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A bem da Nação

Conceitos e preconceitos

Produtividade – capacidade de produzir o máximo de bens e serviços na unidade de tempo utilizando a menor quantidade de recursos;
Competitividade – capacidade de produzir bens e serviços que vençam o teste dos mercados, elevando de forma sustentada o nível de vida das pessoas envolvidas no processo produtivo.

Conseguir uma elevada produtividade de bens sem procura no mercado, é claramente uma forma de se encaminhar rapidamente para a bancarrota; conseguir uma elevada produtividade à custa de mão-de-obra não remunerada, é puro esclavagismo.

Eis por que não faz hoje qualquer sentido falar-se de produtividade. O que interessa – e no actual processo de globalização, por maioria de razão – é cuidar da competitividade. Como facilmente se compreende, este é um conceito que também pode assumir uma dimensão tanto micro como macroeconómica: uma empresa é competitiva porque sustentadamente produz bens ou serviços com procura no mercado, remunera o capital e a mão-de-obra em conformidade com os padrões circunstanciais ou legais e cumpre atempadamente com as obrigações fiscais; um país é economicamente competitivo porque sustentadamente tem um saldo positivo na Balança de Transacções Correntes e a sua população tem um nível crescente de vida.

Devemos, pois, ter uma cautela muito especial quando lidamos com estudos que se servem da produtividade para definir objectivos. A deficiente definição de objectivos a nível microeconómico põe em perigo a empresa e todos os que com ela lidam; a confusão conceptual a nível macroeconómico pode pôr em causa o modelo de desenvolvimento de um país. Como podemos acreditar nos objectivos definidos se os conceitos base não estão correctos? Depois de esclarecida esta questão elementar, podemos ler com mais alguma capacidade de defesa o estudo apresentado em Setembro de 2003 pelo Ministério da Economia intitulado "Portugal 2010 – Acelerar o Crescimento da Produtividade” (1) que vem sendo citado – nomeadamente nesta própria revista há algumas edições a trás – como fundamentação para um conjunto de conceitos e de políticas, pese embora ter sido “deixado cair” pelo Governo presidido por Santana Lopes.

Creio que o Governo fez muito bem ao “deixar cair” aquele estudo e parece-me que chegou a altura de se deixar de o citar como fonte de inspiração. E, se não, vejamos porquê.

Ali são apresentadas as barreiras consideradas responsáveis pelo diferencial de produtividade de Portugal em relação aos outros Estados membro da UE e resumidamente, conclui o Ministério, 28% do atraso resulta da “Informalidade”, 13% da “Regulamentação de mercados e produtos”, 24% do “Ordenamento do território e burocracia no licenciamento”, 18% da “Prestação de serviços públicos”, 13% da “Legislação laboral”; presume-se que os 4% remanescentes sejam da responsabilidade da “Herança industrial”.

A maior responsabilidade pelos nossos problemas (28%) é assim atribuída à “informalidade” que no referido estudo “deve ser entendida como o conjunto de distorções ao enquadramento competitivo e empresarial da economia resultantes da evasão por parte de empresas e agentes económicos a um conjunto de obrigações”, nomeadamente: evasão fiscal (IRC, IRS e IVA), evasão social (não pagamento à Segurança Social e não cumprimento do salário mínimo), evasão a normas de mercado (qualidade, segurança, ambiente, direitos de propriedade).

Segue-se por ordem decrescente o problema globalmente referido como “ordenamento do território” (24%) que ali é definido como “deficiente coordenação e visão integrada dos múltiplos planos de ordenamento aplicáveis a um determinado local” e como “processos de licenciamento complexos, insuficientemente coordenados, heterogéneos e pouco transparentes”. Realce para os “custos associados à complexidade processual existente e aos tempos de espera resultantes”.

A “prestação de serviços públicos” é considerada a terceira causa com maior influência no atraso (18%) pois “representa um encargo elevado para a economia, sobretudo devido aos salários anormalmente elevados que são praticados” (com uma vantagem que chega a ultrapassar os 50% face ao sector privado).

Com 13% cada, seguem-se em quarto lugar “ex-aequo” a “regulamentação de mercados e de produtos” e a “legislação laboral” correspondendo, respectivamente, a “inadequações da regulamentação à promoção do bom funcionamento do mercado” de que resultam “restrições no acesso ao mercado por parte de novos operadores, na definição artificial (não de mercado) dos níveis de preço e da oferta ou na introdução de requisitos que impedem a optimização operacional e comercial da actividade das empresas” e a um enquadramento jurídico relativamente rígido “traduzindo-se em obstáculos significativos à produtividade”, nomeadamente na adaptação do número de trabalhadores ao ciclo produtivo, nos custos de “fricção” em mobilidade e em restrições regulamentares que reduzem o incentivo à criação de novos postos de trabalho.

Finalmente, com 4% de responsabilidades no atraso, é referida a “herança industrial” a quem são apontadas características negativas tais como o de ser “altamente fragmentada” e de ter “um posicionamento em actividades com reduzido valor acrescentado”.

Perante este cenário, verifico que tanto a “informalidade” como a “herança industrial” podem ser directamente imputadas à responsabilidade dos empresários mas as restantes causas só as posso atribuir aos poderes públicos, nomeadamente ao Governo. Ou seja, remetendo-nos para as percentagens referidas no estudo, 32% das razões do atraso poderão ser de responsabilidade empresarial e os 68% restantes têm origem claramente estatal. Não deixa de ser curiosa esta atitude de o maior responsável pelos problemas vir a público reconhecer tal realidade. Quero acreditar que esse seja um passo fundamental para o início do processo de correcção dessas causas negativas.

Reconhecendo assim o próprio Ministério da Economia que o enquadramento legislativo e regulamentar da actividade económica são os maiores causadores dos problemas com que as empresas se debatem, questiono-me se a “Informalidade” é uma causa do atraso ou se, pelo contrário, é uma consequência desse defeituoso enquadramento. E questiono-me também se estará correcta a forma pela qual a “Informalidade” é apresentada pelo Ministério atribuindo-lhe uma característica essencialmente viciosa. Claro está que lidamos neste tema com algo que é quase incomensurável ou, in limine, é defeituosamente quantificável exactamente por se tratar do subterrâneo, do paralelo, do clandestino, do não declarado; mas resta a dúvida sobre a dimensão do vício e do seu complemento, a simples fuga para a sobrevivência. Não será o excesso ou defeituoso enquadramento regulamentar um motivo para que as empresas de menor “expertise” tenham que passar à clandestinidade? Não será a carga fiscal e de encargos sociais excessiva face à rentabilidade interna dos negócios de uma parte significativa da produção nacional? Por outras palavras: terá este Estado alguma coisa a ver com a economia que o suporta?

Eis algumas questões para que não vejo resposta num estudo que já data de 2003 mas que pretende apontar caminhos para o futuro ainda relativamente longínquo de 2010 e que, portanto, pretende ter hoje total cabimento.

Conclusão: estudo governamental que se baseia em conceito duvidoso, que reconhece que o Estado é o principal causador dos problemas com que o tecido empresarial se defronta, que classifica como causa o que muito provavelmente é consequência, que põe vício onde poderá haver apenas muita falta de capacidade para corresponder a exigências exorbitantes, revela o grave preconceito de que o Estado tem sempre razão e os privados merecem desconfiança. Ou seja, porque se baseia em falso conceito e revela preconceitos, não serve de exemplo para nada e deve ser votado ao esquecimento.

Lisboa, Fevereiro de 2005

Henrique Salles da Fonseca

(1)http://www.min-economia.pt/port/documentos/p_sint_portugal2010.html

Publicado na "Economia Pura", edição de Março/Abril de 2005

AS CONFERÊNCIAS DE LISBOA – 5


“Identidades múltiplas em Casamança – Senegal
Conferência de Peter Mark, Lisboa, 13 de Abril de 2005, 18h.

Auditório Afonso de Barros – ISCTE
Centro de Estudos Africanos

"Peter Mark, professor na Wesleyan University, é especialista em história cultural africana, tendo o seu trabalho incidido sobre a Casamança e os Djola. Publicou vários trabalhos, entre os quais “Portuguese Style and Luso-African Identity: Precolonical Senegambia, Sixteenth-Nineteenth Centuries” (Indiana University Press, 2002).

A conferência debruça-se sobre as identidades múltiplas e mutáveis das populações da Casamança (Senegal) durante o período dos primeiros contactos culturais (séculos XVI-XVII). A identidade era definida contextualmente e os indivíduos podiam apresentar várias identidades. Este processo define um modelo senegambiano em que a identidade é múltipla.“
---------------
Eis como a conferência era anunciada na Internet. Despertou-me o interesse e lá fui. Gostei e não dei o meu tempo por perdido; pelo contrário, aprendi muito.
Por exemplo, fiquei a saber que naquela época uma coisa era ser-se “branco” e outra, completamente diferente, era ser-se “português”. Se para se ser djola, era necessário ter-se uma profissão, ser muçulmano e falar a língua djola, para se ser português era necessário ser comerciante (o que significava rico, poderoso), cristão e habitar uma casa rectangular com uma varanda à volta. Não era necessário ser-se europeu e havia muitos negros e mestiços que se diziam (e continuam a dizer) portugueses.
A Inquisição não deixou sequelas naquela zona mas havia quem se dissesse cristão quando contactava com os europeus e muçulmano ou animista quando se integrava nas comunidades locais. Parece que ainda hoje assim sucede mas, baralhando um pouco mais, a influência judia fez-se sentir directamente e através dos cristãos novos neste conglomerado de várias dezenas de nações. Afinal, os judeus também eram portugueses e, portanto, ser-se cristão não era tão importante como parecia para se ter direito à honra da portugalidade.
Por incrível que pareça, a guerra civil que grassou durante 20 anos na Casamança e há pouco terminou (ou fingiu que terminou), nada teve a ver com toda aquela confusão nem sequer foi consequência do regime esclavagista mas tão só com a exploração económica “colonialista” praticada pelo poder senegalês sedeado em Dakar.
Concluo que quem não saiba destas “coisas” se arrisca a nunca perceber o que se passa por aquelas paragens, nomeadamente na vizinha Guiné-Bissau.
Eu, por mim, tenciono continuar a estudar.

Lisboa, 13 de Abril de 2005

Henrique Salles da Fonseca

Divagando pela utopia – 9ª parte


Resumo da 8ª parte: A Segurança Social tem que incorporar cada vez maiores parcelas de capitalização das reformas em substituição progressiva da simultaneidade e dos montantes determinados politicamente; o peso das reformas antecipadas pode ser atenuado pelo incentivo ao prolongamento da carreira contributiva dos pensionistas prematuros; a Agricultura portuguesa é vítima dos circuitos comerciais porque os mercados não têm qualquer transparência.



Plausível – Durante este nosso intervalo morreu o papa. Quer comentar?
Utópico – Neste caso, a morte é uma circunstância natural que em si mesma não merece um comentário especial. O que me parece digno de comentário é a fase anterior à morte de João Paulo II, ou seja, a vida com que ele beneficiou a Humanidade. E não hesito em fazer este evidente juízo de valor sobre a vida de Carol Wojtyla – João Paulo II: na minha opinião, ele beneficiou muito a Humanidade.
Plausível – Está a falar na perspectiva religiosa?
Utópico – Não, estou a falar do Homem. A minha cultura religiosa não é suficiente para dissertar sobre matérias de Fé. Aliás, considero que a Fé não se discute: ou se tem ou não se tem. E dentre os que têm, há perspectivas muito diferentes e que não podem ser comparadas: a Fé cristã é diferente da muçulmana que por sua vez é diferente da budista e assim sucessivamente. Com alguma abstracção, limito-me a dizer que é feliz aquele que tem Fé!
Plausível – Qualquer Fé?
Utópico – Qualquer Fé.
Plausível – Mesmo as falsas?
Utópico – Não há uma Fé falsa. Esse seria um conceito sem sentido. Se existe, é verdadeira porque alguém acredita nela. A Fé é absoluta.
Plausível – Mas não acha que . . .
Utópico – Não acho nem deixo de achar porque acho que não tenho o direito de achar. Não discuto matérias de Fé. Trata-se de matéria da mais reservada intimidade que cada um tem o direito de interiorizar em regime de total exclusividade.
Plausível – Estou a vê-lo muito equidistante relativamente às várias religiões . . .
Utópico – Nestas nossas conversas temos abordado – e é assim que pretendo manter o tom das nossas conversas – assuntos de índole pública. Não creio que haja qualquer interesse em enveredarmos por temas que possam ter alguma coisa a ver com a intimidade de cada um. Temos falado de temas económicos, não temos falado sequer de pessoas. Já uma vez o disse e não me preocupo de repetir: não discuto pessoas e nem sequer as menciono. Portanto, não vou discutir temas que possam afectar a intimidade de alguém como, por exemplo, se S. Jaime era ou não irmão de Jesus, se a Sucessão Apostólica de deveria fazer pela via do primeiro Bispo de Jerusalém ou por S. Pedro, conforme a Fé romana transmitida por S. Paulo. Essas são matérias de Fé que a Historia mais não pode esclarecer.
Plausível – Por quê esse exemplo?
Utópico – Porque foi uma matéria sobre a qual João Paulo II falou “ex cathedra” há alguns tempos. O dogma ultrapassa muito estas nossas conversas. Para mim, o que é relevante é que cada um possa seguir a sua própria Fé, sem interferir com a do próximo. E é aqui que entra a minha enorme admiração por João Paulo II que desenvolveu um pontificado de grande relacionamento com as outras perspectivas da Fé.
Plausível – Ecuménico?
Utópico – Moderadamente ecuménico porque não há nenhum Sacerdote – e estamos a falar do Sumo Sacerdote de uma religião específica – que possa abdicar do proselitismo a que institucionalmente está vinculado e que segue por uma questão de Fé. O proselitismo é inerente à condição sacerdotal e, portanto, a confusão nasce com a aplicação do conceito ecuménico. Ecuménico significa universal e, portanto, nesta perspectiva, o diálogo poder-nos-ia conduzir a uma única religião universal, resultante de acordos parciais que sucessivamente fossem sendo alcançados. Só que há barreiras intransponíveis, as tais que consubstanciam cada uma das várias perspectivas da Fé. Portanto, quando ouvimos dizer que um líder religioso encetou uma acção ecuménica, deixemo-nos de hesitações e reconheçamos que não está a fazer nada senão proselitismo a favor da sua própria Fé, tentando convencer a outra parte a adaptar à sua a respectiva Fé.
Plausível – E acredita que isso seja possível?
Utópico – Limito-me a constatar que dentro da própria família cristã os meros ritos são pretexto para a separação. E repare que nem sequer se trata de matérias de Fé mas tão só de rituais da Celebração.
Plausível – Então, onde está o fundamento da sua admiração por João Paulo II?
Utópico – No discurso da paz.
Plausível – Mas isso também faz o Dalai Lama.
Utópico – Sim, por exemplo o Dalai Lama.
Plausível – Então o que distingue o papa do Dalai Lama?
Utópico – A Fé que cada um representa.
Plausível – E acha que poderá haver alguma aproximação entre as duas religiões?
Utópico – No plano teológico, duvido muito. Na prática de uma política de paz, creio que há já uma ampla sintonia.
Plausível – E será que o próximo papa vai enveredar por maior abertura ao ecumenismo?
Utópico – Mais do que João Paulo II? Parece-me improvável. Repare: os Sumo Sacerdotes representam a respectiva Fé; não são donos dela. Não podem fazer e acontecer contra tudo e contra todos. Lidam com assuntos da mais profunda intimidade dos respectivos fiéis. As evoluções têm que ser muito cautelosas e têm que ter tempo para uma profunda consolidação. Portanto, respondendo à sua pergunta, não acredito que o próximo papa possa ser mais ecuménico do que João Paulo II.
Plausível – Será um papa português?
Utópico – Creio que o Colégio Cardinalício tem um universo eleitoral de 120 votos. Havendo 2 portugueses, as probabilidades são de 1,7%. Se apostarmos numa candidatura lusófona, então as probabilidades aumentam muito se, para além dos Cardeais da CPLP, nos lembrarmos que o Cardeal de Bombaim se chama Dias e tem as suas origens em Goa. Mas isso são temporalidades induzidas pelo nosso nacionalismo e estamos a referir uma questão da chefia de uma religião Católica, ou seja, da terra inteira e, portanto, essas fragmentações tendem a esbater-se.
Plausível – Mas a eleição de Carol Wojtyla teve consequências políticas tão importantes que é difícil acreditar que não tenha havido uma intenção material por trás dessa mesma eleição . . .
Utópico – Não sou membro do Colégio Cardinalício nem tenho o dom do confessionário para poder ter essa certeza. Limito-me a constatar os factos a que Você parece referir-se – a queda do Império Soviético. Sim, acredito que João Paulo II tenha de facto tido uma influência decisiva no derrube do Muro de Berlim e, antes disso, no corte do arame farpado na fronteira austro-húngara. Se não tivesse sido o Ministro do Interior húngaro a cortar aquele arame, o que teria acontecido? Teria Honneker caído? Tudo são agora especulações sem qualquer sentido pois que se trata disso mesmo: especulações. Mas recordo-lhe que a Igreja tinha que fazer alguma coisa para além de manter a mordaça que os comunistas lhe tinham há décadas imposto. A Igreja cumpre desde sempre a chamada Tradição Paulina que não é compatível com o silêncio.
Plausível – E isso vem a ser o quê?
Utópico – A Tradição Paulina consiste na política de que a Igreja não interfere nas questões temporais se o Estado laico a deixar exercer o seu múnus, o apostólico, a acção pastoral. Se o Estado tolhe a actividade da Igreja, então esta sente-se no direito de reagir. A Igreja sentiu que estava ultrapassada a época de ter que manter mais exemplos de refúgio político como o do Cardeal Mindszenty que se manteve anos e anos sob custódia americana na respectiva Embaixada em Budapeste. Os comunistas não deixavam a Igreja trabalhar, só havia uma solução: a Igreja tinha que derrubar os comunistas.
Plausível – E foi isso que sucedeu.
Utópico – Sim, foi isso que sucedeu. Só nos falta saber com quantas peripécias pelo meio . . . Mas isso é trabalho dos historiadores e até mesmo dos romancistas.
Plausível – Portanto, concorda comigo quando digo que João Paulo II teve uma importância muito grande no derrube do Império Comunista.
Utópico – É claro que concordo e a curiosidade é enorme quando hoje se sabe que a tentativa de assassinato do papa pela mão de Ali Agka em 1982, resultava duma deliberação do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética, sob a égide de Breznev. Este, claramente não percebera que os tempos já não eram os de 1968 quando proferiu aquele célebre discurso no V Congresso do Partido Unificado dos Trabalhadores Polacos que ficou conhecido pela “Doutrina Breznev”.
Plausível – Que dizia que . . .
Utópico – . . . a União Soviética se sentia no direito de intervir sempre que constatasse que estavam em causa os seus próprios interesses vitais ou a mera solidariedade socialista internacional.
Plausível – Então, uns sentiam-se no direito de intervir por conta da solidariedade e outros por causa da Tradição Paulina. Tinha que haver um choque.
Utópico – E houve. Um tiro na barriga não é o mais apropriado para um papa. E todos somos testemunhas em como foi a partir dessa altura que a saúde do papa se degradou cada vez mais.
Plausível – Mas a União Soviética morreu mesmo.
Utópico – Sim, era claramente um regime “contra natura”.
Plausível – Acha que João Paulo II ficará na História como o papa que matou a União Soviética?
Utópico – Se não foi ele que a matou, deu uma ajuda preciosa nesse sentido mas eu acho que quem matou mesmo a União Soviética foi o próprio Gorbachov. Repare: o modelo de desenvolvimento soviético estava completamente exaurido e sem capacidade de regeneração perante a chamada “Guerra das Estrelas” de Ronald Reagan.
Plausível – Que, segundo parece, era um tremendo “bluff”.
Utópico – Desconheço. Mas se hoje se diz que era um “bluff”, na época não havia razões para crer que o fosse e, portanto, “bluff” ou não “bluff”, funcionou em pleno como elemento dissuasor do inimigo. Portanto, foi uma arma formidável que derrotou de facto a União Soviética. Se, afinal, não passava de um tigre de papel, então tanto melhor para todos que, afinal, não passámos pelos perigos que temíamos. Mas olhe que me custa a crer que aquilo fosse só “bluff”. Acha que o KGB se deixava ludibriar a esse nível? Duvido. Poderia não haver ainda o armamento para equipar os satélites de defesa contra os mísseis soviéticos intercontinentais mas olhe que se não existiam, deviam estar mesmo a caminho da existência . . .
Plausível – E agora? Será que vai avançar a Guerra das Estrelas?
Utópico – Contra quem?
Plausível – Não sei; contra os actuais inimigos dos Estados Unidos . . .
Utópico – Os tempos são outros. A tecnologia da Idade da Pedra a que se chama a Intifada está a mobilizar um Exército muito bem equipado e não é por causa da sofisticação dos armamentos que as pedras deixam de voar. As questões são políticas, as soluções têm que ser políticas e não se podem resolver à matraca. A matraca serve para intimidar; não serve para resolver os problemas. Olhe como o papa não precisou de mobilizar a Guarda Suiça para atacar a Cortina de Ferro . . .
Plausível – Em sentido figurado.
Utópico – Claro que em sentido figurado. O que interessa é dedicarmo-nos ao software e deixarmos de nos preocupar tanto com o hardware.
Plausível – E assim regressamos aos assuntos económicos.
Utópico – Mas não agora pois vamos fazer um intervalo.
Plausível – Mas fica combinado que depois do intervalo voltamos mesmo aos temas económicos.
Utópico – Fica combinado. Mas também não podíamos prever que no intervalo anterior morresse o papa. E olhe que não deixámos de tratar de assuntos bem interessantes.
Plausível – E bem importantes.
Utópico – Claro.
Plausível – Portanto, até logo.

Lisboa, Abril de 2005

Henrique Salles da Fonseca

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