SABEDORIA
Mentes elevadas pensam no dever; mentes vis pensam no proveito.
Frase atribuida a Confúcio
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Mentes elevadas pensam no dever; mentes vis pensam no proveito.
Frase atribuida a Confúcio
FUNDAÇÃO DA PRIMEIRA FEITORIA
Vicente Sodré ao chegar a Moçambique, vendo-se recebido em boa paz, iniciou logo o trabalho de construir uma caravela, para o que já trazia dos estaleiros de Lisboa toda a madeira convenientemente aparelhada. Quando Vasco da Gama chegou à ilha, estava essa tarefa quase concluída.
Informam os cronistas que o xeque mouro, príncipe e regedor da ilha, já não era o mesmo. Este recebeu com afabilidade a gente portuguesa, entregou ao comandante uma carta de João da Nova e permitiu ao Almirante a fundação de uma feitoria, «para as naus que ali fossem acharem mantimentos».
Assim se fundou a primeira feitoria na Costa Oriental de África - a da ilha de Moçambique.
Ilha de Moçambique – 1616 par Bertino
Alguns autores afirmam haver sido descoberta nesta altura a baía da Lagoa, por se ter desgarrado da armada a nau de António do Campo e ali ter ido parar. Escritores sérios têm nos nossos dias aceitado o facto sem discussão nas suas obras. Os textos não permitem, parece, uma tão formal afirmação, como bem ficou provado pelo erudito director do nosso Arquivo Histórico de Moçambique, Sr. Tenente Caetano Montez, no seu valioso volume sobre Lourenço Marques. Lendo-se atentamente a sua argumentação, assente numa cuidada revisão das fontes, fica-se na incerteza de quem foi o primeiro navegante português que para Portugal levou notícias dessas paragens, pois tanto poderia ter sido António Campo como qualquer outro dos que se fresmalharam das respectivas armadas, antes do fim de 1502. Diz-se antes desta data, por ser ela a do mapa levado por Alberto Cantino ao Duque de Ferrara, no qual aparece já marcada a baía da Lagoa com os seus três rios.
Fundada a feitoria da ilha de Moçambique, como se disse, aprestou-se Vasco da Gama para a partida, tendo o cuidado de deixar nas mãos do xeque uma carta assinada por si, dando ordem a todo e qualquer navio que ali chegasse, para não fazer dano algum aos da ilha, pois tinha feito contrato de paz e amizade com eles. Mandava, também, que se não demorasse e partisse em direcção a Quíloa, o mais breve possível (l).
A 12 de Julho chegou Vasco da Gama a Quíloa, em cujo porto entrou em atitude bélica, disposto a cumprir o regimento que el-rei D. Manuel lhe dera: obrigar o sultão de Quíloa a fazer-se tributário do rei de Portugal.
Deve ter sido assim que Vasco da Gama entrou em Quíloa
Não lhe foi difícil conseguir esse intento, pois o estrondo dos seus canhões lançou o terror em toda a povoação, da qual vieram emissários do chefe mouro pedir as condições de paz. Dois mil meticais de ouro, computados por Edgar Presfage em 890 libras, lhes impuseram como tributo anual, o qual imediatamente pagaram. Tal foi o primeiro ouro da África que chegou a Lisboa e lá se encontra ainda, na formosa jóia manuelina da custódia oferecida pelo rei ao mosteiro dos Jerónimos, o monumento síntese do génio português da época dos Descobrimentos.
E esta a altura de se pôr de novo um pequeno problema histórico que supomos não estar resolvido: o da época e local da junção dos navios de Estêvão da Gama com a armada do Almirante D. Vasco. Com efeito, nem os autores clássicos nem os modernos estão de acordo: Casfanheda, Damião de Gois e D. Jerónimo Osório afirmam que as duas armadas se juntaram em Quíloa, ao passo que João de Barros nos diz ter sido feita a junção em pleno mar, depois de Melinde. Entre os modernos: Presfage fica na incerteza, Manuel Múrias diz que se juntaram na ilha de Moçambique, o General Teixeira Botelho (3) e o Comandante José Torres seguem a opinião de que se encontraram em Quíloa.
E, afinal, a informação dada pela única testemunha do facto, que escreveu um relato circunstanciado da viagem completa de Estêvão da Gama, é tão clara que não deixa ocasião para a mínima dúvida. Vamos, pois, analisar esse documento.
D. ESTÊVÃO DA GAMA EM ÁFRICA
Não foi até hoje, supomos, posta em dúvida a autenticidade ou a veracidade do pormenorizado relato de um dos componentes da armada de D. Estêvão, de nome Tomé Lopes. Não deixa, porém, dúvidas que os autores quinhentistas não o conheceram, pois as suas divergências de opinião não se teriam dado em face de tão claro depoimento.
Esteve esse relato inédito até 1812, ano em que foi incorporado na valiosa Colecção de Notícias para a História e Geografia das Nações Ultramarinas que vivem nos Domínios Portugueses, publicada pela Academia Real das Ciências de Lisboa.
Não se vai reproduzir tão extenso documento, mas apenas analisar a cronologia da viagem na parte referente a África, até ao encontro com a armada de D. Vasco da Gama.
Tendo os navios de D. Estêvão deixado Lisboa em l de Abril,. a 15 de Julho achavam-se na embocadura do rio de Sofala, onde foram verificar se ali estariam ainda os navios do Almirante. Dois dias ficaram surtos em onze braças, não podendo continuar viagem imediatamente como era sua vontade, por falta de vento favorável. Vasco da Gama já nessa altura se encontrava em Quíloa.
Os homens da armada de D. Estêvão não desembarcaram em Sofala, por medida de prudência, pois ignoravam o que teria acontecido ali à outra parte da armada. Apesar de convidados a entrar pela gente da terra, continuaram a rota até Moçambique, onde ancoraram a 22 de Julho, uma sexta-feira.
Vieram logo ter com eles «alguns mouros de reputação», trazendo a carta, a que já se fez referência, com as recomendações assinadas-pelo próprio Almirante.
Souberam ali que Vasco da Gama pouco ouro resgatara em Sofala, por existir «uma grande guerra no lugar donde o ouro vinha».
Feita aguada na maior pressa, partiram de Moçambique a 25 de Julho, não tendo entrado em Quíloa «por não estar lá o Almirante». Este passo de Tomé Lopes destrói todas as opiniões apontadas atrás.
Passaram por Melinde, onde foram muito bem recebidos, e ali souberam que o rei de Quíloa se fizera tributário de Portugal, estando o rei de Mombaça com muito medo dos Cristãos. A 5 de Agosto partiram de Melinde.
Onde se encontraram, pois, as duas armadas ? Vai dizê-lo o próprio Tomé Lopes:
Em o Domingo vinte e um de Agosto, pela manhã, ainda cedo, chegámos à dita Ilha (Anchediva), de modo que antes de hora da Noa fomos vistos e salvados com alguns tiros de bombarda; e como o Almirante, que estava ouvindo Missa os ouviu, deixou tudo e com grande pressa fez aparelhar três naus e duas caravelas, e veio para nós julgando que eram naus de Meca, e pôs-se de permeio com a terra para não nos podermos refugiar a ela. Apenas o avistámos tivemos um grande prazer, e içámos muitas bandeiras, toldos e estandartes; com o que conheceu que éramos Portugueses.
Quem tal escreveu viu os acontecimentos, merece inteiro crédito. Assim, juntaram-se na ilha de Anchediva os dois troços da armada, que juntos à India iriam em parada de glória.
A ÁFRICA E AS ARMADAS DE 1503 A 1505
Propondo-se este trabalho apenas focar as ligações de Moçambique com a História da Expansão Portuguesa, destacando os factos que a ele se relacionam, vamos assistir à passagem das armadas seguintes, tentando encontrar os sinais por elas deixados nas terras da África Oriental.
Depois das vitórias de Vasco da Gama na empresa da Índia saiu de Lisboa, em 1503, a armada dos Albuquerques com nove naus dividida em tres capitanias; a de Afonso de Albuquerque, com três naus, e a de Francisco de Albuquerque, com duas naus, para regressarem com carregamento de especiarias; sendo a terceira capitania a de António Saldanha com os restantes navios, «para andarem na boca do estreito do Mar Roxo, esperando as naus dos mouros de Meca». Apertava-se, assim, cada vez mais o bloqueio ao comércio árabe na Índia.
Os primeiros partiram em Abril, Afonso de Albuquerque no dia 6 e Francisco de Albuquerque a 14, seguindo um pouco mais tarde as naus de António Saldanha.
Nesta armada seguiu para a Índia o primeiro grupo de Dominicanos.
Os Albuquerques não deixaram traços em terras de África, ao contrário de Saldanha que nela deixou ligado o seu nome, pois foi o primeiro explorador da baía onde hoje se encontra debruçada a Cidade do Cabo, conhecida desde então na cartografia por aguada ou baía de Saldanha. Ele e alguns dos seus foram, também, os primeiros europeus que escalaram os montes fronteiros, onde subiram em busca de orientação, tendo então verificado que ainda não haviam transposto o Cabo. Muito possivelmente foi Saldanha o autor do nome daquela montanha, já empregado por Barros - «Mesa do Cabo da Boa Esperança».
Carta de Fernão Vaz Dourado - 1576
Dali partido foi a Moçambique, Quíloa e Mombaça, onde encontrou Rui Lourenço Ravasco com a sua nau, em guerra de presas com o rei da terra, inimigo do rei de Melinde, aliado dos portugueses. A acção conjunta dos dois capitães levou o sultão de Mombaça a confessar~se vassalo do rei de Portugal com um tributo anual de 500 meticais de ouro.
A esta quinta armada e à antecedente se deve o início da consolidação do domínio português na costa ao norte da ilha de Moçambique.
A sexta armada das índias saiu de Lisboa sob o comando de Lopo Soares, a 22 de Abril de 1504, dela dizendo Barros: que «levava mil e duzentos homens, muita parte deles fidalgos e criados del-Rei, toda gente mui limpa e tal que com razão se pode dizer que esta foi a primeira armada que saiu deste reino de tanta e tam luzida gente e de tam grandes naus, posto que foram menos em número que as duas passadas». Nada, porém, vieram acrescentar ao conhecimento já existente acerca da África Oriental, limitando-se a passar por lá na ida e na volta.
À sétima armada, que no total deveria contar 22 navios, estava reservado mais brilhante papel na expansão portuguesa em África. Partindo de Lisboa a sua primeira parte, a 25 de Março de 1505, levando por comandante D. Francisco de Almeida, não perde tempo pelo caminho na pressa de chegar a Quíloa.
Quebradas as pazes à chegada, cujas peripécias longo seria narrar, o ataque à cidade é fulminante: a ilha de Quíloa rendeu-se aos Portugueses, fugindo os vencidos para o continente.
A África Oriental viu então levantar-se ali a primeira fortaleza onde ficou flutuando a bandeira de Portugal.
Foi nomeado para seu capitão Pêro Ferreira Fogaça; para alcaide-mor Francisco Coutinho e para feitor Fernão Cotrim.
Escolhido por D. Francisco de Almeida o novo sultão da ilha, que ficou protegido pela força de setenta homens deixada na fortaleza, seguiu a armada para Mombaça, que veio a ter a mesma sorte ou pior ainda, pois foi saqueada e incendiada. Dura e cruel vingança assim se tirou das falsidades passadas.
Copacabana? Lisboa? Não! Ilha de Moçambique
(1) Tomé Lopes, Navegação às índias Orientais (1502), publicada no vol. II da Colecção de Noticias para a História e Geografia das Nações Ultramarinas que vivem nos Domínios Portugueses (A. R. das C., 1812).
Rio de Janeiro, 24/02/2012
Depois de algumas conversas infrutíferas com entidades responsáveis do sector, publiquei em 1994 um artigo em que apresentei as linhas gerais das alterações que propunha para o ensino superior, para corrigir o que eu considerava errado na legislação de 1980. Esses erros, na minha opinião, tinham sido, principalmente, o “enxerto” dum quarto grau académico, o mestrado, entre a licenciatura e o doutoramento e a criação dos Institutos Politécnicos. Estes eram destinados, inicialmente, a formarem bacharéis – presumo que algo como os “Junior Colleges” dos Estados Unidos – um grau superior mas de limitado nível, para o desempenho de tarefas não muito exigentes. Por essa razão, a carreira dos seus docentes é também menos exigente que a carreira docente universitária (CDU). Mas em breve começaram a dar licenciaturas – com o mesmo valor das das universidades – a colaborar em mestrados e pretendiam dar doutoramentos.
Os pontos essenciais da minha proposta eram a extinção dos mestrados, a padronização de todos os cursos superiores em 3 anos para o bacharelato, 5 anos de cadeiras e um ano para tese de licenciatura, para completar este grau, e 2 anos (ou o que fosse necessário) para o doutoramento. Propunha a extinção dos politécnicos como escolas separadas e a sua integração nas Universidades mais próximas ou com que tivessem mais afinidades, constituindo pólos dessas universidades. Em qualquer parte das Universidades, na sede ou nos pólos, em que houvesse infraestruturas e pessoal docente qualificado, se fariam todos os graus, bacharel, licenciado e doutor. Os docentes dos politécnicos que tivessem qualificações idênticas às de qualquer nível da CDU, passariam para ela. Os que tivessem qualificações entre duas categorias da CDU, manteriam a sua posição até fazerem provas para passar para o grau mais alto.
No ano seguinte (1995) publiquei no Linhas de Elvas um outro escrito em que pormenorizei um pouco mais o esquema e sugeri que o Governo, considerando as discrepâncias existentes na Europa sobre graus do ensino superior, propusesse uma uniformização de graus segundo o esquema apresentado. Tudo foi ignorado.
Em 1998 reuniram-se na Sorbonne os Ministros da Educação da França, da Alemanha, da Inglaterra e da Itália, visando uma certa uniformização dos diplomas europeus, tendo produzido uma Declaração. No ano seguinte (1999) reuniram-se em Bolonha os Ministros da Educação de 29 países europeus (entre os quais o de Portugal e incluindo, portanto, alguns não membros da União Europeia) e produziram uma Declaração em que continuavam e aprofundavam os temas da Declaração da Sorbonne. O esquema aprovado na Declaração de Bolonha difere do que eu propus apenas num ponto. Em vez de 3+3+2 anos, indica 3+2+2 anos. Não me parece tão bom, mas aceito.
Apesar de ter assinado a Declaração de Bolonha, Portugal tardou muito a implementá-la (e ainda não está totalmente) e resolveu suprimir o título de bacharel e designar os três níveis de licenciado, mestre e doutor. É claro que a licenciatura pós-Bolonha é internacionalmente um bacharelato (não comparável com as anteriores) e o mestrado é hoje equivalente às antigas licenciaturas, pelo menos em relação às que exigiam 5 ou mais anos de estudos superiores.
Anunciou-se que os Politécnicos queriam passar a chamar-se Universidades de Ciências Aplicadas. Não concordo. Sou da opinião, creio que de Pasteur, que dizia que não há ciência pura e ciência aplicada, mas sim ciência e aplicações da ciência. Essa designação é provavelmente derivada da ideia, que considero errada, embora a veja apresentada por muitas pessoas, de que o ensino é essencialmente prático nos politécnicos e essencialmente teórico nas universidades. Sei que este tema é muito polémico, mas o simples facto duma licenciatura ter exactamente o mesmo valor, quer seja duma Universidade ou dum Politécnico, parece-me suficiente para a destruir.
Mas se passasse a haver Universidades “de ciências aplicadas”, isso sugeria que as outras são só teóricas. Um médico faria operações à apendicite teóricas, um engenheiro civil construiria estradas e casas teóricas, etc. Parece-me a minha proposta mais válida e acabava o estigma do Politécnico ser considerado um ensino de segunda categoria.
Quando um pólo (antigo Politécnico) tiver desenvolvimento suficiente para constituir uma nova Universidade digna desse nome, ela será criada, separando-se daquela de que era uma parte.
Publicado no Linhas de Elvas de 26 de Setembro de 2013
Não são nem o escultor da Galateia, nem Henry Higgins, o “escultor” de Eliza Doolittle, rapariga vendedeira de flores e de linguagem arrevesada, que o professor foneticista Higgins ajudaria a corrigir, transformando-a numa bela senhora, tanto no conceito de George Bernard Shaw, autor da comédia “Pigmalião”, como no conceito de George Cukor, no seu filme musical “My Fair Lady”, naquele inspirado.
Uma deslumbrante visão, a de Audrey Hepburn do filme de 1968, maravilhoso filme que transforma a rude vendedeira mal vestida e mal falante numa autêntica princesa de modos corteses, distinção nos fatos e, sobretudo, como tinha sido prometido pelo professor Higgins, elegância de linguagem, mirífica transformação que os cenários e as canções tornam admissível, como varinha mágica de contos de fadas prodigalizando desfechos de feeria. Não assim a vida real, embora a comédia de Bernard Shaw admita essa possibilidade de modificação em seis meses, dos jeitos e falas toscos para ademanes e discursos principescos da figura feminina. Mas neste caso, como no anterior, tal possibilidade resulta do facto de as figuras serem elegantes na origem, a linguagem e os jeitos grosseiros são a deformação que os actores caricaturam, em estudo prévio.
Aparentemente, pois, um professor expert em sons humanos vai modelar uma voz e um ser falante, ensinando-lhe, em seis meses, como falar, como pronunciar, como se apresentar, como se distinguir. É o trabalho, afinal, na nossa sociedade, tal como nas anteriores, dos pais, dos professores, dos meios livrescos ou outros, na formação dos indivíduos, em percursos de maior ou menor dimensão, conforme as aptidões dos educandos, em inteligência e dedicação, que a música, o recitativo, podem contribuir para acelerar, como no filme de Cukor. Mas nunca em seis meses.
Todavia, não direi o mesmo dos recentes pigmaliões linguísticos da nossa praça portuguesa, os forjadores do novo Acordo Ortográfico e as personagens governantes que o avalizaram, sem, contudo, revogação do anterior, prova de insegurança nessa sua arte inefável.
Escultores aberrantes de uma língua que não respeitam, com os seus objectos de pedra lascada substitutos dos convencionais cinzéis e buris próprios dos autênticos, foram retocando aqui, podando ali, no final do trabalho produzindo, não, certamente, uma Galateia, não uma Eliza Doolittle, mas simplesmente um aborto.
Na década de 90, Alvin Toffler, escreveu um livro “Guerra e Antiguerra”, no qual defendia a tese de que as guerras futuras serão ganhas, não por generais em campo de batalha, mas pelos serviços de inteligência. Quem dispuser de mais informações, prevalecerá, em eventual conflito.
Os serviços de inteligência, por muitos denominados de espionagem, buscam ter as informações necessárias para que os governos possam decidir as políticas a serem adoptadas perante eventuais adversários, criminosos ou inimigos externos. Até mesmo perante nações amigas.
Tem, o governo federal, seus serviços de inteligência nas Forças Armadas, na Receita Federal, na Polícia Federal e na ABIN, que oferecem dados relevantes para determinar suas acções.
É bem verdade que o direito à privacidade é uma cláusula pétrea no Brasil (artigo 5º, incisos X, XI e XII), mas, até mesmo essa cláusula pétrea pode ser oficialmente quebrada, mediante autorização judicial. Infelizmente, não poucas vezes é quebrada pelas mais variadas acções públicas e privadas (hackers). Quando descobertas pela imprensa, tornam-se escândalo público.
De rigor, com a evolução da informática, o direito à privacidade tornou-se, melancolicamente, um segredo de Polichinelo, tendo, por exemplo, a Receita Federal mais informações sobre a vida económica de cada contribuinte, do que o próprio contribuinte. E legalmente.
No plano internacional, podem as nações defender-se por meio de serviços de inteligência contra potenciais inimigos, aliados ocasionais ou movimentos subversivos internos ou externos com o aprimoramento de seus serviços de inteligência.
Depois do dia 11 de Setembro de 2001 --quando os serviços de inteligência americanos detectaram a possibilidade de ataque, mas as autoridades não avaliaram com o devido cuidado as informações de que dispunham--, toda a estratégia dos Estados Unidos, que, a partir da guerra da Coreia em 1952, tinha sido consideravelmente valorizada e alicerçada nestes serviços secretos, foi definitivamente erigida como elemento chave na defesa da nação. Por variados motivos que não cabe aqui analisar, tornou-se a nação preferencial de ataques no próprio território ou no exterior.
É, pois, natural que cada país, nos limites de sua tecnologia, busque ter informações sobre seus vizinhos ou potências adversárias.
Os serviços de inteligência, portanto, estão na essência da segurança do Estado e sabe-o não só Presidente da República, como todos os órgãos responsáveis para garanti-la.
O encarregado da embaixada brasileira na Bolívia arriscou-se a tirar de lá o Senador exilado há um ano e meio, porque detectou os riscos concretos de sua permanência na Embaixada.
No velho testamento (livro de Josué), os hebreus derrotaram Jericó depois de enviarem dois espiões até a cidade e, tendo obtido informações de uma prostituta, trouxeram-nas para que Josué pudesse invadir a cidade, preservando, inclusive, a vida da informante.
É de se lembrar que, o combate à criminalidade, no Brasil e no mundo, faz-se a partir de serviços de inteligência.
Ives Gandra da Silva Martins
Por fim os cossacos alcançaram o Tura. O príncipe siberiano Epantchá, tributário de Kutchuma, reuniu a sua gente. No lugar, onde o Tura faz uma grande curva para norte, ele armou uma emboscada.
No cabo do rio apareceram os barcos dos cossacos. Começaram a voar as flechas dos tártaros, não atingindo os barcos. Ermak não deu ordem para ripostar e os barcos passaram. Enquanto dobravam o cabo, Epantchá reuniu-se com os seus mais à frente. O lugar agora era estreito e com as flechas feriram alguns cossacos.
No barco do ataman rufou o tambor, sinal de preparação para a luta. Os cossacos fizeram pontaria. Choveu a descarga. Os homens de Epantchá não conheciam a "luta com fogo". Passa o fumo e olham, ribomba dos barcos; caiem mortos e feridos, e não se viam flechas. Os tártaros fogem com medo.
De úluss (aldeia tártara) a úluss corre a notícia que dos montes vêm barcos, que ribombam e lançam raios.
Do nascer ao pôr-do-sol e durante a noite à luz de fogueiras, os tártaros constroem fortificações. Em redor da capital do khan, Kashlyk, cavaram um fosso profundo. No cimo das colinas puseram ramagens secas para fazerem fogueiras de sinalização.
O próprio filho do khan, Makhmetkul foi para o Tobol enfrentar os russos.
Nota: Os cossacos eram russos? Claro que eram, mas russos com estatuto especial: eram livres, tinham fugido, eles ou seus antepassados, das muitas restrições à liberdade que lhes eram impostas pelo Czar moscovita e pelos boiardos, e juntaram-se nas terras do sul, onde viviam independentes, embora não formassem um estado formal, sem impostos, sem leis, sem obrigações militares. Por isso é que o Czar Ivan IV, Gróznii – o Terrível – dera ordens à sua tropa de matarem os cossacos que encontrassem. E – ironia do destino – foram os cossacos, homens libérrimos, que engrandeceram a Rússia, acrescentando-lhe a Sibéria. JR
Juntaram-se os cossacos na margem. Para cada cossaco havia dez tártaros. Durou cinco dias a luta. No sexto dia os barcos navegaram para mais além. Dentro de alguns dias os cossacos ocuparam uma povoação na margem direita do Tobol.
Nesta povoação eles descansaram quarenta dias. Em Setembro, eles ocuparam outra povoação, na qual decidiram invernar. Mas já não havia provisões e tinham pela frente o Inverno e a fome. Em Outubro atacaram o exército tártaro nas proximidades da capital. No outro dia enterraram os mortos: cento e oito tinham caído nesta luta. Mas o khan tártaro abandonou a sua capital.
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* *
Em 22 de Dezembro de 1582, Ermak enviou a Moscovo o ataman Ivan Koltzó ("João Anel"). Levou o ataman para Moscovo um sem número de peles de marta, cinquenta peles de castor castanho escuras, vinte de raposa cinzento-escuras. Levou também um documento escrito por Ermak, que contava as suas lutas e vitórias. Tendo lido a carta de Ermak, Ivan Gróznii gritou:
- Um novo reino Deus enviou à Rússia!
O Czar estava contentíssimo. Vinte e quatro anos lutara ele no ocidente e a luta acabara sem sucesso. E agora, inesperadamente, era a Sibéria. Não se lembrou o Czar que havia tempo ordenara que apanhassem o ataman cossaco Vashka Koltzó e o enforcassem.
A luta contra Kutchum ainda durou muito tempo.
Em 1585, tendo submetido alguns principados, Ermak continuou a avançar pelo Irtysh. No princípio de Agosto, os barcos já voltavam para Kashlyk. A 4 de Agosto, os cossacos aproximavam-se da foz do Vagaia. À tarde, o céu cobriu-se de nuvens.
Os cossacos estavam cansados, sofriam com o calor sufocante e remavam silenciosos.
Chegaram à foz do Vagaia. Aqui o Irtysh forma um comprido arco, entre as extremidades do qual alguém cavara um não profundo fosso com aterro. Neste arco, cercado de todos os lados por água, instalaram os cossacos um acampamento nocturno. Não conseguiram fazer fogueiras, – as primeiras grandes bátegas batiam nas folhas das árvores. Uivava o vento, as ondas batiam contra a margem. Porém, os cossacos, cansados, adormeceram profundamente.
Mas, para lá do rio, na outra margem, estava o khan Kutchum. Já havia muito que ele seguia os cossacos pela margem do rio.
Algumas horas mais tarde, os tártaros atravessaram o rio a vau e à meia-noite chegaram ao acampamento dos cossacos. Estes nem abriram os olhos. Os homens de Kutchum mataram os adormecidos. Apenas um capataz e Ermak conseguiram pôr-se em pé de um salto. Os soldados de Kutchum cercaram-nos de todos os lados.
"Não é possível fugir", – pensou Ermak e começou a lutar. O capataz, rechaçando os inimigos com um machado, recuou em direcção à margem. Ermak também se aproximou da margem. O capataz saltou para o barco. Ermak quis fazer o mesmo, mas o barco empurrado por uma onda afastou-se da margem. Duas pesadas armaduras – um presente para o Czar – puxaram-no para o fundo. Aproximaram-se a correr os tártaros. Olharam – nada, apenas na água se desfaziam largos círculos.
Morreu Nikita Pan. Morreu Yakov Mikhailov. Morreu Ivan Koltzó. Morreu Ermak Timofeevitch. Matvéi Mereshak com os restos da drujina dos cossacos voltaram para Kamen'.
No trono siberiano sentou-se o filho Aley de Kutchum. Lá se manteve pouco tempo: Seid-Akhmet com o auxílio dos bukhartzy e dos kirguizes matou Kutchum e expulsou Aley de Kashlyk.
E de Kashlyk saíram os russos. Destacamento após destacamento, navegou os rios siberianos. Nas águas do rio Tura reflectiam-se as muralhas da fortaleza russa de Tiumen. No Irtysh, não longe de Kashlyk, construiu-se a cidade russa de Tobolsk. Esta vizinhança não agradou a Seid-Akhmet, que sitiou Tobolsk, mas foi derrotado e preso.
O Estado russo avançou para leste.
Gritza
FIM
Joaquim Reis
Na antiga Moscóvia, a mercadoria mais preciosa eram as peles. Da Inglaterra e da Pérsia, da Holanda e da Turquia chegavam mercadores em busca de peles. Mas os animais selvagens afastavam-se cada vez mais dos caçadores para leste, e as peles encareciam. A caça selvagínea chegou até à cintura pétrea, como então se chamavam os montes Urais.
Para lá dos Urais começava a Sibéria e para norte os "países da meia-noite". A respeito dos países da meia-noite, corriam na Rússia boatos estranhos. Falava-se que aí vivia gente que tinha a boca na testa e quando comia punha a carne ou o peixe sob o capuz e os ombros deles moviam-se como maxilares, para cima e para baixo. Havia também gente sem cabeça: as bocas deles estavam entre os ombros, e os olhos no peito. No Inverno, quando apareciam os gelos, essas pessoas gelavam e ficavam de pé como árvores. Mas na Primavera, quando o Sol aquecia, elas desenregelavam e animavam-se.
E puseram-se os russos a andar pelo país da meia-noite; penetraram para além dos Urais em direcção à foz do rio Ob'. Os Samuedos e os ostiakos (actualmente designados respectivamente por nentzy e khanty) forneciam martas e raposas em troca por facas de ferro e panelas de ferro fundido. E com uma só viagem, enriquecia o mercador.
Instalaram-se no rio Kama os irmãos Stroganof e cortaram bosques, construíram pontes e fundiram minério de ferro. O Czar Ivan Gróznii permitiu-lhes a construção duma cidade e ter canhões. Por sua vez, os Stroganof eram obrigados a defender o território russo contra as investidas dos tártaros que dominavam a Sibéria. Os tártaros frequentemente atacavam o território russo. Em 1579, os Stroganof decidiram fazer a guerra ao inimigo.
Os Stroganovs, desde havia muito que se queixavam ao Csar do khan tártaro Kutchuma. Escreviam-lhe que os tátaros "não permitem aos nossos sair dos fortes... nem trabalhar os campos, nem cortar lenha".
O Czar autorizou os Stroganovs a recrutar homens livres – os cossacos. Era do que precisavam os Stroganovs. Para a campanha da Sibéria exigia-se gente de têmpera, hábil em acções bélicas, gente que os Stroganovs não tinham. Mas chegara-lhes a notícia de que do Volga ao Kama avançava um grande destacamento cossaco e quem o comandava era o ataman (chefe) Ermak Timofeevitch.
O Volga era a grande via de comércio. Mas comerciar era então perigoso. Os ladrões do Volga eram gente livre – cossacos. Dos chicotes (knuts) dos boiardos, da pesada escravatura, os camponeses fugiam para o "campo selvagem" – para a estepe. Agrupavam-se os fugitivos em bandos, adoptando para si o nome de cossacos e para os seus chefes o de ataman.
O mais competente entre eles era Ermak. Mediano de estatura, espadaúdo, de barba preta, ele era severo e não gostava que o contradissessem.
Mas em 1579, o Czar mandou para o Volga destacamentos militares, ordenando-lhes que apanhassem os cossacos e os enforcassem. Escapando à fúria do Czar, os cossacos navegaram no Kama pensando acobertarem-se nos confins da floresta.
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Veio até Ermak enviado pelos Stroganovs um homem a pedir serviço, prometendo alimentação e dinheiro. Os atamanes decidiram ir até aos Stroganovs.
Máximo Stroganov contou-lhe, que os tártaros de Kutchuma o ofendiam, não lhes permitindo trabalhar nem construir. Contou também que o khanato de Kutchuma era rico e ia de lá uma via comercial até Bukhara. Os atamanes escutaram calados. Só no fim do verão Ermak se decidiu. E convocou os cossacos:
- Vamos – disse – até ao khan, fama conquistaremos. Bens, tem Kutchuma muitos, que chegam para todos.
Todo o seu exército – oitocentos homens – Ermak dividiu em centúrias. Uma centúria tinha duas cinquentenas – cada uma sob as ordens de cinquenta homens (entendamos esta expressão como significando a forte solidariedade entre os cossacos de Ermak. Não tenho dúvidas quanto à correcção da tradução). Em cada dez homens havia ainda o seu sénior – o seu capataz.
Com o exército iam escrivães regimentais, porta-bandeiras, tradutores, corneteiros e tambores. Iam ainda três popes e um staretz-vagabundo (velho anacoreta) – um monge fugitivo. Ia o anacoreta sem sotaina, sabia cozinhar papas, disparar o canhão e fazer o serviço da Igreja
Celebraram uma curta missa e despediram-se dos Stroganovs e a 1 de Setembro de 1581 puseram-se em marcha.
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O destacamento de Ermak navegou pelo Tchussóvaia (ver anexo, que representa a região dos Stroganov nos Urais com os rios Kama, Tchussovaia, Tobol, Tura e Irtych). Nas margens não se via viv'alma. Os cossacos navegaram desde o nascer até ao pôr-do-sol. À noite, fizeram um acampamento e acenderam fogueiras. Dormiram sob as estrelas e, logo que o céu se azulou a oriente, rufou o tambor, içaram-se as velas e prosseguiram a navegação.
Do Tchussovaia era necessário transporem-se para o Tura e o Tobol. Ermak procurava um pequeno rio, que do norte afluísse ao Tchussovaia e nascesse perto do Tura.
Os Stroganovs libertaram dos cossacos um tártaro de nome Akhmed, que tinha sido feito prisioneiro pelos russos e era oriundo da Sibéria. Servia ele aos cossacos de guia e intérprete e dizia que era preciso navegar no Mejevaia Utka ("Pato Fronteiriço"?). Navegaram em strugs (barcos pequenos) pelo Mejevaia Utka. O rio serpenteava entre montes. Os abetos caíam para a água, sobre os barcos e enredavam-se nos mastros, pelo que recolheram as velas e continuaram com a força dos remos.
Ermak, carrancudo, obrigou Ahmed a trabalhar consigo. Cedo já não havia caminho para os barcos. Então Ermak enviou três cossacos a verificar se estava longe o Tura, e mandou atar o guia Ahmed. Voltaram os cossacos.
- Até ao Tura é longe – disseram. E caminho pelo Mejevaia Utka com os barcos não há. Só bancos de areia e pedras.
Castigaram o guia Akhmed: cortaram-lhe a cabeça com um sabre. De noite fugiram todos os guias tártaros e tiveram que ser os próprios atamanes a procurar o caminho fluvial para a Sibéria.
No ar esvoaçavam as primeiras neves. Do norte voavam os bandos triangulares dos gansos. Os cossacos chegaram ao curso superior do Serebrianka e resolveram aí ficar até à Primavera.
Ao fim de algumas semanas, alguns cossacos entediaram-se com a paragem invernal. Dois deles convenceram os seus companheiros a irem para o Kama sem Ermak. Pegaram nas pesadas armas, pólvora e provisões e foram em esquis. Quando Ermak soube disto, ficou encolerizado. Puseram-se a perseguir os fugitivos.
Apanharam-nos num matagal de abetos. Trouxeram-nos aos atamanes. Estes ordenaram que na parte mais funda do rio fizessem buracos na superfície gelada. Enfileiraram-se os cossacos na margem. Meteram os fugitivos em sacos e atiraram-nos para a água. Os cossacos emudecidos dispersaram-se pelas isbás.
Os cossacos cortaram patins de esquis, puseram os barcos sobre eles e arrastaram-nos durante dez verstas até ao pequeno rio Jarovnaia. Passou o gelo, os cossacos arrearam os barcos e em água primaveril navegaram direitos ao oriente.
(continua)
Joaquim Reis
Não é a primeira vez que me insurjo contra declarações que ofendem a simplicidade de um ser pensante! Os declarantes podem ser quem forem que, em ocasiões como esta, calar seria um acto de covardia.
O frei Pilato Pereira lembrou-se de fazer a apologia das mulheres que invadiram uma propriedade florestal em plena produção, destruíram o laboratório de estudo e multiplicação de plantas - eucaliptos - e ainda se vangloriaram de ter praticado um acto cívico. Disseram elas que eucalipto não se come e a terra é para produzir alimentos. Tamanha bestialidade não merece comentários. Pois o frade começou o seu comentário a este acto com o título: Benditas mulheres que ocuparam a Aracruz. Creio que se enganou na sua teologia. Talvez devesse abençoá-las porque não sabem o que fazem!
E insiste o frade: - É impressionante como a sociedade do nosso tempo é incapaz de compreender gestos proféticos de quem luta pela vida.
É evidente que o capuchinho, no seu afã pela luta revolucionária esqueceu as palavras, ia a dizer do seu MESTRE, mas como não parece ser o caso, basta referir que terá esquecido a Oração de São Francisco, que certamente jamais escreveria a mesma coisa a propósito destes descalabros que grassam pelo Brasil.
Sabemos todos que eucalipto só comem os ursos Panda e os Koala, mas o frade deve ter estudado por livros, e estes vêm da celulose e esta dos eucaliptos, como deve utilizar madeira para milhentos fins e que vem também de árvores que as abençoadas mulheres não comem mas destroem, talvez não saiba que os eucaliptos, apesar de oriundos da Austrália, conseguiram ocupar um imenso espaço em todo o mundo pela sua utilidade e que têm um papel primordial no reflorestamento de terras de qualidade inferior, terrenos de encosta, e muitos outros, e que sem eles os frades, e nós, nos arriscaríamos a não ter mais papel para escrever, desenhar, imprimir livros e jornais, etc.
O reflorestar com espécies nativas é difícil e não daria para celulose. Para madeira sim, e haveria que esperar uns cem anos para a utilizar. Os eucaliptos em 4 ou 5 anos estão prontos para corte e, no mínimo as tais mulheres, supõe-se, usam algum papel, talvez só o higiênico!
Reforma agrária não se faz com destruição. Nem com as promessas falsas e hipócritas de governos ineptos e corruptos, muito menos com lideres “a la Stédile” que só sabem invadir terras produtivas, derrubando moradias, destruindo laboratórios de pesquisa, matando gado, muitas vezes reprodutores caros, para não deixarem de comemorar o acto de puro vandalismo, cujo objectivo é destruir, destruir, destruir.
Hoje, a agricultura familiar só prevalece na Europa à custa de altos subsídios dos Estados contra os quais o Brasil luta e lutará e vai sempre perder. Nenhum país da Europa se quer sujeitar a não produzir o que come para ficar nas mãos de terceiros.
O Brasil vive um momento de economia relativamente folgada devido em primeiro lugar ao agro-negócio, que exige investimento pesado e tecnologia de primeira linha.
O que pensa o frade Pilato disso? Que destruir o que está feito é um gesto profético? Profetizando o quê? O abandono das empresas produtoras e do capital para esse agro negócio que não se pode fazer com a terra totalmente dividida? Que sabe o frade disso? E de teologia?
Senhor,
Fazei de mim um instrumento de vossa paz!
Onde houver ódio, que eu leve o amor,
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão.
e que seja possível perdoar ao frei Pilato porque também parece que não sabe o que diz.
Rio de Janeiro, 7 de Abril de 2006
“Escolhemos bem a nossa candidata” foi declarado por um chefe de partido na campanha eleitoral para as autárquicas de Setembro de 2013. Foi daquele partido mas podia ser de qualquer outro, pois todos funcionam da mesma forma. Ditadura!
Os portugueses mostram não saber que, em democracia, os detentores do poder são os cidadãos e que a sua primeira liberdade é a de decidir livremente em quem delegam esse poder – e de se candidatar – sempre que há que escolher um ou um número restrito dos seus pares para, em seu nome, irem legislar e governar.
Como se sabe, temos apenas uma eleição democrática em Portugal: para o Presidente da República. Candidata-se quem o deseja e tem um certo número de eleitores apoiantes e os partidos limitam-se a apoiar o candidato que entenderem. (Em democracia, os partidos políticos têm toda a razão de existir, como associações de cidadãos com o mesmo credo político, mas não como órgãos de poder).
Penso que a razão porque os que fizeram esta não plebiscitada e antidemocrática Constituição nela incluíram uma eleição democrática pode ter sido porque se trata dum cargo de grande projecção mas de escasso poder.
Enquanto nas eleições para a Assembleia da República (as mais importantes de todas) a ditadura é completa, para as autarquias abriu-se há anos o que chamei de “uma pequena janela democrática”. Podem, também (devia ser exclusivamente), ser apresentadas listas por grupos de cidadãos eleitores. Chamei a esse sistema “uma pequena janela democrática” porque, além dos partidos serem apresentadores de listas, não se lhes exige o que se exige às listas dos grupos de cidadãos eleitores (os únicos realmente independentes), o que os coloca em posição muito desfavorável. Mesmo assim, em eleições anteriores, foram eleitos vários independentes. Veremos o que sucede nas eleições de 29 de Setembro deste ano de 2013. (****)
Recordo-me de alguns casos em que, com toda a naturalidade e com total desprezo pelos eleitores, foram feitas declarações de “nomeação” de candidatos. Ofereço dois exemplos.
Há muitos anos, o “democrata” Pacheco Pereira, então Chefe da Distrital de Lisboa do PSD, declarou, antes de determinadas eleições que “quem nomeia os candidatos desta Distrital sou eu”. Penso que seria um dos que, na anterior ditadura, protestava (ou se queixava) de não ter eleições livres – o que era verdade – pois, embora os cidadãos se pudessem candidatar a deputados – agora não podem! – os entraves e manipulações faziam com que só fossem eleitos os candidatos “nomeados” pela União Nacional.
Num outro caso, muito mais recente, vi na TV Sócrates, perante um vasto auditório de gente do PS, como quem tira da cartola um coelho, apresentar quem ele escolheu para candidato às eleições para o Parlamento Europeu. Demorados e frenéticos aplausos do auditório, onde certamente estavam alguns que no antigamente se queixavam de não terem eleições livres.
Acham que, com tais cidadãos, Portugal tem algum futuro?
Publicado no Público de 26 de Agosto de 2013
(****) Isto é para o caso de o artigo ser publicado antes das eleições. Se não for, agradeço que me informem, para reescrever esta parte.
v Mão amiga deu-me a conhecer, recentemente, o Relatório (datado de 30/06/2013) da Direcção Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) sobre o caso das swaptions contratadas por diversas Empresas Públicas (EP). Em boa verdade, sobre estas operações propriamente ditas, é nada o que se lê por lá.
v Tudo indica que o propósito fosse, apenas, verificar se a DGTF tinha procedido bem, ou não. Dito de outro modo, se à luz das competências que lhe estão atribuídas, teria, ou não, “metido o pé na argola”. Em suma: uma sindicância circunscrita ao período entre 2009 e 30/09/2011 e, aparentemente, conduzida por “gente da casa” (identificada, apenas, por nome e assinatura – logo, do conhecimento pessoal das entidades a que o Relatório se destinava).
v [É possível que os despachos governamentais sobre o caso, abundantemente referidos ao longo do Relatório, justifiquem a escolha dos três sindicantes e expliquem:
(i) porquê aquele período;
(ii) porquê não ir para além de 30/09/2011, ou recuar até 2005, ano em que já havia notícia de contratos destes. Hélàs! não tive acesso a esses despachos que o Relatório dá como estando em anexo.
Resumindo: uma sindicância interna, para uso exclusivamente interno - e que inocentou a DGTF.]
v Se o Relatório nada revela de interesse para o controverso caso das swaptions, revela imenso sobre o estado do aparelho administrativo do Estado. Não tanto sobre a qualidade técnica das pessoas que preenchem os respectivos quadros, mas, desde logo, sobre o modo como a “burocracia estatal”:
(i) se encontra organizada;
(ii) entende as suas competências; e
(iii) se articula com o Governo.
Sob este ângulo, é uma radiografia preciosa.
v [Para o que aqui interessa, “burocracia estatal” são todos os serviços da Administração Central que têm por missão:
(i) ou apoiar o Governo nos processos de decisão;
(ii) ou relatar sobre o modo como as decisões do Governo estão a ser cumpridas pela Administração Pública e pelo Sector Empresarial do Estado;
(iii) ou as duas coisas, à vez.]
v O que primeiro salta à vista é que a função executiva do Estado (Governo+Administração Central) está organizada “à tropa”, segundo um modelo do tipo “comando & controlo”, mas suis generis: o “comando” reside no Governo - e o “controlo”, também (pelo menos, em tese).
v É ver. Informação para cima, despacho para baixo, relatórios a esvoaçar por todo o lado. E mais informações para cima, e mais despachos para baixo – num carrossel interminável. Em muitos assuntos (como neste caso), a “burocracia estatal” paira entre o Governo e a realidade: para o Governo, a realidade são as informações que a “burocracia estatal” lhe prepara – e nada mais.
v Em curtas palavras: a “burocracia estatal” é competente para ver, escrever e, até, talvez reflectir (medir consequências) - mas não para agir, intervindo na realidade que lhe cumpre vigiar, haja o que houver, veja o que vir.
v Um Governo que considera que só ele – e mais ninguém - está à altura de fazer cumprir decisões governativas, de apreciar os desvios que cheguem ao seu conhecimento, de ajuizá-los e de agir para repor o cumprimento da decisão original, reduz a função executiva, toda ela, a um acto multiforme de política partidária, concretizado em decisões avulsas que só por acaso darão à realidade a forma originalmente pretendida. Isto, se, para tanto, ao Governo lhe sobrar tempo.
v E, suprema ironia, se o Governo dá mostras de não confiar um grão que seja no discernimento da “burocracia estatal” que o apoia, esta paga-lhe na mesma moeda, fugindo à responsabilidade como Drácula foge da luz do sol. O seu nicho ecológico é a sombra que tudo uniformiza e não permite distinguir contornos.
v O caso das swaptions, com os longos hiatos entre “despacho de comando” e “informação de controlo”, demonstra bem tudo isto:
(i) as notícias que a “burocracia estatal” ia dando não eram completamente claras – porque evitavam cuidadosamente medir as consequências já previsíveis (o controlo);
(ii) assoberbado por múltiplos problemas, o Governo lá despachava em fim de dia, solicitando, burocraticamente, ora mais informações, ora que lhe apresentassem as mesmas informações sob outra forma – e varria-se-lhe o assunto até à chegada de nova informação.
v Sobre o fundo da questão, nada. E a questão resumia-se a bem pouco: a que riscos financeiros as EP estavam a expor-se (desde logo, com as swaptions, mas também em geral). E não era de somenos.
v Uma primeira leitura deste Relatório deixa a dúvida sobre se alguém teria consciência do que são swaptions – dúvida que não resiste a uma leitura mais atenta. Despachos e informações, tal como o Relatório, referem-se invariavelmente ao caso como sendo de “cobertura do risco de taxa de juro”. Quer dizer, com uma miopía confrangedora, toda a gente olhava para as swaptions e cria ver swaps (ainda hoje isso acontece na Comunicação Social).
v As opções embebidas nos contratos – opções que as EP garantiam levianamente, sem medir o alcance da sua assinatura – passavam despercebidas, se é que alguém (IGCP incluído) compreendia aquilo que lá estava escrito.
v Mas não só. Para o Relatório (pelo que, deduzo eu, também para as informações e para os despachos):
- Riscos financeiros, risco de crédito e riscos de mercado (designadamente, risco de taxa de juro, ou “risco de custo de capital”) é tudo a mesma coisa;
- Demonstrações de Resultados por Natureza e Demonstrações dos Movimentos de Tesouraria (vulgo, Fluxos de Caixa) são duas maneiras diferentes de designar a mesma informação financeira;
- Capitais Próprios e Capital Social são sinónimos (só isso justifica que as EP tivessem o seu endividamento fixado em função dos respectivos Capitais Sociais, quando várias delas os tinham consumido havia muito);
- Os próprios limites ao endividamento eram fixados em termos de orçamento anual (como se esses acréscimos de dívida se esfumassem no final de cada ano).
v E, mais surpreendente ainda, o Relatório refere, sem estremecer:
(i) que cada EP tem o seu modelo de Estatutos;
(ii) que alguns desses Estatutos são ambíguos em matéria de endividamento;
(iii) que não há dois Estatutos iguais – nos capítulos de organização, poderes e competências dos respectivos Órgãos Sociais;
(iv) que ninguém senão o Governo teria competência para se pronunciar sobre a gestão das EP, nomeadamente, sobre os riscos financeiros a que elas se expunham.
v Enfim, a cereja no bolo. Propõe o Relatório que se peça apoio técnico à CGD para se ver como descalçar a bota das swaptions. Justamente a CGD que também conseguiu (segundo os media) celebrar umas swaptions (mais modestas em valores, é certo) com as EP que lhe passaram a jeito.
v E a pergunta impõe-se. Quando é que teremos um Governo que, por uma vez, deixe de perorar sobre a boa maneira de as empresas privadas gerirem os seus negócios e se dedique, diligentemente, a fazer aquilo que só ele está em posição de fazer: organizar a “burocracia estatal”, adaptando-a à eficiência dos tempos que correm?
v Será pedir muito a quem faz questão de se rodear sempre de uma luzida corte de assessores, consultores e outra nobre gente?
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