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A bem da Nação

NOSSA!

 

La Fontaine, ao que parece,

Leio na Internet,

Colheu no italiano Astémius,

Fabulista quatrocentista,

O tema da sua fábula

A Aranha e a Andorinha”,

Segundo a qual,

A Aranha pretendia,

Sem qualquer ironia,

Caçar também a Andorinha

Na sua teia infernal.

Mas como se saiu mal,

Logo se impôs a lição

Sobre o excesso de ambição

Que destrói incautos pedantes,

Que as forças não meçam antes.

 

«A Aranha e a Andorinha»

 

”Ó Júpiter, que do teu cérebro soubeste

Por um inédito parto secreto,

De discutível acerto,

Gerar Palas Atena, minha inimiga outrora

Por, de pura inveja,

Eu bordar tão bem como ela,

Escuta o meu pranto, por uma vez que seja.

Progne, a andorinha, irmã de Filomela,

- Esta em rouxinol transformada,

Sem culpa formada -

Vem sempre à minha porta

Roubar-me os meus pedaços de sustento,

Girando em caracol, fendendo o ar e as águas.

Ela tira-me as moscas da minha horta,

Minhas, posso dizê-lo; e a minha teia

Estaria delas cheia, não fora

Esta maldita Ave,

Pois teci-a de matéria resistente.”

Assim, com um discurso insolente,

Se não mesmo imprudente,

Se queixava a Aranha, tapeteira outrora,

E que, agora fiandeira,

Pretendia apanhar com bastante ardor

Qualquer insecto voador

Para comer.

A irmã de Filomela, atenta à sua presa,

Apesar da bestazinha, a Aranha,

- De atalaia, perto da sua teia -

Apanhava, para os seus filhotes,

Alegria impiedosa para ela,

Sempre de vela,

As moscas no ar,

Que, com os bicos sempre abertos, os seus filhos glutões,

Em tom meio formado, ninhada pipilante,

Pediam com os seus gritos, ainda indistintamente.

A pobre Aranha não tendo mais

Que cabeça e pés,

Supérfluos artesãos,

Foi ela própria apanhada na bicada.

A Andorinha ao passar, levou a teia e tudo,

E o animal pendente

Na ponta da sua conta.

Júpiter para cada estado , ou seja,

Condição social,

Pôs duas mesas no mundo,

Mas não foi por mal,

Antes, como distribuição natural:

O hábil, o vigilante e o forte estão sentados

À primeira mesa;

E os pequenos, mal alimentados,

Comem, com presteza,

Mas com agonia funda,

Os restos daqueles, na segunda.

 

La Fontaine, como se vê,

Seguiu outra indicação

Na sua lição,

Mais cá à nossa maneira:

Trata-se da distribuição

Dos bens deste mundo

E do requinte das mesas

Segundo a mesma condição

De usarmos ou não

Bem as cabeças.

Mas também os pés e as mãos

São auxiliares profundos

Nos desvairos deste mundo.

La Fontaine não o disse

Porque apesar de tudo o que disse,

Não era tão bera

O tempo de outrora

Como é o de agora.

Mas é tempo de dizer - fora!

A tanta discrepância,

A tanta violência

A tanta ânsia

De abundância,

Mesmo quando não fosse nossa

A massa.

Poça!

Não há quem o impeça?

 

 Berta Brás

BEM COMUM, UM IDEAL A REALIZAR

 

 

Consiste o bem comum essencialmente em dois elementos:

  • Na existência de estruturas e instituições que em determinada fase histórica sirvam ao uso, à dignidade e à dignificação da comunidade;
  • Na vontade de solidariedade que une todos os membros dessa comunidade de forma a que todos participem, na devida proporção, desse bem objectivo fundamental.

Se um desses elementos básicos falha, falta a razão de toda a dinamização histórica positiva, de todo o sentido de viver num autêntico horizonte de esperança.

 

Como exemplos do primeiro podem apresentar-se, hoje: as infraestruturas adequadas no concernente à habitação, ao emprego, à saúde, aos transportes, à educação, aos lazeres, numa palavra, ao nível de vida e ao estilo de vida.

 

Como exemplos do segundo será lícito contar: a possível harmonia entre as classes e entre os grupos, sem conflitos de morte ou suas ameaças; o aproveitamento das competências e das capacidades onde elas realmente estiverem, desde que se encontrem dispostas a servir o bem de todos, sem discriminações de raça, de sexo, de condição, de ideologia ou de religião; a tolerância que não ignora que, hoje, dada a espantosa proliferação de sistemas de «verdade e de vida», de opiniões e de propostas de futuro, a modéstia parece de regra, sem dogmatismos intempestivos ou basismos facciosos mas também sem demissionismos cobardes ou sincretismos inconcludentes.

 

É evidente que, no relativo a estes dois elementos fundamentais do Bem Comum, a sociedade portuguesa actual se revela ainda pavorosamente carecida. Propor-se encher ou, pelo menos, atenuar as suas numerosas e fundas lacunas, é responder ao grande desafio da geração presente, é dar mostras de querer servir mais do que «servir-se», é romper com um passado mais ou menos recente em que o «Bem Comum» passava, como prioridade das prioridades, pelo próprio campanário.

 

E ainda hoje. Demasiado bem conhece o País os «socialistas» electivos dos próprios interesses, os zelotes de si mesmos, os saduceus da própria Pátria a pretexto de um futuro melhor, de uma ideologia «universalista» e terrenista. Como demasiado bem conhece os democratas provisórios de todas as bandas que apenas o são enquanto não enquanto não conseguem impor a sua própria ditadura.

Como demasiado bem conhece os oportunistas de todas as cores, do negro ao vermelho, que não perdem ocasião para se locupletarem com as desgraças da Pátria.

 

Pressentindo ou sentindo já esse ideal – que é também um imperativo – do Bem Comum verdadeiro é que alguns começam a falar da necessidade de uma relativa «trégua» entre partidos e de um «pacto social» entre as «classes»

 

Semelhante «discurso», embora ainda demasiado tímido e, por isso mesmo, incapaz de se fazer ouvir com eficácia por entre os gritos desencontrados, semelhante «discurso» - dizíamos – vem na hora H. De facto, enquanto uns e outros se olharem com total desconfiança, enquanto uns e outros procurarem atropelar-se ao máximo, enquanto uns e outros fizerem do conflito o motos dos próprios interesses e da luta permanente a regra do comportamento, enquanto persistir a incompreensão radical da legítima função que os diversos, mesmo antagonistas, têm a desempenhar, enquanto a incompetência e a incúria se instalarem em certos postos de decisão e/ou execução, enquanto a negociação, leal e capaz, não for um hábito, - reservando essa violência, que é a greve, apenas para a ultima ratio -, enquanto tudo isto não passar de voto piedoso de alguns, ou mais lúcidos ou mais ingénuos ou maia generosos, o Bem Comum acima descrito nos seus elementos fundamentais andará peregrino desta terra onde ele realmente merecia ficar não apenas como seu hóspede mas como seu habitante de primeira qualidade. Para sua prosperidade e progresso autênticos. Para cortar o passo, definitivamente, à alternância periódica da anarquia e da tirania. Para demonstrar que uma comunidade pode ser feliz sem viver propriamente numa abundância material de lés-a-lés. Para dizer que, neste mundo finito que começa e que sentimos já a balizar-nos por todos os lados, Portugal nada perdeu da sua verdadeira grandeza: apenas a transpôs a outro espaço, a outra dimensão, a outra vida.

 

Lisboa, Abril de 1977

 

 Manuel Antunes, SJ

 

In BROTÉRIA, Abril de 1977 e Fevereiro de 2013, pág. 191 e seg.

SWAPS E SWAPOPTIONS

 

M/ Caro Dr. Salles da Fonseca,

Peço-lhe o favor de transmitir aos s/ correspondentes as palavras que tiveram a gentileza de me dedicar.

Uma pequena correcção e uma precisão.

A correcção, primeiro: não sou economista, posicionando-me pelo contrário como um crítico agreste da dismal science. Profissionalmente, sou um financeiro apaixonado pelo dinheiro. Não para o acumular, mas para o estudar e perceber duas coisas:

(i)               O que ele fez e faz de nós;

(ii)               E o que nós, Estado de Direito, podemos fazer com ele.

Como não me canso de afirmar (e de repetir nos m/ escritos), uma sociedade moderna é, "apenas", um Estado de Direito com um sistema de pagamentos a funcionar menos mal. Consequência inevitável de uma sociedade de base contratual.

A precisão, agora. O que se diz por aí, com alarme, é que o contribuinte vai ter de desembolsar uns EUR 3 mil Milhões para tapar o buraco que as pseudo swaps já abriram, ou vão abrir não tarda nada. Como escrevi nas duas Caturrices, uma swap de taxa de juro nunca implica desembolsos adicionais. O único desembolso que exige (no decorrer do respectivo prazo, diga-se) é a componente juros (o cupão de taxa fixa) do serviço da dívida (até o reembolso do capital é feito directamente pelo mutuário ao mutuante, sem qualquer intervenção da contraparte no swap de taxa de juro). Isto nada tem a ver com a contabilidade por natureza (resumida na Demonstração de Resultados), mas com a Tesouraria (resumida na Demonstração dos Movimentos de Tesouraria - que, por cá, numa demonstração de subdesenvolvimento teórico e de fraco domínio da língua inglesa, se popularizou como Demonstração dos Fluxos de Caixa).

O reconhecimento contabilístico de um swap pode muito bem ser feito em mark-to-market, o que não é exactamente o mesmo de se movimentar o cupão original (no caso, o cupão com taxa indexada) nos Resultados Financeiros, e as diferenças para o cupão de taxa fixa nos Resultados não Recorrentes (ou Extraordinários, como por cá se diz). Proceder assim levar-nos-ia a contabilizar, por exemplo, a perda de matérias primas num incêndio como um custo directo (matérias primas consumidas), e a indemnização correspondente nos tais Resultados não Recorrentes. Pelo contrário, exige o cálculo e recálculo do preço teórico do swap nas datas de relato (o que nem sequer é complicado).

É que a prática contabilística em Portugal não tem uma qualidade por aí além. Desde logo porque está orientada para o apuramento de matérias colectáveis, não para proporcionar uma visão razoável:

(i)               Da situação patrimonial das empresas;

(ii)            Das variações ocorridas nesses patrimónios;

(iii)          Do que causou essas variações. A diferença entre o cupão de taxa fixa e o cupão de taxa indexada, seja ela qual for, é tema para uma

 

Nota Explicativa, sem reflexo na Tesouraria, nem na situação patrimonial da parte coberta (a tal que se obrigou a pagar o cupão da taxa indexada).

Foi o repetido anúncio de que há mais EUR 3 mil Milhões a pagar que me levou à conclusão de que o corpo do delito seriam as swaptions - e nestas, as empresas públicas a subscreverem opções (e a suspeitar porquê).

Infelizmente, um dos responsáveis (assim referido nos jornais) é um amigo meu que eu tenciona entrevistar mal a tormenta acalmar.

Se o BdP tivesse largado, por um momento, a contabilidade por natureza e olhasse para a Demonstração dos Movimentos de Tesouraria, garanto-lhe que o caso BPN nunca teria chegado ao ponto a que chegou. E digo-lhe isto com conhecimento de causa porque várias vezes alertei Administradores do BPN para o descontrolo da Tesouraria e da Gestão de Liquidez, a partir da análise das Demonstrações Financeiras que o BPN publicava anualmente (nunca trabalhei no BPN, nem nunca fui consultor do BPN; limito-me, desde 2001, a analisar os Bancos portugueses na óptica da exposição ao risco e da suficiência de Capitais Próprios).

Agora, a "deixa" é dos advogados e jurisconsultos. E porque não daqueles que aconselharam as empresas públicas? Suspeito que tiveram o cuidado de deixar "portas da traição".

 A. Palhinha Machado

AINDA AS SWAPOPTIONS

 

 

Caro Amigo Dr. Salles da Fonseca:

 

A notável tese do Dr. Palhinha Machado que fiz circular entre a minha Direção foi republicada em  http://idp.somosportugueses.com/site/?p=6269

 

Deu origem a um longo e apoiado encómio de um membro da nossa direção, o advogado fiscalista, dr Paulino Brilhante Santos que será publicada a seguir no site do IDP, reforçando e elogiando a referida posição e que agora abaixo lhe envio

 

Solicito que a faça seguir para o Dr. Palhinha Machado que poderá ter mais elementos a acrescentar, contribuindo assim para um notável esclarecimento público deste sinistro caso da IIIª República.

 

Um abraço

 

 Mendo Henriques

 

 

Não poderia estar mais de acordo com a análise do Dr. A. Palhinha Machado. Caso os contratos celebrados pelas empresas públicas tivessem sido verdadeiros contratos de “swap” de taxas de juro visando a proteção dessas empresas dos riscos derivados da subida das taxas de juro indexadas à taxa de referência EURIBOR que teria servido de referência aos juros a pagar pelos empréstimos contraídos por estas empresas, certamente que estas teriam trocado – é isto que quer dizer um “swap”, uma troca, em bom português escorreito- as suas obrigações que venceriam juros calculados a uma taxa variável em função da evolução da dita taxa de referência EURIBOR por uma taxa fixa que passaria a ser aplicada a todos os seus empréstimos na data de vencimento dos juros dos mesmos.

 

Assim e como bem diz o Dr. Palhinha Machado, as empresas em questão teriam registado contabilisticamente como encargos financeiros em cada dado exercício financeiro- em Portugal coincidente com cada ano civil ou de calendário- o valor dos juros calculados a essa taxa fixa que teriam “trocado” pela taxa variável antes acordada nos seus contratos de empréstimo ou de financiamento. Sendo essa taxa fixa, por definição haveria sempre um limite para as “perdas” caso se verificasse a circunstância da evolução da taxa de referência EURIBOR ter sido, como foi, afinal, em sentido descendente, ao invés de em sentido ascendente, durante a maior parte do período de duração ou de maturidade dos empréstimos ou financiamentos contraídos por tais empresas públicas. Poderia, quanto muito, discutir-se o valor da taxa fixa “trocada” pela taxa variável, ou seja, poderíamos estar atualmente a discutir se estas empresas teriam feito um bom ou um mau negócio em termos de proteção do risco de taxa de juro que teriam contratado no âmbito dos agora famigerados contratos de “swap”. Uma taxa, por hipótese, de 20% ao ano, poderia considerar-se como um prémio de “seguro” contra um tal risco bastante excessivo na medida em que não seria previsível que a taxa de referência EURIBOR subisse tanto que valesse a pena pagar um tal prémio de “seguro” de montante assim tão elevado. Porventura, uma taxa de 10% ou 12% poderia ser considerada como um prémio de “seguro” contra o aludido risco de subida da taxa de juro variável calculada em função da taxa de referência EURIBOR mais aceitável ou até mesmo vantajoso para as empresas públicas que teriam visado a cobertura do mencionado risco financeiro.

 

Mas em qualquer caso, o Dr. A. Palhinha Machado tem toda a razão num ponto crucial: se estes contratos fossem verdadeiros contratos típicos de “swap” de uma taxa de juro variável por uma taxa de juro fixa, fosse qual fosse a taxa de juro fixa acordada que tivesse sido “trocada” por aquela taxa variável, o valor dos encargos financeiros para as empresas públicas derivados dos seus empréstimos e outros financiamentos assim “seguros” contra o risco financeiro derivado de uma possível escalada das taxas de juro a cobrar pelos seus credores em função da subida da taxa de referência EURIBOR seria sempre um valor exato e perfeitamente conhecido desde o momento da celebração dos ditos contratos de “swap”. Nessa medida, o montante de encargos financeiros em apreço nunca poderia estar em situação de uma subida permanente, contrariamente ao que se diz dos pretensos contratos de “swap” que se alega que as empresas públicas maioritariamente de transportes terão celebrado.

 

Em termos contabilísticos, porém, creio que a questão poderá ser um pouco mais complexa do que foi apresentada pelo Dr. A. Palhinha Machado, na medida em que o Sistema de Normalização Contabilística (SNC) em vigor veio a consagrar o princípio da contabilização dos elementos ativos e passivos na base da regra do “mark-to-market” ou do critério do “justo valor” de mercado. Nesta senda, o artigo 49º nº 1 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), embora com muitas ambiguidades e exceções, parece admitir a contabilização por aplicação do critério do “justo valor” dos rendimentos e gastos relativos aos denominados instrumentos derivados, entre os quais poderíamos incluir os contratos de “swap”. Porém, isto não invalida a conclusão anterior no sentido de que, mesmo com um possível reflexo contabilístico na Conta de Resultados, ou seja, mesmo admitindo a existência de perdas resultantes da diferença entre o montante de encargos financeiros que as empresas públicas pagariam se os mesmos se mantivessem calculados a uma taxa de juro variável e o seu valor calculado a uma taxa de juro fixa calculada por força da celebração dos contratos de “swap”, como dissemos anteriormente, caso tais contratos fossem verdadeiros e puros “swaps” de taxas de juro, tais perdas seriam sempre de antemão conhecidas e reconhecidas. Assim, as ditas perdas nunca poderiam, contrariamente ao que rezam as notícias recentemente vindas a público oscilar e aumentar a cada mês que vai passando. Tais perdas ficariam, também elas, fixadas e definitivamente apuradas, com a celebração dos contratos de “swap”. O que ocorreria é que teriam depois de ser ou alocadas a cada um dos exercícios fiscais pertinentes ou reconhecidas no momento em que terminem os contratos e se encerrem as respetivas posições ativa e passiva dos respetivos outorgantes- ou seja, no momento do denominado closing dos contratos. Por outras palavras, haveria sempre, em qualquer caso, um limite para as perdas a registar, ao invés deste propalado prejuízo constante e ilimitado que tem sido ventilado na praça pública.

 

Em qualquer caso, concorda-se inteiramente com o Dr. A. Palhinha Machado quanto à nulidade dos contratos celebrados que sejam caraterizáveis como “swaptions”. Estes contratos de “swaps” “exóticos” não são aceitáveis á face nem da legislação que regula as empresas públicas contratantes nem dos respetivos estatutos. O banco Santander Totta e o J P Morgan estão a fazer um gigantesco “bluff”, alimentado por certos “comentadores” ignorantes ou intencionalmente a soldo da alta finança que afirmam que estes contratos são legais face à lei inglesa que os governa e que, como são sujeitos a arbitragem ou a tribunais britânicos, a posição das empresas públicas e do Estado é muito débil. Nada poderia estar mais errado. Segundo a lei portuguesa, a denominada “lei pessoal” de uma qualquer empresa, sociedade ou pessoa coletiva, ou seja, a lei que a rege, que lhe confere personalidade e capacidade jurídica e que define imperativamente o que estas entidades jurídicas podem e não podem fazer, é sempre e exclusivamente a lei portuguesa. Ora, a denominada “lei pessoal” constitui o que se designa juridicamente por uma regra ou norma “de ordem pública”, não podendo ser afastada pela lei reguladora de qualquer contrato. Assim sendo, como inequivocamente é, qualquer sentença arbitral ou de um qualquer tribunal britânico ou estrangeiro que não aplique a lei portuguesa quanto à capacidade das empresas públicas poderem ou não ter outorgado contratos de “swaptions” ou de “swaps” exóticos com opções incorporadas é totalmente nula e de nenhum efeito e jamais poderá ser reconhecida e executada em Portugal por ofensa de um preceito e princípio “de ordem pública” do ordenamento jurídico português. E concordamos inteiramente com o Dr. A. Palhinha Machado quando afirma que à face da “lei pessoal” que rege as empresas públicas que celebraram estes contratos de “swaps” exóticos, as empresas públicas em apreço careciam em absoluto de legitimidade e de capacidade jurídica para outorgarem negócios deste tipo já que os mesmos não se coadunam com os seus propósitos legais nem com os seus objetos sociais. Donde, tais contratos são nulos e de nenhum efeito à luz da “lei pessoal” das empresas públicas outorgantes e, logo, inválidos e inaplicáveis em Portugal. Qualquer decisão arbitral ou judicial estrangeira que vá contra uma tal conclusão não pode ser reconhecida nem executada em Portugal sendo, ela mesma, inválida, ilegal, nula e de nenhum efeito, ferida como estaria, como dissemos, do vício de violação de princípio e de norma essencial de ordem pública da lei portuguesa.

 

Convém referir, a terminar, que a natureza de “swaptions” ou de “swaps” exóticas destes contratos bem intuída e presumida pelo Dr. A. Palhinha Machado está hoje já comprovada. Sabe-se, apesar de, incrivelmente, tais contratos se manterem secretos e fora do alcance público, que os mesmos possuíam cláusulas em que a taxa “trocada” estava indexada desde a índices bolsitas até outros “ativos subjacentes” exóticos, tais como, índices de mercadorias e até a taxa de referência LIBOR, ou seja, a taxa interbancária de referência da Libra Esterlina Britânica!

 

Eis o que, corroborando no essencial, a brilhante análise do Dr. A. Palhinha Machado, o que se nos oferece dizer por ora, na impossibilidade que também muito lamentamos, de analisar ao menos um ou dois dos famigerados contratos pretensamente de “swap”.

 

Face ao acima exposto, temos também sérias e fundadas dúvidas que exista sequer algum contrato que seja um verdadeiro e puro contrato de “swap”, pelo que a distinção que tem sido feita entre “swaps” que seriam “especulativos” e “swaps” de gestão de risco nos parece ser altamente duvidosa, para dizer o mínimo. Aliás, a Senhora Secretária de Estado do Tesouro, enquanto Diretora Financeira da REFER e sua Administradora, parece ter caucionado justamente a celebração de alguns desses contratos cuja taxa variável teria sido trocada por uma taxa indexada a índices exóticos e altamente especulativos do tipo dos acima referidos, pelo que a sua manutenção no Governo se afigura difícil de entender.

 

Há ainda duas questões em aberto que nos parecem excepcionalmente graves. A primeira tem que ver com contratos pretensamente de “swaps” do mesmo tipo que segundo consta o Governo anterior parece ter obrigado os concessionários de muitas PPPs a celebrar e que poderão ocultar avultadíssimos prejuízos para o Estado, situação que ainda nem sequer terá sido investigada devidamente, contrariamente ao que deveria e com a máxima urgência. A segunda tem que ver com o verdadeiro impacto desta situação, ou seja, saber se as suas consequências serão meramente económicas- como dissemos atrás, parece-nos que as empresas públicas em causa poderão ter mesmo de contabilizar perdas decorrentes destes contratos anómalos- ou se serão também financeiras, quer dizer, se no termo – ou closing – destes contratos, as empresas envolvidas terão mesmo de pagar aos bancos em efetivo ou em dinheiro a diferença correspondente a tais perdas económicas assumidas nos seus Balanços (ou não, dependendo da interpretação das regras contabilísticas aplicáveis, embora pessoalmente nos inclinemos a pensar que tais perdas irão com a maior probabilidade ter de ser levadas a resultados, restando apenas saber se tal deverá ocorrer numa base anual ou apenas no exercício de closing dos contratos). É que para o erário público não seria de todo em todo indiferente saber se estaremos perante uma questão meramente económica ou também face a um problema de ordem financeira e mesmo de liquidez ou cash-flow para a Fazenda Pública.

 

 Paulino Brilhante Santos

ELEIÇÕES LIVRES

 

 

Em Portugal há alguns milhões de cidadãos que poderiam exercer o cargo de primeiro-ministro. Seja antecipadamente ou no tempo regulamentar, vamos ter eleições para esse importante cargo, o cargo de que depende muito o progresso ou o afundamento dum país.

 

Como quase todos os portugueses clamam que vivemos em democracia e têm, obviamente, eleições livres, os portugueses vão ter de decidir quem é a pessoa que consideram melhor para dirigir o governo de Portugal.

 

Eu costumo jogar no Euromilhões. Sei que as probabilidades  de ganhar um prémio significativo são ínfimas. Mas, porque esse dinheiro ajuda a Misericórdia e porque, apesar dessas ínfimas probabilidades, há uma remota possibilidade de ganhar um prémio significativo, todas as semanas gasto nisso alguns euros.

 

Vamos supor que  em Portugal havia um concurso semelhante em que o jackpot era a eleição do primeiro-ministro. Atendendo ao número de cidadãos que poderiam servir para exercer esse cargo, as probabilidades de alguém acertar não são muito altas, embora as do Euromilhões sejam bastante mais baixas.

 

Por razões que não sei explicar, certamente uma inspiração superior – o sobrenatural ainda nos escapa completamente – eu tive um forte palpite que me dá a ideia de poder concorrer  a esse concurso apenas com dois boletins. Esse palpite diz-me que, entre todos os cidadãos, a maioria dos portugueses vai considerar que os melhores para exercer o cargo de primeiro-ministro, para uns será Pedro Passos Coelho e, para outros será António José Seguro. Se o meu palpite estiver certo e se as eleições fossem agora, bastava-me concorrer com dois boletins para ter a certeza de ganhar. Se preencher só um boletim, arrisco-me a perder.

 

Que pena que eu tenho de não ter a mesma inspiração superior em relação à chave do Euromilhões pois aí também tenho toda a liberdade de escolher a que considero melhor! Até não me importava de fazer vinte ou trinta boletins.

 

 Miguel Mota

 

 

 

Publicado no Público de 28 de Abril de 2013

ACUDAM !

 

CUBANIZAÇÃO do BRASIL !

 

Ano da Graça de 1384. “Acudam ao Mestre que l’o querem matar!”

 

Assim começa a história da Dinastia de Aviz, em Portugal! A este chamado de Álvaro Paes o povo de Lisboa acudiu e aclamou D. João, Mestre de Aviz, como regedor e defensor do Reino, e a seguir Rei de Portugal.

 

Livrou-se assim o país da traição que a Raínha D. Leonor Teles estava prestes a cometer, permitindo que Castela entrasse e absorvesse Portugal. A sua única filha era casada com o Rei de Castela!

 

Inúmeras vezes tenho afirmado o quanto é bom o povo brasileiro. Está na hora de se unir e não permitir que lhe matem a, agora, frágil democracia! Amável que só ele, o povo, a quem os “podres”, perdão, os “poderes”, têm mantido em violenta segregação, enganando-o com promessas e ilusões sem na verdade o educarem e instruirem. Criam leis em cima de leis, tudo para levar o país a uma cubanização, ou tipo Venezuela, ou Equador ou até como a desgraçada Argentina, enfim, para que o famigerado pt possa continuar a governar-se.

 

Não se governa o Brasil desde que o pt tomou conta das contas do país. Mas os “poderes” têm-se governado à farta.

 

Roubaram, continuam a roubar, e uma parte da justiça, além de lenta parece ser altamente corrupta ou passiva.

 

Assistimos durante meses ao julgamento do ano, aliás do século, talvez mesmo da história do país, o famoso Mensalão. O povo aplaudiu o Presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, que se portou de forma impecável. E os ladrões, os mais influentes elementos do pt foram condenados.

 

Mas...

 

Condenados foram, o pt irritou-se, os “ofendidos” insultaram o Presidente do STF, e agora surge mais um ataque inadmissível: o pt, apresentou ao congresso, que domina, uma proposta para submeter ao congresso as decisões da justiça!!! E já recebeu a aprovação da anedoticamente chamada “CCJ”, “comissão de constituição e justiça”! Será é o nicho dos “Condenados pela Constituição e pela Justiça”!

 

Como é de calcular a proposta foi aprovada quando no plenário estavam somente 20 deputados, quando o total é de 513!

 

Cubanização! Stalinismo!

 

Os orgãos de informação já chamam a esta covardissima manobra de “Brincando de desmontar a ordem institucional” e continua “Uma proposta “aloprada” da CCJ da câmara deixa à mostra a leviandade com que certos projetos são arquitetados.”!

 

O Brasil já esteve tão perto de ser uma democracia consolidada e respeitada! Agora parece querer caminhar a passos largos para uma ditadura, não proletariado, mas do “ladroáriado”!

 

Não admira que se vivam momentos de tamanha gravidade; tanto o presidente do senado, quanto o da câmara dos deputados, são ambos réus condenados pela justiça, amigos íntimos do ex-atual-presidente e da dona presidenta!

 

Largar da mão lugares de tamanha importância e responsabilidade, não largam de jeito nenhum e ainda são apoiados pelos restantes comparsas! O autor da proposta, um suplente, agora grita que se deve o Exército para prender os juizes do Supremo! Não estão loucos, não. Os olhos estão raiados de ganância e raiva.

 

E o povo, redil de cordeiros mansos, vai deixando os lobos famintos usarem e abusarem, e ainda aplaude o desempenho da dona presidenta, que não tem a menor noção do que seja conduzir um país.

 

Outra pedra no sapato dos pt’istas é a liberdade de imprensa. Há anos que estudam um método de impôr o silêncio a quem os pode vigiar! Gastam fortunas com alguns órgãos de informação – jornais, rádios e Tv, fora os dos governos – para esconderem casos e mais casos de descaso e banditismo!

 

E ainda há universidades que conferem aos que desonram o país a honra de Honoris Causa, em honra de quê?

 

Se por um acaso a dona presidenta e o vice estiverem impedidos de presidir – viagem, acidente, doença, etc. – já imaginaram o que seria o Brasil ser representado pelos presidentes da camara federal ou do senado, ambos com cadastro e penalidades condenados pela justiça.

 

Que país é este?

 

O livro “Sobre el Cielo y la Tierra” escrito pelo Cardeal Bergoglio, hoje o admirado Papa Francisco, em conjunto com o seu amigo, o Rabino Abraham Skorka, dá-nos algumas máximas que se podem aplicar ao sem vergonhismo que por aqui reina.

 

- “Cuidado, afasta-te de todo aquele que pretende conquistar o teu coração e ter-te em sua mão dominando a tua mente e a tua vontade. (Rabino)

- Se fazes espectáculo do teu poder não és um verdadeiro lider, mas uma mentira. (Rabino)

- As massas sonham com salvadores que hão-de resolver todos os seus problemas e angustias, feitos utilizados por génios do mal que seduzem, conquistam as suas mentes e corações para conduzi-las a seu belprazer. (Cardeal)

- A única defesa para que o público não permita uma liderança nefasta é a educação. (Cardeal)

- Um país é um território; a nação, uma estrutura, jurídico-social para se ordenar, e a pátria um legado do passado. (Rabino)

- Se uma pessoa aguenta sem lutar pelos seus direitos pensando no Paraíso, efectivamente está debaixo dos efeitos do ópio! E diz o Talmud que no futuro o homem terá de dar explicações por todos os belos frutos que viu e não provou.

- Os céus são os céus do Senhor, e a Terra foi dada aos homens. Tem que se procurar viver sempre em equilibrio; se saímos desse equilibrio, estamos perdidos.

- Uma das teses básicas que aparecem nas sagradas escrituras é que não pode haver uma estrutura de sociedade, de povo, de nação – incluindo o Estado – que não tenha uma forte componente ética.

 

 

Ao ler e meditar sobre estas passagens a mente baralha-se ao ver tamanha demagogia, tanta mentira, nos shows pré e post eleitorais, deixando o povo inculto pasmado perante um enganador, um falso messias, sem conseguir lutar pelos seus direitos e até por alimentos, sabendo-se que o Brasil exporta milhões de toneladas de alimentos e uns 13 milhões de brasileiros ainda passam fome, porque não se criam condições de dignidade, trabalho e se distribuem esmolas para comprar votos.

 

Por fim: onde está a ética? Que ética? Vêm-se ministros, deputados, senadores, governadores, etc. numa porcentagem elevadissima, condenados na justiça por crimes de toda a ordem, mas que conseguem adiar o andamento dos processos até que prescrevem. Outros há que condenados a 10, 20 e mais anos de cadeia continuam a “representar” o povo na câmara dos deputados.

 

O povo está sob o efeito do ópio da incultura.

 

Para, se, um dia chegar a ser um país de equilibrio social e ético, não vale a pena fingirmos que pouco falta.

 

Falta muito. A educação de pais para filhos, o exemplo de honestidade, de ética, o sacrifício de representar o povo nas assembleias e não fazer disso um modo de rápido enriquecimento... vai ter que esperar ainda mais um século? Infelizmente, talvez.

 

Rio de Janeiro, 27/04/2014

 

 Francisco Gomes de Amorim

L’ENFER, EST-IL EXOTHERMIQUE OU ENDOTHERMIQUE?

 

 

Voici la version d'une question "bonus" de chimie posée à l'Université de Nanterre.

 

La réponse d'un étudiant a été si loufoque que le professeur l'a partagée avec ses collègues, via Internet, et c'est pourquoi vous avez le plaisir de la lire ....

 

Question Bonus: «L'enfer est-il exothermique (1) ou endothermique (2)»

(1) : évacue la chaleur ; (2) : absorbe la chaleur

 

La plupart des étudiants ont exprimé leur croyance en utilisant la loi de Boyle (si un gaz se dilate il se refroidit et inversement) ou ses variantes.

 

Cependant, un étudiant eut la réponse suivante:

 

 

Premièrement, nous avons besoin de connaître comment varie la masse de l'enfer avec le temps. Nous avons besoin de connaître à quel taux les âmes entrent et sortent de l'enfer.

 

Je pense que nous pouvons assumer sans risque qu'une fois entrées en enfer, les âmes n'en ressortiront plus. Du coup aucune âme ne sort.

De même pour le calcul du nombre d'entrées des âmes en enfer, nous devons regarder le fonctionnement des différentes religions qui existent de par le monde aujourd'hui.

 

La plupart de ces religions affirment que si vous n'êtes pas membre de leur religion, vous irez en enfer. Comme il existe plus d'une religion exprimant cette règle, et comme les gens n'appartiennent pas à plus d'une religion, nous pouvons projeter que toutes les âmes vont en enfer...

 

Maintenant, regardons la vitesse de changement de volume de l'enfer parce que la Loi de Boyle spécifie que « pour que la pression et la température restent identiques en enfer, le volume de l'enfer doit se dilater proportionnellement à l'entrée des âmes ». Par conséquent cela donne deux possibilités:

 

1) si l'enfer se dilate à une moindre vitesse que l'entrée des âmes en enfer, alors la température et la pression en enfer augmenteront indéfiniment jusqu'à ce que l'enfer éclate.

 

2) si l'enfer se dilate à une vitesse supérieure à la vitesse d'entrée des âmes en enfer, alors la température diminuera jusqu'à ce que l'enfer gèle.

 

Laquelle choisir ?

 

Si nous acceptons le postulat de ma camarade de classe Jessica m'ayant affirmé durant ma première année d'étudiant « Il fera froid en enfer avant que je couche avec toi », et en tenant compte du fait que j'ai couché avec elle la nuit dernière, alors l'hypothèse doit être vraie. Ainsi, je suis sûr que l'enfer est exothermique et a déjà gelé … Le corollaire de cette théorie c'est que comme l'enfer a déjà gelé, il s'ensuit qu'il n'accepte plus aucune âme et du coup qu'il n'existe plus... Laissant ainsi seul le Paradis, et prouvant l'existence d'un Etre divin ce qui explique pourquoi, la nuit dernière, Jessica n'arrêtait pas de crier "Oh.... mon Dieu !...."

 

(Cet étudiant est le seul ayant reçu la note 20/20)

 

Recebido por e-mail; Autor não identificado

MENOS ESTADO, MELHOR ESTADO

 

Esta altura do ano é talvez aquela em que se fala mais de política, também talvez, porque a comemoração do 25 de Abril e a proximidade do 1º de Maio, a isso convidem.

 

Porém, o debate é, a maior parte das vezes, enviesado. Há questões que não se debatem, porque para muitos, que se sentem donos do Estado, se trata de conquistas civilizacionais irreversíveis. O resultado tem sido o aumento de peso do Estado e a sua intromissão em assuntos que não lhe dizem respeito e para os quais esta intervenção não tem hipóteses de ser adequada.

 

O resultado da omnipresença do Estado, para além de caro, como agora constatamos, é muitas vezes totalmente ininteligível. A intenção é seguramente boa, mas a inteligibilidade é uma pré-condição da verdade.

 

 Pedro Aguiar Pinto

CHORAI ARCADAS

 

Enviou-me o meu filho Ricardo o e-mail seguinte:

«NABUCCO – Momento dramático na ópera de Roma»

No dia 12 de Março de 2011, a Itália festejava os 150 anos da sua unificação, ocasião em que a Ópera de Roma apresentou a ópera Nabuco de Verdi, símbolo da unificação do país, que invoca a escravidão dos Judeus na Babilónia, uma obra não só musical mas, também, política à época em que a Itália estava sujeita ao império dos Habsburgos (1840). A apresentação era dirigida pelo maestro Ricardo Mutti.

 

Antes da apresentação o prefeito de Roma, Gianni Alemanno – ex-ministro do governo Berlusconi, discursou, protestando contra os cortes nas verbas da cultura, o que contribuiu para politizar o evento. Como Mutti declararia à TIME, houve, logo de início, uma ovação incomum, clima que se transformou numa atmosfera de tensão quando se iniciaram os acordes do coral «Va pensiero» o famoso hino contra a dominação.

 

Há situações que não se podem descrever, mas apenas sentir; o silêncio absoluto do público, na expectativa do hino; clima que se transforma em fervor aos primeiros acordes do mesmo; a reacção visceral do público quando o coro entoa - 'Ó minha pátria, tão bela e perdida'». Ao terminar o hino os aplausos da plateia interrompem a ópera e o público manifestou-se com gritos de «bis», «viva Itália», «viva Verdi». Das galerias são lançados papéis com mensagens políticas. Não sendo usual bisar durante uma ópera, e embora Mutti já o tenha feito uma vez em 1986, no teatro La Scala de Milão, o maestro hesitou pois, como ele depois disse: «não cabia um simples bis; havia de ter um propósito particular». Dado que o público já havia revelado o seu sentimento patriótico, o maestro voltou-se no púlpito e encarou o público. Fazendo-se silêncio, pronunciou-se da seguinte forma, e reagindo a um grito de «longa vida à Itália» disse

RICCARDO MUTTI: «........Sim, longa vida à Itália mas... [aplausos]. Já não tenho 30 anos e já vivi a minha vida, mas como um italiano que percorreu o mundo, tenho muita mágoa do que se passa no meu país. Portanto aquiesço ao vosso pedido de bis para o Va Pensiero. Isto não se deve apenas à alegria patriótica que senti em todos, mas porque nesta noite, enquanto eu dirigia o coro que cantava 'Ó meu pais, belo e perdido', eu pensava que, a continuarmos assim, mataremos a cultura sobre a qual assenta a história da Itália. Neste caso, a nossa pátria, será verdadeiramente 'bela e perdida. (aplausos retumbantes, incluindo os dos artistas em palco) Reina aqui um 'clima italiano'; eu, Mutti, falei para surdos durante longos anos, gostaria agora.... nós deveríamos dar sentido a este canto; como estamos em nossa casa, o teatro da capital, e com um coro que cantou magnificamente, e que é magnificamente acompanhado, se for de vosso agrado, proponho que todos se juntem a nós para cantarmos juntos.... "A tempo"...»

 

Foi assim que Mutti convidou o público a cantar o Coro dos Escravos. O público levantou-se. Toda a ópera de Roma se levantou... O coro também se levantou. Foi um momento magnífico na ópera! Vê-se, também, o pranto dos artistas. Aquela noite não foi apenas uma apresentação do Nabuco mas, sobretudo, uma declaração do teatro da capital dirigida aos políticos.

 

AGORA, NÃO DEIXEM DE VER E OUVIR PELO LINK ABAIXO:

 

http://www.youtube.com/embed/G_gmtO6JnRs»

 

Foi o que fiz imediatamente, relembrando momentos passados em Moçambique, em que escutava, mais do que agora, os discos dos compositores clássicos e não só, e este, em especial, que ia entoando enquanto limpava o pó dos móveis. A dispersão de agora por tantos meios de diversão não acompanha os motivos da nossa saudade desses tempos tão ricos em experiências de trabalho, família e lazer, embora rodeados que estamos dos meios logísticos que a ânsia do conhecimento fez obter, mas que outras motivações levam, quantas vezes, a abandonar.

 

Do Coro dos Escravos Hebreus “Va pensiero” do III Acto da ópera Nabucco de Verdi, extraio a letra da Internet que traduzo e escuto, com as lágrimas que choraram as mulheres do coro apresentado no espectáculo da Ópera de Milão referido no e-mail. Choravam a sua Itália degradada por um governo em crise económica, em 2011, ou em dependência do Império austro-húngaro, 150 anos antes, como os escravos hebreus chorariam no seu cativeiro de Babilónia. Comovente cena, acompanhando um expressivo e tão belo coro de mágoas num compasso de cansado andamento e apelo à coragem, de apelo político, no caso italiano. De apelo político no nosso caso, caso queiramos rever, no YouTube apontado:

 

Vai, pensamento, sobre as asas douradas,

Vai e pousa sobre as encostas e as colinas

Onde os ares são tépidos e leves,

Os ares doces do solo natal.

Saúda as margens do Jordão,

E as torres derribadas do Sião.

Oh, minha pátria tão bela e perdida!

Oh lembrança tão cara e fatal!

Harpa dourada dos vates fatídicos,

Porque dos salgueiros pendes emudecida?

As lembranças no peito reacende,

Fala-nos do tempo que foi!

Ou do destino de Jerusalém,

Traz-nos um som triste de lamento

Ou que o Senhor te inspire um alento

Que coragem nos dê no sofrimento

 

Não, não temos um coro assim, simples e belo. Em termos de lamento, além do fado e da plêiade de poetas que exprime o mundo da dor íntima ou mesmo alheia, e da crença no sebastianismo salvador, em tempo de crise, temos o jogo fónico de sugestão pictural e melódica, própria do simbolismo, no bonito poema de Camilo Pessanha, extraído de “Clépsidra”, publicada em 1920:

 

Chorai arcadas

Do violoncelo!

Convulsionadas,

Pontes aladas

De pesadelo...

De que esvoaçam,

Brancos, os arcos...

Por baixo passam,

Se despedaçam,

No rio, os barcos.

Fundas, soluçam

Caudais de choro...

Que ruínas, (ouçam)!

Se se debruçam,

Que sorvedouro!...

Trémulos astros,

Soidões lacustres..._

Lemes e mastros...

E os alabastros

Dos balaústres!

Urnas quebradas!

Blocos de gelo..._

Chorai arcadas,

Despedaçadas,

Do violoncelo.

 

Também Álvaro de Campos nos atribui o papel de escravos. Mas fá-lo com desmedido orgulho, e com, paradoxalmente, o desalento intenso de um sentir de nulidade e vacuidade que é toda a sinfonia do extraordinário poema “Tabacaria”:

 

Escravos cardíacos das estrelas,

Conquistámos todo o mundo antes de nos levantar da cama;

Mas acordámos e ele é opaco,

Levantámo-nos e ele é alheio,

Saímos de casa e ele é a terra inteira,

Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

 

Mas a nossa escravatura é bem outra, presos que estamos nas lianas da nossa inconsciência cívica, com consequências fatais sobre a nossa perda de identidade.

 

 Berta Brás

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