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A bem da Nação

CRÓNICAS DO BRASIL

NO HOSPITAL DE EMERGÊNCIAS

 

 Para o médico residente ou para o estudante interno (antigo académico), estagiar na Emergência é uma verdadeira prova-de-fogo.

 

 

Sendo um hospital que, a priori,  não pode recusar atendimento, por se supor que aqueles que o procuram, ou a ele são levados,  estão em estado grave ou passando mal, muitos doentes que não conseguem consulta na rede ambulatorial buscam nesse tipo de assistência hospitalar a solução mais rápida para seus problemas de saúde.  A estes se ajuntam aqueles com doenças psico-somáticas que anseiam achar alguém que os ouça e ajude a resolver  as suas dores afetivo-emocionais. Engrossando a fila (bicha), chegam os carentes à cata de comida ou de alguma outra necessidade,  na esperança de encontrar alivio  para a fome ou o abandono que lhes impõe a família ou a sociedade. No meio desse caos, de tempos em tempos,  chegam  as ambulâncias com sirenes ansiosa e estridentes,  quebrando "a rotina de atendimento", trazendo alguma vitima de acidente, suicídio ou assassinato.

 

À falta de critérios médicos seguros e bem definidos de emergência, difíceis de avaliar, as salas de espera superlotam com acompanhantes e pessoas mais ou menos doentes que tumultuam o atendimento, dificultando a identificação com a pronta assistência aos pacientes  em estado grave,   e estressando com sobrecarga de trabalho a equipe de enfermeiros e médicos atendentes.

 

Quando chega a hora do Estágio no P.S, lá vai o estudante de maleta preta e roupinha branca, impecável, pela mãe orgulhosa lavada, com o coração a mil, antevendo as dificuldades e os sofrimentos que irá enfrentar. No hospital, o Staff vê com alívio e alegria o académico chegar. Prestativo, ansioso para aprender e socorrer o mundo, ele irá atender e trabalhar, como um escravo, quase sem descanso e sem muitas explicações, porque o tempo não dá, dentro de um esquema mais ou menos pré-determinado para este ou aquele problema que  não vai lhe  trazer muitos conhecimentos académicos, mas que com certeza vai iniciá-lo e prepará-lo nas habilidades de diagnosticar e tratar com rapidez uma emergência.

 

Nos grandes hospitais que têm Pronto-Socorro, os estudantes e médicos residentes são lotados em plantões diários, com horários pré-fixados,  nas salas de atendimento ( salas de mulheres, de homens e de crianças), sendo que cada sector apresenta um grupo de profissionais experientes que, respondendo pela equipe, supervisiona e ajuda os mais novos nas dificuldades e nos casos verdadeiramente emergenciais. É um aprendizado essencial, básico, quase sem palavras, onde o interno aprende vendo, acompanhando e repetindo o profissional mais velho, nos passos e atitudes,  como o elefantinho com a mãe,  no difícil atendimento de urgência. É uma tarefa desgastante, que exige conhecimento, vitalidade, controle emocional e rapidez com acções precisas e coordenadas na arte do pronto-atendimento.  

 0004dees Afinal, a vida dos médicos brasileiros é igual à dos médicos portugueses. Somos de facto uma Nação.

 Passados mais ou menos dois anos, em esquema de plantão semanal, quando o interno ou o médico residente está pronto, está na hora de partir para outras etapas da vida profissional. Para os que ficam,  o staff, a preocupação é acabar com as intermináveis filas, esvaziar as salas de espera do P.S,  para poderem atender com tranquilidade, junto com o novo grupo de académicos que vai se apresentar,  aqueles que vão chegar em carros ou ambulâncias, em estado grave, enquanto nos corredores os alto-falantes continuam na sua missão de solicitação:" Dr. Fulano de Tal, por favor comparecer à sala de crianças, COM URGÊNCIA"!  

 

Hoje em dia, nas grandes cidades, a Emergência tornou-se uma especialidade médica cada vez mais solicitada pelas crescentes necessidades que a violência e a superpopulação produzem.  O salvamento começa com a rapidez e competência das equipes de paramédicos (em geral estudantes e bombeiros bem treinados) que com coragem e técnica dão os primeiros socorros. Os hospitais por sua vez deveriam ter espaço, tranquilidade, organização e equipe descansada e aparelhada para o pronto atendimento, coisa que  nós brasileiros só conhecemos o contrário, com raras excepções, por falta de investimento político numa estrutura pública hospitalar adequada e pela abundância de carências  de uma população sob todos os aspectos empobrecida.

 

Uberaba, 26 de Novembro de 2006

 

Maria Eduarda Fagundes

 

AS PALESTRAS DO QUELHAS

 

 

No âmbito do Mestrado “Desenvolvimento e Cooperação Internacional” e integradas na cadeira “Economia Africana” ministrada pelo Professor Doutor Manuel Ennes Ferreira, realizaram-se entre 15 e 22 de Novembro de 2006 quatro palestras de audição aberta ao público.

 

Foram elas:

 

  • 15 de Novembro às 18.00: Dr. Kiluange Tiny (santomense, advogado, consultor na Galp em Lisboa), falou sobre o petróleo em STP, a geopolítica do mesmo e as medidas tomadas para controlar as receitas petrolíferas de acordo com a transparência exigida pela comunidade internacional

 

  • 15 de Novembro às 19.30: Dra. Tânia Barbosa (mestre em DCI/ISEG), dissertou sobre a perversidade da ajuda internacional em contextos de guerra civil

 

  • 21 de Novembro às 19.30: Dr. Carlos Lopes (economista, mestre e doutorando), falou sobre o “Mercado do Roque Santeiro” (que é a sua tese de doutoramento a defender brevemente em Lisboa)

 

  • 22 de Novembro às 18.00:  Dr. Emmanuel Carneiro (mestre, ex-ministro em Angola, onde continua) dissertou sobre a economia africana, extroversão e “rent-seeking” (é a sua tese de mestrado que entretanto foi publicada em livro pela Principia)

 

 

 

Para quem se interessa especialmente pela questão do desenvolvimento tanto nos aspectos doutrinários como na vertente das realidades, não é fácil dizer qual a palestra mais interessante e qual a que abordou aspectos mais importantes. Todas abordando aspectos da maior relevância para os países em apreço, pena foi o condicionamento de horários que não permitiu os prolongamentos tão apetecidos para debates.

 

Na primeira palestra, o Dr. Kiluange Tiny intitulou a sua palestra de “A maldição dos recursos naturais – antevisão do caso santomense” e definiu três Leis que considera aplicáveis a todos os países que possuem grandes riquezas naturais e não dispõem de níveis de desenvolvimento económico e social significativos:

1ª Lei – A da doença holandesa – as novas receitas provenientes da exploração dos recursos naturais provocam distorções macroeconómicas, como se verificou na Holanda com a exploração dos recursos petrolíferos no Mar do Norte gerando, por exemplo, importantes tensões inflacionistas;

2ª Lei – A das liberdades decrescentes – instalados sobre grandes rendimentos, os dirigentes tendem a fechar-se sobre si mesmos para se manterem no poder e restringem as liberdades, vide os casos de Angola e Venezuela onde se construíram regimes autocráticos;

3ª Lei – A da apropriação de rendas – à volta do poder e à sua sombra instala-se uma classe que disputa a distribuição dos rendimentos não olhando a meios para alcançar o objectivo de receber o máximo possível, generalizando a corrupção no âmbito de um processo de “rent seeking” (obtenção de rendimentos sem uma justificação produtiva).

 

  Rent-seeking - what's that?

 

No caso santomense, o poder constituído aquando das primeiras receitas provenientes da exploração do petróleo na Zona Económica Conjunta (S. Tomé/Nigéria) terá criado as condições para que a operação inicial tivesse sido considerada o melhor negócio de petróleo do mundo (para o explorador-comprador) e, concomitantemente, o pior negócio de petróleo do mundo para o país vendedor sendo que, mesmo assim, a grande percentagem das verbas movimentadas terão tido apropriação privada por parte de quem estava no poder e apenas uma parte muito reduzida terá constituído receita pública. A evolução política do país terá entretanto permitido um importante debate do assunto e, sob o duplo controlo parlamentar e internacional, vêm sendo salvaguardados os interesses públicos de um modo considerado sólido.

 

Na perspectiva geo-estratégica, S. Tomé e Príncipe é actualmente disputado tanto por Angola como pela Nigéria e pelos EUA.

 

Desta palestra ocorre-me uma pergunta sobre um assunto que o palestrante não abordou:

  • Como se movimentará a diplomacia portuguesa e os interesses que deveria representar (Galp) no meio de tão grande imbróglio?

 

Na segunda palestra, a Dr.ª Tânia Barbosa fez uma nova apresentação da palestra que proferira há dois anos sobre o mesmo tema – “A perversidade da ajuda internacional em contextos de guerra civil” – com duas diferenças fundamentais: em 2004 apresentara o projecto de tese do seu mestrado em Desenvolvimento e Cooperação Internacional e desta vez apresentou a obra concluída e publicada; da vez anterior dissertara sobre os testemunhos alheios que recolhera sobre o caso do Sri Lanka e desta vez falou sobre a sua própria experiência no local. E se a tese não sofreu alterações que a desfigurassem, o amadurecimento da experiência pessoal deu-lhe um gabarito inédito em trabalhos académicos. Como membro da AMI – Assistência Médica Internacional, a palestrante teve a oportunidade de actuar no terreno podendo abdicar das opiniões alheias e confirmou que, em caso de guerra civil, mais vale isolar os beligerantes até à exaustão do conflito do que prestar ajuda a qualquer das partes ou a todas elas pois isso prolonga a capacidade de resistência e o prolongamento do conflito. De notar que a actuação da AMI no Sri Lanka se fez na sequência do tsunami e nada teve a ver com o conflito que existia na região. Com a ocorrência do desastre natural fez-se o cessar-fogo e a ajuda internacional actuou. Ou seja, a tese em apreço dá-nos uma indicação preciosa de que os usos e costumes internacionais podem andar errados quando acorrem pressurosamente a acudir às partes em conflito; pelo contrário, quando acontece um conflito, as partes beligerantes devem ser isoladas de modo a que o conflito cesse por exaustão. No caso concreto do Sri Lanka, os Tigres Tamil são apoiados pela diáspora e o Governo cingalês pela ajuda internacional. No meio deles, quase que a servir de fronteira, está a comunidade burgher católica que podemos apelidar de “os portugueses do Sri Lanka”. A Fundação que a AMI constituiu no país tem como objectivo apoiar esta comunidade que nada tem a ver com o conflito mas que está no meio dele.

 

Na terceira palestra, o Dr. Carlos Lopes dissertou sobre “A economia informal em Luanda – o Mercado de Roque Santeiro” referindo três fases principais:

 

  • Antes da independência, em que a economia informal era estritamente subsidiária;
  • Após a independência, com a construção do centralismo económico (por volta dos anos de 1977-78), surgiram as habituais rupturas no abastecimento regular dos bens de primeira necessidade e, consequentemente, desenvolveram-se os circuitos paralelos a que genericamente se chama “candonga”;
  • A partir de 1987 começa o desmantelamento do marxismo mas a economia produtiva não encontrou condições (guerra civil) para poder funcionar e, em conjugação com uma irrealista política cambial, gera-se uma espiral inflacionista e uma muito significativa perda do poder de compra dos salários. 

 

Em 1998, estimava-se que mais de 42% das famílias (56% da população activa) residente em Luanda vivia da economia informal mas as estimativas actuais apontam para cerca de 62% da população activa a viver de modo não formal, incluindo os “candongueiros” (transportadores informais de passageiros), os “doleiros” (cambistas informais), os “roboteiros” (transportadores das mais diversas mercadorias em carrinhos-de-mão), os “zungueiros” (vendedores ambulantes). Há estimativas de quantificação da economia paralela angolana que apontam para níveis de 20 a 30% da actual economia petrolífera do país. O “Mercado de Roque Santeiro” é o expoente máximo de toda esta actividade, a ponto de que se diz que “se não existe no Roque Santeiro é porque ainda não foi inventado”. Mas nem tudo o que se transacciona naquele mercado tem origem no roubo sendo que actualmente só cerca de 4.000 operadores ali instalados pagam taxas de ocupação dos respectivos espaços enquanto se estima que os não-pagantes ultrapassem os 20.000. O informalismo económico angolano é tão importante que até se formalizou o “Sindicato dos Trabalhadores do Comércio Informal”. Perguntado ao palestrante se havia algum método de formação de preços, a resposta foi obviamente negativa.

 

O informalismo económico evita as rupturas sociais mas neste tipo de raciocínios não costumo entrar em linha de conta com o roubo de mercadorias. Quando o palestrante afirmou que os Polícias que funcionam no Mercado são parte interessada nas operações ali realizadas, fico sem saber a quem se deve recorrer para impedir a circulação de mercadorias de origem duvidosa. Talvez a solução passe pela contratação de gatunos pertencentes a outros bandos. Ficou por perguntar: será o “Roque Santeiro” o salvador ou o algoz de Angola?

 

Na quarta palestra, o Dr. Emmanuel Carneiro dissertou sobre “A economia africana, extroversão e «rent-seeking» ” o que, à primeira vista, não dava para se adivinhar do que trataria. Foi com alguma calma que a assistência (eu falo por mim mas acabei por verificar que não fiquei isolado) se foi envolvendo no tema e quando o tirano relógio nos obrigou a acabar o encontro, ficámos todos – palestrante incluído – com a certeza de que muito ficou por dizer. A tese fundamental consiste na afirmação de que a África sub-sahariana vive de rendas, da remuneração dos direitos de propriedade. Nas sociedades pré-coloniais, cada «conjunto de referências» (eufemismo de tribo) vivia em regime de subsistência e as mais-valias conseguiam-se através da guerra e concomitante pilhagem; nas sociedades coloniais, essas guerras foram sustidas ou muito atenuadas pelo que os «conjuntos de referências» obtinham as mais-valias das apaziguadoras dádivas do Governo colonial; nas sociedades post-coloniais as populações – quanto mais urbanizadas, tanto mais desenraizadas e estranhas a qualquer «conjunto de referências» – passaram a obter as mais-valias no roubo ou na distribuição das rendas pelo Governo que é quem recebe as verbas provenientes da exportação dos recursos naturais e da exportação de “commodities” de origem agrícola. Há também as Ajudas Internacionais que muito alimentam a economia rendeira. Em resumo, todas as rendas vêm do exterior e têm uma distribuição muito assimétrica pois nem todos são “meninos queridos” de quem procede à distribuição. Daqui resulta a segunda tese de que “as rendas bloqueiam o desenvolvimento” pois não há qualquer preocupação com a produtividade (exploração de recursos naturais e gestão do trabalho em regime extensivo), com as rendas a serem formadas (formação de preços) por métodos extra-económicos, com a sistemática criação de mono ou oligopólios e políticas cambial e monetária irrealistas (sobrevalorização cambial por entrada massiça de divisas e níveis elevados de inflação), conjunto de realidades que desincentiva ou mesmo inviabiliza a produção interna e realça a magnitude da componente rendeira, o importante «coeficiente de saque». O único sector viável é o sector rendeiro propriamente dito mas a «reciclagem» das rendas externas propicia o comércio de importação, a prestação de serviços, a banca e o imobiliário. Os prejudicados são os não-rendeiros, nomeadamente todos os sectores relacionados com a produção interna de bens transaccionáveis. Esta, portanto, a expressão máxima do bloqueio ao desenvolvimento. Finalmente, a terceira tese de que o Estado Rendeiro é um Estado Autónomo porquanto se sustenta a si próprio e não necessita de se preocupar com a população e suas necessidades; não cobra impostos mas também “não liga nenhuma” às necessidades das gentes. Assim se justificam os regimes autoritários que existem a sul do Sahará.

 

No final, o palestrante teve a humildade de perguntar aos ouvintes o que é que se deveria fazer para corrigir o cenário descrito pois ele – que já teve responsabilidades ministeriais em Angola – não sabe. O relógio impediu que alguém sugerisse algo de útil.

 

Espero voltar a ser convidado para mais palestras do nível destas quatro.

 

Lisboa, Novembro de 2006

 

Henrique Salles da Fonseca

CRÓNICAS DO BRASIL

A  dança  dos  salários

 

Todos os anos a mesma dança. Começam a circular notícias sobre a «correcção» de salários.

Enquanto o governo debate profundamente o valor do aumento do salário mínimo, de R$350 para R$367 ou R$ 375, achando este um «exagero» (cerca de € 135) os excelentíssimos deputados, juízes, delegados, etc. querem ver o deles ajustado de R$12.800 para R$24.500 (€ 9.050)! Já ganham hoje o equivalente a cerca de 36,5 salários mínimos e querem «rectificá-lo» para 67! Beleza!

E o governo que veio, há quatro anos, com a promessa de dar ao povo três refeições por dia, discute agora se deve aumentar o salário mínimo em 5 ou 7%. Entre outras, são estas maravilhas do país tropical... abençoado coqueiro... que comovem.

Não demorou a solução: o mínimo ficou nos $367, com 5% de aumento, e os bacanas com $24.500, a modestíssima diferença de mais 91%!

E não se ficam por aqui os judiciários, que já têm 60 dias de férias anuais, exigem agora, e como são eles que decidem vão conseguir, mais 18 dias de recesso no Natal e Ano Novo. Viva a justiça, que se vê logo que não é a Deus, nem a cega, que em princípio a devia representar. Mas os caras têm o olho bem aberto.

Estamos a mudar de governos, tanto o federal quanto os estaduais. No federal continua tudo mais ou menos na mesma, com excepção das novas negociatas para se conseguir maioria no Congresso. São milhares de cargos públicos altissimamente remunerados em jogo. E isto é o jogo político. Cargos públicos de inegável interesse público, como... deixa p’ra lá!

«Ó Pátria amada, idolatrada, Salve, salve! …

Dos filhos deste solo és mãe gentil...»

Quer parecer que o hino nacional, para corresponder à realidade do país deveria ser alterado. Talvez:

 

«Ó Pátria amada, esfrangalhada, Deus te salve!..

Dos filhos deste solo... és mãe gentil p’rà vergonha...»

 

Rio de Janeiro, 23 de Novembro de 2006

 

Francisco Gomes de Amorim

 

CRÓNICAS DO BRASIL

(…)  

Esta é a estória de Sebastião Salgado, mineiro de Aimorés, cidade próxima à fronteira do Estado do Espírito Santo. Esse economista, fotógrafo, transformou-se em cidadão do mundo por imperativo da sua grande capacidade de trabalho e sensibilidade diante dos graves problemas que afligem a humanidade. E por imperativo do seu país de origem.

 

Além de toda a sua riqueza,  Minas Gerais, às vezes, acaba exportando os seus filhos mais brilhantes (ou brilhante filhos - por favor, me ajude aqui. Nossa língua não é fácil).

 

Espero não demorar na segunda parte. Falta muito pouco para terminar.

(…)  

Therezinha B. de Figueiredo

  

   

 

SEBASTIÃO SALGADO – CIDADÃO DO MUNDO

1ª parte

 

 Será a fotografia um instrumento da Economia?

 

Para Sebastião Salgado uma pessoa começa a fazer fotografia quando nasce. Ela fotografa com a luz que traz.

 

No desenvolvimento da sua aprendizagem fotográfica considera a importância de sua origem no tipo de luz, enquadramento e na sua maneira de ver o mundo, na maneira que faz o corte representativo da realidade. Esse corte simples, essa fracção de segundo que é a fotografia, a pessoa faz com a sua história.

 

Na Vala do Padre, Conceição do Capim, um dos distritos de Aimorés, Minas Gerais, nasce Sebastião Salgado, onde mora por cinco anos. Em 1949 seu pai muda para a rua, jeito de falar dos mineiros daquela região; quer dizer, muda para a cidade. Mudar para a rua, Aimorés, inova experiências, formas diferentes de ver o mundo, que influenciaram no tipo de fotografia instintivamente trabalhadas contra a luz. Um exemplo é a quantidade de luz existente em Aimorés, muito sol, muito calor e a busca pela sombra. Outro exemplo: - seu pai vindo de dentro da casa andando contra a luz. Mais outro: - enquanto chovia o céu se cobria de tanta nuvem, raios, tanto trovão, que seguramente vem daí, afirma o fotógrafo, o tipo de fotografia revelando o céu muito baixo, com muita densidade. Como estas, outras surgiram como uma visão, um sonho com o resto do mundo, uma coisa fenomenal, uma descoberta de tudo.

 

Terminado o curso ginasial, migra para Vitória, Estado do Espírito Santo, onde faz o científico. Lá descobre uma abertura para o mundo nunca visto antes. Sentado na beira do porto, naquela época, aberto, vê entrar os navios que vinham pegar o minério. No fundo tinha luz. Eles seguiam para o Japão, para a Europa. Dois, três meses depois, voltavam a Vitória e os identificava pelo nome. Contemplar navios define o olhar distante, o sonho com o resto do mundo, o desejar sabê-lo.

 

Graduado em economia pela Universidade Federal do Espírito Santo, deixa Vitória em companhia da esposa Lélia rumo à Universidade de São Paulo (USP). Torna-se Mestre em economia.

  Subindo a mina da Serra Pelada - 1986

Como sempre um pouco ligados à militância política escolhem sair do Brasil, à época sob o regime militar, com destino a Paris, onde mora durante dois anos. Prepara-se para o doutorado em economia agrícola. De férias em Genebra, sua esposa, estudante na Universidade de Paris, compra uma "Pentax". Sua finalidade, fotografar arquitectura. Sebastião Salgado olha através do visor e descobre uma outra maneira de relacionar com as pessoas. Um mês depois adquirem um laboratório. Revela e copia para os estudantes.

 

Após o doutorado trabalha na Organização Internacional do Café, em Londres, como economista. Faz missões na África junto ao Banco Mundial, missões de identificação de projectos de desenvolvimento económico para substituição da produção do café. O café estava em excesso de produção nessa época. Elaborar os projectos era necessário para manter o mesmo nível mundial de preço. Trabalha no Quénia, Uganda, Ruanda, Burundi, Zaire. Leva consigo uma "Nikon". De volta a Londres, as fotografias davam mais prazer do que os relatórios económicos. Não teve jeito. Abdica da profissão.

 

Autodidacta, começa a preparar-se. Vê exposições, copia e revela em preto-e-branco, que segundo ele é essencial para quem faz fotografia. Devido à sua realidade, aos problemas sociais do Brasil, sua militância política e formação profissional, tem mais afinidade com a fotografia social.

 

Ainda na Organização Mundial do Café, esteve no Níger, onde faz sua primeira reportagem sobre a fome. A situação na África não estava bem.   Determinados países iam sofrer uma seca muito grande.  As informações adquiridas por ocasião dos projectos junto do Banco Mundial facilita antecipar-se a vários outros fotógrafos. Essa primeira reportagem, ele a publica em várias revistas mundiais sendo aceite rapidamente no mundo da imprensa.

 

Sua experiência como freelancer e em agências de foto jornalismo, Sigma primeiro, depois Gama, onde cobre a guerra na Irlanda, geralmente com garantia de uma grande publicação – Time, NewsWeek, Paris Match ou Le Monde, possibilita-o presidir à Agência Magnum na Europa. Lá conhece Cartier-Bresson, um dos fundadores, seu mestre e amigo.

 

"Antes de ser fotógrafo, declara, é importante aprender um pouco de economia, ciências sociais e geopolítica, base para entender o momento histórico que se está vivendo".

 

Cria a Agência Amazonas, de imprensa, mas também dedicada à cultura. Lélia dirige a parte artística e organiza exposições de livros. O primeiro, "Outras Américas", sobre o mundo rural, é ilustrado por ela. O segundo, é o livro "Terra". Eles se referem a uma série sobre os trabalhadores agrícolas, sobre o mundo agrícola da América Latina. Seis anos, dezasseis viagens a países, os mais próximos ao Brasil, é a somatória desse trabalho. Em "Outras Américas" existem várias fotos do Brasil, para onde voltam após a amnistia política em fins de 1979.

 

São suas as palavras: "Talvez por influência da economia, que me ensinou a pensar a longo prazo, durante toda a minha vida tentei aproximar meu trabalho de projectos a longo prazo".

 

Depois de "Outras Américas",  outro livro. Agora sobre a fome na África. Houve uma época, entre 1984 e 1985,  morreram de fome na África mais de um milhão de pessoas. Muito próximos da organização de médicos franceses, chamada Médicos sem Fronteiras, passa quinze meses fotografando, em cinco países diferentes, o problema do deslocamento da população fugindo da fome. Nasce o segundo livro ilustrado por Lélia, feito para criar a Organização Médicos sem Fronteiras, na Espanha.

 

 

Tem uma segunda parte.

 

Therezinha B. de Figueiredo

 

Fonte: Conferências do Centenário de Belo Horizonte, 1997   

CRÓNICAS DO BRASIL

A  PETROBRÁS  É  NOSSA !

 

É uma maravilha a PETROBRÁS! A mais rica empresa do Brasil, a que mais lucro tem e que cresce com a subida do preço do barril de petróleo, mesmo lá nas arábias. E é um coração de mãe, a PETROBRÁS. A facilidade com que distribui dinheiros (aos milhões, milhões!) para o «social» também é comovente. São imensos milhões para empresas de construção (sem concorrência pública, nem nada dessas burocracias), que depois generosamente contribuem com milhões para as campanhas dos políticos (e descontam no IR), são milhões para ONGs sociais, sem pedir relatórios da aplicação dessas vultuosas verbas (uma das ONGs pediu dinheiro para promover um leilão de cabras, o que é um muito louvável ato social, sobretudo se for para os grandes masculinos das cabras, os cabrões) e por aí vai, sorrindo, a «nossa» PETROBRÁS. Mas tudo isto só para os da quadrilha! (Quadrilha no sentido daquelas danças juninas!).

Mas é nossa! Nossa? De quem? DELES é que é! O maior cabide de emprego conhecido! Muda o governo muda a cúpula - não a cópula - da Petrobrás. E se for necessário contemplar mais um capanga com 20, 30 ou 50 mil por mês, cria-se uma nova diretoria. Se por acaso o comparsa não se entender muito bem com petróleos transfere-se para os Correios ou outra estatal financeiramente poderosa. A PETROBRÁS não é nossa, não, é deles. Do governo. Do PT. E se alguém se lembra de propor a privatização da Petrobrás é apontado como um traidor à pátria amada! Já mesmo se considerou alta traição ter-se entregue áreas imensas de prospecção - contratos de risco - a empresas estrangeiras, como Repsol, Shell, etc.

Aqueles milhões todos são distribuídos aos amigalhaços «companhêros» - e familiares - mas todos tendo que ser do PT, mostram claramente quanto vale termos empresas públicas. São centenas, milhares de cargos, chamados de confiança que se usam como moeda de troca e/ou compra de apoio político, um vergonhoso assalto à res publica.

A PETROBRÁS já respondeu ao jornal "O Globo" afirmando não ser verdade o que este mentiroso jornal publicou! Diz que todo o dinheiro encaminhado para as ONGs foi muito bem estudado e aplicado a funções sociais (inclusive o leilão das cabras) e o mesmo com o repasse para as empresas construtoras sem concorrência publica. É evidente que o jornalista se enganou. A PETROBRÁS, aliás, os atuais donos da empresa, donos do dinheiro do país (do povo?) acabam sempre por ter razão, até porque se o jornalista não se calar o jornal deve perder também uma grossa verba de publicidade... Enfim! Todo o mundo mente! É uma alegria.

A única coisa que está errada é o nome da empresa: devia chamar-se só PTBRÁS. A verdade.

 Rio de Janeiro, 21 de Novembro de 2006

Francisco Gomes de Amorim

CURTINHAS XXIV

                                     DÊEM-LHES POESIA

v     A entrevista que o Bastonário da Ordem dos Médicos deu ao programa "Diga lá Excelência" (canal 2; 22/10) foi notável a muitos títulos. Mas acima de tudo porque resumiu numa pergunta simples, esta, toda a polémica que se estabeleceu ao redor da descriminalização do aborto (até às 10 semanas): será que o direito a nascer não tem cabimento no ordenamento jurídico português?

v     Convenhamos. No plano puramente jurídico, e não já ético, o direito a nascer é o direito primordial – todos os demais só têm existência concreta se ele for reconhecido e protegido. Aceitar que alguém possa ditar impunemente que o direito a nascer, numa situação particular, não existe é sujeitar todos os subsequentes direitos de uma determinada pessoa ao arbítrio desse alguém.

v     Mesmo o “direito” que é invocado de “a mulher dispor do seu próprio corpo” (eufemismo tosco, já que o que está verdadeiramente em causa é a mulher dispor de um outro corpo que, por se encontrar em formação, não tem ainda voz nem expressão) só existe e pode ser exercido porque houve, anos antes, um direito a nascer (o dessa mulher) que todos respeitaram.

v     Estamos agora a aprender como aquilo que há de mais íntimo em cada um de nós, afinal, também vai dar forma à demografia, à economia e à própria organização da sociedade. Mais vale tarde que nunca.

v     Como seria de prever, o debate sobre o aborto não tardou a descambar para este outro plano, mais comezinho, de saber quem vai pagar a conta. Eis um novo campo de batalha, o financeiro, tão minado como o eram, já, os terrenos ético e jurídico.

v     Pessoalmente, estou curioso por ver como o Governo vai descalçar esta bota, mal os milhares e milhares de doentes que enxameiam os hospitais e entopem as filas de espera comecem a perguntar porquê gastar dinheiro com quem foi, apenas, descuidado, quando tantos atingidos por doença que não escolheram e não puderam evitar aguardam por tratamento? Porquê atribuir verbas escassas (o Governo não se cansa de sublinhar a penúria orçamental para justificar mais isto e mais aquilo) a convenções sobre a IVG quando mazelas menos mediáticas (algumas tipicamente femininas como a reconstituição mamária) não beneficiam de igual medida, nem se espera que venham a beneficiar pelos tempos mais próximos?

v     Tudo isto vem recordar-nos algo que teimamos em confundir: os direitos, mesmo os fundamentais, não são todos iguais. Há aqueles que não dependem de nenhuma prestação específica de ninguém (o direito à livre expressão, o direito ao voto ou o direito ao bom nome, por exemplo) para serem plenamente gozados. E há aqueles outros que, para saírem do limbo dos princípios platónicos, alguém terá de fazer algo em concreto (o direito à saúde é um bom exemplo).

v     O problema com estes últimos é que quem seja chamado a fazer esse algo quer ser pago: o médico quer ser pago; o enfermeiro quer ser pago; o funcionário administrativo quer ser pago; o industrial que fornece equipamentos, medicamentos e consumíveis quer ser pago para, por sua vez, poder pagar; o construtor do hospital quer ser pago, idem; enfim, todos querem ser pagos. Pelo contrário, quem deles seja titular acha que nada deve pagar porque se trata de um direito fundamental. Será. Mas isso não consegue dissuadir os que querem ser pagos.

v     Na óptica dos que defendem a gratuidade destes direitos, o problema resolve-se facilmente, através da exacção (sobre os outros) e da dádiva (a favor deles próprios). Ou seja, senhorialmente, querem impor tributos que os beneficiem em primeiro lugar. Como é óbvio, a solidariedade social não passa por aqui.

v     A ditadura dos contribuintes também não é melhor. Há que fazer escolhas, dizem, porque o dinheiro não dá para tudo. E uma gravidez indesejada é, salvo raras excepções, uma gravidez evitável. Quem, por descuido, a não evitou que suporte as despesas – libertando assim, recursos, meios e verbas para prestar auxílio a quem tenha sido atingido pelo imprevisto e pelo inevitável.

v     O argumento parece demolidor. Um segundo olhar basta para vermos logo onde ele nos conduz: E a obesidade? E as doenças provocadas pelo alcoolismo, o tabagismo e a droga? E os traumatismos sofridos por quem deliberadamente se expôs ao perigo? Não são todas elas maleitas previsíveis e evitáveis? Deve-se-lhes aplicar o mesmo critério e exclui-las liminarmente do SNS e da solidariedade social?

v     Perplexo, só a poesia me podia valer. Proponho para lema de todos aqueles que defendem o “Não” os seguintes versos de António Gedeão:

"Só quero o que me é devido / por me trazerem aqui

Que eu nem sequer fui ouvido / no acto de que nasci"

v     Sempre quero ver o que diz agora o “povo da esquerda”, que tanto louvou em vida o bom Prof. Rómulo de Carvalho.

 Rómulo de Carvalho, aliás António Gedeão (1906-1997)

Lisboa, Outubro de 2006

 

A. Palhinha Machado

CRÓNICAS DO BRASIL

O QUE SE VÊ NA TV

 

 

Não se sabe bem porquê, se por falta de imaginação, cultura ou por oculta intenção, o que mais se vê nos canais abertos da  televisão, em horários impróprios para crianças, compartilhados com adultos, são  programas que exploram a miséria, a violência, a amoralidade, o sexo, o grotesco, seja através de programas ao vivo ou  gravados, novelas, filmes e noticiários, com raras e boas excepções.

 Afinal, a quem compete a definição de valores a incutir na juventude? Aos Pais e Avós ou às TV's tanto públicas como privadas?

 

A necessidade de atingir níveis altos de audiência, de marcar pontos estatísticos no IBOPE (1), quase sempre leva esse tipo de veículo de comunicação, que deveria estar voltado não só para a diversão e divulgação como para a informação e educação do povo, a explorar o vulgar, meio mais rápido e eficiente de atingir as camadas populares. Mesmo quando tenta passar alguma mensagem educadora e moralizadora, a TV usa subterfúgios que sublimam e dificultam a interpretação e a distinção do telespectador entre o sensível e o pornográfico, entre o anómalo e o grotesco, entre o imoral e o amoral, entre o real e o imaginável, propiciando um estado de avaliação letárgico onde o individuo, apático,  literalmente "engole" a mensagem sem "filtrá-la".

 

A propaganda, apesar de inteligente, usa e abusa dos chavões e dos padrões estéticos e morais actuais, às  vezes de gosto duvidoso, mas sempre embasada em pesquisa de  mercado, com a finalidade de atingir o maior número de pessoas, com interesse económico-comercial focado sobre o produto ou empreendimento veiculado.

 

A TV deveria ter como únicas finalidades informar de maneira imparcial e divertir de uma forma educada e cultural a população. Mas o que  percebemos são manipulações dessa força de comunicação que, submetida a diversos e até ocultos interesses, desinformam, deformam palavras e ideias, deturpam valores, idiotizam mentes, para ter sobre a população uma forma hipnótica e mássica de poder.

 

Esse tipo de veículo de comunicação acabou com o diálogo, principalmente entre as pessoas da  família que em seus quartos, em frente às  suas TV’s privadas ou nas salas, diante de uma TV comum, mudas, absortas nas imagens e monólogos mostrados, só se apercebem umas das outras ou se falam nos intervalos dos comerciais, dando suas impressões, em geral limitadas por uma cultura universal televisiva já inculcada.

 

À falta (intencional ou não) de programas instrutivos,  editados de maneira livre, saborosa, atractiva e  assimilável, que prendam a atenção e o interesse da juventude e do público, instruindo-os de uma maneira geral, vemos com preocupação na TV uma leitura de poder manipulador, que se coloca como um TOTEM acima do bem e do mal, ditando as suas próprias regras, fazendo as "cabeças" de uma nova geração.

 

Uberaba, Novembro de 2006

 

Maria Eduarda Fagundes

 

 

(1) - Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística  

CRÓNICAS DO BRASIL

O   ADVOGADO  DAS  BESTAS

 

«Lavocat des bêtes»! O advogado dos animais, ou das bestas, para aqueles menos versados na língua de De Gaulle, o tal que disse que o Brasil não era . . .  Um livro extraordinário que acaba de ser publicado, infelizmente, só em França.

 Inspiram confiança as doutrinas de Autores com aspecto de gente sensata. É o caso de Michel Klein, Docteur Vétérinaire

O autor, Michel Klein, veterinário, especializado em animais ditos selvagens, há décadas que prega: Por causa dos homens, numerosas espécies de animais têm desaparecido. Se não tomamos urgentes providências um dia é o homem que desaparecerá.

Como é triste ter que estar inteiramente de acordo com tão fúnebre perspectiva!

Numa entrevista na TV disse ainda o Dr. Michel: Nós não somos mais do que um chimpanzé com o cérebro um pouco maior!

E mais: Em milhões de espécies animais, o homem é o único que criou um completo sistema de auto destruição: governos, administração pública, impostos, exércitos, etc., para  subjugar toda a espécie, acabando por se aniquilar!

Matamo-nos por bel-prazer, destruímos o nosso meio ambiente, por ignorância e sobretudo ganância (e o de milhares de espécies animais de quem também dependemos) e insistimos em cientificamente nos querermos intitular de sapiens. Sabemos, sim, destruir.

Os outros animais, não chamados de sapientes mas que sabem muito, muito, de inúmeras coisas de que nós nem suspeitamos – como por exemplo os tais chimpanzés que distinguem no meio das florestas (as poucas que lhes sobram) as plantas e os minerais que devem comer quando estão doentes, o que o sapientíssimo homem só sabe quando vai ao médico e olha lá . . .  - ao conversarem entre si devem considerar-nos não um parceiro, nem mesmo um longínquo parente, mas algo que surgiu neste mundo para desgraça global.

Fazemos cinzeiros e porta-canetas das mãos desses maravilhosos primatas, bengaleiros das patas dos elefantes, ingerimos pó de chifre de rinoceronte como afrodisíaco, matamos aves maravilhosas para nos enfeitarmos e filhotes de focas para fazer sofisticados casacos de peles, mantemos em cativeiro passarinhos minúsculos porque cantam bem, etc. Ah! E ainda usamos insecticidas e pesticidas para matar mosquitos e quejandos que já andavam por este mundo bem antes da vovozinha Lucy ter visto a luz deste planeta há uns dois ou três milhões de anos.

Parece que de sapiens nada temos. Fomos dos últimos a aparecer e seremos o primeiro a causar a destruição total em vez de aprendermos com os povos primitivos como se convive com a Mãe Natureza.

Mas . . .  andar nu na floresta não dá dinheiro. Todos teriam que trabalhar para comer, viver, sobreviver. Não cria postos de trabalho para os compadrios e/ou quadrilhas, nem necessita de governos, senados, câmaras legislativas, governadores e toda essa infernal máquina que, parecendo-nos lenta, nos vai torturando e levando à morte com uma velocidade incrível.

Ao homem faltou aprender uma coisa: ser simples! Ao ser simples ele pode reconhecer o Outro como o seu mais próximo!

E nunca deve chamar a um indivíduo menos culto ou inteligente: Sua besta !­ A menos que o queira elogiar.

 

Rio de Janeiro, 14 de Novembro de 2006

CRÓNICAS DO BRASIL

DIAMANTINA

 

Além da herança do fino gosto difundido pelos senhores do diamante e funcionários aristocráticos, bem como do espírito aventureiro do garimpo, talvez toda essa descontracção da cidade, sua elegância e simpatia tenham sido também a sábia compensação de uma história duríssima.

 

Diamantina foi um lugar em que eram "os menores gestos submetidos a normas"; O antigo Arraial do Tijuco foi "um Estado dentro do Estado, pondo em risco a unidade da Capitania". Este foi o significado da demarcação rígida do Distrito Diamantino, onde, para a coroa portuguesa monopolizar a extracção dos diamantes, tudo e todos foram minuciosamente controlados.

 

Por causa do Distrito, o Tijuco teve vida à parte e única dentro de Minas: seu comércio foi intenso, rico e sortido. Tudo que precisava vinha de fora. E também porque seus potentados eram exigentes e cheios de ostentação. Suas fortunas ficaram em poucas mãos, criando uma elite de hábitos e sensibilidade afins com os da Europa. Sua arquitectura, pintura e música religiosas, além de desenvolvidas, foram bastante peculiares.

 

Somente antes da demarcação e criação da Intendência dos Diamantes em 1734, a vida correu mais livre no lugar. Até aproximadamente 1720, quando foram achados os primeiros diamantes, o ouro movimentou o Arraial. O povoamento primitivo foi fundado num local chamado Burgalhau. Em 1713, o bandeirante Jerónimo Gouvea descobriu ali boas jazidas auríferas, depois de ter saído do Serro. No começo do século XVIII, no Serro, Manuel Correa Arzão e António Soares descobriram o ouro, seguindo os caminhos abertos, mais ou menos em 1678, por Fernão Dias Pais.

 

Portugal só tomou conhecimento oficial da existência dos diamantes em 1729, através de carta do Governador de Minas, D. Lourenço de Almeida. Antes houve silêncio e aparente descaso das autoridades locais pelo que se passava no Tijuco, pois estavam interessados que a extracção e o comércio do diamante ficassem clandestinos.

 

No Arraial do Tijuco, o comércio crescia a ponto de ainda em 1817, já decadente a extracção do diamante, causar espanto ao pesquisador francês Auguste de Saint-Hilaire, segundo esta transcrição feita por Aires da Mata Machado Filho:

 

    As lojas dessa aldeia (o Tijuco) são providas de toda sorte de panos; nelas se encontram também chapéus, (...) e mesmo grande quantidade de artigos de luxo, que causam admiração sejam procurados a uma tão grande distância do litoral (...). Essas mercadorias são quase todas de fabricação inglesa.

 

Na Inconfidência Mineira participou com importância o diamantinense, Padre José da Silva de Oliveira Rolim, o padre Rolim, filho do sargento José da Silva de Oliveira, caixa da Real Extracção do Diamante.

 

Os diamantes do Tijuco eram lapidados em Amesterdão sob o controle inglês; essas preciosas gemas fizeram toda a história do Arraial do Tijuco, elevado a Vila em 1831 e cidade em 1838. Durante a época dos contratos, em apenas 31 anos, foram extraídos oficialmente quase um milhão e setecentos mil quilates de diamantes e durante os setenta e quatro anos da fase da Real Extracção mais um milhão e trezentos e cinquenta e quatro mil quilates.

 

Junto com os Intendentes, os contratadores foram verdadeiros reis coloniais. No Distrito Diamantino "eram senhores quase absolutos", segundo Aires da Mata Machado Filho, historiando as épocas dos contratadores Felisberto Caldeira Brant e o desembargador João Fernandes de Oliveira como áureas para o crescimento do Tijuco e "o bem-estar dos tijuquenses".  Sob Caldeira Brant, "dominava o espírito frívolo do século XVIII, na elegância dos trajes, no requinte das maneiras e nas regras do bom-tom". Sob o desembargador, "houve certo progresso graças à moderação do contratador em face do garimpo e do contrabando".

  Kubischek de Oliveira  e Chica da Silva - dois diamantinenses que ficaram na História

Nesta última fase imperou a amante de João Fernandes de Oliveira, a Chica da Silva, espécie de rainha, rodeada de mucamas-cortesãs e vivendo numa corte em que, além da ostentação, não faltavam o teatro e a boa música. A personalidade de Chica da Silva foi o retrato exuberante do comportamento, bem liberado para a época, das mulheres do Tijuco, amantes de bailes, saraus e festas. Chica era anunciada em público como rainha e como tal se vestia, sempre precedida de um séquito de criados e criadas ornamentados  de jóias. "Chica quem manda" virou quase seu  sinonimo,  tamanho seu poder e pompa.  

 

Além da vida mundana, a pompa e refinamento sociais do Arraial ficaram gravados também no teatro, nas festas religiosas, na arte da pintura e da arquitectura das igrejas, no grande número de estudantes que enviou para a Universidade de Coimbra e sobretudo na música.

 

Francisco Curt Lange levou um grande susto ao descobrir que o maior compositor mineiro do século XVIII, José Joaquim Emérico Lobo de Mesquita, não só provavelmente nasceu na região de Diamantina, mas ali já tocava, em 1782, o órgão da Igreja de Nossa Senhora do Carmo. Descobriu ainda que no Arraial do Tijuco houve, no período de apenas 30 anos, sete regentes musicais, o que, calculava ele, implicou na existência de mais ou menos cem músicos. Esta verdadeira escola musical diamantinense foi seguramente fundamental na herança da seresta, até hoje cultuada. Dentro do principal grupo de seresteiros da cidade, o flautista Boanerges Meira tem o virtuosismo comparável ao de um Altamiro Carrilho e José Raimundo dos Reis, com seu cavaquinho, é esplêndido. São óptimos o clarinetista Expedito Silva e os violonistas António "Sete Cabeças" e Paulo Messias de Oliveira. Na alma e na boca do povo diamantinense continuam vivos "coretos" e modinhas, algumas ainda do século XVIII. A inspiração boémia não falta, de preferência sob o luar que torna prateada a serrania em volta da cidade, a música que a alimenta, junto com a boa cachaça encontrada em dezenas de botequins, virou música de todo o Brasil. Afinal, quem não ouviu alguma vez "Elvira, escuta", "A ti flor do céu", "Quem fez a lua", "Tim, tim...tim...tim, olalá", ou "Zum, zum, zum...lá no meio do mar", ou o "Peixe vivo", a música que ficou ligada a Juscelino Kubitschek, outro diamantinense eterno?   

 

Diamantina, no seu núcleo histórico não se descaracterizou. Preserva a identidade configurada no século XVIII. ...A cidade se adaptou progressivamente aos ciclos económicos de sua história, após a decadência da extracção do diamante. A maior parte do casario e das igrejas coloniais está sempre bem cuidada: o povo tem orgulho de sua cidade tal foi herdada do passado. Por isso, mais que em outras cidades históricas de Minas, é o que mais se identifica com a cidade como realidade urbana, física. Por essa razão talvez é que todo diamantinense sabe contar coisas do passado da cidade, como se contasse algo muito presente.

 

Aires da Mata Machado Filho fala do amor que o diamantinense tem por sua cidade, e da intimidade que o garimpeiro do diamante tinha com sua terra: - "É das entranhas da terra, escreve ele, que o faiscador vai tirar o pão de cada dia.  

   

A harmonia e a preservação de todo o conjunto privilegiaram Diamantina com o seu integral tombamento pelo SPHAN, em 1938. Segundo o estudo realizado pela Fundação João Pinheiro, os monumentos religiosos de Diamantina revelam "o carácter de uma autêntica escola regional, no quadro mais amplo da arquitectura religiosa mineira no período colonial". As igrejas ganharam uma fachada original,"sem precedentes em outras regiões do Estado", escreve Afonso Ávila. Também na decoração interna, a arquitectura religiosa de Diamantina é muito peculiar e possui alto nível de qualidade. Embora o estilo rococó tenha aparecido em Diamantina apenas em 1790 pelas mãos do pintor Silvestre de Almeida Lopes, o grande mestre foi o guarda-mor José Soares de Araújo, autor das pinturas de forros mais importantes de Diamantina.  A arquitectura civil, residencial ou pública, apesar de seguir o mesmo tipo geral do colonial mineiro, apresenta também singularidades. Entre as edificações civis uma edificação importante é a Casa da Glória (actual Colégio Nª. Sra. das Dores). Ela é composta de um sobrado do Século XVIII, famoso pelas festas que nele aconteciam; e outro sobrado do século passado (XIX), quando também foi construído o passadiço que os liga. Exemplar ímpar em Minas é a casa do Muxarabi. Construída talvez na segunda metade do século XVIII, ela é a única em Minas que ainda conserva um Muxarabi: um balcão de origem moura, feito de treliças de madeira, totalmente fechado e detrás do qual as mulheres podiam ver a rua sem serem vistas.

 

"Casa da Glória" e . . .

. . . "Casa do Muxarabi" - dois ex-libris de Diamantina

 

Embora construído em 1889, o Mercado Municipal  de Diamantina com suas harmoniosas arcadas em madeira, pintadas em azul e vermelho é um dos cartões postais de Diamantina. Ele evoca o passado dos tropeiros.

 

Nos becos, muitas estórias, às vezes inconfessáveis. De todos, o do Mota ficou eterno.

 

A noite em Diamantina: - antigamente melancolia; depois boémia e seresta. Os seresteiros saem cantando: "Tim, tim,...tim, tim...olalá"

 

 

Therezinha Barreto de Figueiredo 

 

BIBLIOGRAFIA

 

Brant, Francisco – “Edição Minas Colonial”

Editora Efecê S.A.

MORREU MILTON FRIEDMAN

 (1912 - 2006)

Do “Jornal de Negócios” on-line

 

“O Wall Street Journal está a noticiar que Milton Friedman morreu, citando a filha do economista.

Originário de uma família muito pobre, cujos pais emigraram da Rússia, Milton Friedman nasceu no bairro de Brooklyn, em Nova Iorque, a 31 de Julho de 1912.

Depois de completar a educação básica com menos de 16 anos de idade, mesmo tendo perdido o pai, conseguiu manter-se na universidade graças a uma pequena bolsa e grandes sacrifícios financeiros.

No auge da Grande Depressão (1932), Friedman concluiu os seus estudos em Rutgers, tendo-se destacado nas disciplinas de Matemática e Economia. Escolhe a Universidade de Chicago para tirar o mestrado em Economia.

Trabalha com Frank Knight que, na época, se destacava nos meios académicos pelas teses conservadoras. É nesse contexto que se começa a enraizar na formação do pensamento de Friedman a ideia de que a solução para os problemas de uma sociedade é dada por um sistema de competitividade e liberdade absoluta.

Depois de participar do programa de reconstrução do New Deal, especificamente num estudo sobre os padrões de consumo familiar, ingressa em 1946 na Universidade de Chicago.

Friedman foi colunista da revista semanal Newsweek e membro do Departamento Nacional de Pesquisas Económicas. Foi conselheiro do governo chileno do General Pinochet e muitas das suas ideias foram aplicadas na primeira fase do governo Nixon.

O seu posicionamento claro e ortodoxo criou-lhe muitos adversários, no plano das ideias, e foi motivo de muitas controvérsias. Conduziu-o, no entanto, à liderança de uma doutrina de pensamento económico. Pelas suas realizações nos campos da análise do consumo, da história monetária e da teoria e demonstração da complexidade da política de estabilização, ele ganhou o prémio Nobel da economia em1976.

(Informação sobre o percurso de Milton Friedman retirada da Wikipédia)”

 Stigler, Friedman e Wallis . . . os homens não se medem mesmo aos palmos

Concorde-se ou não com o liberalismo acérrimo de Friedman, temos que reconhecer que era um grande pensador económico e que sempre se preocupou com o bem-estar das populações. VIVA Friedman !

Henrique Salles da Fonseca

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