No seu curioso livro “OFenómenodasAparições” (1974), Erich von Däniken, apreciado escritor católico suíço, mencionou que a primeira aparição de Nossa Senhora a uma belga ocorrera em 1449, portanto mais de quatro séculos antes das aparições da Virgem Maria em La Salette, Lourdes e Fátima. Posteriormente a Mãe de Jesus tem aparecido ao longo do século XX na Europa (v.g. Carabandal, na vizinha Espanha, em 1961), no Cairo (Egipto, em 1968) e, nos nossos dias, em Medjugorje (Bósnia Herzgovina) sempre com mensagens e avisos aos homens para respeitarem a vontade de seu divino Filho. Estava-se no dia de São João Batista, a 24.06.1981, em Medjugorje.
Afonsina Mumureke
Decorridos uns cinco meses, a Virgem Maria apareceu aos 28.11.1981 pelas 12.35 hrs. na sala de jantar da Escola de Kibeho, no Ruanda, a três moças: Afonsina Mumureke (17 anos), Natália Mukamamazimpaka (20 a.) e Maria Clara Mukagango (21 a.). Fez-se anunciar à Afonsina que ela era a Mãe do Mundo com a recomendação de se manter calma tendo em atenção suas orações e de se portar com uma firmeza da Fé juntamente com suas amigas. Seguiram-se outras aparições da Virgem Maria à Natália, de Janeiro de 1982 a 03.12.1983, e à Maria Clara, durante seis meses de Março a Setembro de 1982. Afonsina foi Secretária da Diocese de Gikongoro, criada em 1992. Natália ocupava-se em obras sociais e religiosas da paróquia de Kibeho, fundada em 1934, na Diocese, a 160 km da capital Kigali e a 20 km do Burundi. Quanto à Maria Clara, era professora primária, depois casou-se com Elias Ntabadahiga, jornalista dos Serviços de Informação do Ruanda, ambos trabalhando em Kigali e vivendo no bairro urbano de Gatsaka.
Maria Clara Mukagango
As aparições do Ruanda chamaram a atenção do mundo e foram declaradas credíveis pela Igreja de Roma. Em 1990, o Papa João Paulo II visitou o Ruanda e na ocasião exortou o povo Ruandês a se recorrer à Virgem Maria, como sua protectora e guia; ao mesmo tempo recomendou ao povo o espírito de reconciliação evitando as lutas políticas e étnicas. Nem por isso a trágica hecatombe deixou de asssolar o Ruanda com o mais monstruoso genocídio de um milhão de mortos no acervo de num frenesi de ódio e de vingança traduzido em lutas e guerrilhas mútuas. De Roma deslocou-se ao Ruanda o Cardeal Crescêncio Sepe, Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos a fim de consagrar o Santuário de Nossa Senhora das Sete Dores aos 31.05.2003. Este Santuário recebe anualmente milhares de peregrinos com toda a unção religiosa e com o melhor aparato, como tradicionalmente verifica-se em Fátima, Guadalupe ou Lourdes. Com sua inauguração as lutas fratricidas desapareceram e o espírito de arrependimento e de reconciliação estão hoje em bom caminho.
Toda a empolgante história das aparições da Virgem Maria no Ruanda não deixa de tocar-nos no fundo do coração, particularmente a quem em 1968 na Nota Preambular ao seu estudo “ O Chá na Economia da República do Ruanda “ (1968) havia focado os ódios tribais da população do Protectorado de Ruanda-Burundi entregue à Bélgica no final da I Grande Guerra, sem nunca ter em conta os hábitos e costumes tribais, que os tornaram tão estruturalmente divergentes e antagónicos. Voltarei a debater o assunto.
Sanado o ambiente político-administrativo do Ruanda, resta apontar o desfecho final das três videntes ruandesas. A mais nova, chamada Afonsina, escapou da morte refugiando-se no Presbitério da Diocese de Gikongoro, donde passou para Bukavo (Congo-Zaire) e daí seguiu para Abidjan (Costa de Marfim) para estudos secundários e superiores como Bacharel em Teologia (2003) e acabou por professar como Irmã Afonsina da Gloriosa Cruz. A vidente Natália refugiou-se por seis meses em Bukavo (Congo-Zaire), mas regressou a Kibeho-Ruanda para tomar conta de centenas de órfãos (bebés, crianças e jovens), mulheres e filhos dos feridos, aleijados e de religiosos de ambos sexos da Paróquia, tendo em atenção a especial incumbência recebida da Virgem Maria. A vidente Maria Clara e seu marido jornalista faleceram vítimas dos massacres de 1994/95.
II
Os líderes políticos do Ruanda advogaram seu desligamento do Protectorado como um povo independente e senhor do seu próprio destino. Em 1968 o Protectorado era habitado por três etnias diferentes, fundamentalmente antagónicas: Hutus (85%), Tutsis (14%) e Tuas (1%), com respectivas estaturas físicas medianas de 1,66 m, 1,75 m e 1,55 m (sendo aparentados do povo pigmeu Ituri). Durante séculos os Hutus, embora maioritários, foram escravos dominados pelos senhores feudais Tutsis mancomunados com os Tuas (pastoris, agricultores, carpinteiros, ferreiros, com hábitos ancestrais de povo guerreiro), enquanto os Hutus eram funcionários públicos, os Tutsis eram recrutados como agentes policiais e para-militares. Os Hutus ganharam, com o apoio dos Belgas, duas eleições populares, bem como a maioria na Assembleia Legislativa e o Governo Autónomo, mas os Tutsis não se conformaram e agitaram-se pela sua emancipação política com guerrilhas em 1960 e 1961, mais tarde degeneradas em genocídio monstruoso de Hutus e Tutsis, com um milhão de mortos, além de feridos, aleijados e mortos de fome, sem os géneros de consumo de primeira necessidade.
Eis a razão de ser do presente apontamento de quem nunca sonhara voltar a falar dum tema que enlutou a humanidade num acto de selvajaria. É uma verdade axiomática que é na pedra basilar do nosso passado que se assenta o edifício do presente e do futuro. Assim, foi com profunda fé nas aparições da Virgem Maria através do Planeta, que me dediquei a descrever as Aparições de Nossa Senhora das Sete Dores no coração do Continente Africano com todo o acervo da tragédia sofrida pelo povo ruandês.
Já alguma vez lhe aconteceu chegar ao fim da última página de um livro e voltar logo de seguida à primeira? Pois foi o que me aconteceu com este livrinho de apenas 103 páginas de texto. E fiz mesmo mais: reli também o prefácio para ter a certeza de que agora, sim, também ali, havia de saborear coisas que à primeira me pudessem ter escapado.
O livro tem um subtítulo que o identifica como «um breviário de Platão a Foucault» e reúne os prefácios que Sloterdijk fez para cada filósofo integrado numa obra algo monumental com os principais textos originais dos 19 Autores bibliografados. Ficaram de fora Heidegger e Adorno cujos herdeiros, detentores dos respectivos direitos, não permitiram a reprodução dos textos seleccionados. Herdeiros também têm temperamento, não só os filósofos.
Sem lermos, portanto, a dita obra monumental com os principais textos originais – sem comentários de comentário a comentários – ficamos com uma panorâmica extremamente interessante (e sintética) do pensamento europeu desde alguns séculos antes de Cristo (Platão viveu entre 427 e 347 a.C.) e o pleno século XX (Foucault viveu entre 1926 e 1984).
E porque não ouso comentar, limito-me a respigar algumas das frases que chamaram a minha atenção.
Platão
(...) a filosofia logo no seu início é inevitavelmente uma iniciação ao grande, ao maior, ao maior que tudo; apresentou-se como escola da síntese universal; ensina a pensar o múltiplo e desmedido numa totalidade boa; é a introdução a uma vida sob um progressivo peso intelectual e moral; julga estar à altura da oportunidade de corresponder à crescente complexidade do mundo e à soberania intensificada de Deus através do esforço constante para alargar as almas; convida a uma mudança para uma nova construção muitíssimo espaçosa para a casa do ser; quer fazer dos seus alunos habitantes de uma Acrópole lógica; desperta neles o impulso para se sentirem em casa nas sete partidas do mundo.
Santo Agostinho
A alma do augustianismo sóbrio está maculada por uma corrupção insanável. Por isso, o trabalho da recordação do bem supremo terminará no conhecimento desesperado de que ela nunca mais pode reencontrar, pelas suas próprias forças, a participação incólume na luz do bem. (...) o amor de Deus já não tem sequer o carácter de uma dedicação que afirma uma simpatia universal e incondicional mas sim o de um indulto fortemente selectivo, condescendente. (...) Na esfera augustiniana, mesmo os mais pios retêm até ao fim razões para duvidar da sua salvação.
Descartes
O que foi a Guerra dos Trinta Anos se não o combate de meras verosimilhanças que saltaram dos seminários teológicos para os campos de batalha? (...) Simboliza como ninguém a vitória do engenheiro sobre o teólogo.
Leibniz
O universalismo leibniziano significa a (...) sucessão tipológica do mago da Renascença no cientista universal, barroco. (...) conduzir estes impulsos “fáusticos”, cujas formas selvagens desembocavam em charlatanice (...) Onde estava a magia há-de estar a politecnia. (...) Leibniz, o último, o mais brilhante e mais frio dos doutores fáusticos, aplanou o caminho ao cortejo triunfal de uma ciência não fáustica
Kant
Civilidade significa pôr-se do lado civil entre filosofia monástica e filosofia civil (...) no sentido do republicanismo erudito (...) em que o homem kantiano é de raiz o companheiro de espécie e, nessa medida, cosmopolita. (...) Exige-se a todo o indivíduo racional que actue não só como membro útil da sua sociedade nacional como também que dê provas igualmente, e sobretudo, como funcionário da espécie dotada de razão. (...) Na sua religião civil os santos hão-de se tornar juristas e os heróis, parlamentares.
Fichte
O ofício de pregoeiro foi descoberto e justificado no princípio segundo o qual a aquisição da liberdade significa nada menos do que uma ressurreição dos mortos – daqueles mortos que continuamos a ser enquanto vegetamos na idolatria da realidade exterior. (...) como há-de ser bem sucedido o entendimento entre os vivos que estão bem vivos e os mortos que vão vivendo? Como é que os não alienados se hão-de dirigir aos alienados? (...) não terão os vivos de desesperar sempre dos mortos recalcitrantes? (...) A guerra civil entre o espírito filosófico e o senso comum é uma constante da história cultural da Europa antiga. Mas enquanto os antigos sábios se ocultavam em resignação da massa imutavelmente estúpida, têm os modernos, como iluministas, de passar ao ataque pedagógico. Fichte, o autor da sublime falácia segundo a qual a vida do género humano avança segundo um plano fixo que será alcançado porque deve e tem de ser alcançado.
Hegel
Se o espírito mete ombros à tarefa da sua dispersão através dos tempos, é porque só ao longo deles amadurece até ao fim dos tempos e acima do tempo. A nossa afeição ao provisório deve perecer até que tudo se tenha transformado em cinza e saber. (...) poderão intelectos finitos, num qualquer modo enfatuado, estar no fim? Poderão eles, com razões que sejam mais que presunções vaidosas, afirmar de si próprios que eles próprios anunciam e encarnam o fim? (...) Bem pode a maioria dos mortais prender-se ao provisório e vegetar até ao fim da sua existência na obscuridade e na obstinação (...) o reconhecimento de todos por todos estaria formalmente consumado através do acesso de todos ao estatuto da cidadania.
Schelling
(...) estava finalmente entre nós alguém que conhecia os segredos de Deus, a falar a partir do absoluto. (...) muitos houve que fitaram as suas peças de bravura com o olhar de lagarto da mediania serena. (...) No grandioso afastamento das grandiosidades impertinentes da razão, dá-se a conhecer a assinatura do pensamento contemporâneo e da filosofia do «ainda não».
Marx
Compreender as inspirações marxistas significa debruçar-se sobre a história espectral dos conceitos que, enquanto poder que se tornou Estado, espírito que se tornou técnica e dinheiro que tudo liga, sugam mais do que nunca a vida dos indivíduos. (...) O núcleo da sua crítica da economia política é necromancia.
Sartre
Explicável apenas pela sua liberdade, o homem é o ser sem perdão. (...) a Igreja católica foi um asilo para todos aqueles que se viram desprovidos de solo firme. (...) A vanguarda entre os absurdos anónimos que constituem o núcleo da modernidade (...) adquiriu um ponto de apoio sólido em atitudes e na vida talhada à medida da moda.
E porque o rol já vai longo, por aqui me fico. Outras frases bem interessantes poderia transcrever mas tiveram que ficar no tinteiro as de Aristóteles, Giordano Bruno, Pascal, Schopenhauer, Kirkegaard, Nietzsche, Husserl, Wittgenstein e Foucault.
Quer conhecê-las? Leia o livro completo e não se vai arrepender.
A verdade é que em tempos idos, e até hoje, encontramos nas altas rodas da sociedade regalias hierárquicas sociais, militares e políticas que se fazem notar e que são zeladas como relíquias. Mas o que nos conta Marcelino Lima no seu livro “Famílias Faialenses” é, no mínimo, de espantar.
O caso passou-se a 21 de Fevereiro de 1782, na ilha do Faial, entre o Juiz de Fora Dr. Manuel Garcia da Rosa e Francisco Inácio Soares de Souza, fidalgo que reclamava para si, pela origem e pela idade avançada, a primazia na chamada e assento nas sessões de vereação da Câmara.
Manuel Garcia da Rosa (n. 1749 e m. 1837) era sobrinho de Antonio Garcia da Rosa que emigrou para o Brasil e foi vigário na Igreja de Nossa Senhora da Glória, em MG, não se sabendo quando recebeu as ordens pastorais. Esse tio, no Brasil (1741), juntou forte cabedal. Ao voltar para os Açores, no Faial, tornou-se protector do sobrinho que desde pequeno mostrava grande aptidão para os estudos. Por isso, mais tarde, enviou Manuel para estudar em Coimbra, onde tirou a formatura em Direito. De volta à terra natal, foi nomeado Juiz de fora para o Faial. Homem íntegro, bondoso, porém pragmático, levava sua vida profissional e particular sempre com dedicação e minúcia.
Naquele dia, Manuel Garcia da Rosa, alto, esguio, peruca branca, encaracolada, vestido a rigor na sua casaca cor de canário, pontual, recebia com mesuras cada um que entrava no belo edifício de dois andares, que ficava na praça, esquina com a Ladeira de São João. O sinal de chamada já havia sido dado pela garrida que em cima do telhado repicava, anunciando notícias e solenidades que se passavam na comunidade. Os convidados chegavam pouco a pouco, em pequenos grupos ou isolados, para a abertura dos trabalhos na posse dos novos vereadores. Estes, perfilados, calçando sapatos de fivelas reluzentes, portando capas pretas, abertas pela frente, deixando os folhos das camisas brancas aparecerem, engomados, aguardavam a chamada solenemente. Em pé junto à cabeceira da mesa, o juiz se posicionava, segundo a norma, para ler a pauta de introdução dos novos vereadores.
Com voz pausada e firme, chamou o primeiro a tomar lugar:
- Manuel Inácio de Souza. Homem ilustrado, formado em Cânones pela Universidade de Coimbra, poeta, prosador, verve picante, sarcástica, tinha incontestável merecimento. Dono de vinhas, navios (6) e de uma das casas mais ricas e faustosas de seu tempo, tomou assento. O silêncio se fez geral... Uma agitação silenciosa aconteceu quando a plateia percebeu a quebra da etiqueta. Logo ali, na casa onde sempre se respeitou a ordem estabelecida e a hierarquia, a primeira cadeira era ocupada pelo mais credenciado e não pelo mais velho dos oficiais eleitos. Francisco InácioSoares de Souza, homem de estirpe, sangue azulado, fidalgo reconhecido e o mais velho de Casa sentiu-se lesado no seu direito. Após o juramento regulamentar, fez a sua reclamação. O juiz ouviu-o, mas não se comoveu, e dizendo que tudo que ele queria eram inúteis velharias e o que importava eram os títulos oficiais. Continuou a cerimónia. Porém, ao perceber o olhar fulminante do vereador acrescentou; se caso o vereador não concordasse, que recorresse às Cortes competentes. O que logo Francisco Inácio o fez. Mobilizou céus e mares e finalmente ganhou a questão. No final do ano, em 23 /12/1782, baixou uma provisão do Paço Real na Câmara declarando que o recorrente tinha o pleníssimo direito ao assento na primeira cadeira, conforme estatuía o antigo livro da Vereação.
Assim ficou resolvida a pendência entre o Juiz de Fora e o fidalgo mais velho da Vereação. Ganhou a lei das Ordenações sobre a qualificação. Francisco Inácio Soares de Souza pôde então dormir em paz, com a sensação de que se fez afinal justiça, no seu caso....
Em 8 de Janeiro de 2006, foi publicado no blogue “Quadratura do Círculo” um texto que, agora, passo a transcrever e que, com algum humor, dissertava sobre Economia. O próprio título era, disso, exemplo. Para vos falar da Economia do futuro, se é que a Economia tem futuro, inicio este tema com a transcrição das minhas palavras de então.
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“Teologia da Economia”
”Um livro aberto, um crânio e, na estante, a dupla
cavidade de vidro, com a sua armação delgada,
onde um pouco de areia, tirada da eternidade,
realiza o seu trânsito misterioso e sagrado,
exprimindo o tempo...”
Em ”A Montanha Mágica”,
Thomas Mann
Na sequência deste texto, e no contexto, Thomas Mann refere-se, ainda, a improvisações líricas que conduzem a uma sequência de associações estranhas.
E eis aqui os ingredientes para a elaboração de uma Teologia da Economia.
Temos um livro aberto e um crânio; parceria indispensável se viver dentro deste um cérebro filosofal e o livro estiver aberto em Salmos que cantem o Dinheiro, o Poder e o Povo.
A ampulheta é o recipiente onde a eternidade, corporizada em areia, percorre o misterioso e o sagrado exprimindo o tempo.
Eu escolheria escrever um douto “espremendo o tempo”. Para já não falar de outras espremidinhas que levamos...
Mas eu não sou o Thomas Mann.
E tal como ele, não estou a brincar com coisas sérias... Estou aqui, apenas, a fundamentar, uma Teologia, dado que temos uma Trindade (a atrás citada em Salmos) e sobressaem conceitos como misterioso e sagrado que fazem parte da religiosidade das coisas terrenas...
Nas improvisações “líricas” eu arranjaria um alguidar de barro bem vermelho e punha lá as ideias do Karl Marx e do Engels, do Adam Smith e do Keynes que misturaria bem com uma grande académica colher de pau, enfeitada de fitas de várias cores.
A mistura seria executada (não é executada que eu quero dizer! A língua portuguesa é muito traiçoeira) com movimentos vigorosos.
À medida que a papa fosse engrossando (e creio que no estado a que chegámos alguma coisa vai engrossar) eu ia adicionando Trotsky e Estaline, por um lado, Milton Friedman e Galbraith, por outro, e a papa estaria a chegar ao estado de ebulição.
Acrescentaria, para dar sabor à coisa, umas pitadas de nazismo e maoismo e um toque subtil de dirigismo soviético e capitalismo. Entretanto, o alguidar já se partiu com o aquecimento desta fervilhante mistura e foi preciso arranjar um plano Marshal para colar os cacos.
Isto, são associações, além de estranhas, extremamente perigosas. É que são mesmo muito perigosas quando assimiladas por entes com o crânio embrutecido por sucessivas lavagens ideológicas (ou Teológicas?) e que engolem a primeira papa que se lhes dá.
Recordo, só a título de exemplo, uma frase que ouvi dezenas de vezes de um alto dignitário europeu, que, brandindo o punho esquerdo, em reuniões gerais de alunos, afirmava a sua Teologia. “Ousar avançar, lutar e vencer sob a direcção da classe operária”.
Santa ingenuidade! Crânios jovens!
Mas, enquanto a Utopia vai persistindo no seu caminho, arrebatando sorrateiramente crânios, provinda da sua Mãe, a Dialéctica; daí Heraclito ser avô da Utopia; enquanto, como dizia, a Utopia destrói crânios, com os seus indefectíveis utópicos tecnocratas que entre outras coisas são responsáveis por mimos como a burocracia e a tecnocracia (a Burocracia é irmã gémea da Tecnocracia e não é fácil entender uma sem a outra), ambas são progenitoras da papelada infamante e da teia fiscal opressora em que nos enrodilharam.
Sequelas posteriores da Revolução Industrial!
Confesso que nesta altura o meu crânio já está baralhado com tanta asneira... Nem sei se ainda o tenho em cima do pescoço.
As minhas parcas poupanças vão sendo guilhotinadas com tantos procedimentos teológicos. Procedimentos teológicos? Ah, a Igreja já admite o uso do preservativo em condições específicas.
Condições específicas? Aqui está um dos grandes mistérios da Teologia. Mas, voltando à vaca fria, o postmodernismo e o positivismo vão tentando explicar se a parte é um todo ou se, ao contrário, o todo é que é uma parte da parte. É então, neste preciso momento histórico, que se chega à brilhante conclusão também histórica de que “o dinheiro governa o mundo”. E cá está o primeiro elemento da Trindade. O Dinheiro!
Já se vão apercebendo do que é a minha Teologia. Por outro lado, do fumo daquela mistura, atrás citada, feita num grande alguidar de barro vermelho, vão saindo pequenas faúlhas de ditaduras e democracias.
A Democracia, segundo a Teologia, é o Poder do Povo. Mas, a Ditadura, como prática abjecta que é, não faz parte da Teologia, dado que é só um no Poder a arrogar-se que representa (ilegitimamente) o Povo. Eu diria que se arroga representar apenas o Estado, apesar de o Estado ser apelidado de Ente Público, por muitos Professores de Finanças. E aqui temos o segundo e o terceiro elemento da Teologia, o Poder e o Povo. Creio que ao Povo está destinado o ofício de Santo (não confundir com Santo Ofício). É esta a minha Teologia da Economia. Até fui simpático. Não vos macei com fisiocratas e mercantilismo. Não vos macei com socialismo utópico e científico. Tinha-me imprudentemente esquecido do Vladimir Illitch. Não vos macei com economias puras de mercado, nem com mãos invisíveis. Mãos invisíveis? Imaginem! Protejam os bolsos.
Alguns contribuintes (este termo também é usado com outro sentido bem pejorativo) para a Teologia de Economia eram prestidigitadores no Circo Mundial e faziam famosos números de magia com as várias correntes das teorias económicas clássica, neoclássica, moderna, postmoderna, etc... etc... etc...
Não vos macei com Pareto; nem com a teoria da ofelimidade. Não vos macei com políticas estruturais ou de conjuntura. Não vos macei com políticas de exportação, sociais, de desenvolvimento, de reinserção, de inserção, de emprego, quiçá, de desemprego; políticas de saúde, de educação, monetárias, fiscais e de preços.
Entre outras invenções para nos confundir e chatear.
A propósito de política de preços aconselho vivamente o Governo a ler o Leon Walras, entre outros.
Perceberam alguma coisa do que eu escrevi? Eu também não.
Escrevi esta Teologia só com um intuito, i.e, para que se não sintam infelizes por não perceberem porque é que se consente no aumento trepidante dos preços dos combustíveis em preito de vassalagem ao deus Lucro? Porque é que se fecham escolas e maternidades em nome de uma poupança de um Estado mal organizado e mal estruturado, cujos gastos perdulários deviam ser controlados, comprometendo irremediavelmente as gerações futuras que são os nossos filhos e netos?
Porque que é que na sede da economia capitalista mundial, os EUA, os bancos apresentam 15% de lucro, e acham um excelente resultado e aqui neste canto pequenino a Oeste da Europa o lucro apresentado pelos bancos é superior a 30% e acham pouco?
A título de exemplo julgo que um dos maiores bancos privados portugueses aumentou os lucros em 44% (um total de 199 milhões de euros de proventos) em relação a igual período de 2005 e para isso contribuiu o facto de ter reduzido as despesas com pessoal em 10%! Quanto às empresas portuguesas, aumentaram largamente, no final do ano passado, os seus depósitos à ordem ou a curto prazo, na banca comercial e de investimento; depósitos esses que já totalizavam 28,4 mil milhões de euros.
Então, onde está a crise? Pergunta um amigo meu e conhecido jornalista.
A crise está, provavelmente nos nossos bolsos, por via da celebrada Teologia da Economia, segundo este meu Amigo.
Isto tudo num país governado por socialistas.
Não se sintam infelizes por não perceberem. Comungo da vossa dificuldade; não percebo.
É que “eles” de certeza certezinha, também não percebem...
Ou então o celebrado socialismo baixou do nível da gaveta (uns 50 cms
acima do solo) para o caixão (uns 7 metros abaixo da terra...)
Quod erat demonstrandum!
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Como costuma dizer o Ilustre Proprietário deste blogue, continuemos…
Quando se iniciou a anterior ditadura (que era má, mas não tão má como esta, pois não causou aos portugueses tão grande corte no seu nível de vida nem levou Portugal tão baixo), além do estado miserável das finanças (que, em pouco tempo, foram equilibradas), um outro mal era o estado também miserável das obras públicas.
Salazar teve para esse sector um dos seus melhores ministros, o Engenheiro Duarte Pacheco e, em poucos anos, o aspecto era totalmente diferente. Abriram-se novas estradas, melhoraram-se outras e iniciou-se a primeira autoestrada, duma das saídas de Lisboa. A
estrada marginal, de Lisboa a Cascais, foi outra dessas obras importantes. Muitos outros edifícios públicos novos foram construídos (os hospitais de Santa Maria e São João, os liceus Maria Amália e Filipa de Lencastre, milhares de escolas primárias e outras, etc.) e
outros renovados
Com o governo Sócrates, em 2005, iniciou-se uma fúria de construção de autoestradas. Mas, ao contrário do que sucedeu com as da anterior ditadura, que tiveram como objectivo servir criteriosamente os transportes públicos, as de Sócrates tinham o objectivo de, por contratos de descarada gestão danosa dos bens públicos – actuais e futuros – servirem para dar avultadíssimos lucros a alguns senhores.
Uma autoestrada de Norte a Sul e mais umas quatro transversais, compreende-se.
Quando já havia uma Lisboa-Porto, fizeram uma segunda e começaram a fazer uma terceira! Além de várias outras. Nalgumas o trânsito é mais que reduzido, mas nós pagamos os custos e os lucros dos “beneficiários”. (Se fossem “concessionários” teriam eles de pagar ao Estado).
Não há muito passei na estrada de Beja até Serpa, que segue depois para Espanha, na fronteira de Vila Verde de Ficalho. É uma estrada de relativamente pouco movimento, quase toda em terreno plano, apenas com uma faixa em cada sentido. O que certamente estava indicado fazer era o seu alargamento para quatro faixas, algo simples e barato, dada a configuração do terreno. Pois o que vi foram vários troços de autoestrada em construção, muito perto da estrada em que seguia. Presumo que foi parada a construção pelo actual governo, evitando mais um dos negócios fabulosos, pois creio que não deve haver dúvidas de que o alargamento da actual estrada para as quatro
faixas seria perfeitamente satisfatório para o trânsito que ali passa e a autoestrada apenas serviria para os “beneficiários” ganharem mais uns milhões.
Miguel Mota
Publicado no Linhas de Elvas de 22 de Novembro de 2012
Era a nossa Rita Hayworth, a nossa Elisabeth Taylor, a nossa Marilyn Monroe, a nossa Brigitte Bardot, a sex symbol à nossa medida lusa - a ousadia langorosa, comedida e doce, a voz do seu canto, de modulação discreta, numa letra popular aconchegada ao lar português, de atávica modéstia. Era a nossa Vénus bem comportada, por vezes mais ambiciosa ou mais caprichosa, nada, em todo o caso, que os sensatos pais de família não pudessem revelar às suas filhas nos cinemas de sábado à noite. Uma mulher bela, a nossa Milú, que os filmes de Arthur Duarte revelaram em casto mas gentil enredo, que a graça irresistível de António Silva salvaria da banalidade.
Outros filmes fez, fez teatro, obteve medalhas, no final da vida, em simpáticas homenagens provando que a sua aura se mantinha nos nossos corações, numa altura em que já não fazia sombra a ninguém e que era preciso que embarcasse para o além contente connosco.
Como se fez a tantos dos nossos artistas à beira da morte. Entretanto, dos artistas que fizeram o nosso encanto, no humor ou na seriedade dos seus papéis, poucos são os que se mantêm no palco das nossas referências televisivas, a época pertence à juventude radiosa na graça do seu brilho, que terá que se precaver por seu turno, contra a efémera passagem.
Milú manteve a sua elegância, vimo-la nos anos oitenta, num dos excelentes espectáculos de “E o Resto são Cantigas” de Carlos Cruz, Fialho e Solnado, recordámo-la recentemente , nesse espectáculo reposto no Canal Memória.
Morreu em 2008, com 82 anos. Discretamente. O Estado que a agraciou ainda em vida, abandonou-a na morte. Não, nem todos são Amália, a merecerem, muito justamente, a eternidade do seu Panteão.
Mas Milú está nos nossos corações, várias vezes é recordada nos filmes repostos, merecia algo mais que a campa rasa, onde um particular generoso colocou a moldura com a sua foto da escolha da filha, que não tem possibilidades materiais para lhe cobrir a campa com o mármore da sua e da nossa veneração, arriscando-se a ter que enfiar os ossos da mãe, dentro de um ano, num soturno gavetão da nossa feroz e mesquinha indiferença ou ingratidão.
Milú merecia que os seus ossos permanecessem no seu lugar distinto, em campa de mármore bela, como homenagem à personagem distinta que figurou para nós, e permanecerá ao longo dos tempos, para as gerações que lhe sentirão a magia, apesar das transformações que a arte cinéfila vai sofrendo.
O Estado devia proteger a campa da nossa Milú, mandando construir marmórea lápide que lhe eternizasse a memória.
Na semana passada, desloquei-me à Baviera, Bad Wörishofen para festejar o aniversário (90 anos) do meu sogro. Até aqui tudo seria normal se não fosse o facto de o vice-presidente da Câmara se deslocar a sua casa, acompanhado de um jornalista dum jornal da região. O vice-presidente da Câmara trouxe uma oferta da cidade e o jornalista entrevistou o meu sogro e fotografou a família; além disso, o vice-presidente entregou um documento da Câmara Municipal e um documento de parabéns do Chefe de distrito!
Cada comarca alemã tem a sua maneira própria de honrar idosos e famílias. Neste caso o representante da edilidade trouxe como prenda da cidade um cesto com uma toalha fina com insígnia da câmara, um licor e produtos cosméticos biológicos (à base de plantas, dado Bad Wörishofen ser uma estância termal)! A minha sogra pôs à mesa cervejas, uma garrafa de champagne e salsichas brancas (uma especialidade da Baviera) e pão.
O que aqui mais me surpreendeu, como estrangeiro, foi a abertura e a maneira simpática como o representante comunal e o jornalista falaram connosco, durante duas horas, sobre os problemas internos comunais e da maneira como davam resposta aos problemas locais apresentados.
Os municípios alemães homenageiam, além dos aniversários pessoais (90, 95, 100 anos), também os seguintes aniversários de casamento: bodas de ouro (50 anos), bodas de diamante (60), bodas de Ferro (65), bodas de Vinho (70). Semanas antes do aniversário a Comarca telefona à família para saber se é bem-vinda a sua visita.
O Presidente da RFA também assume o apadrinhamento honorífico para os filhos do mesmo pai e da mesma mãe, a partir do 7° filho vivo. Crianças adoptadas são tratadas como filhos biológicos. Neste caso tem de ser feito um requerimento formal, nos departamentos concelhios, pelos interessados.
Na Alemanha, toda a pessoa recebe uma carta de felicitações concelhias ao atingir os 18 anos (maioridade civil).
A cidade mostra-se reconhecida pelo contributo dos seus cidadãos estando consciente que não é nada sem eles.
Uma sociedade que não deita ao esquecimento os idosos é uma sociedade honrada porque reconhece já o que é e vai ser nos que a construíram.
O meu amigo Dr. Jorge Santos, de visita à Alemanha constatava “é uma outra cultura e diferente modo de cidadania. Há um sentir comunitário e gratidão à memória. Ainda bem porque assim vive-se mais feliz”. Sim, cria-se um sentimento de pertença e até de maior compreensão por defeitos e problemas políticos, numa sociedade não anónima!
Já o livro dos Provérbios (16:31) reconhece " Os cabelos brancos são uma coroa de beleza quando se acham no caminho da justiça." Uma sociedade não envelhece se reconhece e honra os seus filhos e os seus pais!
Escrevo isto porque pode servir de exemplo, pelo menos a nível de paróquias, de Juntas de Freguesia e de Câmaras municipais, para a Lusofonia. Não chega homenagear publicamente só as pessoas da classe política e económica!