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A bem da Nação

CRÓNICA DO BRASIL

 

INFELIZMENTE NÃO HÁ NADA A FAZER!
 
O céu estrelado por sobre mim e a lei moral dentro de mim.
Immanuel Kant
 
Este país é agora adulado por dois extremistas fascistas, um de direita e outro de esquerda, qual deles o pior, e que o diabo escolha se for macho suficiente: um, ministro dos negócios estrangeiros de Israel, Avigdor Lieberman, racista e extremista, que vem pedir ao nosso big kxk que não dê muita ênfase à visita do presidente do Irão, Mahmud Ahmadinejad, extremista e racista – amigo dos peitos do Chavez –, que decidiu que a sua primeira visita, após tomar posse para o segundo mandato, seja ao Brasil, para, em primeiro lugar mostrar ao mundo que há um país importante que louva o resultado daquelas malditas eleições, e ao mesmo tempo pedir ajuda para ver se o Brasil também “malha” nos sionistas!
Não há melhor interlocutor para os receber e deixar que ambos chorem no seu ombro, do que o nosso big sheriff! Como jamais fez alguma coisa pelo país sendo seu máximo dirigente, nem reformas básicas, nem investimento em infra-estruturas, nada, e com o desastre que tem sido a actuação do nosso (deles!) ministério das relações exteriores, o resultado destas duas famosas visitas... vai ser zero.
Zero para eles e abaixo de zero para o Brasil. Uma beleza, ou uma vergonha, recebermos dois indivíduos que são, cada um no seu extremo, o oposto da democracia, dos direitos humanos, da dignidade? País nenhum os recebe, e eles vêm procurar apoio no Brasil!
Sérgio Vieira de Mello*, um dos grandes e esquecidos homens deste país, tristemente assassinado num ataque com carro bomba na loucura do Iraque, em Bagdad, onde estava como chefe da missão da ONU, disse um dia, numa aula no Instituto de Altos Estudos Internacionais da Universidade de Genebra:«...uma das dificuldades insolúveis mais antigas e mais profundas do pensamento e do comportamento humano é a tensão, a incompatibilidade, o choque entre a moral e a política». E continua: «Que a política seja, por essência, distinta da moral, está mais do que claramente demonstrado pela existência da história. Mas essa incompatibilidade seria a confirmação cínica da inevitabilidade do mal, e do mal absoluto da história. Sem dúvida alguma, a escolha mais fácil, mas também a mais irresponsável, é aquela em que tudo, absolutamente tudo, pode ser rediscutido. Tal posição é manifestamente insustentável».
Sérgio Vieira de Mello
(Rio de Janeiro, 15 de Março de 1948 - Bagdad, 19 de Agosto de 2003)
 
Esta linha de pensamento define os grandes homens, talvez os homens normais. Estes não discutem nem ética nem moral. Elas são intrínsecas ao carácter do homem, com «H» maiúsculo, que o distingue das bestas, grandes ou menos grandes.
O espectáculo a que, cada vez mais profundamente estamos a assistir neste país, é de uma degradação impressionante. Não escapa governo, nem senado, nem câmaras, sejam elas de deputados federais, estaduais ou municipais, nem polícia, nem tribunais. Nada! Tudo se vende, tudo se compra, tudo se corrompe.
Imagino que quem aqui não viva possa fazer a pergunta: «Como é que o país sobrevive e ainda progride?» É que, apesar de tudo, são quase 200 milhões de habitantes que todos os dias têm que lutar para sobreviver, alguns para vencer e, por muito que o (des)governo se ausente e descomande, que o senado se corrompa até à vergonha absoluta, que os tribunais castiguem o ladrão de galinhas e deixem impunes os «colarinhos brancos», aliás «colarinhos de ouro», o país tem que crescer.
A leitura de qualquer jornal, diário, é pior do que tratamento de choque! Choque de pouca-vergonha, de violência, de impunidade e sobretudo o choque do descaramento com que tudo se embrulha e discute e rediscute, como se roubar aos biliões os dinheiros públicos, corromper a todos os níveis, fosse coisa de somenos. Como disse Sérgio Vieira de Mello, isto é insustentável. Este grande brasileiro não viveu o suficiente para ver o seu país degradar-se moral e eticamente até ao mais baixo nível, o que lhe teria sido doloroso, como é para todos nós. Uma vergonha.
Vê-se o presidente defender com todos os meios – $$$ – de que dispõe, e parecem ser infindáveis, os agora seus correligionários que ainda há poucos anos eram os mais ferozes adversários políticos, que ele insultava em comícios chamando-lhes de ladrões! Mas hoje precisa deles na chamada «base» para sustentar a sua inépcia!
Um ex-presidente da República, que consegue extorquir das formas mais absurdas verbas fabulosas para enriquecer mais ainda, a ele e a família! Que inclusive «esquece» de participar no seu imposto de renda mais uma «casinha» em Brasília avaliada em 5 milhões de reais!
Ver outro ex-presidente que foi corrido por indecente e má figura, a quem o actual, na época, se atirou como hiena a carniça, ser tratado como grã-senhor, abraçando-se ambos com sorrisos de «velha e longa amizade»! Para «nós» (eles) os donos do poder, a sociedade dominante, tudo. Para o resto, o povo imbecil que vota sem ter a mínima noção do que está a preparar para si próprio, o desprezo, o cinismo, o abandono. Referindo uma vez mais Sérgio Vieira de Mello: «...como sociedades diferentes podem desenvolver tamanha desconsideração implacável pela vida humana!»
Perdeu-se totalmente o senso. Qualquer senso. Não há moral nem ética, muito menos vergonha.
A tal lei moral, de que fala Kant é ignorada. Só o céu continua estrelado! Porque os corruptos ainda não conseguiram apoderar-se dele!
 
* ler: Sérgio Vieira de Mello - Pensamento e Memória. Org. Jacques Marcovitch, EDUSP e Ed. Saraiva, 2004.
 
Rio de Janeiro, 24 de Julho de 2009
 Francisco Gomes de Amorim

 

DESFIGURAÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE

 

 

 


 

 

 

 

1. No consulado de Sócrates e MLR intensificou-se o processo de mercadorização da educação, com o argumento de que os professores e as escolas públicas estavam a deixar para trás um número demasiado grande de crianças. Em 2005, logo que Jorge Sampaio regressou da Finlândia, e com ele uma comitiva de professores e opinion makers socialistas, MLR lançou uma campanha contra os professores centrada no absentismo docente, nas taxas de insucesso e abandono e na carga horária lectiva. Tenho para mim, embora sem dados comprovativos, de que Jorge Sampaio exerceu um papel importante na campanha. E voltaria a exercer papel importante na viagem que fez ao Chile e de onde o think tank de apoio a MLR trouxe o modelo burocrático de avaliação de desempenho.


2. Imposta à opinião pública a ideia falsa de que os professores faltavam muito, de que trabalhavam pouco e de que eram os responsáveis pelas taxas de abandono e de insucesso, estava criado o ambiente propício para lançar o maior ataque de sempre a um grupo profissional. A estratégia seguida foi a da correnteza legislativa: mudar tudo ao mesmo tempo, fazendo abater sobre as escolas o maior volume de despachos, portarias, decretos e leis de que há memória. Os professores ajoelharam. Tornaram-se os bodes expiatórios do sistema.

3. A primeira medida foi a verticalização da carreira e a divisão dos professores em duas categorias. Os professores embarcaram nela, acorrendo em massa ao 1º concurso para titulares porque receavam represálias e retrocessos profissionais caso não concorressem. O ME jogou com a incerteza e o medo. E ganhou.

4. De seguida, o ME fez abater sobre as escolas o modelo de avaliação de professores mais burocrático do mundo. Muito mais burocrático do que o modelo chileno, trazido do país dos Andes pela comitiva que acompanhou Jorge Sampaio a Santiago do Chile. As escolas e os professores ajoelharam ainda mais. E demoraram algum tempo a levantar-se.

5. A terceira etapa no processo de mercadorização da educação foi a destruição da gestão democrática. É um processo em curso que será concluído em 2009. A criação de um subsídio de chefia de 750 euros para os PCEs (em escolas com mais de 1200 alunos e um pouco menos para as restantes) é apenas um exemplo do que aí vem. Seguir-se-á a perseguição aos professores insubmissos e aos que tiverem a coragem de lutar contra a agenda anti-intelectual do ME e das DREs.

6. Em simultâneo, o ME criou os mecanismos de prolongamento da carga horária semanal dos professores, roubando-lhes o tempo para a reflexão, a leitura, a preparação das aulas e a relação pedagógica. Em vez de tempo para ler, para acções de formação, para aprofundamento dos estudos e para a preparação das aulas, os professores foram esmagados com procedimentos de prestação de contas: preenchimento de inquéritos, relatórios, registos, tratamentos estatísticos, fichas, actas, grelhas, etc. Foram humilhados e transformados em burocratas subalternos, fazendo lembrar o burocrata infeliz retratado por
Franz Kafka no livro "O Processo".

 


7. Em 2008, estava consumada a agenda anti-intelectual de Sócrates e de Maria de Lurdes Rodrigues. Foi criada uma nova concepção de escola e um novo paradigma de profissão docente: a escola como instituição de guarda, de prestação de serviços sociais de apoio à família e de construção de competências meramente utilitárias e instrumentais; o professor como trabalhador social, guarda de crianças, empregado doméstico dos pais, animador e terapeuta generalista. É preciso dar nomes às coisas. E eu vou dar: o professor faz-tudo e a escola da Dona Margarida.

8. Agora só falta formar os professores à medida da nova concepção de escola. A escola da Dona Margarida exige professores generalistas. E o que são professores generalistas? São professores que não sabem de nada em profundidade mas têm a lata de pensarem que sabem um bocadinho de tudo. Esses professores começaram a ser formados no ano lectivo de 2007/08. A primeira leva frequenta, actualmente, o 2º ano. Falta-lhes mais um ano para completarem a licenciatura bolonhesa em Educação Básica. Depois, têm mais 3 semestres pela frente para ficarem com um mestrado bolonhês e as habilitações profissionais para leccionarem tudo e mais alguma coisa do 1º ano de escolaridade até ao 6º ano de escolaridade. Os primeiros mestres bolonheses de ensino de generalidades serão diplomados em 2011/2012. A tempo de concorrerem ao concurso nacional de 2013. Serão os primeiros professores bolonheses inteiramente formados à medida da escola da Dona Margarida. Depois, só falta dar-lhes habilitação profissional para leccionarem um pouco de tudo até ao 9º ano de escolaridade. A pouco e pouco, chegaremos lá.
 
 Mendo Castro Henriques
in:  http://www.profblog.org/

As uvas da nossa vinha

 

 
Quando criança, vivi numa aldeia portuguesa com fruta, que eu arrancava directamente das árvores, subindo às macieiras, cerejeiras, colhendo os abrunhos de um pequeno abrunheiro do nosso quintal, na casa alugada.
 
Mais tarde, em Moçambique, eram bananas, papaias, mangas, laranjas, goiabas, ananases, as frutas da terra, mas tinha saudades da fruta da minha aldeia. Havia também uvas, peras, pêssegos, maçãs, fruta bonita importada da África do Sul, de clima temperado como o nosso aqui. Mas o sabor não era o mesmo do da encantada infância.
 
Recuperei esses sabores quando retornei, porque eram bons ainda os produtos que chegavam do campo aos mercados. Mas a entrada na “Europa” criou entraves à fruta e a tantos produtos da nossa praça. A nossa fruta não tinha tamanho suficiente para ser vendida nos mercados europeus, incluindo o nosso. Pagou-se aos camponeses para abandonarem as hortas, Portugal caiu na modorra produtiva.
 
Houve laranjas e tomates destruídos nas ruas, porque não vendáveis nas praças, Portugal secou nos campos. Preservaram-se, contudo, apesar das destruições impostas, vinhos da nossa lavra, alguns com direito a prémios internacionais. Vinho é sempre algo a preservar e não houve Europa que no-lo fizesse dispensar.
 
As praças abundaram em fruta estrangeira, do tamanho próprio, calibrado, das suas clonagens esterilizadas, sem o sabor do nosso solo não artificial e do nosso sol criador, mas com o tamanho necessário para as nossas importações de povo que se abotoou com a côdea do servilismo, deixando os campos maninhos donde lhes viera antes o proveito, sem saudades das terras verdes de outrora, os velhos cada vez mais velhos, os filhos e netos optando pelas cidades de mais cultura e possibilidades de sobrevivência.
 
Abriu uma loja da fruta aqui perto. E oh surpresa! A proveniência da fruta, tirando as bananas e as papaias, diz “Portugal”. E também os feijões e os nabos e os grelos. Comi uva da nossa! E figos, e pêssegos, retomei os velhos sabores do passado.
 
 Que se passou? Será que já se pode trabalhar a terra para vender ainda que só como produto caseiro? Serão novas as directivas impostas pela União Europeia, envergonhada com a sua política de intrusão anterior na vida económica dos povos da sua esfera política?
 
Mas se se quiser que o nosso povo trabalhe agora, que envelheceu com direito a vencimento e a reforma, o nosso povo dirá, gasto, solitário e indiferente: Vai tu.
 
Porque deve ser muito difícil limpar os campos maninhos, endireitar, de novo, a nossa vinha, para vender as suas uvas, bem mais saborosas do que as de importação.
 
Destruir é imediato, a reconstrução muito mais penosa.
 
Berta Brás
 

POSTAIS ILUSTRADOS XXII

 

TEOLOGIA DA ECONOMIA II
Parte III
(Continuação)
Tudo e Nada
 
 
“Há quem passe pelo bosque e apenas veja
lenha para a fogueira”. Leon Tólstoi
 
 
 
A Encíclica caiu no seio do G8 alargado.
 
Teria sido a sopa que caiu no mel? Ou o contrário? Quem sabe? São misteriosos os desígnios do Vaticano! A agenda emparelhou com a intenção e conteúdo da “Caritas in Veritate”. Foi clarividente e oportuno! Um outro Homem, há 34 anos, Valéry Giscard d’Estaing, presidente da República Francesa, apadrinhou e levou a cabo uma reunião de chefes de Estado, dos países economicamente mais fortes do mundo, para discutir uma agenda política comum, nomeadamente, os assuntos de ordem internacional que poderiam influenciar e afectar as políticas internas e, estas, vice-versa, influenciar e afectar as relações internacionais.
 
Esta visão é agora repetida, num outro plano, por Bento XVI, chamando à colação os temas que um grupo de poderosos países de indefectível e determinante influência vão analisar e que não podem eximir-se de ver as árvores do bosque e que estas (as árvores), no Mundo de hoje, não são lenha para a fogueira dos problemas económicos, políticos e sociais com que se debate a comunidade internacional.
 
As Igrejas do Mundo também devem fazer cimeiras deste género (I8) para dar uma “mãozinha” ao esforço do G8 e colocar os seus fiéis no caminho de uma ajuda efectiva aos seus semelhantes, atingidos pelo infortúnio da miséria e da enorme humilhação da fome injusta, mas solucionável. Esperemos que de L’Aquila, surja um furacão de vontades unânimes e sob a sombra das Igrejas que o actual Sumo Pontífice terá a humildade, caridade e dever de fazer congregar à sua volta, tenha ficado a semente de uma nova era, recolhendo os frutos do longínquo 1975 [1], e que os temas tratados, não sejam pura e simplesmente ignorados, ou postos em movimento com a lentidão que é peculiar nas teias burocráticas dos Governos das Nações.
 
 
É preciso lançar o alerta da premência e consciencializar todos para a urgência da defesa dos valores humanos em prol da sobrevivência da nossa própria Humanidade!
 
Viajemos, então, pelo pensamento de Bento XVI: “O lucro é útil se, como meio, for orientado para um fim que lhe indique o sentido e o modo como o produzir e utilizar. O objectivo exclusivo de lucro, quando mal produzido e sem ter como fim último o bem comum, arrisca-se a destruir riqueza e criar pobreza.[2]
 
O que Bento XVI nos quer dizer é que o fim aceitável do lucro, numa economia capitalista, não deve ser enriquecer uns quantos, mas enriquecer a Comunidade para que deva ser redistribuído. E, mais adiante, escreve o Santo Padre, o seguinte: Actualmente o quadro do desenvolvimento é policêntrico. Os actores e as causas tanto do subdesenvolvimento como do desenvolvimento são múltiplos, as culpas e os méritos são diferenciados. Este dado deveria induzir a libertar-se das ideologias que simplificam, de forma frequentemente artificiosa a realidade e levar a examinar com objectividade a espessura humana dos problemas”.[3] Acutilante! Atendendo que na extensa Agenda do G8 se incluiu, tendo em conta o cenário de agitação internacional, a análise do recente golpe militar que teve lugar nas Honduras e os distúrbios causados pelo resultado do processo eleitoral iraniano, em matéria de política internacional, bem assim, a preocupante agitação que decorre dos recentes testes bélicos ocorridos na Coreia do Norte e as violentas agitações de natureza político-religiosa ocorridas na China. Por outro lado, em matéria social, o espectro da fome faz também parte dos pontos da Agenda, já que a segurança alimentar também é matéria fundamental, cuja existência, mormente nas regiões da África profunda e entre os movimentos de refugiados originários de conflitos regionais, exige ser discutida.
 
Hodiernamente, mesmo com os altos níveis de produção de cereais, o problema da fome é cada vez mais preocupante. Novos apoios a programas de controlo de natalidade; novos modelos de distribuição da produção agrícola e as ajudas com carácter de urgência aos países mais necessitados, constituídos, também, pontos cruciais desta panóplia de debates, são realidades que não têm fácil solução.
 
Outro antigo, mas não menos importante tema de reflexão é a questão ambiental, sabido que, do Protocolo de Kyoto não se conseguiu ainda a unanimidade na redução dos índices de emissão de CO2 e isto é um ponto fulcral para que o aquecimento global e outras catástrofes naturais sejam evitados. Mas, no próximo texto, abordarei com mais pormenor, a questão do lucro e a espessura humana dos problemas, tópicos que são essências para uma melhor identificação do pensamento de Bento XVI, em contraste com as receitas milagrosas para estes tempos conturbados da Crise que nos oferecem certos “autores” e cujos livros vendem milhares de exemplares. É assim! Em terra de cegos quem tem um olho é rei e há que aproveitar a onda da crise, vendendo sonhos e disparates aos incautos sequiosos de encontrar uma panaceia para a sua falta de dinheiro.
 
Os Homens não têm mesmo juízo e continuam sempre a bater no mesmo, sem descanso, e sem qualquer resquício de sensibilidade. É o salve-se quem puder, mesmo que isso equivalha a destruir tudo...
(continua)
 
 Luís Santiago
[1] A primeira reunião teve lugar em Rambouillet , nos arredores de Paris, a 15 de Novembro de 1975;
[2] Encíclica Caritas in Veritate – CAPÍTULO II – O DESENVOLVIMENTO HUMANO NO NOSSO TEMPO, Ponto 21;
[3] Idem, ponto 22.

David e Golias

 

 Confronto em África
 
O livro de Witney Schneidman, “Confronto em África”, editado em português pela Tribuna, 2005 - de que só agora tomei conhecimento –, constitui excelente exemplo de objectividade e exactidão (quase [1]) em matéria de relato histórico. Diria mesmo que no que toca ao braço-de-ferro luso-americano suscitado por John Kennedy e continuado posteriormente por  diversos grupos americanos constitui a melhor peça de toda a abundante literatura produzida sobre o assunto. A luta entre Kennedy, Presidente da nação mais poderosa do mundo, e Salazar, chefe de um governo falho de força militar moderna visível, está magistralmente descrita e mostra como o pequeno David soube usar a sua “funda” diplomática para "cegar" o gigante Golias e frustrá-lo nos seus intentos.
    
Schneidman fez parte da direcção do State Department durante a administração Clinton e posteriormente especializou-se em assuntos africanos. Além de um doutoramento nos EUA, tem um mestrado na Universidade de Dar-es-Salaam. Reúne pois fortes credenciais para se ocupar destas matérias. Eu sinto-me em boa posição para poder avaliar da veracidade do relato e da lucidez da conclusão pois testemunhei os principais factos registados pelo autor. Estava como observador no Conselho de Segurança das NU quando o delegado da Libéria propôs – com geral surpresa – uma reunião do dito Conselho para se ocupar da situação em Angola [Fevereiro 1961]. Até aí, pensava-se que em Angola estava tudo sossegado. [Na realidade, tinha havido um ataque às prisões em Luanda mas a notícia de tal feito não chegara Nova York.] O pedido da reunião foi  pois o toque da trombeta  anunciador do início das hostilidades no terreno e de tudo o mais que aconteceu dentro e fora do território. Pouco depois,  fui eu transferido para Washington que Kennedy transformara em quartel-general das cruzadas em que se empenhou contra Salazar, Fidel Castro e Ho Chi Minh. Posteriormente fui nomeado chefe da repartição política África-Ásia (ao tempo designada por Negócios Políticos Ultramarinos) onde continuei a acompanhar até 1965 a luta diplomática suscitada pelo Império Português.  
 
Como Schneidman regista, as campanhas em que Kennedy se empenhou foram-lhe funestas. Os sucessores de Kennedy afastariam a questão portuguesa da Casa Branca e Nixon – que se rendeu a Ho Chi Minh – acabaria por apoiar a posição portuguesa em África.
 
O relato de Schneidman sobre a evolução da situação no terreno já não me parece tão exacto como a sua narração do processo diplomático. O autor fala de grande actividade militar em Angola nos anos 1972 /73, enquanto eu, que viajei intensamente por toda Angola nesse tempo, não notei ali o menor sinal de agitação. Actividade militar havia em Moçambique e na Guiné. Diria contudo que o autor está certo quando aponta a chegada à Guiné do míssil russo Sam 07 como o facto que tornou irreversível a vitória final dos movimentos nacionalistas africanos. A tecnologia não cede o seu lugar.
 
Havia muito a referir sobre tudo isto; entendo porém que não nos devemos enfronhar demasiado nas brumas do passado. Daí não vem grande benefício. O passado não explica o presente. Quem diria que este nosso presente seria o futuro daquele passado? De tudo o que aconteceu eu guardo o sentimento gratificante de que, numa determinada altura, a minha vida se cruzou com o destino histórico do meu país e isso conferiu-lhe transcendência. Se foi uma hora  gloriosa ou uma hora triste é secundário. O que ficará para a história é a forma como se viveu o momento e não me resta dúvida que, sob a batuta de Salazar,  o fizemos com dignidade.
 
Morrer sim, mas devagar.
 
Estoril, 25 de Julho  2007
 
General Domingos de Oliveira - A bem da Nação Luís Soares de Oliveira

 

1] As pequenas falhas que notei na parte diplomática não têm consequência de maior. Garin não era o embaixador em Washington em 1961 (p. 59). O convite para encontrar os estudantes angolanos na Universidade de Lincoln foi dirigido a Teotónio Pereira e este embora não tenha comparecido pessoalmente enviou-me a mim – ao tempo 1º Secretário da Embaixada – para o representar. A Universidade convidou o Rev. Mac Veigh, ex-missionário em Angola e realizou-se  uma sessão de apresentações e debate da situação angolana perante os corpos docente e discente da Universidade. Nunca me esquecerei de tal experiência. Acabou bem. No final, no Campus, os estudantes angolanos rodearam-me e, entre outras coisas, queriam saber se o Benfica tinha ganho a Taça dos Campeões europeus. “Ganhou”, disse-lhes eu e a notícia produziu vibrante manifestação de regozijo. O corpo discente da Universidade olhou-nos com espanto e indisfarçáveis sinais de receio. A conversa decorria em português e os doutos professores não sabiam do que falávamos.

Restaurar a Pátria

 

 
A decantada crise económica não é mais que um tumor de fixação de um mal generalizado e profundo. Efectivamente do que se trata é da contumaz e desabrida subversão de uma ordem. Verdadeiramente o que está em curso é a destruição ignominiosa dos fundamentos e dos valores de uma Civilização. A crise não é propriamente de economia, mas de doutrina e de autenticidade.
 
O despudor hedonista, a ânsia materialista, o desaforo consumista, tornaram o Ocidente ocioso, guloso e balofo; a adopção desse filho espúrio que é o existencialismo ateu justificou a alienação do seu sentido, da sua missão, do seu destino; com o mesmo efeito, a promoção da versão eufemista e anestesiante de existencialismo, aquilo a que hoje se vai chamando humanismo para significar-se o homem referenciado a si próprio.
 
consumo
O deus consumo, novo ícone
 
Descambou-se numa civilização do comprimido e do botão, símbolos míticos da renúncia ao sofrimento e ao esforço; de renúncia ao merecimento. Vivem-se as falácias do progresso e do bem-estar como simples frutos de reivindicação e, como resultado, as frustrações que geram o niilismo que se afirma e massifica. Impera o pacifismo, mistificação da paz, para justificar a desmobilização que nos prepara para ser presas fáceis de qualquer paz que não é a nossa.
 
O pragmatismo que começou por ser uma tentadora filosofia do senso comum e prático e se converteu na confusão entre a prossecução da verdade e a prossecução do útil imediato. A tecnocracia que cingiu a avaliação dos custos dos bens de que gozamos a um cálculo económico-contabilistico imediatista e vem propor como objectivos para o destino das nações, números, taxas, e que se vangloria de atingi-los como se governar se reduzisse a gerir cifras.
 
Os governantes dos regimes que nos sujeitam não alcançam ou não querem assumir a responsabilidade que os legitimaria, ou seja, a defesa dos autênticos princípios e valores pátrios, o prescutar dos clamores abafados da nacionalidade, o apontar e dirigir objectivos de dignidade, de grandeza e de missão, o realizar de um destino.
 
Perdida a perspectiva da história, subalternizada a Honra, repudiado o Heróico, ficamos à mercê de um qualquer internacionalismo, ficamos satisfeitos com as aparências e devotos do comodismo. Esquecemos, fazemos por esquecer, que mesmo os bens materiais de que dispomos e em que as gerações de hoje se atafulham despreocupadamente são árduas afirmações civilizacionais, frutos de uma cultura milenária e de uma esforçada luta de conquista. Merecê-los – quando eles nos não dominam, nem diminuem, nem adulteram – não resulta só de ter moeda para dar em troca, mas também da disponibilidade para nos batermos. Nos tempos que correm pululam os exemplos de que assim é, e, triste sinal dos tempos, concomitantemente os exemplos de tibieza dos supostos primeiros responsáveis em defender uma herança e fazê-la prosperar. Crise de pensamento, crise de acção, crise de identidade; desordem nos espíritos, desordem na convivência, desordem nos objectivos; eis a degradação do Ocidente.
 
Assim, particularmente, está Portugal, país sem projecto, amputado no espaço, na população e na alma, cerceado na vocação, distraído do destino. Não se fale então em recuperar a economia, antes afirme-se o imperativo de restaurar a Pátria.   
 
 
 
Herlander Duarte
 
 

CITANDO...

 

De tanto ver triunfar as nulidades,
de tanto ver crescer as injustiças,
de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude,
a rir-se da honra,
a ter vergonha de ser honesto.
 
Ruy Barbosa
(Salvador, 5 de Novembro de 1849Petrópolis, 1 de Março de 1923) era jurista e foi político, diplomata, escritor, filólogo, tradutor e orador

HERÓIS DE CÁ - 24

 HEDONE E A FÉNIX

 
 
 
A História não pode ser distorcida ou branqueada, deve ser escrita com verdade e interpretada com pudor.
 
Se em Portugal o processo político seguiria a partir de 1976 por vias pacíficas, já o mesmo se não poderia vir a dizer de Angola, Moçambique, Timor e Guiné-Bissau onde grassaram flagelos humanos de clamorosa dimensão. Apareça alguém a citar a «descolonização exemplar» e terá por certo os descendentes de milhares de mortos a desmenti-lo.
 
Quanto a nós, sem armas, não se tratava de lamber as feridas deixadas pela peleja calada em Novembro de 1975: era a ocasião de definirmos um modelo de sobrevivência que assegurasse a soberania nacional tomando como base uma dimensão territorial pouco maior do que aquela que tínhamos em 1415. E se não podíamos contar com as riquezas naturais espalhadas pelo Império que deixáramos de gerir, o que fazer?
 
Em terminologia moderna, a resposta é: não podendo contar com o hardware, haveria que cuidar do software. Mais prosaicamente: tinham-se ido os anéis, tratássemos dos dedos.
 
Das riquezas naturais restava o amealhado por uma política mercantilista e relacionamento financeiro com o exterior controlado em exclusivo pelo Banco de Portugal[1] em cujas caves se acumularam centenas de toneladas de ouro[2]. Eis a «pesada herança» que alguns abutres se apressariam a tentar desbaratar.
 
Nas riquezas humanas prevalecia uma grande desorientação. A começar pelos desalojados[3] do Império que num ápice se viram esbulhados de tudo o que haviam amealhado ao longo de vidas de trabalho na construção de “novos Brasís” passando pelos que cá estávamos ainda meio atordoados com as zaragatas por que acabáramos de passar e até àqueles que tudo haviam perdido na Reforma Agrária e nas demais nacionalizações, intervenções, saneamentos e aposentações compulsivas.
 
Portugal estava em cinzas físicas e morais. Tornava-se imperioso e urgente remotivar a Nação.
 
Perfiladas as várias hipóteses com respaldo internacional desde o comunismo[4] à democracia-cristã passando pelo socialismo e pela social-democracia, todos se apresentaram com as soluções típicas das respectivas orientações doutrinárias. Já tínhamos optado por um regime parlamentarista (apesar de apregoado como semi-presidencialista), faltava agora definir um modelo que assegurasse a soberania nacional.
 
As alternativas que se perfilaram à escolha dos eleitores não deram muitas hipóteses de escolha pois os comunistas apregoavam algo ao estilo salazarista do «orgulhosamente sós» enquanto não pudessem voltar a impor a tenaz, a hipótese atlantista padecia então de clara precocidade uma vez que os PALOP’s ainda não estavam em condições de rejeitar a esfera soviética e todos os demais Partidos (PS, PPD e CDS) preconizavam uma aproximação à CEE – Comunidade Económica Europeia.
 
Mesmo os euro-cépticos (eu, por exemplo) optámos pela aproximação à CEE pois isso significava que seríamos uma democracia parlamentar e que não cairíamos nas mãos da URSS.
 
E como os principais oradores diziam o mesmo, ganharia quem mais gritasse e mais prometesse. Em resumo, todos diziam que nós (os eleitores) tínhamos todos os direitos, tínhamos direito a tudo e JÁ!
 
Hedonismo primário, o mais prometido
 
Há quem lhe chame cultura post-moderna e outros eufemismos do género. Eu sou adepto da frontalidade e chamo-lhe demagogia e hedonismo, dupla dançante que ganhou as luzes da ribalta portuguesa e que sistematicamente cortava as asas à Fénix.
 
Para já, contávamos com promessas e cinzas...
 
Julho de 2009
 
 Henrique Salles da Fonseca


[1] - A que reportavam os outros dois emissores, o Banco de Angola e o Banco Nacional Ultramarino.
[2] - Essa riqueza não tinha só origem na exportação de bens mas também de serviços. Por exemplo, na remuneração do trabalho dos magaíças: a África do Sul pagava em ouro a Portugal o equivalente ao trabalho dos moçambicanos nas minas daquele país; os trabalhadores eram parcialmente pagos em Rands (argent de poche de que viviam enquanto emigrados) e complementarmente em Escudos moçambicanos emitidos pelo BNU (as verdadeiras poupanças com que se estabeleciam «no regresso a casa»).
[3] - Errada e quase pejorativamente apelidados de «retornados».
[4] - No rescaldo do 25 de Novembro de 1975 Melo Antunes, moderado Conselheiro da Revolução, «pedira» em entrevista na RTP que não baníssemos o PCP do teatro político. Na altura a ideia foi recebida com alguma estupefacção mas hoje sabemos que Melo Antunes teve razão: se o PCP tivesse regressado à clandestinidade, não ostentaria hoje a caducidade que evidencia.

Era o vinho, meu bem...

 

 

 

Não era destas uvas que se fazia o vinho para Angola !

 

 


Desde os primórdios da expansão portuguesa, e de outros países, pelo mundo, depois do sucesso das especiarias do Oriente e do ouro e preciosidades saqueadas pelos espanhóis aos astecas, mayas, incas e outros, o grande “negócio internacional” acabou por se fixar no tráfico de escravos, onde o Brasil teve um papel importante. E importante sob diversos aspetos:

- primeiro porque precisava de mão obra, que nem Portugal tinha nem os indígenas proviam;
- depois pelo lucro do tráfico entre os diversos portos de África e outros tantos espalhados pelas Américas do Sul, Centro e Caribe, indo até a Argentina;
- e como centro de produção de alimentos, tal ainda hoje é, e mais ainda será em futuro breve, enviou para Angola imensos produtos que por África se foram difundindo, sobretudo a mandioca, o milho, o amendoim, a cana de açúcar, e outros, que rapidamente alteraram os hábitos alimentícios de muitas populações africanas, conseguindo melhorar a sua saúde e resistência. O número de habitantes cresceu sensivelmente em função da melhoria da alimentação.

Curioso notar que já no século XVII os principais “exportadores” de escravos de Luanda eram mestiços brasileiros, como o foram mais tarde em outras regiões de África.

Do Brasil ia muita “farinha de guerra”, a farinha de mandioca que era distribuída aos soldados que marchavam para o interior, onde lutavam com extrema dificuldade de abastecimento, contra os nativos e contra as doenças. Em quase todas as batalhas travadas nesse século, a morte de soldados portugueses (e muitos italianos à mistura) era enorme, quando não ficavam todos dizimados!

Outro produto de muito interesse era a aguardente de cana, a nossa pinga, não só para presentear os sobas com quem se pretendia pumbar – negociar – mas sobretudo para servir de boa moeda de troca por escravos, alguma cera e marfim.
 
Tanto o vinho como a aguardente eram transportados em peroleiras, vasilhas de barro de formato perolado, com capacidade de um almude, de 20 a 25 litros.

Em 1679 a qualidade de vinho e principalmente de aguardente que se enviava para Angola era tão ruim, causando até morte a quem bebesse dose maior, que acabou sendo proibida a sua importação! Como isso prejudicou o comércio com o interior, e Portugal não tinha quantidade para abastecer as necessidades locais, o negócio da escravaria... diminuiu! Só passados dez anos, e após os produtores brasileiros terem enviado amostras e se comprometido com a melhoria da qualidade é que essa proibição foi levantada!

O tempo rolou, os países evoluíram (?) mas a verdade é que 300 anos mais tarde, o Brasil repete o “envenenamento” alcoólico duns tantos angolanos, já depois de Angola se ter tornado independente. Desta vez não foi com aguardente, mas com vinho tinto! Uma espécie de zurrapa, de uva americana, embalada em garrafões e enviada em quantidades apreciáveis, virou problema político! Eu mesmo ainda tive a infelicidade de provar essa “novidade”, e bastaram dois copitos (é bom notar que estava com muita sede!) para passadas poucas horas correr para... com a diarréia a ameaçar-me!

Alguns africanos tinham por hábito, assim que conseguissem algum dinheiro, comprar um garrafão de vinho, e só, ou com algum companheiro, virar o garrafão para a goela e acabar com o líquido num abrir e fechar de olhos! Aconteceu que alguns depois não os abriram mais, e outros foram parar aos hospitais, com diarréias, intoxicações, etc. Resultado: nova proibição de importação de vinho do Brasil!

Felizmente este problema foi resolvido com muito mais celeridade do que nos idos do século XVII, e em cima de novos acordos comerciais deve ter sido aposto um novo kirimbu – sabia que carimbo nos vem de Angola, do kimbundu? – com o necessário OK.

A propósito, sabe de onde vem este OK? O que siginifica?

Rio de Janeiro, 16 de Julho de 2009
 
 Francisco Gomes de Amorim

EU ASSUMO!

 

 
O drama da diferença e da repressão de uma singularidade genética
 
1. Peço que me desculpem os leitores mais conservadores, a quem esta minha confissão pública possa chocar.
Peço que se acolha esta minha declaração com tolerância, que é a virtude cívica que se define como indiferença ante o bem e o mal, e que, por isso, proíbe terminantemente qualquer imposição ou condenação em termos morais.
Peço para mim e para todos os que sentem na pele o estigma de uma excepção que nos foi imposta pela natureza, à revelia da nossa vontade, uma plena integração social, pondo assim termo à injusta discriminação a que fomos expostos e que continuamos a padecer.
Peço e exijo que, em nome da igualdade, se nos aceite como somos: iguais na diferença e diferentes na igualdade.
2. Desde que tive consciência desta minha particularidade de género, experimentei a segregação a que todos os que partilhamos esta condição somos, por regra, expostos. Com efeito, qualquer tímida manifestação desta nossa anormalidade – que o é, convenhamos, em termos estatísticos – é logo censurada por severos olhares que, não obstante a sua mudez, nos gritam o drama da nossa reprimida singularidade genética.
Mas hoje, finalmente, graças à abertura e compreensão dos nossos governantes, que parecem não ter outra preocupação que não seja a de pôr termo a estas injustiças atávicas, tomei a decisão de me assumir publicamente: sim, sou canhoto! Afirmo-o pela primeira vez sem complexos, diria que com orgulho até, disposto mesmo a desfilar numa triunfal canhotos’ pride parade!
3. Cônscio de que a democracia está incompleta enquanto não nos forem dados os mesmos direitos que já usufruem os dextros, não posso deixar de fazer algumas reivindicações. A saber:
Exijo que o Estado financie as operações de mudanças de braços e mãos, pernas e pés, de todos os canhotos que queiram mudar de género!
Exijo que todas as cadeiras dos anfiteatros tenham igualmente amplos os apoios dos dois braços, e não apenas o direito, como pretende a maioria fascizante dos dextros!
Exijo que nós, os canhotos, tenhamos direito a carros com o travão de mão à esquerda e os pedais invertidos (com perdão!), pondo assim termo à imposição, por parte da indústria automóvel, de um único modelo comportamental!
Exijo que as autarquias reconheçam o nosso inalienável direito a circular pela esquerda, criando um itinerário alternativo canhoto (IAC)!
Exijo que seja despenalizada, para os canhotos, a condução em contra-mão e que sejam imediatamente amnistiados todos os esquerdinos que, por este motivo, já foram hipocritamente condenados por tribunais dominados pelos dextros!
Exijo que o trecho bíblico que coloca à esquerda de Deus os condenados e à sua direita os bem-aventurados, seja alterado, de modo que se não possa associar aos esquerdinos nenhuma humilhante inferioridade de género.
Exijo que a expressão «cruzes, canhoto!» e outras análogas sejam criminalizadas, pelo seu evidente cunho canhotofóbico.
E, claro, exijo também o direito à adopção de crianças dextras por casais esquerdinos!
4. Graças ao carácter fracturante desta minha proposta, que suponho também assumida por todos os outros cidadãos da mesma condição, quero crer que será acolhida favoravelmente por todos os partidos políticos que têm pugnado pela igualdade de género. Afinal de contas nós, os canhotos, também somos de esquerda, não é?
  P. Gonçalo Portocarrero de Almada
Voz da Verdade, 20090621
 

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