A vizinha Espanha alterou a sua posição política de 2013, deixando de se opor a que Portugal aumente a extensão da sua plataforma continental, a partir da região da Madeira, aumentando o leito e subsolo marítimo de 200 para 350 milhas. A nota verbal entregue pela Espanha à ONU acontece depois de Portugal ter também declarado que não se opõe a que a própria Espanha estenda a sua plataforma continental a oeste das Ilhas Canárias.
É um mar imenso! Soberania sobre as primeiras 12 milhas e jurisdição até às 200 (incluindo espaço aéreo, água, solo e subsolo, com direitos de soberania sobre os recursos). Das 200 às 350 milhas, o poder estatal exerce-se só sobre o solo e o subsolo.
Repetimos, é um mar imenso à superfície e no subsolo, com recursos vivos (vegetais e animais), minerais e energéticos (gás e petróleo) incalculáveis. Uma enorme potencial riqueza.
E é isso mesmo que nos interessa. Sob muitos aspectos, o nosso país é pequeno e pobre, com a fertilidade e a riqueza mal distribuídas. O mar, esse mar imenso que ajudámos a desbravar, surge de novo na nossa história como caminho de riqueza e de descoberta, com a possibilidade de polarizar o país e de dinamizar a sua economia.
Quando olhamos para o país e vemos as notícias e as lutas internas, pouco mais vemos que questiúnculas, intrigas, pequenas lutas de poder, “casos”, atomizando o tecido social e travando o esforço colectivo.
Falta-nos um objectivo comum, um desígnio grande e possível, donde possa sair mais riqueza, mais emprego, mais iniciativa e inovação. Ele aí está, o mar!
Saibamos nós unir os esforços, preparar o futuro, rentabilizar os recursos e grandes perspectivas se abrirão.
De novo, o futuro passará pelo mar.
P. António Vaz Pinto, SJ
In Editorial, BROTÉRIA, Março de 2015, pág, 213 e seg.
Felicidade da mulher como índice do desenvolvimento de um país?
Segundo o estudo da ONU sobre o Índice de Felicidade Mundial realizado pela universidade Colúmbia de Nova Iorque, a felicidade mundial aumentou ligeiramente em relação a anos passados. O norte é mais feliz que o sul, tem mais confiança. Nos países desenvolvidos, as mulheres são mais felizes do que os homens, enquanto nos países em desenvolvimento se passa o oposto.
A ordem de felicidade por países: 1° Suiça,2° Islândia,3° Dinamarca, 4° Noruega, 5° Canadá, 6° Finlândia, 7° Holanda, 8° Suécia, 9° Nova Zelândia, 10° Austrália, 15° Estados Unidos, 16° Brasil, 26° Alemanha, 88° Portugal.
Dos países qualificados, os dez países menos felizes seriam o Afeganistão e países africanos.
Os indicadores de felicidade do questionário efectuado abrangiam sistemas sociais, mercados do trabalho bem como perguntas sobre a autopercepção das pessoas (bem-estar mental, liberdade na tomada de decisões, ter alguém em quem se confia, falta de corrupção, esperança de vida saudável, etc.).
A investigação sobre a Felicidade de um povo é uma boa iniciativa dado orientar a atenção do cidadão e dos políticos para um objectivo que deveria ser o mais importante da política. A satisfação da vida e o bem-estar social deveria estar na agenda de todo o deputado e do governo.
Naturalmente haverá povos de caracter mais alegre que outros, o que torna difícil a interpretação da qualificação da felicidade de uns países em relação a outros. A maneira de compreender a vida é muito diferente de cultura para cultura. Há povos por natureza mais satisfeitos que outros.
Talvez por falte de uma ciência da felicidade ainda não se saiba como fazer os cidadãos felizes.
O Botão foi o primeiro país que colocou como objectivo do governo a felicidade pública. Aí os indicadores de felicidade apresentados eram: bem-estar psicológico, equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, vitalidade comunitária, educação, preservação cultural, proteção ambiental, boa gestão governamental e segurança financeira.
O grau de esperança é um elemento e um indicativo da felicidade de uma pessoa. Ela empresta à realidade vestidos mais agradáveis e coloridos! Quem já tem tudo poderá ter o gozo do desejo saciado no tempo mas, apesar de tudo, não ser feliz! Pode-se ter gozo sem se ser feliz, porque o gozo é a felicidade da parte enquanto a felicidade é o gozo do todo. A felicidade é rara porque gozo é um estado, um momento e felicidade é ser, o ser que não é soma dos momentos. A felicidade está ligada à saudade que goza a dor do não viver! Também é verdade que, por vezes, se vive com felicidade mas sem gozo porque o gozo depende também do parceiro, tem a ver com o próximo!
Lembro perfeitamente. Era mesmo Gundemaro o nome dele. Eu não teria nem dez anos e volta e meia um homem, bem velhote, cabelinho todo muito branco, andar um pouco curvado, ar humilde, aparecia lá em Sintra, em casa de meu avô. Era o Gundemaro. Quando ouvíamos o nome dele, todos nós, irmãos, tínhamos que sair de perto, para rir.
Aos nossos olhos de crianças, era bem velho. Bem como o nosso avô que naquela ocasião teria quase oitenta anos, e ele passava-lhe uns quantos.
Não sabíamos sobre o que o tal Gundemaro ia falar com o avô, nem ficávamos por perto, até que um dia, estimulado pelos irmãos, que me cutucavam – vai perguntar ao avô se ele é alemão; não vou nada, vai sim – enchi o peito de vento e de coragem e fui perguntar como era mesmo o nome dele, porque jamais aos nossos ouvidos havia chegado tal nome, nem éramos capazes de o pronunciar correctamente.
- O nome deste senhor é mesmo Gundemaro, porquê?
- Que nome tão esquisito. Ele é alemão?
- Conheço-o há muitos anos, mas creio que nem ele sabe bem onde nasceu. Mas deve ter nascido em Portugal. Foi criado num orfanato, lá se fez homem e um óptimo marceneiro. A verdade é que Gundemaro é o nome dum rei visigodo de há mais de 1300 anos.
- Ó avô, quem eram os visigodos?
- Foi um povo que veio lá dos lados da Alemanha, a seguir aos romanos e governaram toda a península, o que hoje é Portugal e Espanha.
- ?!?!?! Foi o pai dele que lhe pôs esse nome?
- Deve ter sido, mas nunca lho perguntei. É o melhor marceneiro que eu conheci.
Levei a conclusão das minhas investigações para os irmãos e ficámos todos admirados sobre os conhecimentos do avô, nós que nunca tínhamos ouvido falar em visigodos, nem romanos, e mil e trezentos anos era coisa que as nossas cabeças não tinham capacidade para imaginar o tanto que seria, e muito mais curiosos ainda a pensar que o senhor Gundemaro poderia ser um príncipe. Afinal tinha nome de rei.
Aquilo era um mistério, e crianças adoram mistérios, reis, príncipes, guerras, selva com Tarzan, caubóis, polícias e ladrões, essas “aventuras” que vivíamos no nosso tempo da quase pedra lascada sem Internet e joguinhos nos telefones.
Telefones? Lá na Quinta em Sintra tinha telefone, sim. Número: Sintra 98. Levantava-se o auscultador, rodava-se uma manivela, atendia uma simpática voz feminina e nós dizíamos (nós não, porque criança não falava no telefone):
- Menina, liga-me a Oeiras 20
– Pode desligar que eu chamo quando completar a ligação.
Maravilha de tecnologia.
- Quando ele voltar aqui nós vamos-lhe perguntar onde nasceu e quem lhe pôs o nome, mas sem o avô perceber, porque se não vamos todos de castigo. Ainda por cima o senhor está muito velhinho. E temos que decorar o nome dele e dos avós, os visigodos. VI–SI–GO–DOS! Não esqueçam
Passam alguns dias, ou semanas, nós sempre a repetirmos – Gundemaro, visigodos, Gundemaro, visigodos – lá aparece ao portão da quinta aquela figura simpática. Um de nós correu para o abrir. Antes de irmos avisar o avô que ele tinha chegado, convidámo-lo a sentar-se numa das cadeiras que sempre ficavam na entrada, fora de casa:
- Sente-se um pouco, o senhor deve estar cansado.
- Muito obrigado. Os meninos são muito simpáticos.
Nós, meio envergonhados, não queríamos perder a ocasião de fazer as nossas pesquisas.
- Sabe que nós temos dificuldade em dizer o seu nome? – atrevi-me.
Sorriu e respondeu
- É um pouco estranho, mas foi assim que meu pai me chamou. GUNDEMARO. A minha mãe morreu logo a seguir a eu ter nascido, e o pai que trabalhava numa mina morreu também tinha eu só quatro anos e mais nenhuma família. Como não tinha mais ninguém, puseram-me num orfanato, de modo que nunca cheguei a poder perguntar a origem do meu nome. Dizem que tem origem alemã, mas nada sei.
- O avô diz que é nome dum rei dos visigodos. – e olhei de lado para os irmãos para me certificar de que tinha dito tudo certo.
- É sim, mas foi coisa que só vim a saber era já homem feito.
- Mas se tem o nome dum rei o senhor devia ser um príncipe.
Riu com gosto o simpático velhinho.
- Nada disso. Sou um homem simples, do povo. Mais nada.
- Eu bem dizia aos meus irmãos que devia ser um nome alemão! Deve ter sido muito triste para o senhor, não ter família nenhuma, não foi?
- Foi sim. Mas sempre me trataram muito bem. Lá cresci, depois mandaram-me estudar e aprender marcenaria nas Oficinas de São José, onde com o curso feito fiquei muitos anos como professor. Um dia juntei um dinheirinho, abri a minha marcenaria, pequenina, e pronto, fui marceneiro toda a vida. E abri a marcenaria aqui em Sintra, por isso conheço o vosso avô há muitos anos.
- E o senhor ainda trabalha?
- Já não posso. Não tenho mais forças. Mas fiz muitos trabalhos para o senhor Amorim, que me apresentou muitos clientes e sempre me tratou muito bem e de quem eu tenho muita satisfação e orgulho que ele me considere seu amigo.
- Por isso o avô tem móveis bonitos. Sabe que eu acho muito bonito o trabalho de marceneiro.
- Só nesta casa são uns cinco ou seis feitos por mim. Eu não venho aqui ver os móveis. Como o vosso avô me recebe sempre com muito carinho, cada vez que surge uma oportunidade e as pernas, já fracas, m’o consentem, venho vê-lo, e conversamos um pouco sobre o que calha. Não tenho mais ninguém com quem conversar.
Neste momento da conversa aparece o avô.
- Ó senhor Gundemaro, porque não entrou?
- Sentei aqui um pouco a conversar com os seus netos que queriam saber coisas da minha vida! E eu tive muito gosto em lhes responder.
- Estiveram a importuná-lo?
- Não. Foram muito simpáticos. Este pequenito até me disse que gosta muito do trabalho de marcenaria. Mesmo que ele venha a fazer um curso superior, marcenaria é muito bom para as horas de lazer.
O avô olhou para mim com ar meio sério meio de dúvida, e eu confirmei.
- Gostaria muito, sim avô.
- Um dia falaremos sobre isso.
Nunca calhou falarmos sobre isso. As férias terminaram. No ano seguinte Gundemaro não apareceu.
Perguntámos ao avô. Tinha morrido nesse Inverno, com noventa e cinco anos.
Um a dois anos depois, no Liceu, tínhamos aulas de “Trabalhos Manuais” e era brincando com madeiras que eu mais gostava dessa aula. Fazíamos barcos de guerra, raquetes de ping-pong e outras coisas simples, mas o suficiente para aguçar o meu gosto para mexer com madeira, reparar uns móveis, etc. o que fiz toda a vida. Ainda hoje!
E sempre lembro o príncipe dos marceneiros, Gundemaro.
A situação é de descontrole na cabine de comando do Planalto, com queda abrupta em todos os níveis
Não há antídoto contra a loucura de quem pilota um avião ou um país. Podemos submeter um piloto de Airbus ou o Presidente de uma nação a avaliações psicológicas e físicas periódicas para tentar assegurar um certo equilíbrio e coerência nas decisões tomadas na cabine de comando. Mas nada é 100% garantido. Crises de depressão ou egocentrismo são especialmente perigosas para quem controla a vida de centenas de passageiros ou milhões de habitantes.
Vivemos uma situação de descontrole total na cabine de comando do Planalto. A queda do país é abrupta em todos os níveis – e já era esperada por quem não se deixou iludir em 2014. Está claro que a recessão começou no ano das mentiras. Desemprego sobe, renda tem a maior queda em dez anos, preços aumentam 7,9%. Trabalhadores são assaltados nos metrôs, nos pontos de ónibus, nas vias expressas congestionadas, nos túneis. Os Estados estão quebrados, os aliados voam como baratas tontas e moscas azuis, a "comandanta" é chamada de agiota por prefeitos muy amigos.
Só não sabemos ainda quem são hoje o piloto e o co-piloto do Brasil – e qual deles é mais propenso a ataques de pânico ou de autoritarismo. Temos apenas duas certezas: uma é que tem gente demais empoleirada no comando, posando de bonzinho, mas querendo derrubar o Brasil de encontro às montanhas, estilhaçar qualquer possibilidade de ajuste de expectativas. A outra certeza é que nós somos os trancados do lado de fora, reféns de um bando de loucos mal-intencionados.
Quem são o piloto e os co-pilotos hoje responsáveis por nossa vida e a de nossos filhos e netos? Está difícil enxergar Dilma Rousseff sentada na poltrona de quem aperta os botões e define a direcção e a velocidade do jumbo Brasil. Se traçarmos um paralelo com a tragédia do Airbus que provocou luto e estupor no mundo, Dilma hoje parece-se mais com aquele que foi ao banheiro em hora imprópria e não conseguiu retornar.
Ninguém escuta mais as broncas de Dilma, que estão virando sussurros. Ela pegou o machado para decepar a lei de Novembro passado que aliviava as dívidas dos prefeitos. O machado voltou como bumerangue. Não importa mais o partido político na hora em que o bolso aperta. Pode ser Eduardo Paes (PMDB-RJ) ou Fernando Haddad (PT-SP). Paes já entrou com acção contra Dilma. Haddad já disse que não vai deixar barato. Os calotes se ampliam nos Estados. A irresponsabilidade fiscal compromete o ajuste fiscal prometido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Trocando em miúdos, os únicos que precisam pagar as contas em dia somos nós, os contribuintes.
Ao enfrentar um clima adverso, nuvens negras e trovoadas, o pior conselheiro é a solidão – por isso, é tão crucial ter "alguém" com experiência, honestidade e credibilidade ao lado do comandante. Quem será?
O jumbo Brasil precisa do tecnocrata Levy como co-piloto. Mas faltam-lhe experiência e autoridade políticas para lidar com os abutres ou aplacar disputas. Quem teria de enfrentar as rebeliões dos aliados seria a "presidenta". Não foi ela quem ganhou nas urnas? Só que Dilma foi ao banheiro e não conseguiu voltar, não abrem a porta para ela, não há mais cavalheiros, só cavaleiros do apocalipse, até em seu próprio partido, o PT.
O que parecia inacreditável aconteceu. Quem apoia hoje medidas de austeridade da presidente, quem é contra o impeachment, quem é a favor da governabilidade para não espatifar o Brasil no Planalto Central é uma das instituições mais criticadas por Lula, Dilma e sua turma: a imprensa.
O jumbo Brasil está sem rumo. E quem está aboletado na cabine de comando são os amotinados do PMDB, a dupla caipira Renan Calheiros e Eduardo Cunha, um alagoano e um carioca com milhares de fios de cabelos implantados e muitos delírios de Poder na cabeça. Ambos odeiam um tripulante da nave Brasil com fama de oportunista, Gilberto Kassab. A manobra de Kassab para criar mais um partido, o PL, é chamada por Renan de "molecagem" e por Cunha de "alopragem".
Sob a pressão de moleques, aloprados e loucos, Dilma é a primeira refém da armadilha que Lula e ela criaram. Já não lhe compete demitir ou nomear. Dilma hoje é torpedeada até quando tenta acertar. Mas é impossível ter pena. Se a hora é de arrocho, Dilma dê o exemplo, ceda à jogada do novo PMDB e comece a cortar seus 39 ministérios e seus 22 mil cargos de confiança. Porque é imoral o tamanho dessa máquina e das boquinhas públicas.
Confiança ganha-se devagar e perde-se muito rápido. Poucos de seus eleitores embarcariam hoje num avião pilotado pela senhora. Os maiores reféns somos nós.
Não tem muita simpatia pela juventude portuguesa, Vasco Pulido Valente, como, de resto, pelos portugueses, os indígenas da sua designação rancorosa, o qual desejaria para o seu país mais qualidade mental, o que é, aliás, a ambição de tantos, derrotados na verdade dos números ínfimos de alfabetização, dos tempos da monarquia, gradualmente progredindo segundo as políticas republicanas, mas que não nos farão nunca apanhar a carruagem dos outros povos europeus, mais previdentes e estruturados de longa data, nos parâmetros da dignificação humana. Portugal, um país bom, de bom sol, de boa gente, segundo se diz e a gente o sente, na ternura linguística do nosso atraso de “inhos” e “inhas” que simultaneamente nos agasta e nos agrada, nós próprios também abusando, e que Fernando Mendes evidenciou no carinho pela sua Lenkazinha de beleza esplendorosa, que nem esta repele.
Em conversa com a minha filha, soube das suas lutas últimas, com alunos desordeiros que ela bem descreve nas suas participações à directora, lutando por uma sociedade mais digna, considerando estar a Escola reduzida ao nada de uma indisciplina inominável. Pobre da minha Paula, pobres de todos esses professores sem um mínimo de condições sérias, num país que inutilmente se esforçam por elevar, há muito votado ao rebaixamento da indignidade legalizada em termos disciplinares e consequentemente culturais.
Vasco Pulido Valente tem razão. Para quê essa medida discriminatória de proibição da venda de bebidas alcoólicas a menores, quando se não tem possibilidade de averiguar da sua eficácia, nos vários condicionalismos que igualmente permitem que a droga se propague numa sociedade em que, “por várias razões, as famílias não educam os filhos”?
Leiamos o seu artigo, no qual, aceitando embora a necessidade de imposições como a da proibição de compra de bebidas alcoólicas a menores, permitem, contudo, as estruturas sociais, o partidarismo de uma mocidade mais ou menos desordeira, que pouco mais apresenta que a expressão sonorosa da sua reivindicação sem consciência efectiva daquilo que reivindica, na ausência de leitura e preparação reais. A mocidade que, continuando atrelada a amizades como meio de evolução pessoal para as suas ambições, poderá vir a dirigir a coisa pública, como se tem visto, em cursos arrebanhados na pressa da ambição amparada.
“O Sangue dos Outros”, um livro de Simone de Beauvoir, me vem à memória, não pela menoridade etária das personagens participantes, mas pelo contraste com a sua juventude participativa consciente, personagens que, provenientes de uma burguesia bem instalada, por ódio às injustiças sociais apoiadas em tenebrosos fascismos, escolhem – com hesitações no seu caminho – (os egoísmos existencialistas como rocha impeditiva da participação imediata) – a luta por ideais de fraternidade e de defesa dos direitos humanos que terão a morte como resultado. (Nada que não estejamos saturados de ouvir, aliás, do ideário comunista, direccionado exclusivamente, hoje, sobre as medidas governamentais que não implicam retaliações à maneira nazi e por isso propícias ao ruído, que na época das Resistências se fazia pela calada). Mas os livros de Simone de Beauvoir e dos seus companheiros da época são impregnados de saber filosófico, pertencem a mentalidades estudiosas que envolvem os seus enredos nos artifícios da sua preparação intelectual. Não têm a ver com a nossa juventude – a da mândria, do desrespeito, da reivindicação em gritos de balbúrdia – os mais espertos e sérios definindo-se por outras filosofias – as do capitalismo - que, afinal, talvez não sejam nem melhores nem piores que as dos tempos dos facínoras que espalharam a guerra e a morte no mundo.
A educação da juventude
Público, 17/4/15
O Estado, na sua qualidade de educador, resolveu agora proibir a venda de bebidas alcoólicas (de qualquer espécie) a menores. Já era proibido vender tabaco a crianças. Para não falar de drogas que são universalmente ilegais.
Claro que a eficácia desta medida é discutível: em casa não se pode verificar quem bebe o quê e quanto. Fora que há sempre o mercado negro ou um amigo ou irmão maior que abastece os mais miúdos. Mas não deixa de ser verdade que o mais pequeno obstáculo diminui o consumo e que, neste caso, o fim é meritório. A dependência do álcool não se adquire depressa (“too much, too often, too long”) e atrasar ou dificultar o processo contribui para uma população mais saudável e segura. Uma vez que por várias razões as famílias não educam os filhos, medidas como estas acabam por se justificar.
Em compensação, proibir o fumo em locais públicos fechados — como, por exemplo, restaurantes, cafés, bares, discotecas, casas de jogo e sítios semelhantes — frequentados geralmente por adultos não passa de uma restrição à liberdade individual, sem desculpa ou atenuante. O fumo, como nos lembram em toda a parte, a todo o tempo, é uma actividade perigosa. De acordo. Só que daí não se segue que um cidadão, na posse das suas faculdades, se veja impedido de correr os riscos que bem lhe apetecer, ainda por cima por um Estado que não cumpre os seus deveres mais básicos. Principalmente quando não existem riscos para terceiros, porque a maioria dos locais públicos fechados não admite hoje fumadores. A nova lei contra o fumo que por aí se anuncia não passa de um acto de uma prepotência mesquinha.
Pior ainda: no meio da sua preocupação com o bem-estar dos portugueses (que, aliás, morrem no desemprego e na miséria) e do seu amor ao viçoso crescimento da nossa querida juventude, o Estado permite a ascensão e a influência das “mocidades” partidárias. Um menor está impedido de comprar tabaco, de beber álcool, de se casar sem a autorização dos pais. Desde os 14 anos não está, em contrapartida, impedido de escolher qual o regime que melhor convém à sua doce pátria e as políticas mais capazes de a salvar e modernizar. Para essas actividades menores, nem o Governo, nem os partidos o consideram irresponsável ou inepto. Depois de beber o seu leitinho ou a sua limonada sob a vigilância da polícia e provar (com testemunhas) que nunca comprou um único cigarro, a criancinha irá daqui em diante pastorear o povo no exercício dos seus plenos direitos.
Começo pelo mais difícil. As lágrimas contidas de quem não esteve fisicamente no lugar-da-partida. Tudo o que foi sentido e vivido para chegar até aqui. Racionalizo e tento digerir as ideias de Marc Augé, sobre os não-lugares, tomando então o Aeroporto Francisco Sá Carneiro como o «local» fecundo de memória e de identidade, para-partir-de-novo. No concreto, a partida de duas jovens, a Diana e a Sofia, que pertencem aos “Leigos Boa Nova” (LBN), que são um grupo de voluntários cristãos, membros da organização não-governamental de desenvolvimento, “Obra Missionária de Acção Social” (OMAS), instituição particular de solidariedade social criada em 1992.
Partiram hoje, pela manhã, rumo a Moçambique, no dia 1 de Abril de 2015. Isto não é mentira… não é a verdade do dia das mentiras!? Deveria abrir a grelha noticiosa do telejornal! É a Verdade encarnada em rosto e histórias de vida, que é sempre simples, sempre sacrificada e sempre generosa, quando se existe para servir os outros. No não-lugar do aeroporto, onde tantos jovens no nosso país, neste momento difícil, partiram e regressam, para partir novamente. Estas jovens partiram para realizar um projecto de voluntariado missionário por dois anos. É a segunda vez nas suas vidas pessoais, de forma mais permanente.
Cruzei-me com elas na comunidade paroquial da Chapadinha, no Maranhão-Brasil, onde as vi, entre muitas actividades e serviços, pôr de pé a Pastoral Penitenciária, fazendo da Prisão – isso sim também «não-lugar», não apenas da nossa hiper modernidade – dignificando a Pessoa presa. Da sua coragem pessoal, aliando vontades de várias pessoas, até à acção de ternura e de justiça, onde não existiam. Milagres possíveis acontecem ordinariamente. Para mim foi um verdadeiro “murro no estômago” no meio de uma pastoral conformada e acomodada. Hoje, na sua partida, a criatividade e a competência surgem reforçadas e voltarão a fazer revoluções pacíficas, sobretudo, evangélicas.
No endereço digital desta associação de leigos podemos aprofundar sobre a importância deste testemunho de serviço: «O voluntariado enraíza-se na caridade e busca a dignidade e o bem do “outro” que se encontra em situação de necessidade. Este “outro”, na perspectiva cristã, não é apenas um outro “eu” mas configura-se ao próprio Jesus Cristo. As palavras de Jesus não deixam margem para dúvida: “Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes (Mt 25,40)”1.»
Sei que Zygmunt Bauman disse coisas interpelantes sobre a nossa sociedade “líquida”. Sei sobre a (im)possibilidade trágica de uma verdade “líquida” deformadora de valores e do carácter. Sei que se for feita da seiva do evangelho e, concretamente, com a água do “Lava Pés”, nada há que temer da Verdade do nosso tempo presente. Sei que os milagres existem onde os vemos. Sei que os milagres existem onde não os vemos. Sei que os milagres possíveis e os impossíveis acontecem dentro da Verdade Pascal (em qualquer estado da matéria humana…), enquanto houver a ousadia do nosso testemunho, como cristãos.
Aliando todos as vontades crentes e descrentes. E sei, também, pelo testemunho da Diana e da Sofia, que os “milagres-da-partida” são raros, baratos no dinheiro poupado, mas caros na Graça a partilhar.
Agradeço a sua partilha como modo de estar e ser para os outros. Aconteceu-me já Páscoa antecipada, no dia das mentiras dos nossos pecados, pela virtude do seu testemunho!
Pedro José, CDJP
(*) - da Internet, «O Velho do Restelo», Autor não identificado
É Jean-Paul Sartre que, em “Les Mots” conta a sua relação com o seu avô Charles Schweitzer, casado com a avó Louise, com os quais viveram, ele e a sua mãe Anne-Marie, após a morte de seu pai, Jean-Baptiste Sartre, Jean-Paul com apenas dois anos de idade. Desde cedo criança precoce, tornou-se o ídolo do avô, nos seus jeitos de exibicionismo narcisista, para atrair as atenções gerais e do seu avô em particular, derretido com os prodígios de raciocínio da criança que ele ajudava a esculpir. Escrito em tom jocoso, desmistificador, o olhar do narrador não pretende deixar-se comover por sentimentos de simpatia pelo órfão desvalido que, afinal, ele não foi, ou sequer pela família burguesa que o protegia e que ele escalpeliza com a ironia de quem, acima de tudo, pretende desmascarar-se a si próprio, nos seus artifícios malabaristas que o levam ao mundo dos livros da biblioteca do avô, como meio de exibir perante os mais as suas graças de geniozinho.
Foi um programa passado na TV24, em 25 de Abril, que me fez lembrar-me da autobiografia de Sartre, não pela semelhança de situações mas pela semelhança de malabarismos exibicionistas, neste caso de adultos lembrando aos jovens alunos assistentes, que eles próprios foram jovens, protagonistas de algo que se fizera quatro décadas antes, que despertara o país para horizontes mais amplos de ideologias mais abertas e modernas, ao que parece, respeitadoras dos direitos humanos.
Freitas do Amaral, Jerónimo de Sousa, Marcelo Rebelo de Sousa, Ângelo Correia, Jorge Miranda, Basílio Horta – contaram a história em que foram participantes, revelando que, graças a eles e a outros jovens da altura, o país dera meia volta. E contaram do quartel do Carmo e da Constituição, e do que fora mudado, do que significava o regime anterior, do que significava a democracia actual, que os estudantes estavam fartos de conhecer, não conheciam outra.
Mas contaram das mazelas também. Sobretudo Jerónimo de Sousa, que tinha que pôr o dedo na ferida das muitas desgraças que por aí vão, ressabiado por não ser ele a promovê-las. O regime tinha que ser botado abaixo, isso era mais que sabido, e fora, mas não contaram do país que também fora deitado abaixo, porque dizê-lo seria falar em traição e essa parte ninguém quis assumir porque era feio reconhecê-lo, e um mau exemplo, para todos os efeitos. Se bem que talvez nem se apercebessem disso, esses conceitos de traição sendo muito relativizados hoje, o patriotismo mais do conhecimento geral em termos futebolísticos. Falaram da Constituição e doutras questões de glória, mas também esconderam os empréstimos e outras mazelas, malabaristas orgulhosos, sofismando e sonegando dados, mas não há tempo para contar tudo, que aliás está morto.
São heróis. Eles são os nossos heróis. Cavaleiros felizes desdobrando-se em recontos dos seus heroísmos, na cavalgada do tempo.
As calças de ganga tornaram-se em símbolo de liberdade.
0,8% da produção mundial de algodão para calças de ganga provém de agricultura biológica.
Uma costureira de calças de ganga ganha em Bangladesch 65 euros por mês (antes da catástrofe em 2014 ganhava 37 euros por mês).
75% do preço de umas calças de ganga são para os revendedores (retalhista dois terços) e para a empresa de marca (um terço).
24% são para material e transporte
1% são custos do trabalho. Por umas calças que custam 49 euros a trabalhadeira recebe 0,49 €
Para a produção de umas calças de ganga (plantação de algodão e acabamento com produtos químicos) são precisos 8.000 litros de água. Só para o branqueamento de umas calças de ganga com cloro são utilizados 60 litros de água (para comparação, um alemão utiliza 128 litros de água por dia). No tratamento de umas calças de ganga são usados até 700 produtos químicos.
Umas calças precisam de percorrer 19.000 km até chegarem ao vendedor na Alemanha. O algodão é cultivado na Índia ou Cazaquistão, fiado em fios na Turquia, colorido em Taiwan, tecido em pano na Polónia e com ele são feitas as calças de ganga na China.
Em 2013 a Alemanha importou 114.000.000 calças de Ganga. Por isso a média do custo de umas calças de ganga na Alemanha são 8,77€. Na França e na Itália o preço médio de umas calças de ganga são 15€. A diferença dos preços vem do facto de a Itália e a França importarem apenas um terço da quantidade que importa a Alemanha. Para esta informação servi-me dos dados para a Alemanha referidos no HNA de 25.04.2015.
O preço da moda obriga! A indústria têxtil é mundialmente a maior poluidora. A globalização, no que se refere à ganância de lucro tem consequências horrendas: destrói o saber ancestral e hábitos culturais, coloca os trabalhadores num combate de concorrência internacional desesperada e não respeita o ambiente.
Se na Europa os consumidores por razões éticas deixassem de importar os produtos Fast Fashion quem sofreria as consequências seriam as trabalhadeiras dos países da produção. Moralmente repreensível são as empresas que adquirem lucros à custa da humanidade. A sociedade precisa de uma mudança de pensamento, de uma nova mentalidade.