Cada nação precisa dos seus ideais e dos seus mitos; de facto precisamos de utopia mas não da alienação. Em nome de uma superioridade moral vendemos o mito da revolução. Portugal perde a guerra do ultramar e vende-a como libertação de Portugal. A derrota de um ultramar entregado ao bloco soviético é empacotada na cor dos cravos de Abril. Uma descolonização que já há muito deveria ter sido feita, deu-se na confusão e na traição em nome da auto-estima. Todos nós sofremos do mito de Abril que nos levou para onde nos encontramos. Portugal ajoelhado não aos pés duma civilização, mas ajoelhado aos pés da troika que apesar de tudo, com o seu ditado, ajudou Portugal a sair da bancarrota (de que nos libertamos, esta semana, ao voltar aos mercado financeiros internacionais).
Agora seria óbvia a era da recuperação da dignidade individual assumindo responsabilidade pessoal. Primeiramente seria necessário desencantar os feitores da revolução. Antes deixávamos o negócio do Vinho do Porto nas mãos dos feitores portugueses a serviço das quintas inglesas. Com o 25 de Abril entregamos o negócio da nação, primeiramente, a feitores da ideologia, aos representantes soviéticos e à fé no movimento 68 para depois colocarmos o nosso destino na UE. Abandonamos a consciência lusófona e de portugueses para seguirmos a anónima internacional. Em nome da moral e contra a razão endinheiraram-se os novos-ricos produzidos pelo Abril à custa do esvaziamento cultural e da auto-estima da nação.
Para começarmos de novo teremos de deixar nas ruínas do “império” os seus “heróis”, aqueles que lhe fizeram o enterro. Temos que da ruína da nação enferma, agora ajoelhada erguer-nos de novo como noutros tempos contra os interesses daqueles portugueses traidores que arquitectavam o seu futuro na entrega de Portugal a Castela. 1640 é um dia do povo, agora que a liberdade individual e do povo se encontra mais que nunca ameaçada, há que o restaurar. Mandemos para o ferro-velho da história muitas das aquisições de Abril para readquirirmos Portugal readquirindo-nos a nós. Não queremos já ideais floridos nem a libertinagem enganadora; não precisamos da roupa velha mas duma vontade firme para cada um se erguer. Também o entusiasmo e valores do 25 de Abril nos poderão ajudar. Um estado que domina e mantém o povo à trela da ideologia e das dívidas perde a confiança.
Talvez fosse melhor dizer adeus a alguns direitos para recuperarmos a nossa dignidade ultrajada numa massa de ovelhas em que a perspectiva prometida era a erva e o traseiro da “ovelha” vizinha. Para nos tornarmos cidadãos adultos teremos de deixar de ser massa partidária, confessional ou nacional. Ter-se-á de sair de novo para a rua para aí se construir o nosso Abril, um Abril de liberdade para cada um. Uma rua trabalhada e enfeitada por todos mas sem ladrões das flores e dos frutos e sem os protagonistas da nação apresentados na imprensa e na televisão. Somos um povo a caminho à semelhança do de Israel a realizar-se em comunidade.
RUMINAR A REVOLUÇÃO
A revolução não pode ser analisada apenas sob o aspecto moral; precisa também de uma abordagem histórica séria que ainda não chegou à consciência pública. Na análise da ditadura e da revolução exigimos dos protagonistas que sejam heróis ou pelo menos pessoas admiráveis. Os que fizeram a revolução revelaram-se muito normais (excepto Ramalho Eanes) e a nível de liderança será difícil encontrar uma personalidade da craveira de Salazar. Seria hipocrisia continuar-se a apostar numa “vítima de lavradores” como dizem os Alemães para ilibarem os restantes, quando todos faziam parte do sistema. Karl Marx dizia “As pessoas fazem a própria história, mas, sob circunstâncias auto-selecionadas, não o fazem livremente”. Trata-se de viver uma cultura da memória com capacidade para se rever no positivo e no negativo sem passar tudo a ferro nem com heroizações.
É melhor uma controvérsia honesta que contribua para a construção de uma sociedade civil crítica na continuidade da paz civil. Entretanto o 25 de Abril tem-se tornado numa carga que transforma a mudança do nome da ponte Salazar para ponte 25 de Abril numa usurpação. O armazém da memória da comunidade democrática aguenta e deve ser resistente, na certeza de que não foi o 25 de Abril que inventou a liberdade, a igualdade e a fraternidade e na consciência que cada época tem os seus padrões e normas. Liberdade só o é se for ao mesmo tempo uma conquista individual e social.
O sociólogo Laurene Peter fala de um princípio que pode explicar parte da situação portuguesa. Fala de uma “sublimação sem barulho” e de um “cair pela escada acima” uma pseudo-promoção. Segundo o Princípio de Peter, cada funcionário tende a subir na carreira até atingir o seu grão de incompetência. Enquanto não se atinge o grau da incompetência ganha-se aplauso, reconhecimento e influência. Depois, uma vez atingido o último degrau, fica-se lá, em vez de se ter ficado no grau anterior onde se era criativo e competente.
As novas gerações (pós 25 de Abril) receberam, gratuitamente, uma herança que agora desemboca na crise e que é preciso ruminar. Acordamos num jardim zoológico muralhado quando sonhávamos a liberdade de passarinhos sem gaiola nem fronteiras. Julgávamos que o sonho era realidade e que a realidade era sonho. Julgávamos que era possível uma sociedade só de académicos e por isso acabamos coma as boas escolas comerciais e industriais de então. A revolução nascida mais da ideologia do que da realidade desprezava o trabalho manual. A discriminação do trabalho manual em relação ao intelectual levou-nos a onde nos encontramos.
O 25 de Abril envelheceu deixando os mais velhos desiludidos dos marxistas, maoistas, comunistas, anarquistas que queriam uma mudança radical. Constatou-se que o sonho era só para eles, como podemos verificar nas suas posições, remunerações e pensões. Tudo corria para o partido que dava mais.
Somos todos corresponsáveis. Quando um dedo da nossa mão aponta para a responsabilidade dos outros pelo menos outros três apontam também para nós. Sou crítico porque amo o meu país, procurando ver o porquê das coisas irem mal.
(continua)
António da Cunha Duarte Justo Formado em Ciências da Educação (Português e História) Conferência proferida na sede da ARCADIA a 4 de Abril de 2014
A revolução tinha outras intenções com o seu golpe de estado. Os seus realizadores queriam, como se pode verificar nos governos provisórios, a mudança do regime autoritário para outro regime ainda mais autoritário mas de caracter popular. Encenavam-se como heróis tornando-se autoridades morais em nome duma consciência socialista internacional pronta a sacrificar a própria nação.
Dos livros de ensino começam a substituir-se textos de portugueses consagrados por textos da internacionalidade. A própria constituição deve ser a mais progressiva e mais internacional possível. Celebravam por toda a parte a salvação dum estado de sonho, dum povo liberto das heranças do passado. Um povo que esperava liberdade foi amarrado à manjedoura da ideologia por dançarinos do poder que de pacientes passaram a salvadores. Organizam-se programas de reeducação popular no sentido de ideários socialistas que queriam resgatar Portugal, expurgá-lo da pátria para o tornar internacional e popular. Apresentam-se como vítimas legitimadoras duma nova identidade a criar. Não chega lamentar e remediar o autoritarismo da ditadura anterior; precisa-se de um fascista grande para argumentar e para isso comparámos Salazar com Hitler. Com um Salazar monstro não precisamos de mudar a nossa conduta; apenas a ideologia. Por mais que os erros da nova classe se levantem, nunca chegarão àquela gravidade! E o povo acreditou nas promessas seguindo a voz do novo canto. Um povo de abelhas vai seguindo o cantar da cigarra. Queria em nome do marxismo criar uma nova sociedade com novas amarras. Os espíritos do velho regime instalam-se com mais convicção no novo. A vergonha dum antigo regime apressa a identificação com o socialismo internacional. Chega a cor para nos dar o sentimento de pertença.
O impasse em que vivemos hoje deve-se a uma liberdade gratuita, prometida e que se quer atingida sem o suor do próprio rosto. Uma libertação de tudo mas sem saber para quê. Um mundo de abrilistas torna-se pioneiro da liberdade prometendo felicidade. Em nome da liberdade dá-se oportunidade ao novo oportuno: novos senhores exploradores ocupam agora o lugar dos antigos. Dá-se também uma democratização da exploração, sendo agora possível um número maior de exploradores do que antes. O Golpe de Estado efectuado não se orientava pela realidade das pessoas e da nação mas seguia apenas ideologias mais ou menos internacionais de fardas engomadas.
Portugal passou a albergar, especialmente no Alentejo, muitos peregrinos e “refugiados” da civilização ocidental.
A revolução ao ser feita em nome da esquerda tornou-se sua propriedade; este foi o seu busílis ao esquecer que o Homem consta de uma parte esquerda e outra direita, uma parte inferior e outra superior. A revolução tinha boas intenções mas ao polarizar-se desrespeita a pessoa e a nação, tal como fez o regime anterior. Este foi um grande erro na estratégia de educação popular. Por isso hoje já não é o povo quem festeja, quem festeja é o partido ou os funcionários do Estado. A vivência da nova era sente-se no acto da compra no supermercado e no sexo. Cai-se no vício de uma liberdade sem vontade.
O "movimento 68" resume a sua doutrina na frase “depois de Ausschwitz não se pode acreditar mais num Deus bom e amoroso” quando a conclusão lógica a tirar seria: depois de Auschwitz não se pode acreditar mais na bondade natural do Homem. A primeira frase leva à desculpa e à ideologia, a segunda compromete e responsabiliza cada pessoa.
Tal como uma árvore precisa de estrume no seu solo assim uma cultura precisa do húmus da tradição para poder desenvolver-se e do sol da esperança que constrói o presente com uma panorâmica gratificante. A liberdade precisa de um horizonte e o húmus de que ele se alimenta é o cristianismo e o idealismo (idealismo pensado na alternativa de pensamento alemão ao iluminismo francês). Para o cristianismo cada pessoa é um ser singular único com uma consciência pessoal com uma dignidade humana que o torna responsável e transcendente.
(continua)
António da Cunha Duarte Justo Formado em Ciências da Educação (Português e História) Conferência proferida na sede da ARCADIA a 4 de Abril de 2014
O 25 de Abril foi um acenar de revolução que deixou no ar um aroma de cravos e liberdade. Seguiu depois a política dos embuçados que ocuparam a República sob a mão duma máfia de luvas brancas e invisível que contamina a vida do Estado e da Nação. Dá-se a repetição do que tinha acontecido na primeira república com a sua maneira de estar e fazer jacobina maçónica e ideológica aliada a um conservadorismo pedante de atitude medieval.
“Quem se deita com crianças acorda molhado!” O que se deu em Portugal ocorre também noutros países atendendo ao facto da política ser uma questão da “res pública” e 90% do povo não estar preparado para ser verdadeiramente “ser político” mais predisposto para a alienação do que para a realidade e a utopia.
O Golpe de Estado deu oportunidade à revolução cultural (movimento 68) em via nos USA, Alemanha, França, etc. O 25 de Abril vulgarizou-a então por todas as camadas sociais do povo português. O 25 de Abril torna-se socialmente também no veículo político e social do Movimento 68. Despertou-nos da Bela Adormecida para um mundo fandango.
Passou-se de uma matriz de pensamento paternalista de direita para uma matriz de pensamento paternalista de esquerda. Um rigorismo paternalista deu lugar a um conformismo rígido de opinião de esquerda. Passou-se da proibição de opinião individual para a liberdade de pensar em bloco. O pensamento individual e verdadeiramente aberto continua a ser uma pedra de tropeço neste sistema democrático.
O golpe de Estado deu-se quando me encontrava a estudar teologia e pedagogia social na Alemanha. Tive então um sentimento de libertação, esperançado em novos tempos e numa nova humanidade.
Com o tempo notei que a liberdade, igualdade e fraternidade que os revolucionários apregoavam eram as liberdades dos seus grupos de interesses não a de todo o povo nem para todo o povo. Tratava-se de uma liberdade querida por certas ideologias de panorama limitado à própria mundivisão e justiça sem ter em conta a situação de cada pessoa. Vivia de encenações e proclamações duma liberdade sem corpo nem alma, duma liberdade internacional abstracta, visível em festas e comícios mas não na realidade. O atributo “facho” era na altura distribuído com proficuidade e até com carinho porque a palavra fascista além de agressiva era injusta. Em comícios, chegava-se a aguentar a liberdade de opinião reservando-se a decisão para horas tardias onde então se protocolavam opiniões dos restantes mais iguais. Quem não pensasse igual era julgado como “facho” e como tal de opinião manipulada pelo antigo regime. A nova “censura” (pensar politicamente correcto) marcava os seus pontos na sociedade. À conformidade dum sistema segue-se a conformidade com o outro. Da conformidade com o novo pensar surgia a oportunidade profissional.
Pensar politicamente correcto
O tempo de Salazar incorpora uma era da ordem rígida e de regras sociais intransigentes adversas à mudança. Antes havia o paternalismo da censura depois passou-se ao paternalismo das ideologias e do oportuno. Aos cães de guarda de regras do decoro e da moral perante o povo e a juventude sucedem-se os novos cães de guarda de ideologias. Os saneamentos efectuados nas instituições e a penteação mental operada nas escolas e universidades deram pouca margem ao surgimento de despenteados do pensamento: aqueles que promovem a mudança sem lhe determinarem a orientação para a esquerda ou para a direita! Dos acomodados tradicionalistas passou-se aos acomodados progressistas. Mudou-se o folclore, a atitude permanece a mesma. Antes seguíamos a ordem do orgulhosamente sóspara depois seguirmos a ordem do valha tudo menos nós.
O discurso político faz mais parte do passatempo. Assim como só discutimos superficialmente os tempos da primeira república e de Salazar assim se branqueia o 25 de Abril. Cada época branqueia, irreflectidamente a sua, na procura de culpas passadas que distraiam das suas.
Vive-se de uma história do passado e do futuro sem olhar crítico para o presente. Os fracos e a demonização de um sistema chegaram para justificar medidas irreflectidas e a lavagem de cérebro aos portugueses.
Havia um congestionamento de reformas, é verdade. O espírito da geração 68 do ocidente empacotado no 25 de Abril a pretexto de saneamentos dos ” fachos” e como estratégia de infiltração partidária iniciou a sua marcha através das instituições. Este processo também se deu nas instituições europeias pelos arautos da geração 68. A revolução ocidental dos jovens de 68 conseguiu chegar à ribalta da história portuguesa e questionar hábitos e valores já com musgo. Uma época da História com um ambiente a solicitar o florir de pessoas e instituições continuava ainda manietada por regras e ordens desconformes ao espírito que flui do mundo ocidental.
Neste contexto, tornamo-nos todos abrilistas, consciente ou inconscientemente. Ao golpe de Estado de Abril junta-se uma revolução cultural. O projecto de mudança social desencadeou um processo de esperanças e ideais. À leviandade com que se operou o processo das independências junta-se o erro de mera aplicação de ideologias internacionais já em processo decadente da rebeldia e do preconceito vigente contra as instituições: contra Deus, pátria e família. Também isto levou a nova classe política a desobrigar-se também porque deixou de entender a diferença entre pecados sociais/culturais mortais e pecados socias/culturais veniais!
O sentido da liberdade esgotou-se no questionar a ordem antiga. A razão familiar, democrática e de opinião é despenteada a favor do liberalismo histérico da economia e do mercado. A revolução apodera-se da liberdade e do sexo que oferece a belo prazer sem apelar para a responsabilidade nem para as consequências dos próprios actos. Liberta-se o instinto do animal e reduz-se a pessoa ao indivíduo inocente sem roupa, nem cabeça na esperança de uma vida natural de necessidades realizadas numa sexualidade que restabelece a vida inocente de Adão e Eva antes da mordedura da maçã. Agora tudo corre à procura de auto-realização num novo Homem sem consciência nem moral. Depois das aldeias esvaziadas de sentido até à última aldeia das Cabras, passamos a sofrer de liberdade abstracta. De recordar que na altura em que a revolução andava à solta, a “juventude” da cidade, nas suas campanhas de esclarecimento popular se deslocava às aldeias para politizar o povo (facto este que se não tivesse sido ao serviço da ideologia seria uma boa iniciativa). (Neste contexto conheci um episódio em que se organizou a desfloração de virgens em grupo, sendo para o efeito escolhido democraticamente um jovem delicado para executar tão delicado trabalho Conheci, na altura, um jovem que o fez, era ligada aos grupos de Otelo e chegou a ter várias metralhadoras em casa). Tropeçamos na própria liberdade: Uma falsa compreensão de emancipação espera agora por vingança. Alimentada de valores e da fé numa democracia e numa liberdade elástica. A dança da liberdade leve ameaça tornar-se numa dança de mortos na preparação de um apocalipse que acontece ciclicamente no desenvolvimento da História. O caldeirão do consumo torna-se num buraco negro que engole tudo, engole a razão, a liberdade e equaciona a ética em termos de mercado e consumo, num mundo que se quer caótico sem sujeitos individuais, sem políticos responsáveis nem estado. Um niilismo nostálgico quer de sujeitos funcionários, só tipos numa realidade factual meramente económica. Agora é o tempo dos nostálgicos na procura da inocência perdida.
Uns e outros com falta de realismo.
(continua)
António da Cunha Duarte Justo Formado em Ciências da Educação (Português e História) Conferência proferida na sede da ARCADIA a 4 de Abril de 2014
A política, como “actividade nobre de servir os outros e governar o que é de todos”, tem um senão: é obra de pessoas habituais e votada e criticada por 90% de quem não entende de política nem de governação. Assim, em vez de uma democracia orientada para o povo, como é o caso da Suíça, instalou-se uma partidocracia todo-poderosa e incontrolável.
Torna-se cínica a forma como os nossos democratas falam dos privilégios do clero e da nobreza na Idade Média e se reservam para si privilégios que a plebe democrática não tem. Seria lógico que ganhassem mais mas que estivessem sujeitos aos mesmos direitos e deveres que o normal do cidadão e de instituições sociais. Marinho Pinto, bastonário dos advogados, relata, entre muitos privilégios dos partidos, os seguintes: os partidos políticos estão isentos de IRC, IVA, IMI, imposto de selo, imposto de doações e sucessões, isentos de imposto sob património, de imposto de automóvel, de imposto municipal de transmissão de imóveis, de taxas de justiça e de custas judiciais. “Tudo privilégios adquiridos às escondidas”. Cada voto rende para os partidos 3,1 Euros por ano. O MRPP, devido aos votos recebe mais de 15 mil euros por mês; o PSD vencedor das eleições irá receber entre as últimas eleições e as próximas 38 milhões de euros; o PS vai receber mais de 28 milhões; O CDS/PP 13 milhões; PCP e o VERDE mais de 10 milhões; Bloco de Esquerda mais de 6 milhões; e não parlamentares como PCTP/MRPP mais de 777 mil euros e o Partido dos Animais e da Natureza recebe mais de 730 mil euros.
Além disso os partidos parlamentares receberam mais de 8,3 milhões de euros para as despesas da última campanha eleitoral a dividir entre os partidos segundo os resultados obtidos. Cada grupo parlamentar também terá direito a uma subvenção anual para encargos de assessoria aos deputados no correspondente a cerca de 2.000 euros por cada deputado; a Assembleia da República paga as remunerações dos funcionários dos grupos parlamentares 2 milhões e 550 mil euros por ano; o PS recebe 2milhoes 104mil euros o CDS 1 milhão e 200 mil e o PCP 865 mil euros o bloco de esquerda 631 mil; e os Verde 244 mil euros.
Além dos 24 milhões de Euros ainda há verbas de 18 milhões e 500 mil euros para apoiar as campanhas para a assembleia da república, assembleias legislativas dos Açores e da Madeira parlamento europeu e depois ainda há outra verba para as autárquicas.
Mudança de padrões de pensamento: da matriz de pensamento de direita passou-se para a matriz de pensamento de esquerda
Passaram-se já 40 anos depois do canto de Grândola Vila Morena na Rádio Renascença a 25 de Abril de 1974. Numa altura de crise e em que as conquistas de Abril e os valores da civilização cristã são sistematicamente destruídos por forças da esquerda e da direita, a comemoração da “revolução dos cravos „ pode tornar-se cínica. Canta-se hoje o 25 de Abril como outrora se cantavam as proezas da Constituição de Salazar em 1933. O processo revolucionário caótico interrompido por Mário Soares e pelas forças em torno do “Grupo dos nove” deu origem a outro processo que embora avançado, é escuro e muito mais corrupto que o anterior.
O 25 de Abril deu-se na confusão de forças militares e partidárias continuando ambíguo.
O 25 trouxe-nos a paz e a democracia e direitos sociais e sindicais e criou a plataforma para o progresso em diversos campos contribuindo para o melhor bem-estar das pessoas, especialmente nos sectores da saúde, educação e comunicação mas não conseguiu a suficiente inclusão que entusiasticamente se propunha; pelo contrário fomentou a diferença dos mais ricos e dos mais pobres. Quanto aos pobres manteve-os no assistencialismo, que os mantem a pouco mais que a pão e água.
O alarido em torno da música de Abril conseguiu a grande adesão popular mas não envolveu depois o povo no processo cívico. Há deficiências que se devem à falta de formação política do povo mais configurado para a “res privada” do que para a “res publica”; isto explica-se pela falta de responsabilidade da classe política também ela demasiadamente condicionada por influências de grupos alérgicos à gerência do seu comportamento na praça pública.
A situação em que nos encontramos e o estado de corrupção estatal/partidária é tão grave que não seria responsável um discurso que pretende ajustar contas com a direita ou com a esquerda. Neste sentido, já há muito deveria haver coligações de maiorias governamentais de salvação nacional formadas pelos partidos mais fortes. A palavra de ordem só pode ser de reconciliação, responsabilização e metanoia.
A situação portuguesa não pode ser desintegrada da matriz económica da UE a que nos unimos e que vincula esquerda e direita, como a economia dos USA e da China que não nos deixa produzir artigos concorrentes em termos de preço. A globalização capitalista liberal com a falência dos bancos… e a má administração dos governos levaram Portugal à bancarrota, pondo-o nas mãos dos credores. A riqueza desenfreada de alguns provoca a dessolidarização social do Estado. A nível de infra-estruturas, apesar da crise económica, Portugal é um dos países mais avançados.
(continua)
António da Cunha Duarte Justo Formado em Ciências da Educação (Português e História) Conferência proferida na sede da ARCADIA a 4 de Abril de 2014
O 25 de Abril é um Marco histórico que introduz uma Matriz de Pensamento de Esquerda
O 25 de Abril é passível de muitas interpretações. Tal como afirma Josep Sánchez Cervelló, o objectivo do 25 de Abril (FMA) era a descolonização e a instauração de um regime socialista em Portugal.
Na madrugada do 25 de Abril de 74, Portugal sonhou e a 25 de Novembro de 75 acordou para uma discussão entre forças radicais e moderadas que impediu uma futura guerra civil entre as forças armadas divididas.
Fernando Rosas diz que a revolução portuguesa «foi a última revolução de esquerda da Europa do século XX». O mesmo povo que possibilitou o início da revolução impediu-a depois.
Do que observei, nos primeiros tempos da revolução poderia afirmar, que o que se passava nas ruas era a expressão de um povo dominado que saia à rua para cantar a liberdade.
Liberdade e libertinagem eram atitudes não claras tanto nos revolucionários como no povo que os aclamava. A festa foi mesmo boa e à maneira portuguesa; mas a liberdade e a desordem eram tão grandes que já assustavam os países vizinhos, numa época de caos e de inovação onde imperava a esquerda e a extrema-esquerda (Fase dos governos provisórios até ao fim do quinto governo de Vasco Gonçalves, 19 de Setembro de 1975). Entretanto Mário Soares servindo-se também do cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros para os contactos com o estrangeiro, conseguiu, com o Grupo dos Nove, dar força à contra revolução que incluía também os interesses da burguesia. Durante o VI Governo provisório do 1° ministro Pinheiro de Azevedo e do Presidente Costa Gomes dá-se o golpe militar do 25 de Novembro de 1975 propriamente manejado pelas forças inerentes ao "Grupo dos Nove", as forças moderadas da esquerda e da direita; aqui dá-se o fim dos sonhos da esquerda radical (prisões de militares e desautorização do gonçalvismo e do otelismo). O PCP, Vasco Gonçalves e as forças revolucionárias da esquerda, opta pela luta ideológica do domínio político. Têm uma função de catarse no discurso político. O maquiavelista Mário Soares “ambicioso sem princípios nem convicções” como desabafa Vasco Gonçalves, pôde fortalecer os interesses dos parceiros europeus. Com o apoio dos socialistas franceses, austríacos, do SPD alemão e da CIA americana, conseguiu endireitar a revolução da esquerda radical. A Constituição institucionaliza depois uma democracia partidária. Acaba-se a era dos líderes militares para se iniciar a dos líderes políticos.
Com o começo do 1° Governo Constitucional (sob a chefia de Mário Soares a 23 de Setembro de 1976) inicia-se uma política no sentido da integração europeia, começando por devolver as terras e as casas ocupadas e as empresas nacionalizadas aos seus proprietários. A Europa respira fundo porque vê afastado o perigo de Portugal se tornar numa segunda Cuba.
Ainda me lembra de, na altura, haver expressões públicas contra a Europa, mas a autoridade indiscutível dos partidos conseguiu manter o povo nas suas fileiras, sem referendo tal como se fez com a integração de Portugal na zona euro (Na altura mais que discurso político reinava o discurso ideológico e a generalidade do povo não tinha ideia do que se estava verdadeiramente a passar). O povo teve, porém, papel muito importante, logo no início do 25 de Abril, porque com o seu acorrer às ruas impediu que os militares entrassem em conflito imediato entre eles. A força partidária esteve extremamente presente conseguindo domar à sua maneira, o caos “democrático” de um povo que então se sentia à solta, de ocupação em ocupação. Nesta altura ainda não havia verdadeiramente líderes onde o povo se pudesse alinhar, isso só veio a acontecer com a organização partidária que conseguiu alinhar e chamar a si um povo já de si desalinhado. Cantava-se, então, que o povo é quem mais ordena, o que em parte acontecia até ao 25 de Novembro; este mesmo povo que repetia a cantiga dos revolucionários cantava depois a cantiga dos Partidos organizados.
Aqueles que queriam uma revolução à maneira russa, de Mao Tsé-Tung ou cubana perderam logo nas Eleições para a Constituinte, obtendo a maioria o PS com 37,8% e o PPD com26,3%). O povo optou pela democracia representativa. Depois manteve-se uma discussão extremista e muitas das palavras que se hoje ouvem contra o fascismo são saudades frustradas de um tempo em que a revolução de carácter totalitário foi de facto impedida por Mário Soares e pelas forças inerentes ao grupo dos nove.
Foi um golpe de estado feito pelos capitães e não pela hierarquia militar superior. Decisivo no sentido de impedir a divisão da instituição militar foi a acção dos intermediários António de Spínola e Francisco Costa Gomes, tornados chefes de estado até às eleições presidenciais de 1976. O que temos é fruto da democracia de manifestações de interesses muito embora numa democracia formal.
Muitos, que antes atribuíam todo o bem adquirido ao 25 de Abril, responsabilizam-no agora, fazendo dele um bode expiatório de todo o mal, tal como foi feito outrora com o regime de Salazar. Também houve uma hiperbolização do 25 de Abril como tudo se devesse a ele e não fosse possível desenvolvimento histórico sem ele e como se não houvesse outros Estados na altura em condições semelhantes às nossas e, apesar de não terem tido revolução, conseguiram acompanhar o desenvolvimento dos tempos.
Os que fizeram a revolução aproveitaram-se dela (vejam-se os partidos e seus membros relevantes que reservaram o amanhecer de Abril para eles e o anoitecer para a maioria); a falta de formação política e cívica que não se pode adquirir só na rua acentuou a dicotomia entre a História e o mito!
(continua)
António da Cunha Duarte Justo Formado em Ciências da Educação (Português e História) Conferência proferida na sede da ARCADIA a 4 de Abril de 2014
Na noite de breu ergueu-se a voar; À roda da nau voou três vezes, Voou três vezes a chiar, E disse: «Quem é que ousou entrar Nas minhas cavernas que não desvendo, Meus tectos negros do fim do mundo?» E o homem do leme disse, tremendo: «El-Rei D. João Segundo!»
«De quem são as velas onde me roço? De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes, Três vezes rodou imundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso, Que moro onde nunca ninguém me visse E escorro os medos do mar sem fundo?» E o homem do leme tremeu, e disse: «El-Rei D. João Segundo!»
Três vezes do leme as mãos ergueu, Três vezes ao leme as reprendeu, E disse no fim de tremer três vezes: «Aqui ao leme sou mais do que eu: Sou um povo que quer o mar que é teu; E mais que o mostrengo, que me a alma teme E roda nas trevas do fim do mundo, Manda a vontade, que me ata ao leme, De El-Rei D. João Segundo!»
Da construção europeia, do Euro, da Euro-Alemanha e de outras histórias e historietas explicadas ao Povo e contadas às criancinhas
Relativamente ao título acima transcrito, não resisto em reproduzir, em tradução livre e adaptada, um e-mail que, um pouco ao sabor da pena, sem grandes preocupações de erudição nem de organização de ideias, escrevi a um amigo meu, francês, fidelíssimo crente no mito europeu.
Ei-lo:
“Meu caro
Li com atenção os documentos que me enviaste.
Sabes, servi durante dois anos e meio, como membro do Gabinete do Comissário europeu - de nomeação portuguesa, ou seja do Governo de então -, Prof. João de Deus Pinheiro, em Bruxelas, de 1993 a 1995. Não fui, pois, passageiro, piloto ou comissário de bordo dos aviões, estive na própria torre de controlo do aeroporto. Por conseguinte, posso assegurar-te que, modéstia à parte, julgo conhecer minimamente como funciona a “máquina europeia”, as pessoas que ali trabalham ou que por lá andam e que dão a volta à manivela.
Jacques Delors era, à época, o grande patrão, tinha um projecto e, se bem me lembro, tinha a ilusão de que a Europa podia ver a luz do dia, em grande estilo. A fé move montanhas e a Bélgica é lisa como uma panqueca. Nesses tempos que já lá vão, eu era um crente entre os crentes, a bem dizer quase um fundamentalista pró-europeu, passe a expressão. Ah! A Europa! A magnífica e grandiloquente construção do nosso futuro comum! A criação de um mundo exemplar! Blá-blá-blá, sempre blá e ainda blá...
Tudo isso, entretanto, mudou e tal como os adolescentes, que aos 14 ou 15 anos descobrem um belo dia que têm sérias dúvidas sobre a religião, que deixam de ir à missa e que já não sentem necessidade de rezar, perdi também a minha fé na construção europeia. Tornei-me agnóstico e, à medida que o tempo ia passando, pior ainda: tinha-me tornado num agnóstico militante e revoltado. Por outras palavras, a Europa era um mito que se auto-alimentava e que com o qual tínhamos de viver.
Tratava-se do novo ópio do Povo do século XXI! Todavia, para os descrentes como eu, no fundo, tínhamos de engolir a pílula – éramos e somos apenas umas vozes isoladas que clamam no deserto - , sem embargo não podemos engolir tudo e há coisas que muito claramente devemos recusar.
Vejamos o que se passa. A Europa perde-se e perdeu-se em debates intermináveis, alguns serão bizantinos outros não tanto: federalismo vs. soberania dos Estados-Nações, Europa prato do dia ou “à la carte”, alargamento ou aprofundamento, união mais estreita ou mais flexível, implementação ou não do conceito de subsidiariedade, etc, etc, etc. Poderia perder horas a equacionar todos este problemas, mas o melhor é passarmos adiante porque estas questões são meramente retóricas e as consequentes respostas não nos conduzem a parte alguma. Concentremo-nos, antes, nos problemas mais actuais e mais prementes. Alguns poderão directa ou indirectamente responder a algumas dessas questões de fundo.
O euro constituiu uma armadilha, criado que foi à pressa por pressões de François Mitterrand, assustado com a reunificação alemã e com os riscos dum potencial – e imaginável - domínio alemão da Europa (os fantasmas da guerra franco-prussiana e dos dois grandes conflitos mundiais do século passado emergiram, como emergem sempre, nas mentes gauleses). O PR francês dá um salto na cadeira após ter escutado o discurso do chanceler alemão Helmut Kohl no Bundestag: a Alemanha unia-se de Leste a Oeste. As luzes no Eliseu estiveram acesas toda a noite, a insónia era infindável. Enervado Mitterrand decide então avançar com a criação imediata do Euro, custasse o que custasse, como fórmula para amarrar a agora Grande Alemanha ao projecto europeu. Todavia, impôs duas condições a Bonn: a) a Alemanha podia reunificar-se (era o discurso politicamente correcto, não se atrevia a dizer outra coisa) desde que se comprometesse publicamente com a criação da moeda comum; b) os alemães deviam, igualmente, aceitar critérios financeiros estritos para aquela criação.
O erro de Mitterrand foi colossal. Para os alemães, porém, foi a festa au grand complet : “Este imbecil oferece-nos a reunificação de mão beijada e ainda por cima o euro. Os critérios seremos nós a decidi-los”. E Kohl & Cia. disseram-no de uma forma bem clara e explícita: “Sim, é evidente, mas os critérios serão os do marco alemão. Ponto final”. Eis-nos, pois, chegados ao Tratado de Maastricht e aos famosos critérios de convergência. Iríamos adoptar colectivamente o marco com outro nome.
Mas será que ninguém viu? Toda a gente subscreveu o acordo sem pensar nas consequências? Quem foi o responsável? Bom, Mitterrand à cabeça, sem qualquer dúvida, mas todos os demais foram cúmplices. A Alemanha ganhou em todos os tabuleiros.
O euro foi pois criado à imagem e semelhança do marco. Não houve nem uma regulamentação estrita e uniforme do sistema bancário, nem harmonização fiscal, nem convergência das políticas económicas. Tudo isto implicaria uma maior integração e consequentes perdas de soberania, mas não se podia adoptar uma moeda comum sem pensar nestas questões que são verdadeiramente cruciais. Os EUA também dispõem de uma moeda comum, mas estes problemas estão, como se sabe, resolvidos à partida, sem prejuízo das diferenças – que são muitas – entre, por exemplo, o Alabama e a Califórnia.
O euro é pois uma criação ex nihilo, baseada em falsas premissas, sem quaisquer bases sólidas, apenas para satisfação das pretensões alemãs. Esta é a verdade dos factos. Porém, tudo parecia navegar em águas tranquilíssimas, num mundo panglossiano: “Tout va bien dans le meilleur des mondes”. Melhor ainda: nos pequenos países de economia débil da periferia, acabavam as taxas de juro elevadas, o dinheiro era abundante, fácil e barato. Ninguém temia o que quer que fosse. Vivia-se na euforia. Podia-se, finalmente, construir as auto-estradas, os hospitais, as escolas, os aeroportos; o povão iria viver melhor, tinha-se posto termo à miséria e aos anos das “vacas magras”. Era o tempo de todos os sonhos e de todas as loucuras, que, infelizmente, não iria durar muito.
Com efeito, a crise já lá estava. Começa em 2007 e em Setembro de 2008 dá-se o colapso – é a famosa crise do sub-prime, que está na origem da subsequente recessão nos EUA e na Europa, ou seja, uma crise do sistema bancário à escala mundial, com múltiplas causas, mas com o eixo principal centrado no mercado hipotecário.
Na Europa, para além de todos os sinais precursores negativos prosseguia-se tolamente com a mania das grandezas. Alguns governos, aparentemente aconselhados pela própria Comissão Europeia (!), gastaram ainda mais para “fazerem face à crise” que era, dizia-se, passageira e a Alemanha lá estaria como anjo da guarda de toda a gente, a proteger-nos dos males e pestilência que vinham de fora. O euro era uma moeda forte. As pessoas continuavam a gastar.
Lentamente, porém, aqui e acolá, as apreensões começavam a surgir, mas “era só fumaça”, ninguém via as labaredas do incêndio já declarado, que se avizinhava a passos largos.
Crise? Meu amigo, a crise é essencialmente bancária e não outra coisa. O sistema bancário é a causa, o endividamento público e privado a consequência. A quem pedimos nós, Estado ou particulares, dinheiro? À banca, pois claro. Quem é que o emprestou de uma forma irresponsável, mafiosa, criminosa, através de um sistema opaco e corrupto? A banca. É, porém, óbvio que os governos, por ignorância, irresponsabilidade e ineficácia, têm também a sua quota-parte de culpas no assunto, mas a responsabilidade principal reside no sistema bancário, insuficientemente regulamentado e a funcionar sem qualquer controlo ou supervisão, dignos de nota.
Concretamente, no caso português, o euro acabou com a nossa indústria, pôs um ponto final no que restava da nossa agricultura, criou empregos fictícios no sector dos serviços e, last but not least, impediu o livre curso das nossas exportações.
Devemos continuar a reiterar os nossos erros? Cair de vez no precipício? É tempo de dizer. “Alto e pára o baile!”
Mais. Adoptámos o euro, sem qualquer consulta popular. Para quem se vangloria de uma democracia, de pura ficção, diga-se de passagem, o que se passou foi, pura e simplesmente, revoltante.
Eis-nos chegados à pergunta que se impõe: pode-se ou não bater com a porta?
Sim, mas tal implicará sacrifícios de monta. Já sofremos bastante, é verdade, mas podemos sofrer ainda um pouco mais para sermos recompensados a longo prazo.
Trata-se de testar a nossa capacidade de resiliência. Se batermos com a porta, o barco vai ao fundo, ou seja a “Eurolândia” desaparecerá. A minha resposta é simples: que se afunde. Francamente – e não quero cair na demagogia barata – ao ponto a que chegámos e com a idade que tenho, é-me indiferente. Com uma nova moeda – escudo, cruzado, maravedi ou pataca – teríamos de imediato uma desvalorização de 30 ou 40%, quem sabe se mais. Mas se resistimos passiva e heroicamente até agora, não podemos aguentar mais um embate? Teremos ou não capacidade para sofrer ainda mais? Na certeza, porém, de que recuperaremos a nossa soberania, seremos, apesar das limitações, de algum modo senhores do nosso destino e não os servos da gleba dos outros. Podemos fechar as portas por um período relativamente curto e, entretanto, mandar os banqueiros e os políticos desonestos para a cadeia, depois...depois, se verá! Isto não é populismo. É possível.
Duas pequenas notas finais:
a) Portugal não viveu acima dos seus meios e das suas possibilidades.
Foi a banca nacional e internacional que nos disse de forma enfática: “Façam os vossos jogos! Há dinheiro para todos!”. Meu caro amigo, sabemos bem que assim foi e podia apresentar-te n exemplos do que afirmo.
b) A nossa adesão à UE (na época CEE) foi apresentada como a “terra prometida, onde corre o leite e o mel”. Vamos de um dia para o outro transformarmo-nos em suecos ou em alemães, apesar do nosso cabelo escuro e da nossa tez morena. Isto foi vendido ao pagode, desta maneira, sem jamais, em tempo algum, se ter pronunciado em referendo sobre o assunto. Os políticos-politiqueiros da nossa praça assim nos venderam o peixe.
Podia continuar, mas fico-me por aqui. Falaremos longamente sobre o assunto, mas esta já vai longa, demasiado longa. É um dilatado grito da alma e interpreta-o assim.
No Linhas de Elvas da semana passada (17-4-2014), o economista José António Contradanças faz uma excelente análise da diferença entre as agriculturas de Portugal e de Espanha. Com base no que sabe e no que vê de um e de outro lado da fronteira de Elvas, mostra o chocante atraso da agricultura portuguesa em contraste com o bom desenvolvimento da agricultura espanhola.
Pedindo desculpa de ter de referir a minha pessoa, não posso deixar de dizer que, ao longo de dezenas de anos, em centenas de escritos, alguns no Linhas de Elvas, tenho chamado a atenção para as erradíssimas políticas de sucessivos governos e indicado o que, na minha opinião, é necessário fazer para o desenvolvimento da nossa agricultura. No Público de 6ª feira passada (18-4-2014) está o último desses artigos.
O que proponho não tem nada de original. Está mais que provado em todo o mundo e alguns casos pontuais em Portugal bem o demonstram. Os elvenses, pelo menos alguns dos agricultores que não sejam dos mais jovens, também o devem saber. Elvas tem uma instituição de investigação agronómica que, até ao início da destruição da agricultura (que incidiu fortemente sobre os organismos do Ministério da Agricultura necessários ao seu desenvolvimento), tinha grande projecção internacional e deu muito dinheiro à agricultura, principalmente do Alentejo. Refiro-me à Estação de Melhoramento de Plantas, mais tarde designada Estação Nacional de Melhoramento de Plantas.
Alguns dos citados agricultores talvez se lembrem das muitas variedades de cereais e forragens ali “fabricadas” e que, pela sua maior produtividade, deram muito dinheiro à agricultura do Alentejo. O primeiro trigo lançado na lavoura foi o ‘Pirana’, a que se seguiram o ’Lusitano’, o ‘Restauração’ e muitos outros. Das forragens creio que a primeira foi o ‘Grão da Gramicha’, que também teve grande expansão. Já lembrei várias vezes (e perdoem-me que o repita) as palavras do então Secretário de Estado da Agricultura, na sessão comemorativa dos 25 anos da Estação, em 1967, quando disse que, em troca das escassas dezenas de milhar de contos investidos no organismo, a lavoura colhera a mais um valor estimado em um milhão de contos.
Hoje, a investigação no Ministério da Agricultura está reduzida a uma pequena amostra do que foi, consequência da destruição deliberada e criminosa (do ponto de vista da ciência e da economia) a que foi sujeita. E temos o país no estado em que está.
Do nível científico da Estação de Melhoramento de Plantas falam, além das publicações dos que lá trabalharam, os numerosos cientistas estrangeiros que a visitavam. Em 1970, por indicação do então Secretário de Estado da Agricultura, o Eng.º Vasco Leónidas, tive o honroso e agradável encargo de receber e de o acompanhar a Elvas, esse muito ilustre agrónomo que era o Dr. Norman Borlaug, na sua primeira visita a Portugal. Uns dois meses depois, o Dr. Borlaug recebia o Prémio Nobel da Paz, pelos seus notáveis trabalhos de combate à fome no mundo, precisamente através da investigação agronómica. Essa foi apenas a primeira de várias visitas que fez à Estação.
O actual governo travou a destruição geral que a agricultura vinha sofrendo. Mas, tanto quanto sei, a investigação continua aquém do que podia ser, mesmo nestes tempos de extrema penúria. E a solução dos problemas não cai do céu. Sem a investigação agronómica não seremos capazes de desenvolver significativamente e continuadamente a nossa agricultura.
Publicado no "Linhas de Elvas" de 24 de Abril de 2014
A canção de Zeca Afonso, “Grândola Vila Morena”, usada na Rádio Renascença como palavra de ordem para dar início à revolução, expressa o ideal da liberdade e da fraternidade, que como ideal nunca poderá ser totalmente cumprido. Quarenta anos depois da canção, apesar da abertura e do desenvolvimento havido, é preciso relembra-lo e coloca-lo na ordem do dia.
Outrora, na origem da Revolução de Abril, o MFA – um movimento de anti colonialistas e idealistas de esquerda - dava expressão à crise do colonialismo e às lutas ideológicas entre o imperialismo soviético e o imperialismo americano. Hoje, o mesmo país, tornou-se, de novo, o rosto da crise socioeconómica e cultural do mundo ocidental (ver Repensar a Revolução em www.antonio-justo.eu).
Portugal, na falta de agir próprio, foi também vítima do estado do clima das potências mundiais, devido ao seu enquadramento nos centros de interesses internacionais (URSS-USA, Europa, Nato). O que aconteceu em Portugal em contextos próprios, acontece hoje, de maneira mais descarada, na Síria, na Ucrânia, etc.. Tudo em nome da defesa de interesses regionais mas a servir os grandes imperialismos internacionais.
O golpe militar que derrubou a ditadura de Salazar viu-se indirectamente legitimado pelo apoio que o povo lhe deu; corria entretanto perigo de se tornar numa ditadura militar, no sentido de Vasco Gonçalves, dado a realidade das forças populares e burguesas portuguesas não serem unívocas, tal como acontecia dentro do MFA entre o ideólogo Vasco Gonçalves leal a uma ideia comunista extrema (gonçalvismo) e o ideólogo Melo Antunes com os pés mais assentes na terra portuguesa que, embora socialista, era adverso do socialismo soviético.
O general Vasco Gonçalves, de ideologia comunista, era, com Rosa Coutinho e Otelo Saraiva de Carvalho, um dos líderes do Movimento Forças Armadas (MFA) que encabeçou vários governos provisórios e tinha o intuito de instalar em Portugal uma ditadura popular. À frente do V governo provisório o “companheiro Vasco” conseguiu determinar a nacionalização da CUF, Setenave, Covina, Pirites Alentejanas, Petroquímica, Amoníaco Português, Nitratos de Portugal, bancos, seguros, transportes públicos e dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e implementar a reforma Agrária.
Na altura a Europa temia e tremia com o desenvolvimento da política portuguesa. A Nato não ia permitir que dentro do seu seio se criasse uma nova Cuba. A intervenção indirecta mas maciça dos USA e estados europeus, através do apoio a Soares e às forças moderadas do 25 de Abril, possibilitou a contra revolução (do Verão Quente) que aplainou o caminho para a integração de Portugal no mundo ocidental.
A partir daí a revolução deixou de ser um processo para se tornar num credo! Hoje a bancarrota de Portugal também dá razão aos revolucionários de então, dado ter falhado e a contra-revolução da democracia partidária também. Daí a desorientação e a complicação do enredo em torno da revolução. Apesar dos hinos e louvores inegáveis à mudança histórica, depois de 40 anos de revolução, Portugal não se encontra economicamente melhor em relação ao grupo de países europeus de então menos produtivos mas que também se desenvolveram apesar de não terem tido revolução.
Portugal entre a cólera e a peste: de um lado o imperialismo ideológico marxista e do outro o imperialismo económico (USA). Duas perspectivas intragáveis para um país pequeno como Portugal com um corpo pequeno na Europa e o coração no mundo.
O intuito de revolucionários influentes e do MFA era instituir uma sociedade socialista (à imagem de Cuba e da União Soviética em nome de interesses populares.
Portugal, embora se encontrasse em posição militar vantajosa na guerra colonial, optou por um processo de descolonização que não fosse neocolonialista mas cometeu o erro de abandonar as colónias a outras forças/ideologias colonizadoras.
Vasco Gonçalves e Melo Antunes eram os ideólogos das forças armadas. A 7.04.75 o MFA tinha-se decidido pelo socialismo/comunismo. Melo Antunes e o grupo dos nove (membros do Conselho da Revolução: Vasco Lourenço, Canto e Castro, Vítor Crespo, Costa Neves, Melo Antunes, Vítor Alves, Franco Charais, Pezarat Correia e Sousa e Castro) conseguem uma tomada de posição política pluralista própria, contra os radicais do MFA em torno da ala comunista de Vasco Gonçalves, ao tornarem público o documento dos nove (6 de Agosto de 1975) ao presidente da república general Costa Gomes. Ramalho Eanes e muitos outros líderes militares apoiaram o documento. Costa Gomes, homem de esquerda, entre o 25 de Abril e o 25 de Novembro também apontava para uma terceira via.
O Documento dos nove (Melo Antunes, Vasco Lourenço, etc.) foge ao controlo do MFA no sentido de impedir o socialismo e de enveredar por uma terceira via que não a capitalista nem a socialista. Ao ser questionado sobre as razões de “O Documento dos nove” não querer que se seguisse um modelo de sociedade socialista de tipo soviético, Vasco Gonçalves avisa: “pergunto que sinais de modelo soviético haveria nas conquistas alcançadas? Não vieram todas elas a ser integradas na Constituição de 1976, com a aprovação do Presidente da República, do próprio Grupo dos Nove, do PS e do PPD, além do Partido Comunista e do MDP/CDE?”
Vasco Gonçalves refere no livro „Vasco Gonçalves – Um General na Revolução": “Recordo ainda que o New York Times, em Setembro de 1975, noticiava que a ajuda americana ao PS para combater o Quinto Governo seria canalizada por intermédio da CIA, por meio dos partidos socialistas e dos sindicatos sob sua influência da Europa ocidental.Segundo a imprensa da época, o Presidente Ford disse que a operação tinha custado apenas dez milhões de dólares.” E cita que Carlucci (CIA) «foi um protector das forças democráticas, designadamente do PS e de Mário Soares». Os EUA estavam preocupados porque do futuro de Portugal dependiam os seus interesses estratégicos em três continentes.
Datas críticas do processo revolucionário
A 28 de Setembro de 74 organiza-se uma manifestação da “Maioria Silenciosa” contra as expropriações, etc. apoiada pelo Presidente General Spínola; Otelo Saraiva de Carvalho do COPCON opõe-se e são organizadas barricadas nas estradas de acesso a Lisboa. Spínola é obrigado a demitir alguns generais conservadores e demite-se também.
O apoio do povo ao golpe de estado do 25 de Abril conduziu ao "Processo Revolucionário em Curso"(PREC), que constava do período que iria até à aprovação da Constituição Portuguesa, em Abril de 1976. A extrema-esquerda colada ao PREC e formada pelo MDP/CDE e a UDP, de vez em quando aliadas ao PCP, queriam implantar uma república popular. Em 1975 a grande maioria dos 250 Deputados da assembleia Constituinte pertenciam ao PS, PPD e CDS, e defendiam a implantação de uma Democracia constitucional de cariz semi presidencialista.
A 11 de Março de 75, um grupo revolucionário quer eliminar militares agrupados em torno do General Spínola. A 11 de Março Spínola assume o comando tentando um golpe de estado contra-revolucionário mas falha.
O 25 de Novembro (Verão quente de 1975) designa o “golpe militar” em que as forças moderadas militares conseguem impor-se às forças militares radicais de esquerda, iniciando-se assim a contra-revolução dos moderados.
Com os militares moderados apoiados pelo PS e do PPD obtiveram o apoio táctico do PC. Este confirmou que não convocaria manifestações para essa altura; os militares mais afectos ao PS conseguem também marginalizar mais de 1000 camaradas militares ganhando assim força contra os ('gonçalvistas') e contra a Esquerda Militar Radical ('otelistas'). No dia 24 são cortadas as estradas de acesso a Lisboa. Várias personalidades, entre elas, Mário Soares, deslocam-se para o Porto ao Quartel Militar Norte na expectativa de um plano contra-revolucionário previamente estabelecido. O presidente da república decreta o estado de sítio na área da Região Militar de Lisboa, sendo aprisionados soldados de alta patente da extrema-esquerda revolucionária. O Regimento da Polícia Militar da Ajuda rende-se tendo havido 3 mortos. Melo Antunes declara na RTP que o PCP: "é indispensável à democracia". Consolida-se o regime partidário. No dia 27 os Generais Carlos Fabião e Otelo Saraiva de Carvalho são destituídos, respectivamente, dos cargos de Chefe de Estado-maior do Exército e de Comandante do COPCON; Ramalho Eanes passa a ser o Chefe de Estado-maior Geral das Forças Armadas e o COPCON é integrado no Estado-maior e a Rádio Renascença é devolvida à Igreja. Em consequência de manifestações contra a prisão de Otelo e outros militares, são mortas quatro pessoas e outras feridas.
A partir daqui a incompatibilidade ideológica que se encontrava nas casernas, entre os grupos das forças armadas, passa para a sociedade na luta entre os partidos. PS, PPD e CDS acusam o PCP de estar envolvido nas insurreições de 25 de Novembro.
Entretanto os cravos murcharam e, com eles, o sonho. Passaram-se os tempos dos fogos-de-artifício e o sonho da canção de Abril, agora nas carruagens dos partidos, continua a ser música, por vezes de embalar. Só a bandeira portuguesa parece ser desfraldada, por alguns, com mais força! O cenário é pintado com cores mais escuras. Hoje tudo berra mais alto porque a realidade ensombrece os sonhos. O povo português iniciou a revolução sem saber que ia sozinho para a festa. Uma revolução feita por utopistas num Portugal incardinado na Europa (e não num oceano - Cuba), não poderia ir longe. A União Soviética, a Europa e a América também não permitiam uma terceira via: tal como a ideia de Salazar de um império lusófono não podia ter sucesso, num mundo dividido entre os interesses soviéticos e os interesses americanos.
Hoje encontramo-nos numa crise que, em grande parte, não é nossa mas que temos de aguentar e expiar porque por muitas saídas que tivéssemos em mente a situação enquadrante é esmagadora: o capitalismo liberal internacional e o socialismo não permitem uma terceira via. Uma perspectiva digna de sonho, no sentido de se inovar uma terceira via seria uma união, no sentido de uma confederação, entre os países lusófonos o que pressuporia um longo caminho e, a princípio, menos progresso imediato mas mais humanidade e felicidade. (continua no próximo artigo “A Revolução marxista e a Contra-revolução moderada”)
António da Cunha Duarte Justo
Formado em Ciências da Educação (Português e História)