O texto de Octávio Teixeira “Brutalidade, Irresponsabilidade e falácias”, saído na revista Visão de20/26 de Outubro pondo em causa toda a acção governativa, apela para a luta, como fazem os chefes sindicais, os chefes dos partidos mais virados à esquerda, que, aliás, desde há muito que o fazem, chamando não ao trabalho mas à destruição do país pela inércia, pela vozearia, pela greve, pelo aumento salarial e o boicote às forças do poder, que, aparentemente, pretendem levar a bom termo a solução para a crise monstruosa em que nos afundamos há 37 anos, por má cabeça de todos, que nos lançámos vorazmente sobre um osso alheio, maná no nosso deserto de mediocridade, inépcia, incompetência, ambição, vaidade, orgia, insensatez, ignorância, desonestidade, bestialidade.
E não saímos desta roda-viva, os governantes com maus governos, os governados repudiando-os na desordem e na rebeldia, ninguém se esforçando por progredir, no tempo das vacas gordas comprando, gastando os bens imóveis e os móveis, mais do que aplicando os dinheiros distribuídos segundo uma orientação de previdência e de prudência, antes curtindo o dia horaciano segundo o lema “viaje agora e pague depois”.
Chegámos ao tempo das vacas magras, e o actual governo quer sair bem na foto, pagando a dívida, acima de tudo pagando a dívida, centrado preferencialmente naqueles que não podem recusar a participação no pagamento. Os grandes responsáveis por ela mal são chamados a terreiro, protegidos pelas leis de uma Constituição há muito feita sob ideais de defesa de direitos próprios, mais do que sobre imposição de deveres segundo um ideal pátrio que mais nenhuma nação se lembraria de desprezar, como nós há muito fazemos, salvo por alturas dos jogos futebolísticos ou outros, internacionais, em que defendemos galhardamente, as mais das vezes grotescamente, as nossas cores.
O bispo Januário condena as medidas drásticas, tal como o faz Cavaco Silva, seguindo os acicatadores da desordem, sem respeito por uma orientação governativa assente, é certo, sobre um critério de força desumana, mas com um Primeiro-Ministro crente que é esse o caminho a seguir, lembrando outros países como Finlândia e Suécia que venceram idênticas fragilidades económicas.
Estranham-se, contudo, as referências de Passos Coelho a esses países de exemplo, porque não nos parece que tenhamos qualquer possibilidade de paralelismo com outros povos, pois desde sempre carentes de massa humana intelectualmente apta e responsável para que, paga que seja a dívida, nos lancemos sobre revolução económica salvadora, assente numa política de trabalho que leve à exportação e elimine a importação. Dos limões, dos alhos, das nossas comodidades gastronómicas e de prazer.
As nossas revoluções são de folclore, ruidosas e com flores. E essas, que já destruíram, vão continuar a destruir, desresponsabilizando todos, a lisura para sempre arredada das contas e do respeito humano.
Imagem da Internet: Wikipédia (enciclopédia livre)
Toda a morte devia ser assim: tranquila, natural, como um apagar de luzes de um espectáculo teatral, gradual e sem traumas.
Com mais de 100 anos, uma velha e querida amiga, já no final dos seus profícuos dias, dizia-me toda a vez que a encontrava para os nossos enriquecedores papos: Estou tão cansada que o simples exercício de me levantar para tomar banho e me alimentar me deixam esgotada. Espero que Deus não se esqueça de mim, e venha logo me buscar!
Ele atendeu-lhe o pedido quando ela completou 103 anos. Depois de viver intensamente, de viajar, de estudar, de conhecer e transmitir ao próximo, tanta sabedoria e saber, repousou. Sua luz se apagou naturalmente.
Como na apoptose, processo metabólico que tem a morte celular geneticamente determinada, a morte humana deveria ser tranquila, não sofrida, naturalmente acontecida. Deveria ser um item no processo evolutivo humano bem entendido, com o objectivo claro de dar reprogramação e continuidade à vida.
Foi na década de 70 que o jovem médico inglês, Andrew Wyllie, pesquisando, observou argutamente que certo grupo de células, a determinada altura do desenvolvimento, parecia suicidar-se para que o organismo fetal, como um todo, evoluísse e mantivesse o número de células necessárias ao equilíbrio do organismo. A esse fenómeno deu o nome APOPTOSE, termo grego que quer dizer CAIR LONGE DE..., numa semelhança como ocorre com as folhas amareladas e secas do Outono do Hemisfério Norte, quando estas caem para dar lugar às novas que vão nascer.
Todos os dias perdemos por volta de 70 biliões de células, num processo suicida, geneticamente programado, que tem como fundamento a remodelação e homeostase orgânica. Primeiro a molécula de DNA, respondendo a um relógio biológico, vai mudando gradativamente, fluida e precisamente, induzindo a célula à morte. A membrana celular se dobra sobre si mesma, formando bolhas que serão englobadas pelas células vizinhas até o processo ser finalizado com o desaparecimento da célula inicial.
Assim é o processo amplamente conhecido do desenvolvimento embrionário, em que as membranas natatórias interdigitais do embrião desaparecem à medida que as mãos do feto vão se formando! Quando certo grupo de células do nosso corpo se torna inviável ao sofrermos damos irreparáveis, as células são naturalmente eliminadas dando lugar a novas células teciduais reparatórias (fígado, medula, ovários, osso,...).
Biologicamente, a apoptose é um processo metabólico complexo, geneticamente determinado, onde factores enzimáticos actuam como relógios biológicos, ainda não totalmente elucidados. Esperança dos cientistas para tratamentos de doenças como o câncer e esterilidade, a apoptose é um segredo da vida que faz lembrar os dizeres premonitórios dos antigos que diziam que morrer é preciso para se ter vida.
Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no peito, vacilou, cambaleou. Deu um gemido e apagou-se. Quando voltou a abrir os olhos, viu-se diante de um imenso Portal.
Ainda meio tonta, atravessou-o e viu uma miríade de pessoas. Todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender bem o que estava a acontecer, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes:
- Enfermeiro, eu preciso voltar com urgência para o meu escritório, porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque o meu seguro de saúde é Platina, e isto aqui está a parecer-me mais a urgência dum Hospital público. Onde é que nós estamos?
- No céu.
- No céu?...
- É.
- O céu, CÉU....?! Aquele com querubins, anjinhos e coisas assim?
- Exacto! Aqui vivemos todos em estado de graça permanente.
Apesar das óbvias evidências, ausência de poluição, toda a gente a sorrir, ninguém a usar telemóvel, a executiva bem-sucedida levou tempo a admitir que havia mesmo batido a bota.
Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação era inaceitável. Porque, ponderou, dali a uma semana iria receber o bónus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa.
E foi aí que o interlocutor sugeriu:
- Talvez seja melhor a senhora conversar com Pedro, o coordenador..
- É?! E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?
- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.
- Assim?
- Quem me chama?
A executiva bem-sucedida quase desabava da nuvem. À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro.
Mas a executiva tinha feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu logo:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século veio?
- Do XXI. O distinto vai dizer-me que não conhece o termo 'executiva'?
- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro. Se me permite, gostaria de lhe fazer uma proposta. Basta olhar para essa gente toda aí, só na palheta e andando a toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistémica.
- É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reorganização. Por exemplo, não vejo ninguém usando identificação. Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Percebeu? Sem controlo, há dispersão. E dispersão gera desmotivação. Com o tempo isto aqui vai acabar em anarquia. Mas podemos resolver isso num instante implementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização e um organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver.
- !!!...???...!!!...???...!!!
- Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Accionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Óptimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing progressivo, encontrar sinergias high-tech, redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, parece-me extremamente atractivo.
- Incrível!
- É óbvio que, para conseguir tudo isso, teremos de nomear um board de altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias da praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho a certeza de que vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar num Turnaround radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que a senhora terá um futuro brilhante... se for trabalhar com o nosso concorrente. Porque acaba de descrever, exactamente, como funciona o Inferno...
Na História, qualquer facto que não possa comprovar-se torna-se uma dúvida permanente, um mistério insolúvel. É o caso da verdadeira identidade do autor da monumental obra literária de William Shakespeare, que era filho dum analfabeto e foi pai, ao quem parece, de filhos analfabetos. Como pode numa série de analfabetos surgir um notável génio literário? Muitos homens notáveis têm sido candidatos à identidade real de Shakespeare, sendo Sir Francis Bacon, homem famoso pela sua cultura, o mais preferido. Quem sabe? Nunca ninguém saberá, talvez.
Em Portugal, sucede o mesmo com a identidade real de Cristóvão Colombo, ou Cólon. Parece, contudo, que este famoso navegador era português, tantas são as provas que o indiciam. Mas quem? Ainda se não chegou a uma solução, embora esta pareça agora ser possível pela análise do DNA. Segundo o luso-americano Manuel Rosa, originário dos Açores [vide "Colombo Português", 2ª edição (Novas revelações), Edição Esquilo], uma hipótese muito possível é ter sido Cristóvão Colombo filho de um ex-rei polaco, Ladislau III (conhecido em Portugal como Henrique Alemão), refugiado na Madeira, casado com uma portuguesa. Falta encontrar o DNA polaco que confirme esta hipótese. E qual era o seu verdadeiro nome? Segismundo Henriques? Fosse qual fosse, o nome de Cristóvão Colombo já ninguém o apaga da História.
Victor Gaspar, a «cara» do Orçamento do Estado Português para 2012
Votei para a constituição deste Governo com toda a convicção pois sabia que era fundamental mudar o que estava obviamente mal.
E o que é que estava mal?
Um «modelo de desenvolvimento» que apostou nos bens não transaccionáveis (nomeadamente na construção e obras públicas) e fomentou o crédito ao consumo, desequilibrou profundamente a Balança de Transacções Correntes pois tivemos que passar a importar o que deixámos de produzir e passámos a consumir a mais. Daqui resulta o endividamento do sistema bancário face ao estrangeiro até níveis que impedem a continuidade da abertura de créditos externos.
Com o desmantelamento do sector produtivo de bens transaccionáveis, os portugueses «agarraram-se» ao Estado como empregador restante. Daqui resultou um enorme aumento da Despesa Pública Corrente, «posta maior» dos gastos do Estado.
O desmantelamento do tecido empresarial produtivo reduziu a base tributária o que, coincidente com o aumento das despesas, conduziu a um profundo endividamento do Estado para cobrir os sucessivos défices públicos. A dúvida instalou-se entre os credores e os juros começaram a subir.
Eis, grosso modo, o cenário à época da tomada de posse do Governo presidido por Pedro Passos Coelho.
O que espero que o Governo faça imediatamente?
Que reduza a Despesa Pública Corrente de modo a reduzir os défices públicos com a maior rapidez possível assim reduzindo a pressão exercida pelo Serviço da Dívida sobre a Despesa Pública Global.
O que espero que o Governo faça logo após a aprovação do Orçamento que confirma a vontade política de redução da Despesa Pública?
Que lance políticas de correcção do «modelo de desenvolvimento» que nos conduziu ao descalabro.
Eis por que apoio as medidas em curso.
Espero que logo após a aprovação do Orçamento de 2012 se inicie o relançamento económico e espero também que o Governo não defraude as minhas esperanças.
v O nosso Presidente não cessa de me surpreender – e não serei caso único, temo bem.
v Agora foi quando veio qualificar de iniquidade fiscal a suspensão do pagamento dos subsídios de férias e de Natal aos funcionários públicos.
v Cria eu, na minha santa ignorância (influenciado, talvez, pelo “contrato social” de J. J. Rousseau e pelas sempre sensatas reflexões de I. Berlin), que os impostos se caracterizavam justamente por carecerem, em absoluto, de base contratual: o rendimento seria apropriado (extorquido, dirão uns tantos) no exercício de um poder soberano, a que não corresponde nenhuma contrapartida específica.
v Qual quê! O nosso Presidente acaba de arrumar definitivamente o assunto: se o Governo, forçado pelas circunstâncias, resolve suspender unilateralmente algumas cláusulas do contrato de trabalho da função pública, está, objectivamente, a apropriar-se de rendimentos - logo, a tributar.
v Vejo agora, claramente, que o facto de esses tais rendimentos pretensamente tributados nunca terem sido, nem nunca virem a ser colocados à disposição do pretenso contribuinte (no caso, o funcionário público) é, apenas, um detalhe sem importância. Para todos os efeitos práticos, é como se a mão direita se apressasse a tirar aquilo que a mão esquerda acabava de dar.
v Eis uma tese prenhe de ensinamentos. Se, quando está em cena o Estado, “não pagar” é sinónimo de “tributar”, então “pagar” só pode ser outra maneira de dizer “subsidiar” – e os contratos de trabalho que Estado e funcionários públicos se têm dado ao incómodo de celebrar são uma formalidade inútil. Que reduzir a factura do SNS é, bem vistas as coisas, um imposto dirigido à indústria farmacêutica. Que diminuir a despesa pública e aumentar os impostos são, afinal, uma e a mesma coisa. Que o princípio enformador dos Estados de Direito “No Taxation Without Representation” nunca passou de um soundbyte bem imaginado por Jefferson e Hamilton. E por aí adiante.
v É claro que o Governo poderia ter sido mais hábil, oferecendo aos funcionários públicos um leque de alternativas: menor remuneração, remuneração igual com empréstimo patriótico, ou resolução do contrato de trabalho. Com o excelente pretexto de que a economia, tal como está hoje e se perspectiva para o futuro, não comporta de todo uma folha de salários tão pesada quanto esta que herdámos do passado. Não ocorreu a ninguém, nem ao nosso Presidente, nem ao nosso Ministro das Finanças. Mas também não se lhes pode pedir tudo.
v Talvez se esperasse que o nosso Presidente pusesse o dedo na ferida que esta controversa medida abre: não assenta em prioridades, nem tão-pouco as estabelece. Todos os funcionários públicos levam por igual. Quando, na realidade: uns estão afectos a funções de soberania e há que colocá-los num regime de excepção que garanta a exclusividade e os preserve de conflitos de interesses, outros exercem funções que, no dia a dia, se sobrepõem à iniciativa privada. Mas isso seria exigir uma ideia de Estado e de organização estatal a mentes que têm mais com que se preocupar.
v Por falar em funções de soberania, a proposta governamental tem uma subtileza que, ou passou despercebida ao nosso Presidente, ou não lhe suscitou quaisquer engulhos: a suspensão dos ditos subsídios é só para o aparelho administrativo do Estado. Órgãos de Soberania, como Presidente da República, Assembleia da República e (fica-se na dúvida) Tribunais escapam à razia, ainda que sejam pagos também pelo produto dos nossos impostos. O BdP, com o pretexto de que se trata de um organismo independente dotado de receitas próprias, fica de fora também – embora organismos semelhantes venham a ser abrangidos.
v Digno de registo é, ainda, a miopia de que o nosso Presidente parece padecer. Refiro-me ao congelamento das rendas habitacionais anteriores a 1990 - assunto sobre o qual nunca se lhe ouviu uma palavra.
v Aí, também, sucessivas leis condicionam a vontade de cidadãos, os senhorios, impedindo-os de auferir rendimentos que o normal funcionamento do mercado de arrendamento torna legítimos. Analogia por analogia, é como se o Estado tributasse os senhorios, e só eles, de forma desigual para, com não menor iniquidade, subsidiar de imediato os inquilinos. De cada um, o seu imposto; a cada um, o seu subsídio – como se mais nenhuma variável entrasse na equação.
Baía morena da nossa terra Vem beijar os pézinhos agrestes Das nossas praias sedentas, E canta, baía minha Os ventres inchados Da minha infância, Sonhos meus, ardentes Da minha gente pequena Lançada na areia Da Praia Gamboa morena Gemendo na areia Da Praia Gamboa.
Praia Gamboa(*) - S. Tomé
Canta, criança minha Teu sonho gritante Na areia distante Da praia morena.
Teu teto de andala À berma da praia. Teu ninho deserto Em dias de feira. Mamã tua, menino Na luta da vida Gamã pixi à cabeça Na faina do dia Maninho pequeno,
No dorso ambulante E tu, sonho meu,
Na areia morena Camisa rasgada, No lote da vida, Na longa espera,
Duma perna inchada Mamã caminhando
P'rá venda do peixe E tu, na canoa das águas marinhas ...
— Ai peixe à tardinha Na minha baía... Mamã minha serena Na venda do peixe.
“O estômago e os pés disputavam-se sobre as respectivas forças. A cada passo, os pés informavam serem de tal modo superiores àquele na questão do vigor, que eram eles quem carregava o próprio estômago. Este deu-lhes a seguinte resposta: “- Enfim, Senhores pés, se eu aí não estiver para vos alimentar, vós não podereis transportar seja o que for!” É o que acontece com os exércitos: sem a inteligência dos seus chefes, a superioridade do número não vale nada.”
Eis a fábula do Esopo – “O estômago e os pés” que traduzi para a minha amiga, como intróito ao comentário sobre uma crítica recebida num texto que li na Internet a respeito da falta de compostura na actual designação dos chefes, por bloguistas ou outros comentaristas, embora o autor do texto considerasse que antigamente, na primeira República ainda fora pior o desbragamento da linguagem, do que nos tempos hodiernos.
Nós ambas acusámos o toque, sobretudo a minha amiga que foi quem usou o hipocorístico designativo de “Zezinho” aplicado ao nosso Presidente, coisa que eu também censurei na altura, confesso, já tenho dito que não fui habituada a essas desconsiderações, tal como o Damazinho Salcede, que a ninguém as admitia, e até costumo ser punhos de renda nos meus designativos, para aplicar uma imagem dos preciosismos clássicos, mas deixei-me convencer da justeza da expressão, depois de ponderadas as razões e por isso a postei no texto do meu blogue (*).
Realmente, ponderámos que chefes não temos de grande valia, mas creio que o erro está na nossa massa demográfica, em todos nós, portanto, que somos de estilo rasteiro, provinciano, como o nosso Presidente, que teve origem modesta, segundo diz, embora tenha cavado a pulso o seu percurso de excelência, gabando-se, apesar da modéstia que afirma ter, de ter contribuído para que a nação – os pés da fábula – não tenha soçobrado ainda, como teria acontecido, não fora ele o Presidente – o estômago da fábula – dos pés que somos.
Admirámos o optimismo do Presidente, no seu discurso de candidatura, revimos os gerais motivos actuais de queixa sobre a inacção do Presidente, e não vimos nenhum motivo para ele embandeirar em arco sobre o que fez para evitar o estado das nossas misérias, achando que, pelo contrário, nada fez a não ser referir bastas vezes a sua preocupação, deixando, pelo contrário, destruir a ortografia portuguesa, a Escola portuguesa, os diferentes ramos da Economia portuguesa, participando no estado da corrupção portuguesa, com os vários vencimentos que se diz que aufere, não dando um passo para limpar a pequena casa do seu país.
Creio que estamos mais que justificadas, a democracia tornou-nos a palavra mais solta, é certo, embora eu me lembre de que na ditadura também ousei ser ousada em minha escrita objectiva. Não condenávamos os chefes, pelo menos frontalmente – houve quem chamasse a um deles “Dinossauro Excelentíssimo”, mas só depois do chefe fora de cena - mas os chefes também tinham diverso carisma. E amavam a Pátria, e tinham outros ideais, que agora achamos prosaicos, porque a prosa dos chefes idealistas de agora se cifra mais nas cifras pessoais e dos amigos funcionais.
Nem vale a pena prosseguir, nestes apertos em que vivemos, e em que vivem, sobretudo, os que foram despedidos dos seus empregos ou os que receiam vir a perdê-los, todos os que se sentem coarctados na acção que julgavam desempenhar como cidadãos do seu país.
Etc., etc., não vale a pena prosseguir, vou antes traduzir a fábula de Esopo, para me divertir um pouco.
E à minha amiga a vou dedicar, para se divertir a seguir:
«O estômago e os pés»
«O estômago com os pés contendia
Porque estes se vangloriavam
Do seu poder sobre aquele
Já que eles é que o transportavam
Com a necessária galhardia,
Jamais reclamando
Nem se enxofrando
Embora sentissem na pele
O esforço tão forte
Desse transporte,
Tantas vezes sem norte.
É claro que o estômago não se deixou vencer
E respondeu, a esclarecer:
“- Nada vos fico a dever
Porque não fora eu a dar-vos de comer
E aí ficaríeis parados no tempo,
Sem vos poderdes mexer.”
A moral da fábula aplica-a Esopo
Às tropas do seu tempo:
Havia nelas chefes a mandar.
Sem esses, lá se iam as vitórias ao ar
Pois, sem orientação,
Os múltiplos soldados dispersariam…
Mas também, é certo, não seriam
A carne para canhão
Que habitualmente são.
O que eu acho curioso,
Sem que isso me dê gozo,
É a analogia dos tempos de outrora
Com os de agora
No que toca à questão dos chefes
Que Esopo, na sua alegoria,
Atribui ao estômago
E não à cabeça,
Que comandar deveria.
O estômago a mandar,
Eis uma observação
De grande universalidade,
Pois, vinda da ancestralidade,
Chega impune à actualidade.
Berta Brás
(*) O blog da Autora tem o endereço http://poramaisb.blogspot.com/ e ligação directa (link, como diz a estranja) a partir do "A bem da Nação"
v O montante da Dívida Pública portuguesa, nos dias que correm, é enorme - e só aí teríamos já um problema e tanto. Mas não é este o problema que nos ladra aos calcanhares.
v A Dívida Externa Total (pública e privada), designadamente a dos Bancos, é ainda maior (mais do triplo da Dívida Pública) – suficiente para tirar o sono ao mais despreocupado. Mas, hélàs! Não é também o “tal” problema.
v E qual é, então, esse malfadado problema?
v Algo bem mais prosaico:
- Estado, Bancos e empresas (como os empresários não se cansam recordar) - todos nós, em suma, para continuarmos a funcionar com uma aparência de normalidade, só com mais empréstimos;
- E não há quem queira emprestar-nos um cêntimo que seja (excepção feita aos mecanismos internacionais de apoio a países indigentes, mas aí com condições severas e limites apertados).
v Dito de outro modo, o nosso problema, neste preciso momento, não são as dívidas que acumulámos esforçadamente durante os últimos 20 anos, num ciclo que começou no Estado (até 1997), acelerou “prego a fundo” com a Banca (entre 1998 e 2008) e regressou de novo ao Estado (2009-2010).
v Essas poderiam muito bem ser “roladas” (isto é, novas dívidas para pagar as que se vencem) sem grande alarido, até que chegassem tempos mais bonançosos. Desde que pagássemos a tempo e horas uns juritos puxadotes, naturalmente.
v O problema é que qualquer caminho a partir daqui, da situação em que presentemente nos encontramos, só é imaginável (e minimamente suportável) com mais endividamento: do Estado, dos Bancos e das empresas.
v E, por muito que pese a todos aqueles que clamam por medidas dirigidas ao crescimento económico e ao emprego, a dura realidade é que não se encontra, lá fora, quem se disponha a financiá-las (se esses tais souberem de alguém, que façam o obséquio de o apresentar). E porquê?
v Porque, entre nós, o investimento directo esbarra com “custos de contexto” (legislação, sistema judicial, burocracias várias) que desmotivam o empreendedor mais arrojado (talvez por isto, muitos dos nossos empresários nada fazem sem a asa protectora do Estado e do seu aparelho).
v Porque o investimento de carteira não encontra, por cá, nem mercados suficientemente líquidos, nem as mais elementares soluções de cobertura dos riscos financeiros, nem segurança jurídica quanto baste, nem confiança fiscal que o convençam.
v Porque, até 2015, vencer-se-ão cerca de € 3 biliões (3 seguido de 12 zeros) das Dívidas Públicas da UE, o equivalente a 5% do PIB mundial – e nesse concurso de beleza só por acaso alguém reparará em nós, por mais lifts que façamos.
v Porque, enfim, mais dívida (se houvesse quem emprestasse) só agravaria o actual prognóstico – o qual não poderia ser mais reservado.
v Espíritos ingénuos (e, também, menos hábeis no manejo da “dismal science”) pensariam, talvez, que uma boa parte da novel dívida poderia muito bem ser colocada cá dentro - se necessário fosse através de “empréstimos patrióticos” (eufemismo para empréstimos forçados).
v Na realidade, os recursos financeiros internos chegam e sobejam para financiar a parcela maior da Despesa Pública Primária (os gastos públicos, excluindo os juros da Dívida Pública), aquela que consiste em remunerações e na aquisição de bens e serviços locais. E os empréstimos internos teriam sempre três vantagens inestimáveis:
- Reduziriam num ápice a procura interna (como os impostos, aliás);
- Deixariam praticamente intacta a liquidez da nossa economia (o que já só acontecerá com os impostos a partir do momento em que os depósitos a prazo e outras aplicações financeiras comecem a ser liquidados);
- Não induziriam o sentimento de espoliação que acompanha invariavelmente uma chuva de impostos brutais, mesmo se temporários.
v Com eles, o deficit orçamental não diminuiria tão rapidamente, é certo. Mas os deficits orçamentais (muito vulneráveis a contabilidades criativas) só são relevantes porque implicam acréscimos da Dívida Pública – e a Dívida Pública Externa (essa sim, que não engana) estabilizaria bem mais cedo do que a troika prevê.
v Espíritos ingénuos, disse bem. Ignoram, pobres deles, que, desde há muito, IGCP (Instituto de Gestão do Crédito Público) e BdP (Banco de Portugal) capricham em menosprezar o aforro nacional: um, com burocrática displicência, só tem tido olhos para os mercados internacionais – oferecendo internamente taxas ridículas e condições terceiro-mundistas; o outro assistiu passivamente ao crescente endividamento dos Bancos de cá junto de uma mão cheia, se tanto, de Bancos espanhóis, franceses e alemães – evitando assim que os depositantes fossem adequadamente remunerados.
v É claro que os empréstimos internos (necessariamente de longo prazo) teriam de ser representados por títulos escriturais livremente transmissíveis, para os quais haveria que organizar um mercado secundário que lhes conferisse suficiente liquidez.
v [Descrever em pormenor como isto se faz não é difícil, mas afugentaria o Leitor mais paciente. Sempre digo, porém, que teria de ser algo radicalmente diferente dos Certificados do Tesouro - um disparate que pede meças à “engenharia financeira” das SCUTS]
v E é de crer que, com taxas de juro da ordem daquelas que as novas emissões de Dívida Pública (de muito curto prazo, diga-se de passagem) estão a obter, e com um mercado secundário bem organizado, uma parte significativa das necessidades financeiras do Estado nestes tempos de aperto viesse a ser assegurada por empréstimos internos não forçados – o que seria oiro sobre azul.
v E porque é que não se faz tal? Ouço perguntar.
v Simples. Porque a conversão de depósitos a prazo em títulos de Dívida Pública fragilizaria ainda mais os nossos já frágeis Bancos, na exacta medida em que tornaria o perfil temporal dos seus Balanços ainda mais desequilibrado (Activos realizáveis a um prazo médio bem acima dos 8 anos, financiados por Passivos a vencerem-se a menos de 1ano, sem se saber se será possível, ou não, renová-los).
v O que é dizer: não se faz para poupar os Bancos de cá à “angústia do roll over” (a imperiosa necessidade de ir renovando, renovando sempre o Passivo) e ao risco de liquidez que a acompanha.
v Alguma razão assistirá àqueles de entre nós que clamam contra o papel dos Bancos na actual crise: os Bancos estiveram na origem da crise; os Bancos condicionam fortemente as medidas que podem solucioná-la; os Bancos querem fazer crer que o que se passa não lhes diz respeito.
v Em vista disto, ocorre perguntar:
- Porque é que os Bancos de cá não reforçam os seus Capitais Próprios, como forma de atenuar o referido desequilíbrio temporal nos seus Balanços - e € 12 mil milhões para tal são manifestamente poucos?
- Porque é que não se incentiva as empresas a reforçarem, também elas, os seus Capitais Próprios – em vez de se continuar a premiar fiscalmente o endividamento?
- Porque é que não se oferece aos visados, como alternativa aos impostos brutais e à suspensão de cláusulas contratuais (o que é o caso dos subsídios na função pública), a subscrição de Dívida Pública específica, nos termos que delineei mais acima?
- Porque é que ninguém fala em Dívida Pública interna?
v Não ignoro que o Governo (este e os anteriores) tem recorrido amplamente a empréstimos internos mais ou menos forçados. Mas são reservados aos Bancos de cá, o que significa duas coisas pouco recomendáveis:
- Que os Bancos vão usar nesses empréstimos depósitos e/ou fundos obtidos junto do BCE, conseguindo assim margens apreciáveis – só porque se impede o mercado de funcionar;
- Que esses empréstimos vão ocupar, nos Balanços dos Bancos, o lugar destinado ao financiamento da actividade económica.
Um dia a maioria de nós irá separar-se. Sentiremos saudades de todas as conversas atiradas fora, das descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que partilhámos.
Saudades até dos momentos de lágrimas, da angústia, das vésperas dos fins-de-semana, dos finais de ano, enfim... do companheirismo vivido.
Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre.
Hoje já não tenho tanta certeza disso.
Em breve cada um vai para seu lado, seja pelo destino ou por algum desentendimento, segue a sua vida.
Talvez continuemos a encontrar-nos, quem sabe... nas cartas que trocaremos.
Podemos falar ao telefone e dizer algumas tolices... Aí, os dias vão passar, meses... anos... até este contacto se tornar cada vez mais raro.
Vamo-nos perder no tempo...
Um dia os nossos filhos verão as nossas fotografias e perguntarão: Quem são aquelas pessoas?
Diremos... que eram nossos amigos e... isso vai doer tanto!
- Foram meus amigos, foi com eles que vivi tantos bons anos da minha vida!
A saudade vai apertar bem dentro do peito.
Vai dar vontade de ligar, ouvir aquelas vozes novamente...
Quando o nosso grupo estiver incompleto... reunir-nos-emos para um último adeus a um amigo.
E, entre lágrimas, abraçar-nos-emos.
Então, faremos promessas de nos encontrarmos mais vezes daquele dia em diante.
Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a sua vida isolada do passado.
E perder-nos-emos no tempo...
Por isso, fica aqui um pedido deste humilde amigo: não deixes que a vida passe em branco, e que pequenas adversidades sejam a causa de grandes tempestades...
Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!"