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A bem da Nação

O TGV Lisboa-Porto

 

 http://www.observatoriodoalgarve.com/cna/Images%5Calfa_pendular2.jpg

O comboio Alfa Pendular na Estação do Oriente, em Lisboa

 

A secção de “Negócios” do “Sol” de 26-5-2007 publicou um quadro com os custos e duração das viagens entre Lisboa e Porto e Lisboa e Madrid, comparando os valores relativos ao automóvel, ao avião, ao comboio Alfa pendular e ao TGV.

 

Esses números deixaram-me algumas dúvidas, que gostava de ver esclarecidas. Os tempos de viagem apresentados para o avião são apenas, certamente, os tempos de voo. Como as pessoas normalmente não estão interessadas em contar apenas o tempo de voo, seria conveniente saber quanto é o tempo total, desde o centro da cidade até ao aeroporto, as demoras antes do embarque e, à chegada, a demora até receber a bagagem, e o percurso até à cidade do destino.

 

Consideremos os números, comparando apenas o Alfa e o TGV entre Lisboa e o Porto. O tempo de viagem indicado para o Alfa são 2 h e 45 m e para o TGV 1 h e 15 m. Na realidade, o Alfa faz grande parte do seu percurso a velocidade muito inferior aquela para que foi construído, presumo que por deficiência da via. Não compreendo, se é essa a razão, porque não está já a via reparada e em condições do comboio fazer o percurso à velocidade para que foi construído, um custo certamente muitíssimo inferior ao do TGV. Penso que a viagem do Alfa devia levar algo menos de 2 horas. Será que é mantida assim para justificar o TGV? Em condições normais, a diferença do tempo de viagem entre o Alfa e o TGV não deveria ser de meia hora ou menos?

 

O preço duma viagem de ida e volta é, para o Alfa, de 79 € e para o TGV é de 80 €, “dados fornecidos pela Rave”. Gostaria que me explicassem como é que há apenas a diferença insignificante de 1 € entre os dois custos, quando num caso os investimentos já foram feitos há muito, faltando apenas corrigir a via (se essa é a causa de não se viajar à velocidade possível) e no caso do TGV há que fazer um enorme investimento. Será que o valor indicado pela Rave vai depois aparecer multiplicado por um número alto ou é o Estado – todos nós – quem vai pagar os custos?

 

São dúvidas que eu gostava de ver esclarecidas.

 

 Miguel Mota

 

Publicado no “Linhas de Elvas” de 26-7-2007

SERÃO DE 24 DE ABRIL

Uma noite em cheio, a de 24 de Abril: primeiro, "Le plus grand cabaret du monde", na TV5, por Patrick Sébastien, que, sentado em mesas com convidados muitas vezes ligados aos números extraordinários do seu palco, palco fértil em proezas de uma extraordinária beleza corporal, de humor, de magia, vai brilhando nas suas capacidades de comunicador, de entrevistador, de cantor, de humorista vibrante e afável, que definem o seu espectáculo numa dimensão de encanto e sedução, também pelas qualidades de comunicação da gente elegante que ele apresenta.

 

 

 http://images.google.pt/imgres?imgurl=http://drx.typepad.com/psychotherapyblog/images/2008/02/23/paul_henreid_ingrid_bergman_humphre.jpg&imgrefurl=http://drx.typepad.com/psychotherapyblog/2008/02/photo-of-the-20.html&usg=__cWMSsuZPEWxyG3CRyGf9cVLUwfQ=&h=500&w=410&sz=141&hl=pt-PT&start=71&um=1&itbs=1&tbnid=hgiHBeZuweoniM:&tbnh=130&tbnw=107&prev=/images%3Fq%3DCasablanca%252BBergman%26start%3D60%26um%3D1%26hl%3Dpt-PT%26sa%3DN%26ndsp%3D20%26tbs%3Disch:1

 

Seguidamente, no TVMemória, "Casablanca", tantas vezes visto. Uma história de amor, concentrando ingredientes próprios de um verdadeiro amor: a ternura da paixão, no encontro de ocasião em Paris, antes da Ocupação, entre a jovem desconhecida (Ingrid Bergman, no papel de Ilsa Laszlo) e o fugitivo Richard (futuro Rick) (Humphrey Bogart), as raivas deste pela incompreensível traição daquela de não fugir com ele no comboio, como combinara, raivas armazenadas num sofrimento que traça um novo perfil de cinismo aparente a um Rick, dono de um bar em Casablanca. É neste bar que o casal Ilsa / Victor Laszlo, leader da resistência checa (Paul Henreid) se acolhem, na busca de dois vistos para, partidos de avião para Lisboa, daí embarcarem para os almejados Estados Unidos da América. E os sentimentos e as emoções irão desenrolar-se, na surpresa, na raiva, na negação dos vistos à mulher suplicante pelo seu marido perseguido, no infinito amor, na ofensa, pela ignorância das razões da traição de Ilsa em Paris (soubera, nesse dia, que o marido, prisioneiro num campo de concentração nazi, não morrera como ela julgara - e por isso se deixara envolver num novo amor - mas estava vivo e precisava dela, pelo que faltara ao compromisso de partir com o amado, no comboio da fuga). As lágrimas, de novo a ternura, a temerosa decisão de construção de um novo futuro dos dois, salvando, embora, o marido. A conversa do marido e do amante, o pedido daquele para que salve a mulher. E o cinismo e a raiva de Rick cedendo ante a nobreza do casal, cedendo o seu lugar na partida do avião, em truque mistificatório que o incriminará, mas que a sua própria nobreza pede.

 

Como pano de fundo desta história de amor, realizada por Michael Curtiz, em 1942, história romântica feita dos ingredientes apontados mas sobretudo de dedicação e generosidade de todos os intervenientes, a canção, interpretada por Sam (Dooley Wilson), que permanece no nosso ouvido, "As Time goes by", evocando os bons velhos tempos de Paris, do início desses amores inextinguíveis, porque "Sempre teremos Paris", na resposta do sacrificado Rick à comovida e perturbada Ilse.

 

Romântica história, história de renúncia e sacrifício, história de ternura, história de nobreza e contenção, de beleza e dignidade, de coragem, poderia servir bem de exemplo aos tempos conturbados que vivemos hoje, de separações e agressão constantes, de incontinência de atitudes, de jovens e menos jovens, incapacitados de medir as inconveniências de comportamentos menos ponderados, egoístas e cobardes, tempos em que nos habituámos a colher nos noticiários o indicativo constante de crimes não de amor mas de terrorismo, indignidade e bestialidade. De cobardia.

 

Berta Brás

SOBRE A REGIONALIZAÇÃO

 

 

O problema da chamada regionalização vem-se arastando há anos e alguns dão a ideia de que dela esperam verdadeiros milagres. O que me impressiona é que, em tudo o que tenho visto, há uma grande indefinição que julgo seria importante esclarecer.

 

Se bem compreendo, os que querem a regionalização pretendem a criação dum orgão político-administrativo entre o governo central e o governo dos concelhos.

 

Esses órgãos serão, naturalmente, uma Assembleia Regional e um executivo, Governo Regional.

 

A primeira definição que julgo necessária é a das competências desses órgãos. Não se vislumbrando o aparecimento de novas competências, as atribuições dos órgãos regionais terão de ser retiradas do governo central, ou do governo dos concelhos (municípios) ou de ambos.

 

Enquanto não houver propostas concretas sobre as competências dos órgãos regionais, discutir a regionalização é um exercício vago. Não é aceitável pensar em criá-las e deixar para depois a definição das suas competências.

 

Não me surpreenderia se essa fosse a ideia de alguns dos nossos políticos profissionais ou candidatos a sê-lo, aqueles que consideram os seus interesses e não os do país. No que estão interessados é em ter à sua disposição mais algumas dezenas de lugares políticos. T

 

emos ouvido grandes elogios ao poder local, nalguns casos justificados. Mas também se ouvem as mais severas críticas à sua actuação, como nos casos de urbanismo, de que alguns pontos do Algarve ou o centro de Cascais são bons exemplos.

 

Também há que evitar que, se houver regiões, elas sejam mais um passo burocrático a acrescentar à vergonha da situação actual e a sobrecarregar os cidadãos com custos e demoras ainda maiores que os actuais. E lembro que qualquer excesso de burocracia é sempre da responsabilidade dos chefes ao mais alto nível, do governo e das Câmaras Municipais.

 

Um outro ponto a tratar é o do número e limites das regiões.

 

Com excepção do Algarve, a unica região bem definida pela cadeia montanhosa que o separa do resto do Continente, é matéria de grande controvérsia. E se se fizer regionalização é para durar muitas décadas e não para depois obrigar a constantes alterações.

 

Há, talvez, mais pontos a exigirem ponderação. Mas, pelo menos estes que indico parecem-me que devem ser tratados por todos aqueles que querem a regionalização.

 

  Miguel Mota

O PORTUGUÊS DE CASTELA

 

 

São infelizmente poucos os portugueses que conhecem que a raia leste de Portugal não é exactamente uma fronteira linguística, que a fronteira política deixou em Espanha territórios bem portugueses onde a nossa fala vive em estado de depauperação.

 

Estou-me referindo aos concelhos espanhóis de Olivença <http://olivenca.org/> e Tálega (a Olivença portuguesa) ocupados por Espanha em 1801 e que apesar de ser mandato do Tratado de Viena de 1815 o seu retorno à pátria, seguem ocupados e o português neles perseguido.

 

Os territórios de Valência de Alcântara, Ferreira de Alcântara e Cedilho que cantou Pessoa – e que bem se lembrou deles Afonso VI ao assinar Portugal um tratado secreto com Filipe de Anjou, (neto de Luis XIV da França), intervindo Portugal a troca desses territórios, na longa guerra de sucessão em apoio do Bourbon, frente ao aspirante austríaco - porém, obtida a vitória polo Bourbon (Filipe V da Espanha) este negou-se a cumprir o tratado – não tornando esses territórios bem portugueses a Portugal - comportando-se assim dum jeito muito espanhol.

 

Estão logo os territórios do vale do Xalma - concelhos espanhóis de Valverde do Freixo, Sam Martim de Trevejo e Eljas. Mais ao norte estão os concelhos de Almedilha e Calabor. Todos esses territórios são contíguos de Portugal e afastados geograficamente das falas galegas do português, ainda que a pressão do castelhano e a sua imposição dá a estas falas uma farda muito galaica <http://www.pglingua.org/index.php?option=com_content&view=article&id=1906:o-galego-ou-a-caminhada-do-portugues-para-o castelhano&catid=8:cronicas&Itemid=69>.

 

Um grupo de professores galegos membros do colectivo glu glu, realizaram um interessante filme sobre esta realidade, que pode ser adquirido na Loja on-line imperdível <http://imperdivel.net/documentarios/60-entrelinguas.html> e que estou seguro vai ser todo um descobrimento para o público português em geral, e para entender de jeito muito mais claro que as falas galegas são parte da sua própria língua.

 

O documental é acompanhado com outro DVD com dados, inclui uma entrevista - de muito interesse - com um professor da universidade de Vigo – Henrique Costas - que seguindo as teses espanholas, defende que as falas galegas não são português e por tanto algumas das falas portuguesas da raia leste e pela mesma razão - são galegas - é dizer espanholas (e não portuguesas).

 

A obra é uma pequena jóia que vai servir para os portugueses recuperarmos algum aspecto da complexidade da nossa formação nacional, pois a fronteira do tratado de Alcanhizes não é exactamente uma fronteira linguística.

 

Só mais uma cousa: se o português destes territórios vive uma dura situação, onde pior está é no mais recente território roubado de Portugal – Olivença – onde se empregaram a fundo os espanhóis com «jugo e vara» para apagar a nossa língua.

 

Alexandre Banhos

 Alexandre Banhos Campo

36 ANOS DEPOIS...

CARTA DE UM ALUNO AO PROFESSOR DE HISTÓRIA

 

 

Exmo. Senhor Professor:

 

Sou obrigado a escrever-lhe, nesta data, depois de ter escutado, com toda a atenção, a aula de História, que nos deu sobre a Revolução de Abril de 1974.

 

Li todos os apontamentos que tirei na aula e os textos de apoio que me entregou para me preparar para o teste, que o Senhor Professor irá apresentar-nos, na próxima semana, sobre a Revolução dos Cravos.

 

Disse o Senhor Professor que a Revolução derrubou a ditadura salazarista e veio a permitir o final da Guerra Colonial, com a conquista da Liberdade do Povo Português o dos Povos dos territórios que nós dominávamos e que constituíam o nosso Império.

 

Afirmou ainda que passámos a viver em Democracia e que iniciámos uma nova política de Desenvolvimento, baseada na economia de mercado.

 

Informou-nos também que a Censura sobre os órgãos de Comunicação Social terminara e que a PIDE/DGS, a Polícia Política do Estado Fascista acabara, dando a possibilidade aos Portugueses de terem liberdade de expressão, opinião e pensamento.

 

Hoje, todos eles podem exprimir as suas opiniões nos jornais, rádio, televisão, cinema e teatro, sem receio de serem presos.

 

Disse igualmente que Portugal era um país isolado no contexto internacional e que agora fazemos parte da União Europeia e temos grande prestígio no mundo. Que somos dos poucos países da União a cumprir, na íntegra, os cinco critérios de convergência nominal do Tratado de Maastricht para fazermos parte do pelotão da frente com vista ao Euro.

 

Li os textos de apoio do Professor Fernando Rosas, onde me informam que os Capitães de Abril são considerados heróis nacionais, como nunca houvera antes na nossa história, e que eles são os responsáveis por toda a modernidade do nosso país, pois se não tivesse acontecido a memorável Revolução, estaríamos na cauda da Europa e viveríamos em grande atraso, em relação aos outros países, e num total obscurantismo.

 

Tinha já tudo bem compreendido e decorado, quando pedi ao meu pai que lesse os apontamentos e os textos para me fazer perguntas sobre a tal Revolução, com vista à minha preparação para o teste, pois eu não assisti ao acontecimento histórico, por não ter ainda nascido, uma vez que, como sabe, tenho apenas dezasseis anos de idade.

 

Com o pedido que fiz ao meu pai, começaram os meus problemas pois ele ficou horrorizado com o que o Senhor Professor me ensinou e chamou-lhe até mentiroso porque conseguira falsificar a História de Portugal.

 

Ele disse-me que assistira à Revolução dos Cravos dos Capitães de Abril e que vira com «os olhos que a terra há-de comer» o que acontecera e as suas consequências.

 

Disse-me que os Capitães foram os maiores traidores que a nossa História conhecera, porque entregaram aos comunistas todo o nosso Império, enganando os Portugueses e os naturais dos territórios, que nos pertenciam por direito histórico. Que a Guerra no Ultramar envolvera toda a sua geração e que nela sobressaíra a valentia dum povo em armas, a defender a herança dos nossos maiores.

 

Que já não existia ditadura salazarista, porque Salazar já tinha morrido na altura e que vigorava a Primavera Marcelista que, paulatinamente, estava a colocar Portugal na vanguarda da Europa. Que hoje o nosso país, conjuntamente com a Grécia, são os países mais atrasados da Comunidade Europeia.

 

Que Portugal já desfrutava de muitas liberdades ao tempo do Professor Marcelo Caetano, que caminhávamos para a Democracia sem sobressaltos, que os jovens, como eu, tinham empregos assegurados, quando terminavam os estudos, que não se drogavam, que não frequentavam antros de deboche a que chamam discotecas, nem viviam na promiscuidade sexual, que hoje lhes embotam os sentidos.

 

Disse-me também que ele sabia o que era Deus, a Pátria e a Família e que eu sou um ignorante nessas matérias. Aliás, eu nem sabia que a minha Pátria era Portugal, pois o Senhor Professor ensinou-me que a minha Pátria era a Europa.

 

O meu pai disse-me que os governantes de outrora não eram corruptos e que após o 25 de Abril nunca se viu tanta corrupção como actualmente.

 

Também me disse que a criminalidade aumentara assustadoramente em Portugal e que já há verdadeiras máfias a operar, vivendo à custa da miséria dos jovens drogados e da prostituição, resultado do abandono dos filhos de pais divorciados e dum lamentável atraso cultural, em virtude de um Sistema Educativo, que é a nossa maior vergonha, desde há mais de vinte anos.

 

Eu fiquei de boca aberta, quando o meu pai me disse que a Censura continuava na ordem do dia, porque ele manda artigos para alguns jornais e não são publicados, visto que ele diz as verdades, que são escamoteadas ao Povo Português, e isso não interessa a certos órgãos de Comunicação Social ao serviço de interesses obscuros.

 

O meu pai diz que o nosso país é hoje uma colónia de Bruxelas, que nos dá esmolas para nós conseguirmos sobreviver, pois os tais Capitães de Abril reduziram Portugal a uma «pobreza franciscana» e que o nosso país já não nos pertence e que perdemos a nossa independência.

 

Perguntei-lhe se ele já ouvira falar de Mário Soares, Almeida Santos, Rosa Coutinho, Melo Antunes, Álvaro Cunhal, Vítor Alves, Vítor Crespo, Lemos Pires, Vasco Lourenço, Vasco Gonçalves, Costa Gomes, Pezarat Correia... Não pude acrescentar mais nomes, que fixara com enorme sacrifício e trabalho de memória, porque o meu pai começou a vomitar só de me ouvir pronunciar estes nomes.

 

Quando se sentiu melhor, disse-me que nunca mais lhe falasse em tais «sacanas de gajos», mas que decorasse antes os nomes de Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, Diogo Cão, D. João II, D. Manuel I, Bartolomeu Dias, Afonso de Albuquerque, D. João de Castro, Camões, Norton de Matos, porque os outros não eram dignos de ser Portugueses, mas estes eram as grandes e respeitáveis figuras da nossa História.

 

Naturalmente que fiquei admirado, porque o Senhor Professor nunca me falara nestas personagens tão importantes e apenas me citara os nomes que constam dos textos do Professor Fernando Rosas.

 

Senhor Professor, dada a circunstância do meu pai ter visto, ouvido, sentido e lido a Revolução de Abril, estou completamente baralhado, com o que o Senhor me ensinou e com a leitura dos textos de apoio.

 

Eu julgo que o meu pai é que tem razão e, por isso, no próximo teste, vou seguir os conselhos dele.

 

Não foi o Senhor Professor que disse que a Revolução nos deu a liberdade de opinião?

 

Certamente terei uma nota negativa, mas o meu pai nunca me mentiu e eu continuo a acreditar nele.

 

Como ele, também eu vou pôr uma gravata preta no dia 25 de Abril, em sinal de luto pelos milhares de mortos havidos no nosso Império, provocados pela Revolução dos Espinhos, perdão, dos Cravos.

 

O Senhor disse-me que esta Revolução não vertera uma gota de sangue e agora vim a saber que militantes negros que serviram o Exército Português, durante a guerra, que o Senhor chamou colonial, foram abandonados e depois fuzilados pelos comunistas a quem foram entregues as nossas terras.

 

Desculpe-me, Senhor Professor, mas o meu pai disse-me que o Senhor era cego de um olho, que só sabia ler a História de Portugal com o olho esquerdo. Se o Senhor tivesse os dois olhos não me ensinaria tantas asneiras, mas que o desculpava porque o Senhor era um jovem e certamente só lera o que o Professor Fernando Rosas escrevera.

 

A minha carta já vai longa, mas eu usei de toda a honestidade e espero que o Senhor Professor consiga igualmente ser honesto para comigo, no próximo teste, quando o avaliar.

 

Com os meus respeitosos cumprimentos,

 

O seu aluno,

 

XXXXXXXXX

 

(Autor desconhecido, recebido por e-mail)

OS PRINCÍPIOS DA ECOLOGIA NA FÁBULA

 

 

Se La Fontaine estivesse

Nos dias de hoje, veria

Que o que já se fazia

Antigamente,

- Desrespeitar a natureza

Com ingratidão e fereza

- Se acentuou

Extraordinariamente

No tempo presente.

 

Felizmente agora

Há a ecologia

A advertir,

Conquanto inutilmente,

Que é preciso ser grato à Terra

E não lhe fazer guerra;

Ter-lhe respeito

Com jeito;

Porque senão

A Terra vinga-se e é o que se vê,

Nos sismos a eito,

Nos vendavais e tornados,

Nas tempestades e enxurradas,

No aquecimento global, nas inundações,

Nos vulcões em explosões,

No pânico geral e na dor inenarrável

De se destruírem os lares

Os amigos e os familiares

 

Só porque a natureza se vingou

De maneira insuportável

Sobre o Homem que a envileceu

Sujando, ferindo, agredindo,

Emporcalhando,

Destruindo.

 

Gratidão e respeito pela mãe-natura

São os princípios de envergadura

Que La Fontaine apontou

Na fábula do Lenhador devastador

Da sua Floresta.

 

Sentimentos verdadeiros hoje ainda,

Mas cada vez mais calcados

Espezinhados,

Pelo Homem irresponsável,

Num abuso irracional,

Sobre a Floresta Universal.

 

De um perigo

A merecer o castigo,

Apesar dos avisos já antigos

Duma Ecologia ainda em formação

Segundo um fabulista admirável

De percepção.

 

A Floresta e o Lenhador

 

Um Lenhador acabava de partir o cabo

Com que tinha encabado o seu machado.

O estrago não pôde ser tão cedo reparado

E o Bosque por um tempo foi poupado.

Enfim o Homem rogou-lhe humildemente

Que o deixasse suavemente

Levar um simples ramo

A fim de polir um novo cabo:

“Ele o seu ganha-pão empregaria noutro lado:

Muito carvalho e muito pinheiro deixaria intacto

Cuja velhice e encanto toda a gente respeitava.

”Mas outras armas a inocente Floresta lhe forneceu.

Bem se arrependeu.

Ele encabou o seu machado:

O miserável disso se foi servir

Para a sua benfeitora despojar

Do seu principal ornamento,

Os ramos do seu tormento.

Ela gemeu a cada momento:

A sua dádiva causou a sua dor.

Eis o trem do mundo e dos seus sectários.

Servem-se do benefício contra o benfeitor,

Estou cansado de assim o expor.

Mas que doces sombras a tais ultrajes

Estejam expostas,

Quem não se lamentaria!

Ai de mim!

Por muito que me esforce a gritar,

Para avisar,

A ingratidão e os abusos

Em moda não deixarão de estar

Dia após dia.

 

Quem diria

Que La Fontaine previa

O que hoje nos está a acontecer

Em escala ainda maior

Do que a que ele apontou

Quando nos avisou,

Autêntico professor?

Quanto à questão

Do oportunismo na utilização

Do benefício

E na ingratidão

Contra o benfeitor

É coisa sabida,

Nem vou contestar

Nem sequer lamentar

Que é coisa perdida.

 

Berta Brás

TGV

 

 

Vamos levar com o TGV em cima. É já claro que a aposta na construção do comboio de alta velocidade está imparável. É verdade que essa decisão, que hoje parece definitiva, é um enorme disparate. Mas que interessa isso?

 

O TGV é uma tolice. Claro que o projecto tem vantagens (era o que faltava se não tivesse!) mas são muito inferiores aos custos esmagadores, não apenas financeiros, mas também ambientais, urbanos, políticos, entre tantos outros. As estimativas mostram já um valor astronómico do investimento, e todos sabem que acabará por derrapar para muito mais.

 

Mas as empresas construtoras precisam muito de grandes obras e os políticos anseiam por traficar dinheiros, conceder benesses e fazer inaugurações. A pressão é insuportável. Os governos no poder, ganhando esses dividendos, são sempre a favor e são contra na oposição. Dado que o resultado é inevitável, debates e atrasos só aumentam os custos.

 

Daqui a muitos anos vai-se ver que os comboios andam às moscas, têm de ser subsidiados de forma ruinosa e prejudicam outras formas de transporte. Já foi assim com o complexo de Sines, está a ser com os estádios do Euro 2004, será com o Alqueva. Mas que interessa isso agora? Uma coisa é o processo político, outra, muito diferente, a realidade económica e social.

 

Mas se neste momento é claro que vamos levar com o TGV, devemos no mínimo pedir uma coisa ao Governo: por favor, ao menos não tentem mais justificar o projecto! É que os disparates são tantos que, quanto mais inventam explicações, mais se enterram.

 

João César das Neves

 

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TEOTÓNIO SAIU À RUA

 

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Terá sido a partir de Leiria que D. Afonso Henriques decidiu fazer uma surtida contra Sevilha em retaliação contra as permanentes investidas muçulmanas sobre o território português que frequentemente chegavam tão longe como os campos do Mondego.

 

Desse fossado [1] resultaram grandes ganhos materiais para os cristãos pelo que os muçulmanos se decidiram por perseguir as forças de Ibn al-Rink, o filho de Henrique, a fim de recuperarem os bens de que tinham sido espoliados.

 

Lançada a perseguição, escolheram atacar em território aberto e vazio – a que então se chamava «ourique» – para que os cristãos não dispusessem de defesas naturais a que se pudessem acoitar.

 

Mas as evoluções no terreno e a sorte da batalha determinaram que os muçulmanos deviam fugir de volta a Sevilha deixando mortos espalhados pelo campo da luta e ali mesmo abandonando os peões moçárabes que os haviam acompanhado. Constituindo famílias inteiras, logo foram estes aprisionados por D. Afonso Henriques que dali mesmo marchou até à sua capital nas margens do Mondego.

 

Chegados às proximidades de Coimbra, logo a notícia se espalhou de que eram cativos moçárabes, os cristãos de rito visigótico.

 

Avisado na sua clausura, Teotónio saiu de rompante à rua em direcção ao cortejo que seguia o rei e ao encontrá-lo bradou-lhe rijas palavras em defesa dos cristãos que trazia assim cativos. Logo ali foram os cristãos libertados e Teotónio regressou à clausura em Santa Cruz.

 

Bernardo, Bispo de Coimbra, acérrimo defensor das reformas gregorianas, não terá gostado assim tanto dessa libertação e foi a partir daí que nunca mais houve paz perfeita entre a Ordem de Santa Cruz e a Sé de Coimbra que tanto se empenhou na instauração do novo «Império Romano».

 

Mas no final, foi Teotónio que subiu aos altares.

 

Abril de 2010

 

Henrique Salles da Fonseca

 

[1] - Incursão militar para saque mas sem intenção de conquista territorial

 

BIBLIOGRAFIA: Mattoso, José – D. Afonso Henriques, pág. 128 e seg. - Círculo de Leitores, Ed. 2006

MARTIM BEHAIM – SOB UM OLHAR AÇORIANO

 

 

Marcelino Lima, historiador e pesquisador açoriano, no seu livro Famílias Faialenses – Subsídios para a História da Ilha do Faial, faz uma breve história sobre Martim Behaim.

 

Segundo ele, o famoso construtor do mais antigo globo terrestre conhecido nasceu em Nuremberga entre 1430 e 1436. Seus pais, Martim Behaim e Agnes Schopper, provinham da remota Boémia e enriqueceram com o comércio na cidade de Nuremberga.

 

Martim Behaim filho recebeu uma das melhores educações que podia haver na época. Foi discípulo de Camille Jean Müller de Monte Régio (Regiomontano) célebre matemático e astrónomo. Aos 17 anos saiu de sua cidade natal e foi para Mechelen. Viajou como comerciante por Veneza, Anvers, Malines, Frankfurt, Viena. Sem muito sucesso nessa actividade, empregou-se em casa de mercadores e tintureiros de panos.

 

Em 1484, em Anvers, tomou contacto com flamengos que mantinham relações comerciais com Lisboa. Possivelmente impressionado pelas façanhas marítimas dos portugueses, resolveu visitar Portugal. Nessa época, a escola de navegação de Sagres recebia muitos homens, como Perestrello, Cadamosto, Colombo, Vespúcio, navegantes que ofereciam seu engenho e arte a quem quisesse descobrir os mistérios do mar. Todos buscavam fortuna, fama e reconhecimento. No começou supõe-se que chegou como especulador mas naquele meio náutico seu génio aflorou e a vocação para obras maiores levaram-no a ser reconhecido por D. João II, grande rei português, impulsionador dos grandes descobrimentos marítimos. Foi acolhido à célebre junta do aperfeiçoamento do astrolábio em que, entre outros, faziam parte os judeus médicos do Paço Mestre Rodrigo e Jusepe, facto contestado pelo historiador Joaquim Bensaúde (Legendes Allemandes). Acompanhou Diogo Cão na segunda viagem de exploração da costa africana (atingindo o rio Zaire). Foi premiado pelo rei que o fez Cavaleiro da Ordem de Cristo. Fez trabalhos valiosos para a navegação. Fernão Magalhães descobre o estreito a que deu o nome observando uma carta desenhada por ele. Colombo fortalece a sua ideia de viajar para o ocidente para atingir as Índias. Mas os portugueses já tinham fortes indícios de lá chegar navegando pelo oriente.

 

Numa das viagens que fazia com frequência a Lisboa, onde tinha também residência, o flamengo Josse Hurtere (Jorge Dutra), donatário das ilhas do Faial e Pico, travou conhecimento e relacionamento com Martim Behaim. Desta ligação surgiu o casamento dele com Joana de Macedo, filha do donatário das ilhas com a dama da corte portuguesa Brites de Macedo. O casamento provavelmente foi negociado, pois a noiva tinha de 13 a 14 anos e Martim Behaim já passava dos 40. Casado foi morar no Faial, na cidade da Horta. Em 1490 viaja à sua terra natal para receber a herança de sua mãe falecida a 1487.

 

Durante a permanência de dois anos em Nuremberga, construiu o famoso globo terrestre que lhe eternizou o nome e sobre o qual muito se escreveu de louvor, crítica, análise e controvérsia. Para a época, foi uma obra interessantíssima baseada à luz dos conhecimentos clássicos de Ptolomeu, Estrabão, Plínio, Marco Pólo e pelas novidades das descobertas portuguesas de que ele tinha conhecimento através das próprias experiências adquiridas nas viagens que fez.

 

Martim Behaim e o seu globo

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A obra de Martim Behaim, o globo terrestre, tinha 7,5 m de diâmetro, era revestido por pergaminho sobre o qual escreveu e desenhou o que se conhecia na época. É trabalhado em ricas iluminuras, contendo legendas explicativas. Os nomes dos lugares foram assinalados a tinta vermelha e amarela. A nacionalidade de cada país é indicada pela bandeira e brasão de armas respectivos a cores vendo-se também, referentes a cada região, os modelos de moradas e figuras de habitantes com os seus trajes típicos. É interessante notar que ele colocou as ilhas do Faial e Pico assinaladas sob bandeira das armas dos Behains.

 

O Faial é designado Nova Flandres em razão de serem de Flandres os primeiros colonos e o donatário Josse Hurtere, seu sogro. O Globo foi concluído em 1492 e oferecido a Nuremberga, sua cidade natal. Na Academia de Ciências de Lisboa há uma reprodução.

 

Voltando a Portugal, Martim Behaim vai para o Faial, onde ficou pouco tempo, pois o rei D. João II incumbiu-o de, em missão secreta junto a Maximiliano, rei dos romanos, para que este intercedesse junto à Santa Sé para legitimar D. Jorge (filho natural de D. João), que o rei se empenhava em habilitar para o suceder na Coroa. Porém, a caminho da missão, em alto mar, o navio de Martim foi tomado por um corsário que o levou para Inglaterra. Lá ficou três meses. Retido, adoeceu, mas mesmo assim conseguiu fugir a bordo de um navio pirata que o levou até França. De lá foi à Flandres. Em 1495 já se encontrava de volta a Lisboa. Lá ficou na obscuridade até ao seu falecimento, muito pobre, num hospital.

 

Num documento da época, da Chancelaria Real, conta-se que a sua jovem esposa tinha um relacionamento amoroso com um escudeiro de nome Fernão de Évora que foi expulso do Faial pelo irmão de Joana de Macedo e enviado a ferros para Lisboa. Em Cabo de São Vicente conseguiu escapar. Procurou e conseguiu o perdão do rei. Mas esse homem, desafiando a autoridade do donatário da ilha, confiando na carta de seguro que o rei lhe dera, tornou a voltar ao Faial. Ignorando a carta de seguro, autoritário e de maus bofes, desta vez prendeu o escudeiro e enviou-o para a Ilha da Terceira onde ficou retido.

 

Com pedidos de familiares junto à Corte, Fernão de Évora conseguiu junto à Coroa, um indulto. Liberto nunca mais se soube dele. Quanto a Joana de Macedo ficou-lhe a fama. Supõe-se que o marido ficou ciente do ocorrido, e por isso se isolou sozinho em Lisboa até morrer a 29 de Julho de 1507, onde foi sepultado na Igreja de São Domingos.

 

Em 1519, seu filho português do mesmo nome, mandou colocar em Nuremberg, na Igreja de Santa Catarina, uma lápide comemorativa em memória do pai. Na Praça Tereza há uma estátua de bronze dele com as armas de Portugal.

 

Joana de Macedo voltou a se casar desta vez com D. Henrique de Noronha (quarto neto de D. Henrique II de Castela), e foi viver na ilha da Madeira. Martim Behaim filho passava tempos em Lisboa, na casa de uma tia e na Madeira com a mãe. Numa das viagens entre a Madeira e Lisboa matou um homem, em legitima defesa. Foi solto devido à intervenção do legado pontifício que o considerava bom cristão e rapaz polido.

 

 

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Em 1520 Behaim neto vai a Nuremberg receber a herança que lhe pertencia pelo falecimento de seu tio Wolf. Na volta a Portugal trazia uma carta de recomendação do Senado de Nuremberg para D. Manuel pedindo que o empregasse no seu serviço, em atenção aos merecimentos do pai e da sua ilustre estirpe. Dessa data em diante não se tem mais nada relatado sobre a vida de Martim Behaim filho.

 

Uberaba, 3 de Março de 2010

 

 Maria Eduarda Fagundes

 

Dados e notas retiradas e resumidas do livro de Marcelino Lima FAMILIAS FAIALENSES. (Subsídios para a história da Ilha do Faial)

O ENSINO DA ENGENHARIA

E A DECLARAÇÃO DE BOLONHA – 2

 

 

Em 1998 reuniram-se na Sorbonne os Ministros da Educação da França, da Alemanha, da Inglaterra e da Itália, visando uma certa uniformização dos diplomas europeus, tendo produzido uma Declaração.

 

Em 19 de Junho de 1999 reuniram-se em Bolonha os Ministros da Educação de 29 países europeus (entre os quais o de Portugal e incluindo, portanto, alguns não membros da União Europeia) e produziram uma Declaração em que continuavam e aprofundavam os temas da Declaração da Sorbonne.

 

A Declaração de Bolonha visa criar um Espaço Europeu de Ensino Superior (EEES) em que, embora não havendo absoluta uniformidade - que não se deseja - haja possibilidade de facilmente encontrar equivalência entre os diferentes diplomas e níveis de estudo, que permitam grande mobilidade entre países, seja de estudantes, seja de diplomados.

 

Para isso, além de alguma semelhança em tempos de escolaridade, pretende-se criar um sistema de créditos (European Credit Transfer System, ECTS) que assegure a qualidade do ensino.

 

Em 19 de Maio de 2001, em Praga, voltaram a reunir-se os Ministros da Educação, um grupo agora alargado a 32 países. O objectivo, apresentado numa Declaração final, foi analisar os progressos feitos depois da Declaração de Bolonha, prosseguindo o trabalho que levará à criação do EEES.

 

*

 

Nas suas linhas gerais, a Declaração de Bolonha veio propor, em 1999, algo muito semelhante ao que consta dos meus escritos de 1994 e 1995. Apenas tenho dúvidas em relação ao expresso nessa Declaração sobre a "obrigatoriedade" de o primeiro grau académico - seja ele designado de bacharel, como prefiro, ou licenciatura, como parece ser desejo de muitas pessoas - dar preparação suficiente para exercer uma profissão. Isso não me parece compatível com um bom esquema de cadeiras em cursos como engenharia ou medicina - e, provavelmente, outros - que exigem um amplo conjunto de cadeiras básicas, necessárias à aprendizagem de variadas técnicas, mas que não conferem os conhecimentos específicos para exercer uma profissão.

 

Também me parece que o esquema que proponho, de 3 anos (mais um ano de estágio profissional, se for um bacharelato profissional) + 3 + 2 me parece mais satisfatório do que o de 3+2+2 ou 4+1+2.

 

Para a mesma quantidade de créditos por ano, quanto mais longa for a aprendizagem, mais bem preparado sai o estudante para o mercado de trabalho. Ele poderá, assim, escolher o nível a que deseja sair dos estudos, embora fique sempre com a possibilidade de voltar à universidade se quiser prosseguir esses estudos para um nível mais elevado.

 

*

 

A proposta que tenho feito e que me parece mais adequada é que os três níveis tenham as tradicionais designações de bacharel, licenciado e doutor. Depois da introdução do grau de mestre e com argumentos que não me parecem suficientemente válidos, muitas pessoas preferem eliminar o bacharel, ficando o licenciado, o mestre e o doutor. Mas o licenciado será, internacionalmente, considerado, como actualmente é, um bacharel, pois, como se referiu, é a quem tem um "Bachelor" que se manda fazer um "Master".

 

Se, no entanto, essa nomenclatura prevalecer, é óbvio que o título de "engenheiro" (tal como o de "médico") não pode ser atribuído ao nível de licenciado e deverá sê-lo, pelo menos, ao de mestre.

 

O título de “mestre” é usado, em Portugal, ou para o mais elevado dos doutores ou para o mestre sapateiro, mestre carpinteiro, mestre de obras, suponho que com origem nos ofícios da Idade Média, em que havia o aprendiz, o oficial e o mestre. Há ainda a antiga figura, simpática e carinhosa, do mestre escola. O título de bacharel, além de ter tradição, corresponde ao usado na Grã Bretanha e nos Estados Unidos, os países para onde temos enviado mais estudantes, especialmente para obtenção de graus superiores. Por esse facto, proponho os títulos acima indicados. Mas se, por razões que me escapam, for preferível usar “licenciado”, “mestre” e “doutor”, admito que o nome é um tanto secundário.

 

***

 

Para além dos engenheiros, a quem compete a concepção e comando da execução das respectivas actividades, a engenharia ocupa uma vasta gama de outros trabalhadores, a diferentes níveis, todos colaborando para um produto final. Por esse facto, além do ensino superior, com os níveis de "engenheiro técnico" e de "engenheiro", não deixa de ser importante abordar o problema do ensino até ao nível do 12º ano de escolaridade, onde igualmente se propõe um esquema a generalizar, que só em muito pequena parte está em execução.

 

A reorganização do ensino que levou ao desaparecimento das "escolas técnicas" e do "ensino médio" privou o País de pessoal com formação a esses níveis, de que vários sectores e em particular a engenharia muito necessitam.

 

Muitos estudantes que deixam a escola ao fim do 9º ano (escolaridade obrigatória) ou do 12º ano, entram no mercado de trabalho sem qualquer qualificação profissional, o que, além de maior dificuldade em encontrar emprego, cria, por vezes, frustrações em quem se vê obrigado a ir fazer no seu trabalho, quando o encontra, uma formação que não possuía. Por esse motivo se considera importante para a engenharia - e não só... - uma generalização do sistema que se propõe.

 

O ensino básico - obrigatório - deve poder ter, a partir do início do 5º ano, duas vias.

 

Terminado o 4º ano, teremos a possibilidade de seguir a via central, que visa, essencialmente, a preparação para a universidade, ou uma via profissionalizante que dê, ao fim do 9º ano, uma profissão. É muito vasto o elenco de profissões, cada uma com o seu curriculum próprio. Naturalmente, cada escola apenas poderá oferecer um certo número desses cursos, dependendo das infra-estruturas e do pessoal disponível.

 

Terminado o 9º ano profissionalizante (válido como escolaridade obrigatória) o estudante possuirá uma profissão e poderá entrar imediatamente no mercado de trabalho em melhores condições do que com o 9º ano "académico".

 

Mas o sistema não deverá impedir ninguém de prosseguir os seus estudos e o diplomado com o 9º ano e uma profissão pode seguir uma de duas vias. Uma é continuar na via profissionalizante para um nível profissional mais elevado, até ao 12º ano, que lhe permitirá entrar directamente no mercado de trabalho, a esse nível. A outra é fazer um ano lectivo adicional, em que aprenda as matérias que teve de sacrificar para aprender uma profissão e entrar seguidamente no 10º ano da linha central.

 

A partir do 9º ano, na linha central, pode igualmente seguir uma de duas vias. Ou a linha central, até ao 12º ano, ou a linha profissionalizante que lhe dê, ao completar o 12º ano, uma profissão a esse nível.

 

Também deste ponto poderá, se desejar voltar à linha central para acesso à universidade, fazer um ano lectivo que lhe dê as matérias que teve de sacrificar para aprender uma profissão.

 

 Miguel Mota*

 

* Engenheiro Agrónomo, Investigador Coordenador e Professor Catedrático, jubilado

 

Publicado na "Ingenium" (Revista da Ordem dos Engenheiros) Nº 65, Fevereiro 2002

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