Tem-se instituído como regra entre muitos estudiosos da história que esta decorre sobretudo das grandes correntes sociais e dos movimentos colectivos – étnicos, militares, económicos, políticos, religiosos – e é frequentemente verdade. Mas é também verdade que, em circunstâncias específicas, surgem indivíduos que imprimem à história dos povos um curso que não era à partida, de nenhum modo, inevitável. Confúcio, Buda, Tamerlão, Júlio César, Jesus, Alexandre, Maomé, Sócrates, Galileu, Newton, Napoleão, Einstein – mas também Átila, Lénine, Hitler, Churchill – foram alguns dos vultos que inflectiram a história da humanidade, para o bem e para o mal.
O nosso país, pela sua permanência como ultra-minoritário na Península Ibérica (existe há quase 900 anos, constituindo com a Dinamarca o duo dos Estados mais antigos da Europa) e sobretudo pela sua projecção no mundo, pela língua e outros factores, que vai desde o Estado brasileiro do Acre, a 500 km do Pacífico, até Timor e Macau, no outro lado do mesmo Pacífico, passando pela África, com mais de 40 milhões de utentes do português e mais alguns em diversos pontos da Ásia, constitui uma das realidades mais improváveis do nosso tempo, só possível por uma sucessão de factos excepcionais.
Porém o facto mais determinante residiu, como é lógico, na sua criação como Estado independente em 1143. E para esse evento fundador foi decisiva a figura de D. Afonso Henriques, ibn Arrik como lhe chamaram os mouros. Todos sabemos isso, não é novidade. Dirijo hoje porém a minha atenção para a filiação do príncipe: o pai, D. Henrique, oriundo da Borgonha, era um cavaleiro franco, isto é, protofrancês de origem germânica, e tinha vindo à Península, com o primo Raimundo, no âmbito da campanha da Abadia de Cluny para recristianizar a Ibéria, reforçando a reconquista cristã iniciada por Pelágio. Neste movimento teve papel importante o influente abade Hugo de Cluny, tio da rainha D. Constança, mulher do rei Afonso VI de Leão e Castela.
Tendo D. Henrique falecido jovem, seu filho Afonso, ainda criança, não perdeu a noção da sua identidade e ajudado pela acção pedagógica de Egas Moniz e pelo apoio decidido da nobreza do Condado de Portucale, rival acesa dos nobres da Galiza, concebeu muito cedo o projecto dum reino independente. Dotado dum excepcional vigor físico e anímico e de apoios valorosos (ex.: Gonçalo Mendes da Maia), foi determinante na concretização do novo Estado cujas fronteiras alargou até ao Tejo e parte do Alentejo Norte.
É verdade que ainda tentou algumas vezes conquistar territórios na Galiza, com escasso êxito e sem continuidade. Veio, sim, a concretizar o seu objectivo maior: o nascimento dum novo reino, separado e independente, chamado Portugal.
Se observarmos o que ocorreu no resto da Península Ibérica, verificamos que o reino de Leão e Castela, cedo unificado e que já absorvera a Galiza, e o de Aragão, que veio a incluir Navarra e a Catalunha, se vieram expandindo para o sul, à medida que progrediu a reconquista cristã, até incluírem em 1492 toda a Andaluzia (Al Andalus islâmico) no reinado dos Reis Católicos, cuja união definiu praticamente o território da actual Espanha, 5,5 vezes maior que Portugal e com 4 vezes mais população.
Se tivermos em conta o projecto alternativo da mãe de D. Afonso Henriques, a condessa D. Teresa que visava a unificação com a Galiza e chegou a nomear governador de Coimbra o seu valido galego Fernão Peres de Trava, restam poucas dúvidas de que a sequência natural dessa política seria a extensão para sul do reino da Galiza, no seio do qual Portucale seria apenas uma província. No oeste cristão todos falavam a língua galaica (Afonso X, o Sábio, avô de D. Dinis, embora rei de Leão e Castela, só escrevia a sua notável poesia em galaico-português porque considerava o castelhano demasiado “áspero”) e sem a ocorrência de outros imprevistos, o movimento unificador dos Reis Católicos teria abrangido naturalmente Portugal – ou melhor, a Galiza ampliada até o Algarve.
Sem o reino criado por D. Afonso Henriques não teria havido tão pouco uma dinastia de Aviz (D. João I era filho natural do rei D. Pedro I, como se sabe) nem teria havido a Ínclita Geração, nem a figura do Infante D. Henrique e a Ordem de Cristo, determinantes para a gesta dos Descobrimentos e a expansão de Portugal e da língua portuguesa no mundo. Recordo que o britânico Martin Page considerou no seu livro que Portugal criou no séc. XVI “ a primeira aldeia global “. Teria havido decerto outros factores, mas é proibido fazer vaticínios nesta área – permanecia a posição geográfica, favorável à abertura e à aventura.
Resta a certeza de que, sem a determinação e a coragem de D. Afonso Henriques e dos seus companheiros, tudo teria sido diferente.
Neste ano de 2014 a sua cidade natal, Guimarães, património da humanidade e capital europeia da cultura, bela, e agora ainda mais bela depois dum notável trabalho de recuperação por parte da municipalidade, aguarda ainda a visita de todos aqueles que se queiram actualizar.
Façam como eu e vão a Guimarães tomar um banho de portugalidade. A cidade bem o merece.
Descidos das etéreas espiritualidades inerentes às visitas que nos programaram a vários pagodes (onde se confessam os pecados em oração ao Senhor Buda e se proclama o arrependimento) e templos (onde se pedem benesses ao Orago em apreço), rumámos à Baía de Halong para um cruzeiro que nos mostrasse as belezas naturais da região, o que faço por imagens...
Nosso barco na Baía de Halong
Baía de Halong
Grutas
Metidos no barco durante tempo excessivo para meu gosto, aproveitámos para conversar informalmente com o nosso guia, o franzino e insignificante Juan, tirando-lhe «nabos da púcara» que ele não haveria de referir se não perguntado.
Assim, explicou que o budismo vietnamita lê as condições estruturais da vida de cada um, o karma, logo à nascença em função da posição dos astros na data e hora do nascimento, das condições climáticas, das origens familiares, etc. Portanto, cada um tem a sua «folha» devidamente preenchida e não há como fugir. Na dúvida, para afugentar os maus espíritos, à criança é inicialmente dado um nome feio que a proteja de acidentes, maus-olhados, doenças e morte. No caso dele, Juan, chamaram-lhe Esqueleto. Só quando ultrapassa a idade mais perigosa é que se dá um nome normal à criança que vigorará para o resto da vida. No caso dele, como a avó era católica, chamaram-lhe João e também lhe puseram o nome budista de Yin para não se sentir desenquadrado da maioria social. Escapou-me o apelido.
- E como é que Você fala tão bem espanhol?
- Estive em Cuba.
- A fazer o quê?
- Nos primeiros tempos a aprender espanhol e depois a fazer o curso de microbiologia com uma especialização em biologia marinha.
- E essa formação foi importante para si?
- Sim, estudei as águas em diversas acções científicas ao longo da costa vietnamita e depois passei a dar aulas de Microbiologia na Universidade de Hanói, onde continuo.
- E como concilia as aulas com a actividade de guia turístico?
- Os meus cursos são trimestrais e no resto do tempo aproveito para isto.
- E para que estuda mais: para a Biologia ou para o Turismo?
- Para a Biologia tenho que estudar muito mais para não me desactualizar enquanto que a conversa turística é quase sempre a mesma.
- E esta actividade é importante para si?
- Sim, claro! Tenho quatro mulheres em casa.
- A poligamia é permitida no Vietname?
(risos)
- Não, não! Tenho a minha mãe, a minha mulher e duas filhas.
- E a casa é sua?
- Sim, herdei-a do meu pai que a construiu conforme o seu karma. Mas como o meu karma é diferente do dele, tive que colocar um espelho sobre a porta para afastar os maus espíritos que não me queiram a viver ali.
- Esses espelhos que se vêem sobre as portas significam então que as casas não foram construídas de acordo com os proprietários actuais?
- Exacto. A habitação está totalmente privatizada no Vietname assim como a agricultura. Nós somos donos das nossas propriedades e podemos vendê-las livremente.
- Mas então o Vietname não é um país comunista?
- Ho Chi Minh nunca quis um Vietname comunista à maneira da China ou da Rússia. Nós somos uma sociedade socialista, não comunista.
- E o que há de diferente nisso?
- Tudo: nós enterrámos há muito o comunismo e vivemos em economia de mercado com preocupações sociais. Mas tocaram para o jantar e a continuação da conversa fica para amanhã.
Tive dúvidas que o Juan quisesse continuar a conversar sobre o regime mas, afinal, a iniciativa foi mesmo dele como amanhã se verá.
O artigo de Alberto Gonçalves, do DN de 30/11/14, Fim de regime?, vem, uma vez mais, mostrar a insanidade moral e mental em que nos movemos, permitindo estes espectáculos jornalísticos de raparigas e rapazes bonitinhos e falsamente delicados, e no fundo divertindo-se com a espécie de bobo em que se tornou um homem que, para todos os efeitos, durante longos anos, foi o representante mor de uma mudança política no seu país. Como zângãos zumbindo e adejando, felizes, permitem-se desrespeitar a velhice, vaidosa, é certo, como sempre foi, manhosa e simplória como sempre foi também, mas neste momento, apenas descontrolada nos balbucios. É a prova cabal de um atraso social que nos vilipendia, este despudor inquiridor juntamente com a inanidade das questões postas, apelativas de reacções de emotividade e rancores.
Quanto ao título do artigo – Fim do regime? – julgo que Alberto Gonçalves se engana. Grande parte dos seus componentes têm cabeça e sabem defender-se, não se expondo às visitas, calando os seus pensamentos, conhecendo quanta patranha afectou os sucessivos governos na modernização do país, com os dinheiros alheios, e que fingem ignorar que a hora de pagar chegaria. Mas continuarão a defender os seus pretensos ideais democráticos.
FIM DE REGIME?
por
, 30 Novembro 2014
Uma das principais queixas dos defensores não oficiais de José Sócrates é a de que a detenção deste - e o que sucedeu em seguida - foi um "circo mediático". A sério? Do que vi, e acreditem que vi muito, o "circo mediático" consistiu nas imagens recorrentes de dois ou três carros em ruas pouco iluminadas e de uma dúzia de repórteres plantados, género moita, nas imediações do TIC. Em matéria de espectáculo, há filmes romenos mais conseguidos. Se o objectivo fosse capturar, interrogar e prender José Sócrates em segredo a diferença não teria sido grande. Aliás, é difícil imaginarmos outra democracia em que notícia semelhante suscitasse tratamento tão discreto. A menos, como de resto é provável, que não sejam democráticos os exemplos que ocorram a essa gente.
O verdadeiro circo, se insistirem na metáfora, sucedeu já em Évora, quando Mário Soares saía de uma visita ao novo inquilino da cadeia local. Menos de um minuto, o patriarca do regime, que os histéricos alegam encontrar-se em risco, proferiu : puras mentiras, enormes disparates, sentenças absolutamente incompreensíveis, e acusações que levariam a tribunal um cidadão - lá está - menos “mediático”. Sendo o doutor Soares , o disparate é livre.
De João Marques de Almeida a Bruno Alves, algumas das pessoas que prezo entendem, julgo que sem ironia, que a provecta idade do Dr. Soares não devia ser aproveitada pelos jornalistas. Curiosamente, algumas pessoas que desprezo disseram o mesmo. Peço licença para discordar.
Faço ao Dr. Soares o favor de não achar que ele não sabe o que diz. Se os anos lhe removeram alguma capacidade foi a de não saber o que calar. Com a velhice perderam-se os filtros e a franqueza do homem, já historicamente razoável, tornou-se absoluta. Ou seja, o Dr. Soares limita-se a lançar pela boca, o que sempre lhe ocupou a cabeça: a convicção, partilhada justamente com a casta de uns quantos, de que manda nisto tudo. O confuso desespero revelado à porta de uma cadeia alentejana sugere o receio de que a casta talvez tenha deixado de mandar. Se é assim que o regime acaba, acaba mal. E ainda bem.
Notícias da Segunda Guerra
1 de dezembro/
1934
¾ Josef Estaline dá início a uma purga de inimigos reais e imaginários O chefe do Partido Comunista em Leningrado, Sergei M. Kirov, é uma das pessoas assassinadas.
1937
¾ O Japão reconhece o governo de Franco.
1939
¾ Em Dezembro, Adolf Eichmann assume o comando da secção IV B4 da Gestapo, a qual se dedica exclusivamente aos assuntos e evacuações de judeus.
¾ SS-Führer Himmler dá inicio às deportações de judeus polacos.
¾ Na guerra de Inverno, Helsínquia é bombardeada pela aviação soviética, causando a morte de 80 pessoas.
¾ Na Finlândia ocupada, é proclamada a República Democrática da Finlândia, apoiada pelos soviéticos e chefiada pelo comunista finlandês Otto Kuusinen em Terijoki no Golfo da Finlândia. O governo de Kuusinen apela a todos os finlandeses para derrubar o opressor (ou seja, o governo em Helsínquia) e acolher os libertadores do Exército Vermelho. É assinado um tratado com a URSS no qual os soviéticos cedem tudo o que foi anteriormente exigido, em troca de toda a Karelia.
¾ Na União Soviética, a agência de notícias TASS afirma que na Finlândia, o povo já se revoltou em várias partes do país e proclamou a formação de uma república democrática. Parte dos soldados do exército da Finlândia apoiam já o novo governo.
¾ Em Helsínquia é reorganizado o legítimo governo finlandês. É formado um governo de coligação tendo como primeiro-ministro Risto Ryti e como ministro dos negócios estrangeiros Väinö Alfred Tanner.
1940
¾ Durante a noite de 1 para 2, a cidade de Bristol é bombardeada por 120 aviões, causando enormes estragos em áreas residenciais.
¾ Em Itália, é introduzido o racionamento para a farinha, arroz, esparguete e macarrão.
1941
¾ O imperador japonês Hirohito assina a declaração de guerra contra os Estados Unidos.
1942
¾ Em Dezembro, termina o extermínio no campo de Belzec após uma estimativa de 600.000 judeus assassinados. O campo é então desmontado, arado e plantado.
1943
¾ Termina a Conferência de Teerão. Durante as reuniões, os norte-americanos parecem tentar distanciar-se dos britânicos. A decisão de invadir a Europa ocidental em Maio de 1944 está confirmada. Os planos para uma invasão do sul da França também são acordados. Estaline promete entrar na guerra contra o Japão, uma vez que a Alemanha foi derrotada. Há rumores de que os alojamentos americanos foram alvo de escutas por agentes soviéticos.
1944
¾ Na Hungria, a sul de Budapeste, as forças soviéticas são sucessivamente travadas pelas forças alemãs.
¾ A guarnição alemã sedeada na ilha de Creta abandona toda a área, à excepção das grandes cidades.
Sobre o comunismo vietnamita falaremos quando chegarmos ao armazém das peças não expostas de algum museu mas, entretanto, vamos à realidade palpável em que preponderam as gentes.
O «formigueiro» vietnamita compõe-se duma população que se diz homogénea mas que, conta a lenda, resulta do casamento duma princesa protegida por «Chim Lac», o pássaro Viet, com o herói que veio do outro lado do mar, das bandas do Coromandel. Eis como ainda hoje é perfeitamente visível o perfil chim de muitos vietnamitas – braquicéfalos, de pálpebras grossas, pele clara e amarelada – em contraste com os de origem indiana que são dolicocéfalos e têm a pele mais escura e os olhos amendoados. Entre estes dois tipos, move-se o «formigueiro» vietnamita resultante da miscigenação secular.
E assim se percebe melhor o nome de Indochina.
Fundamento de civilização, à estrutura religiosa actual não é estranha alguma doutrinação dos tempos da luta armada em que as alianças estratégicas impunham «pareceres» nem sempre compatíveis com a etérea espiritualidade. E quando perguntado, um dos guias não hesitou em referir estatísticas tão precisas que dá para desconfiar. Mas como não tenho resposta alternativa, aí vai:
76% da população é oficialmente budista mas na realidade não é nada;
11% são budistas praticantes;
10% são católicos;
3% seguem a religião cao dai, genuinamente vietnamita.
Uma breve nota sobre o caodaismo que, para melhor condensação do que por lá me foi contado, fui agora buscar à Wikipédia:
A religião acredita na existência de um único Deus a quem chama de "Cao Dai" e que se considera ser o mesmo adorado pelas outras religiões monoteístas. Este Ser, que não possui género ou forma, é representado por um olho esquerdo inserido num triângulo, símbolo que pode ser visto em todos os templos da religião.
A história religiosa do mundo é dividida em três grandes períodos: o primeiro iniciou-se em 2500 a.C. quando Deus inspirou a fundação do judaísmo, do hinduísmo e da religião chinesa. Cerca de mil anos depois, iniciou-se o segundo período durante o qual surgiram o Budismo, o Confucionismo, o Cristianismo e o Islão. Porém, as mensagens destas religiões foram corrompidas e elas não deram lugar ao nascimento de uma religião universal, entre outras razões, pelas dificuldades nos transportes e nas comunicações. Por esta razão, Deus iniciou um terceiro período de transmissão no qual surgiu o caodaismo no qual o principal objectivo é reunir os ensinamentos destas religiões e unir toda a humanidade na mesma fé.
A religião tem 7 ou 8 milhões de seguidores no Vietname e nas comunidades emigrantes, com especial relevância para a da Austrália.
Se dou especial atenção a esta religião, não é por causa da sua importância relativa mas sim porque ela é genuinamente vietnamita – se bem que, tanto quanto me foi dito, também o Budismo vietnamita tem particularidades que o distinguem do chinês.
Mas como a minha viagem ao Vietname e ao Camboja não foi propriamente uma aula de Teologia, fiquemo-nos por aqui.
Volta e meia aparecem uns livros que despertam a minha curiosidade. Desta vez foi “O Século XX Português”, do professor José Miguel Sardica. Uma análise interessante, sem manifestar qualquer tendência político-partidária, acaba por nos levar a comparar a I República, 1910 a 1926, com a gloriosa revolução dos cravos: períodos de anarquia total, perseguições, vinganças, governantes a vomitar o seu ódio represado, levando, a primeira à Ditadura de Gomes da Costa, seguida pelo período de Salazar, que deixou o país rico de finanças e pobre de liberdade, e a segunda, depois de acalmar um pouco, ao des-governo cavaquista que se embandeirou em arco com os dinheiros que recebia da UE e que acabou deixando o país com liberdade mas arruinado.
Os primeiros, anarquistas, carbonários, ferozmente anti católicos, fecharam-se num grupo “revolucionário, jacobino e ditatorial”, fazendo com que a esmagadora maioria da população aplaudisse a chegada da paz interna com Carmona e Salazar. A “dos cravos” quase leva o país aos sovietes com o famigerado MFA – Movimento das Forças Armadas – perdido, vingativo, sem saber que direcção tomar.
Tal a Revolução Francesa, que se quis impor pelo Terror, a que Napoleão, quer gostem dele ou não, acabou por dar rumo.
Até nos poucos meses que esteve exilado na ilha de Elba, revolucionou aquela pequenina parcela do território, ordenando-o, abrindo estradas, valorizando-o. Portugal não teve um Napoleão! Teve Salazar que afastou tudo e todos que lhe poderiam fazer sombra ou atrapalhar os seus projectos.
Em 1932 ele afirmou; “Os que não concordam podem ser sinceros e dignos confessando a sua discordância... mas no que respeita a uma actuação política efectiva, levá-la-emos pelo melhor modo possível, a que não nos incomodem demasiadamente...”. Brilhante! Mas todos os que incomodaram foram postos ou fora ou a ferros, desde a extrema-esquerda à extrema-direita.
Também dele a frase: “O poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente.” Ele parece não ter metido um cêntimo no bolso, mas julgou-se imortal e insubstituível.
Nomeou Marcelo Caetano, um dos primeiros a apoiar a Mocidade Portuguesa e a ocupar sempre cargos da mais alta confiança desde que fizesse exactamente o que o chefe queria.
E Salazar tinha dele uma opinião curiosa! Em 1973, em (ainda) Lourenço Marques, um padre, cujo nome felizmente esqueci, director do jornal “O Diário”, quase órgão do bispado, tinha sido em tempos capelão da Mocidade Portuguesa, profundo admirador de Salazar, mas, pagar os empréstimos que devia ao banco, onde eu estava... nada. E lá vou eu, poucos dias depois da desastrosa comunicação de Marcelo Caetano ao país, a propósito do livro “Portugal e o Futuro” do general Spínola, uma vez mais ver se conseguíamos receber algum! O padre como já se esperava disse que a Diocese estava sem dinheiro, chorou um pouco, etc., e veio à baila o discurso de Marcelo. Diz-me ele: “Eu conheci bem o Presidente Salazar. Várias vezes o fui visitar, e numa delas perguntei-lhe porque não nomeava o professor Marcelo Caetano como primeiro-ministro e ia descansar, que bem merecia. Salazar respondeu-me: o professor Marcelo Caetano é um homem inteligente, íntegro, mas quando cria problemas não sabe como os resolver. Foi, por exemplo o que se passou quando me pediu para ser reitor da Universidade de Lisboa. Começou por afirmar que a Universidade mais antiga era a de Lisboa e não de Coimbra, arranjando logo confusão com os coimbrões. Depois, contra a minha opinião, que previa viesse a dar problemas, criou a Casa dos Estudantes do Império, que não tardou a ser um centro de desenvolvimento de movimentos de esquerda e pró independência das colónias. Quando já não sabia o que fazer veio apresentar a demissão. Um homem de valor mas não para conduzir um país!”
Curiosa esta opinião de Salazar. Dias antes todos tínhamos ouvido pelo rádio o pronunciamento de Marcelo Caetano, que foi um balde de água fria na abertura para o diálogo com os movimentos de libertação. Tal e qual a personalidade que Salazar definira!
O livro do professor Sardica dá-nos outra confirmação desta visão: a guerra de África consumia todos os recursos do país, não só económicos mas sobretudo em gente. 2% da população estava nas frentes de batalha. “Não querendo, não podendo ou não sabendo libertar-se deste fardo, o governo marcelista entrou em paralisia a partir de 1970-71. Foi o momento em que Caetano desistiu de liberalizar mantendo a guerra, passando a manter a guerra sem liberalização. E o sinal mais claro do recuo foi a recandidatura de Américo Tomás à Presidência, aceite por Caetano no verão de 1972.”
Do blog Portugal Vitorioso
Por Vítor Santos
Para muitos, o 25 de Abril que se comemora, é o expoente máximo da liberdade e da independência nacional. Intocável na sua génese, 40 anos depois, é imprudente discordar dos militares que lhe deram corpo. Passados 40 anos, temos uma associação liderada por uma figura que mais parece ter sido tirada de uma banda desenhada que mais não faz do que manter a todo o custo a insegurança, dividindo o povo e semeando o medo entre aqueles que discordam das suas palavras e dos seus actos.
Tinha razão Marcelo Caetano quando um dia se pronunciou sobre o 25 de Abril. Disse ele: “Em poucas décadas estaremos reduzidos à indigência, ou seja, à caridade de outras nações, pelo que é ridículo continuar a falar de independência nacional. Para uma Nação que estava a caminho de se transformar numa Suiça, o golpe de Estado foi o princípio do fim. Resta o Sol, o Turismo e o servilismo de bandeja, a pobreza crónica e a emigração em massa”.
E acrescenta: “Veremos alçados ao Poder analfabetos, meninos mimados, escroques de toda a espécie que conhecemos de longa data. A maioria não servia para criados de quarto e chegam a presidentes de câmara, deputados, administradores, ministros e até presidentes de República”.
Comemorar, hoje, o 25 de Abril é deixar a esmagadora maioria dos portugueses com “amargo de boca”. Livramo-nos de uma ditadura para acolher e votar em ladrões e vigaristas oriundos de todas as classes sociais.
Deixemos Caetano em paz. Foi um professor de direito muito estimado e admirado por seus alunos, pelo seu saber e sua postura.
Só mais um aspecto de Portugal no século XX: a Mocidade Portuguesa. Criada por Decreto-Lei em 19 de Maio de 1936, pretendia abranger toda a juventude - escolar ou não - e atribuía-se, como fins, estimular o desenvolvimento integral da sua capacidade física, a formação do carácter e a devoção à Pátria, no sentimento da ordem, no gosto da disciplina, no culto dos deveres morais, cívicos e militares.
Há quem se divirta a comparar a Mocidade Portuguesa – MP – com a juventude hitlerista, ou as juventudes fascistas italiana ou espanhola.
É evidente que foi uma obra de Salazar, o que era bem visível nos cintos da farda, com um grande S na fivela!
Jovens da MP dando início à plantação da floresta de Monsanto em 28-Maio-1938
(Eu sou o que esta atrás, à esquerda, assinalado com a cruz azul)
Quem, como eu passou uns anos na MP, deve lembrar-se como era uma organização bem estruturada, e onde os jovens, primeiro só rapazes e mais tarde também as moças, tiveram oportunidade de praticar uma imensa variedade de desportos como vela, equitação, campismo, atletismo, jogos diversos, etc.
Fomos nós que plantámos as primeiras árvores do que é hoje o Parque Florestal de Monsanto. E fizemo-lo com o maior prazer. Ainda hoje consigo reconhecer a árvore que lá plantei há 76 anos!!!
Primeira página do número especial do Século Ilustrado” de 28-Maio-1938
Em 74 a famigerada “dos cravos” acabou com tudo. Todos éramos ou tínhamos sido fascistas! E em seu lugar simplesmente, covardemente e incompetentemente deixou... NADA.
Tenho muito orgulho e saudade de ter sido esse fascista! Fiz muito desporto, sobretudo atletismo, sem nunca me ter preocupado em ser um campeão – atletas profissionais nem me lembro se havia – e tão fascista fui que quando das eleições de 1958, quando me indignei ao ouvir pelo rádio um surpreendentemente idiota discurso do major Botelho Moniz, mais salazarista do que o próprio dizer “não saímos daqui nem a votos nem a tiros”! Lembro bem de ter dado um pulo da cadeira e dizer que essa gente está a fazer de nós todos uns carneiros.
As listas de eleitores em Angola, onde não havia nada organizado, foram pedidas às empresas e só votavam os que os directores lá inscreviam.
Depois daquele “soco no estômago” que me deu o tal major, coloquei em letras bem grandes no vidro traseiro do meu carro “VOTE NO HUMBERTO DELGADO”.
Foi o suficiente para que o director geral da Cuca, em Luanda, ter feito a seguinte observação: “Você não está maduro para votar!” e riscou o meu nome da lista!
Não serviu de nada porque o “general sem medo”, em Angola deve ter ganho com mais de 90%, mas “oficialmente” creio que foi só com uns 58%!
O mausoléu de Ho Chi Minh situa-se no meio de grande alameda, junto ao palácio da Presidência da República (antiga residência do Governador Geral da Indochina francesa) e das casas que Ho Chi Minh habitou – situadas nos jardins do dito palácio – desde que assumiu a presidência do Vietname independente em 1946 até à sua morte em 1969.
Nascido em 1890, foi-lhe dado o nome de Nguyen Sinh Cung sendo que, à semelhança do que acontece na cultura húngara, no Vietname o apelido aparece em primeiro lugar a que se seguem os nomes próprios. Nguyen é um apelido tão vulgar por lá como Silva o é por cá com a diferença de que ao Nguyen de lá o tratavam respeitosamente por «Tio» enquanto nós não chamamos isso ao Nguyen de cá.
Mas isto merece uma explicação pois o respeitinho é uma coisa muito bonita. Assim, qualquer homem solteiro é considerado rapaz e, portanto, é tratado pelo seu nome mas quando casa passa a ser tratado por «tio»; por «tio» são também tratados todos os homens a partir dos 40 anos e por «avô» a partir dos 60. Mas este último tratamento é reservado aos casados pois, sendo solteiro, fica «tio» até ao final da vida. Foi o caso do dito Nguyen de origem que adoptou o nome de Ho Chi Minh, “aquele que ilumina”, quando passou a liderar o movimento político que haveria de conduzir o Vietname à independência. Eis como se chegou ao tratamento de «Tio Ho», o que se manteve até ao final da sua vida pois que não se lhe conheceram mulheres e, portanto, nunca chegou às honras de «Avô».
E porque não se lhe conheceram mulheres, Ho não tomou por morada o palácio do antigo Governador Geral francês onde se sentiria muito isolado e preferiu residir numa casa situada nos jardins, mesmo ao lado daquelas em que permaneciam os soldados da sua escolta. Não ficou esclarecido – nem foi sequer perguntado – que tipo de aconchego atraía Ho.
Junto à casa do «Tio Ho»
Para quem, como eu, sempre ouviu dizer que as vietnamitas eram as mulheres mais bonitas do mundo, não deixa de ser estranha esta opção celibatária. Mas, sim, admito perfeitamente que Ho não tenha sido o primeiro nem sequer o último leigo a optar por soluções monacais.
E quanto a essa ideia que o meu Pai me transmitiu de as vietnamitas serem as mulheres mais bonitas do mundo, fez-me andar com os olhos sempre bem abertos para ter a certeza de que nenhuma beldade me escaparia mesmo que a luminosidade excessiva me pudesse sugerir algum destendimento das pálpebras. Tratarei do importante tema mais lá para as bandas do sul do Vietname.
Regressando ao «Tio Ho», oficialmente comunista mas contrário ao maoismo e apenas aliado dos soviéticos por razões estratégicas militares, queria ser cremado após a inevitável morte mas acabou por ser embalsamado e colocado no já referido mausoléu. É que a reencarnação budista se aplica apenas ao comum dos mortais de tal modo que se em vida a pessoa se porta bem, na vida seguinte subirá um patamar na qualidade de vida e na escala da santidade; se se porta mal, reserva-se-lhe a evolução descendente até que reencarne como um desprezível verme. Ora, rezava o senso comum no Partido do «Tio Ho» que tendo ele feito tanto bem a tanta gente em toda a Nação, só lhe poderia estar reservado o mais elevado patamar na escala da santidade em que o espírito é eterno e não mais reencarnável. Portanto, não seria necessário cremar o corpo para que o espírito dele se pudesse libertar totalmente e seguir na progressão das reencarnações; poderia ser embalsamado para que o espírito, querendo, nele se pudesse acolher eternamente e em paz numa ligação perene com o Ser Supremo.
Curiosa fundamentação teológica para um acto partidário comunista. Não imagino o Dr. Álvaro Cunhal a recorrer à Teologia para nacionalizar a banca nos idos de 70 do século passado.
(continua)
Lisboa, 5 de Dezembro de 2014
Henrique Salles da Fonseca
(nos jardins de Hanói - artimanha para fotografar os militares, o que parece não ser do agrado das Autoridades vietnamitas)
Um dos alimentos mais produzidos e consumidos no mundo (4º), a batata branca ou inglesa, como se chama no Brasil, de origem sul-América (região dos Andes), chegou à Europa levada pelos espanhóis no século XVI. No início não apreciada, espalhou-se por esse continente através da Espanha, Itália e Inglaterra. No século XVIII já era cultivada intensamente em Portugal.
Na Ilha do Faial, o seu cultivo começou de forma produtiva em 1780 por ordem do Capitão-general dos Açores D. Antão de Almada, que seguia as instruções do então Ministro do Reino, o futuro Marquez do Pombal, no intuito de estimular a agricultura nas terras cultiváveis das ilhas. Já nessa época recomendava que evitassem “...o grande e prejudicial erro de se reduzirem a pastagens de gado terras úteis e capazes de produzir frutos”. Dava, inclusive, entre muitas outras providências as regras de manejo das terras.
Pelo pouco interesse inicial das gentes, que não apreciavam o tubérculo, a batata só era cultivada em terrenos baldios. Mas a autoridade se impôs e as sementes distribuídas à população geraram uma grande produção, que era vendida a baixos preços, nos primeiros tempos. Para estimular a plantação o governo não cobrava a dizima. No ano 1866 a produção no Faial chegou a 551.044 Kg.
Mudara-se o interesse e o gosto pela batata, agora um dos produtos mais consumidos na ilha.
Viajantes como Jacques Cook (1775) e Gustavo Hebbe (1800) escreveram sobre o Faial o seguinte:
CooK:
...achamos os campos bem cultivados e de belo aspecto: o trigo que os insulares semeiam é de espécie barbu (com barba); vimos junto às casas terrenos de abóboras, pepinos e melões; os pomares produzem limões, laranjas, ameixas, damascos, figos, peras e maçãs; há poucas couves e as cenouras degeneram, tornando-se brancas, vendo-se os habitantes na necessidade de importar todos os anos sementes novas. Plantam por ordem do Governador grande quantidade de batatas que vendem a baixo preço, pela razão de não gostarem delas. As cebolas e alho, legumes que os portugueses usam muito, abundam nesta ilha, assim como os morangos e o solanum lycopersicon a que dão o nome de tomate.
Gustavo Hebbe:
A terra é bem cultivada, produz milho e cevada, às vezes debaixo de soberbos castanheiros. Produz bom trigo, frutas, abóboras e batatas de excelente qualidade, em quantidade superior ao consumo local. Os pomares produzem com abundância várias espécies de laranjas e limões...os morangueiros abundam”
Isso foi o que viram esses viajantes no Faial dos séculos XVIII e XIX. Na actualidade os pastos tomaram conta das terras, raros são as hortas e pomares. Hoje, no século XXI, na era do conhecimento e da tecnologia, nada se planta, tudo se importa! Estamos evoluindo...na dependência!
Uberaba, 16/11/14
Maria Eduarda Fagundes
Dados compilados dos ANAIS DO MUNICIPIO DA HORTA (Marcelino Lima)
(História da Ilha do Faial) 1943 Oficinas Gráficas “Minerva”, Vila Nova de Famalicão
Baixo e franzino, o nosso guia no norte do Vietname foi buscar-nos ao hotel em Hanói e induziu-me como primeiras impressões a insignificância, a fome e o subdesenvolvimento.
Falando fluentemente castelhano (fiquei então a saber que estávamos programados para visitar o Vietname de alto a baixo na companhia de um grupo de 16 espanhóis e um brasileiro), apresentou-se apenas como Juan. Para quem já tinha tido em Israel um guia judeu que naquele «dia do Pai» se chamava José, não liguei importância à aberração onomástica e preparei-me para ouvir aquele insignificante «unhas-de-fome» enquanto o autocarro se dirigia para o Mausoléu de Ho Chi Minh. E lá chegados, fomos arrebanhados num semi-círculo para que ele nos dissesse que...
... conta a lenda que o mítico pássaro Viet, «Chim Lac», desceu dos Himalaias para se fixar nas planícies e aí crescer livremente sem ter que continuar subjugado a intempéries e a ditames alheios; mas teve sempre que travar batalhas para afastar cobiçosos, a começar pelos chineses que ainda hoje não desistiram de dominar o mundo, começando precisamente pelas planícies do pássaro Viet. E tantas têm sido as batalhas que os protegidos de «Chim Lac» têm sido obrigados a travar em defesa da paz em que querem viver, que acabaram por se especializar na guerra ganhando assim a justa fama de imbatíveis. Passaram os séculos em defesa permanente contra os que se intitulavam os Senhores do Império do Meio... até que do Sul chegou um povo estranho com grandes narizes que apenas queria fazer comércio. A esse o receberam em paz os protegidos do pássaro Viet e não tardou muito para que tais novos amigos os ajudassem na defesa contra os chins. Diziam-se súbditos dum reino longínquo de seu nome Portugal e fizeram sempre comércio em paz. Mas também fizeram filhos e foram ficando até que um dia falaram de um Deus que não era o Senhor Buda. E falaram, falaram... e a muitos encantaram. Trouxeram sacerdotes desse novo Deus e continuaram a falar de paz e a ajudar contra os cobiçosos das planícies do pássaro Viet pelo que também lhes foi dada guarida no Vietname. A esses sacerdotes chamavam Padres e foi um deles, de seu nome Alexandre, que fez o Dicionário Vietnamita Português Latino. Puderam então os protegidos de «Chiam Lac» libertar-se dos caracteres chineses passando a escrever do modo que os novos amigos ensinaram e cortando mais uma dependência dos chins. O alfabeto latino passou a ser um instrumento da independência vietnamita e isso se deve aos amigos do comércio e do novo Deus. Mas os Padres portugueses começaram a ser substituídos por franceses e então as relações azedaram-se pois os novos mensageiros estavam a impor-se por meios mais activos. A rejeição começou e a França enviou militares para proteger os seus Padres. Eis que os vietnamitas tiveram que abrir nova frente de combate que se concluiu com a conquista da base francesa de Dien Bien Phu, já em pleno séc. XX. Foi em inferioridade que a França negociou a sua saída acabando mesmo por desistir de todo o território a que chamava Indochina (Vietname, Camboja e Laos). Mas conseguiu dividir o Vietname em Norte e Sul de modo que um poderia ser comunista e o outro se manteria alinhado com o Ocidente. Mas os filhos do pássaro Viet não podiam ver a sua pátria dividida e encetaram o processo de reunificação. Foi nessa circunstância que os americanos se prontificaram a proteger a metade Sul e todos sabemos como em 1975 se conseguiu a reunificação do país. Foi então que os chineses, a pretexto dos problemas cambojanos, se aprontaram para o regresso e foi nesse exacto então que os vietnamitas tiveram que lhes fazer novamente frente. A paz foi assinada já na década de 80 do século passado.
E agora, minhas Senhoras e meus Senhores, podem passear durante uma hora pelos jardins mas não podem entrar no Mausoléu de Ho Chi Minh.
Há coisas na nossa vida e na vida de todos nós, habitantes deste planeta onde vivemos num meio em equilíbrio quase milagroso, que têm enorme importância para a nossa sobrevivência. E esta é a coisa mais importante para qualquer ser vivo.
Nos três colóquios anteriores tive a honra e o prazer de vos roubar largos minutos tratando algumas coisas relacionadas com a questão da sustentabilidade da cidade e portanto fazendo parte dessas coisas muito importantes.
Este ano resolvi alterar o critério e aqui estou para fazer convosco um exame simples e leve das coisas ditas sem a importância daquelas a que me referi no início mas que talvez valha a pena examinar.
Antes de mais devo confessar-vos ter tido um pequeno problema com o título pois acheio-o conveniente para o objectivo que tinha mas, ao iniciar o trabalho, cheguei à conclusão que na verdade quando disse “sem importância” o que acontece de facto muitas vezes é “não se lhes dar a devida importância”. E assim teremos na verdade três tipos de coisas no que se refere a importância: as reconhecidamente importantes, as que poderão ser importantes (conforme as opiniões) e as que cada uma por si não são importantes.
O que implica um problema que é: quem é que lhes dá ou não importância?
É claro que a própria palavra importância tem que ser melhor analisada porque a sua dimensão, o seu porte, não é a única influência pois as circunstâncias em que a coisa acontece é determinante. Como exemplo simples admitamos que caímos numa zona alagada funda: o mais importante é alguém nos atirar um cabo ou uma bóia de forma a nos salvarmos de morrer afogados em vez de nos ler um projeto de sistema de salvamento.
Portanto as coisas importantes referem-se à Vida, e para quem é crente a Deus, ao Universo, à Terra, ao País, à Cidade, à Família e finalmente à Pessoa.
Enquanto as tais coisas sem importância se referem aos factos da nossa vida doméstica e profissional na nossa proximidade que muitas vezes se repetem sistematicamente e que tantas vezes já nem lhes prestamos qualquer atenção.
Que constitui logo uma fonte de problemas porque as rotinas fazem perder a noção das mudanças embora pareçam ser pequenas cada uma, no entanto os seus efeitos vão sendo aditivos e daí as complicações que surgem, principalmente ao longo do tempo
Um pouco como a história da rã posta num tacho com agua fria ao lume e quando ela percebe que a água está quente demais já não é capaz de saltar para fora.
Todos os seres vivos têm como a coisa mais importante a sobrevivência. O Homem como ser vivo mais complexo também assim procedeu até atingir a forma civilizada.
Mas entretanto exactamente por ser mais complexo transformou a luta pelo poder comum aos animais, relacionada com a luta pela sobrevivência, numa luta pessoal e de grupo muitas vezes adversa da sobrevivência da espécie.
E assim assistimos ao desenrolar da história da humanidade onde, conforme as populações se foram organizando em organismos sociais mais complexos, estes foram dependendo sempre dos comportamentos dos seus dirigentes, frequentemente dominados pela ganância e pela vaidade, que provocaram a sua própria destruição, tantas vezes disfarçada de agressão exterior, pois não sendo capazes de analisarem as verdadeiras causas do seu insucesso também não conseguiram corrigir os rumos incorrectos que vinham seguindo.
Neste fenómeno comportamental das populações sempre houve uma influência muito relevante da comunicação social que não é tão moderna como se pode julgar, porque o que é moderno é o conjunto de meios técnicos ao dispor dos utilizadores, a velocidade de propagação e a área abrangida, pois durante séculos apenas havia o contacto oral directo.
Mas a influência da oração e do exemplo dado pelos dirigentes era semelhante à que acontece agora apenas limitada a número de pessoas muito menor, tal como a população que no fim do século XIX era cerca de 1 bilião e agora já passa dos 7.
E se nesses tempos recuados só alguns tinham acesso à apresentação das suas ideias e opiniões verifica-se agora exactamente idêntica situação, o que conduz às mesmas distorções e confusões na informação fornecida à população, embora pareça haver a convicção de que toda a gente que, por ter liberdade para se exprimir sem ser preso se estiver em desacordo com o poder vigente, consegue ter influência nas decisões.
Na realidade a influência da comunicação social está muito dependente de quem controla os meios que a maioria consome seja na TV, na Rádio, nos jornais e nos cartazes.
Uma das consequências deste comportamento dos dirigentes em exercício é o desinteresse da maioria da população em participar activamente na vida política que nas democracias se manifesta periodicamente pela enorme abstenção nas eleições, o que desgasta fortemente a sua eficiência. É conveniente recordar que na pátria original da democracia estava previsto que em ocasiões de dificuldades excessivas era nomeado um tirano para ultrapassar essas dificuldades momentâneas.
Entretanto a comunicação social depende desses mesmos dirigentes, de forma directa ou indirecta, e assim as correcções ao rumo seguido que permitiriam melhorar as condições de vida e a sustentabilidade do País e portanto da população não se realizam da forma mais eficiente ou por vezes de forma alguma.
Chamo a vossa atenção para a palavra sustentabilidade que é mais atual que a sobrevivência embora o resultado seja idêntico.
Portanto a lista dos assuntos a que se não dá a devida importância fica assim mais aumentada e complicando a definição da linha de separação entre as coisas mais importantes e as menos importantes.
Para atenuar esta dificuldade vou apresentar algumas coisas que julgo mais importantes mas a que eu acho que não tem sido dada essa categoria e outras que reputo serem de facto menos importantes.
A reforma da estrutura do Estado de forma a não só evitar os gastos enormes com actividades improdutivas e/ou impeditivas da nossa competitividade mas também alterar os comportamentos tradicionais das nossas elites dominantes que conduzem aos factos conhecidos destes últimos trinta anos.
Os equívocos da educação nacional expresso no título dum Ministério que na verdade não passa da instrução, como já foi, uma vez que se despreza o peso essencial dos enquadramentos e dos exemplos dos chefes sejam eles políticos, corporativos, familiares, desportivos e outros
O equívoco da Cultura a nível do Governo, tal como na Educação, que só trata de uma parte, as Artes, desprezando as restantes componentes como são as actividades, as crenças e comportamentos, enfim tudo o que define a maneira como a população vive.
O desprezo pela essência da identidade do povo português que levou à destruição da Marinha nacional e à insistência em falar no Mar mas não na recuperação da nossa Marinha, sem a qual aquele pouco mais será que paisagem e Portugal jamais poderá ser independente como a História ensina a quem a quer conhecer.
O esquecimento do dever de defender a independência do País pelos Órgãos de Soberania como está expresso na Constituição
A recuperação de capitais nacionais em indústrias de grande porte em vez de serem vendidas a estrangeiros alterando os enquadramentos herdados do sistema antigo do condicionamento industrial e do chamado complexo de Edison que consiste na sistemática obrigação de tudo ter que ser autorizado por um governante de forma discricionária significando que, se Edison tivesse nascido aqui, nunca conseguiria fazer lâmpadas pois os ministros não sabendo o que isso seria nunca o autorizariam. Comportamento este que muito contribui para ocorrências de corrupção, além do velho truque de se criarem dificuldades para se venderem facilidades.
A gestão da água no prazo adequado a garantir a segurança do seu abastecimento incluindo a sua reutilização devidamente interligada com a produção de energia renovável. Nunca se deve esquecer o facto da água ser, como o ar, um bem essencial para a vida.
Após estes esclarecimentos ou melhor desta tentativa de esclarecimento já podemos voltar às coisas sem importância e para isso sugiro recordarmos um princípio que parece ter origem na Sabedoria oriental e que diz: se queres aperfeiçoar o mundo começa por te aperfeiçoares a ti mesmo, depois a tua família, a seguir a tua cidade e o teu país e então chegarás ao mundo.
Portanto as coisas sem importância começam ao acordar e vão acontecendo pelo dia e pela noite fora até ao acordar do dia seguinte: umas só com o próprio protagonista seja a fazer a barba ou a cortar uma unha, outras com quem se convive em casa, no transporte para o trabalho e depois neste e assim até recomeçar na manhã seguinte.
São muitas as coisas que acontecem em cada dia que passa e muitas as que não terão importância alguma mas se repararem com atenção algumas delas deixaram marcas noutras pessoas ou em si próprio.
Se nos lembrarmos de que isto sucede 365 vezes por ano, pelo menos, o somatório destas marcas acaba sempre por deixar um rasto de maior ou menor intensidade que poderá ter mais influência da que se julga não existir.
Uma palavra ou um gesto pode ser suficiente para dar ou receber uma alegria ou uma frustração e a soma de tudo isto pode significar um contributo relevante para mais momentos felizes que são o sustentáculo da felicidade de cada um e de quem com ele convive.
Chegar a Hanói era para mim qualquer coisa tão estranha – para não dizer mesmo perigosa – como entrar em Pyongyang vindo de Seul, o mesmo que se poderia imaginar de um judeu em Berlim no tempo de Hitler ou um comunista em Lisboa com Salazar em S. Bento. Para mim, o Sol não tinha hipóteses de brilhar naquelas paragens dominadas pelas trevas. Chegando à noite, a escuridão fazia todo o sentido nas minhas tenebrosas expectativas e as luzes da aerogare soavam-me a falso apesar do sorriso com que fora beneficiado pela minha vomitória vizinha de cadeira na última fila do avião plúmbeo. E, no entanto, eu estava ali de livre vontade. Masoquismo, aventureirismo, inconsciência? Não, apenas confiança nos sensatos que me acompanhavam e que tudo tinham planeado.
E quando os nossos amigos Amélia e Pepe inadvertidamente se dirigiram a um guichet errado, foram rigidamente instados por uma orgulhosa guarda de fronteira impecavelmente fardada e de chapéu à Elvis do modelo soviético a fazerem meia volta encaminhando-se para o rendoso balcão dos Vistos que pinga à razão de us$ 45,00 per capita para o erário público do país. Um pouco a trás, a Graça e eu não passámos pela reprimenda e lá nos pusemos frente ao guichet apropriado. Afinal, os guardas fronteiriços dos Vistos eram amáveis e eu pensei que poderiam prender-nos e torturar-nos mas que o faziam com um sorriso simpático. Humor sádico? Talvez não. Pareceu-me que estavam ali a desempenhar a patriótica missão de sacarem umas massarocas aos capitalistas imperialistas que se aventuravam a meter o nariz no seu querido pais. Só isso e nada mais.
Chapéu à Elvis
Aliviados do peso dos Dólares na exacta quantidade legalmente fixada e de duas fotografias, lá fomos à das malas que já rolava em tapete tão barulhento ou tão silencioso como os dos nossos aeroportos. Não se perderam as bagagens e os carrinhos em que as transportámos até à rua tinham todas as rodas a funcionar. E cá fora, passada a silenciosa Alfândega, estava uma guia turística ostentando o meu nome como se eu fosse o organizador daquilo tudo, o tipo importante e não, afinal, o que ia com os outros. Sensação estranha, a de chegar ao Inferno e constatar que o Diabo nos trata pelo nome.
Sem vénias nem salamaleques estapafúrdios à moda dos vizinhos tailandeses, a guia cumprimentou-nos com natural simpatia num castelhano fluente de fazer inveja a Gil Vicente nalgum dos seus Autos. Espanto meu quando a viatura a que nos encaminhou não era uma carrinha celular nem um armão fúnebre. Pelo contrário, tratava-se dum mini bus quase luxuoso de origem japonesa ou coreana. O pobre desconfia quando a esmola é gorda.
E lá fomos, noite dentro, rumo ao hotel...
Do grupo de quatro, deveria ser eu o único que não sabia a que hotel nos dirigíamos e eis se não quando me deparo no hall monumental do Hotel Hilton de Hanói cuja magnificência me deixou completamente maravilhado e bouche bée.
Hall do Hilton em Hanói
E logo me lembrei da labrega que nos acompanhou numa visita a Istambul quando, cheia de orgulho patrioteiro, disse ao guia (Professor universitário da História de Constantinopla) que o estádio do Benfica era maior em não sei quantos lugares de espectadores que o do Galatasaray pois dei por mim a pensar que toda aquela arquitectura me fazia lembrar o antigo Cinema Eden, em Lisboa, do arquitecto Cassiano Branco. E foi no meio do meu estupor de encantamento arquitectónico que o Director do hotel nos veio gentilmente cumprimentar. Espanhol, sabia que o meu amigo Pepe também o é e não faltou com o seu acolhimento. Solidariedade ibérica a funcionar em terras de vietcongs.
E, quase mortos de cansaço, lá fomos até aos quartos em elevadores a condizer com a arquitectura e com os corredores a condizerem com os elevadores. Mas o espanto não ficaria por ali pois as loiças sanitárias eram de conhecida marca espanhola.
Foi então aqui que topei claramente com o que nos distingue dos espanhóis a quem chamamos usurpadores, colonialistas e mais não sei quê: enquanto nós ficamos a chorar frente aos telejornais por causa de todas as desgraças e misérias que nos impingem, a fazer greves e a dizer mal do Passos Coelho, os espanhóis colocaram em Hanói um Director hoteleiro e venderam por lá não sei quantas retretes e bidés. Entretanto, a nossa indústria faliu e foi comprada pela concorrente espanhola. Mas nós é que somos os bons e eles os maus.
Estafados, não fui ver a marca do colchão e dormimos, dormimos... Até amanhã!