corações.

 

A profusa reportagem e entrevista a Salman Rushdie, um escritor cujos “Versículos Satânicos” transformaram em fugitivo condenado à morte pelo Ayatollah Khomeini, mostra um homem provocador que continua combatendo a causa da liberdade de expressão, num desafio contra os extremismos islamitas, e figurando já como espécie de vedeta pouco amável para com os entrevistadores, mostrando as feridas de fera acossada. Transcrevo o final da entrevista, como exemplo:

 

- Já era um escritor importante, mas graças a Khomeini tornou-se um elemento central da cultura contemporânea, a par de muitas coisas que nada têm a ver com literatura. Ficou mais consciente (ou menos defensivo) em relação à cultura popular com os anos?

- Sempre tive interesse, e usei, a cultura popular desde o início da minha obra. Você sente de novo a necessidade de agradecer a Khomeini pela minha reputação. Acho que vou encerrar esta conversa.

- Finalmente, pode dizer-nos algo sobre a sua vida hoje em dia?

- A minha vida é excelente, muito obrigado por perguntar. Também é privada.

 

Quanto à entrevista a Yeonmi Park, jovem de 22 anos que ouvi também na Internet contando em lágrimas bem sentidas os horrores por que passou a fugir do seu pais, a Coreia do Norte, num apelo ao mundo para que libertem o seu país da ditadura dos Kim, transcrevo apenas a introdução à entrevista, suficientemente esclarecedora de quanto o mundo dos com mais poder pode admitir ainda tanta barbaridade, sem intervir, quer a nível interno quer a nível externo:

 

Não é suposto uma criança passear na rua e cruzar-se com cadáveres. Não é suposto enganar a fome comendo flores e gafanhotos fritos. Mas esta é a realidade de 25 milhões de norte-coreanos que vivem no país mais isolado e esquecido do mundo. Também não é suposto uma menina de treze anos atravessar a fronteira a pé, ainda com os pontos de uma operação na carne, para fugir à fome e à falta de esperança. Muito menos é suposto ver a mãe ser violada à sua frente pelo intermediário que as deveria ajudar a chegar à China. Como também não é suposto ser ela própria violada e trocada de mão em mão como mercadoria. Mas este tráfico de seres humanos em que caem milhares de norte-coreanas que tentam fugir do seu país, na perspectiva de uma vida, foi o que aconteceu a Yeonmi Park. Uma menina de 22 anos que passou os últimos oito a tentar sair do inferno. Conseguiu. O Ocidente sabe pouco do quotidiano da Coreia do Norte. Conhece o ditador , Kim Jong-Un, e o arsenal nuclear usado como permanente ameaça, mas ignora as provações por que passa a população daquele país desde que há 70 anos os ditadores Kim tomaram o poder. Yeonmi Park viveu na pele essas privações. Viu o pai ser preso e levado para um campo de “reeducação” onde quase morreu, por ter um negócio de contrabando. Passou dias inteiros sem nada para comer. Até que o desespero a levou a tentar dar o salto. Sem sonhar que do outro lado o pesadelo não iria ser pior. Conversámos com ela em Londres.

 

Um mundo, de atordoar. Respiremos – se é que conseguimos – divertindo-nos um pouco com as lamentações egoístas do nosso Álvaro de Campos. As dores da alma também têm o seu peso neste mundo cruel, embora ditas em certo tom chocarreiro:

 

Coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa!

Coitado dele que tem tanta pena de si mesmo!

E, sim, coitado dele!

Mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam,

Que são pedintes e pedem,

Porque a alma humana é um abismo.

Eu é que sei.

Coitado dele!

Que bom poder-me revoltar num comício dentro de minha alma!

Mas até nem parvo sou!

Nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais.

Não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.

Não me queiram converter a convicção: sou lúcido!

Já disse: sou lúcido.

Nada de estéticas com coração: sou lúcido.

Merda! Sou lúcido.

 

Berta Brás.jpg Beta Brás

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