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A bem da Nação

Coronel Rowan

Quando em 1898 rebentou a guerra entre Espanha e os Estados Unidos, foi necessário entrar rapidamente em contacto com o chefe dos insurrectos cubanos, o General Garcia (1), que se encontrava algures nas montanhas agrestes da ilha sem que alguém fizesse a mínima ideia de onde o encontrar. Não havia correio nem telégrafo e o Presidente americano, Mac-Kinley (2), tinha que o contactar com a maior urgência. Alguém disse ao Presidente que a única pessoa que talvez conseguisse encontrar o General seria um homem chamado Rowan (3). Mandado chamar, apresentou-se na Casa Branca, recebeu do Presidente uma carta para entregar a Garcia, guardou-a, fez-se ao mar, desembarcou de noite numa pequena enseada cubana e internou-se no mato. Passadas três semanas, depois de atravessar a pé um país hostil e de ter entregue a carta ao General, saiu pelo outro lado da ilha onde alguém o recolheu e levou de volta aos Estados Unidos. Não interessa saber o que ele fez para entregar a carta; o importante é notar que Mac-Kinley confiou a Rowan uma carta para entregar a um destinatário em parte incerta e o Coronel não fez perguntas sobre o paradeiro do General. Quem já liderou outras pessoas sabe o que é a falta de vontade para concentrar esforços e cumprir uma missão; quem já liderou sabe o que é a cooperação deficiente, a falta de atenção, a indiferença, o entusiasmo medíocre. Eis a regra por cuja causa não há triunfo sem algum tipo de ameaça ou suborno. Experimente-se pedir a um funcionário administrativo que consulte um processo e que redija um resumo. Começará logo por perguntar para que queremos o resumo, que aspectos consideramos importantes e não nos abandonará sem perguntar qual o grau de urgência. Não quereremos que traga o processo para vermos directamente o que possa interessar-nos? De seguida irá junto de colegas procurar ajuda e tentará mesmo que outra pessoa faça o trabalho. Depois de mais algumas perguntas intercalares que por certo colocará, havemos de concluir que será mais prático sermos nós próprios a fazer o trabalho que havíamos pedido. Se incumbirmos de um recado àquele outro funcionário, quantos “cafés” tomará pelo caminho? Lembrar-se-á do que tinha para fazer quando chegar ao destino? Há quem traga consigo a vã suspeita de que é sistematicamente oprimido pelos chefes e esse sentimento assume tais dimensões que facilmente se transforma em mania da perseguição; a esse, ninguém que o conheça dará emprego porque sabe que ele é um facho aceso de descontentamento. A lamentação da sorte dos oprimidos nas fábricas e dos sem abrigo que procuram emprego honesto é habitualmente acompanhada de duras palavras em relação aos que estão no poder mas ninguém lamenta o envelhecimento precoce daquele a quem compete dirigir empregados que fazem o mínimo possível ou que esperam que ele volte costas para deixarem de fazer seja o que for. Se as empresas pudessem depurar constantemente os maus elementos, a competitividade económica nacional seria bem mais elevada pois não haveria qualquer possibilidade de confundir empresa com asilo. Com este tipo de voluntarismo, só um capataz armado de garrote e o medo do despedimento induzem os abúlicos ao cumprimento dos mínimos. Se os homens não agem por si próprios, que fariam quando o benefício dos seus esforços individuais se destinasse à colectividade? A incapacidade para a acção independente, a fraqueza da vontade e a falta de disposição para pôr mãos à obra, conduzem o socialismo puro para o campo da utopia. Quando a maioria mostra piedade pelos incompetentes, é chegado o momento de aparecer alguém que dedique uma palavra de simpatia àquele que triunfou, que venceu os maiores obstáculos e que, chegado ao fim da missão, verificou que apenas ganhou alimentos e roupa. Não há excelência na pobreza; os andrajos não servem de recomendação. Nem todos os chefes são rapaces e arbitrários assim como nem todos os pobres são virtuosos. Ergo a minha taça em louvor daquele que, quando se lhe entrega uma carta para Garcia, obedientemente lhe pega sem fazer perguntas desnecessárias e sem a intenção oculta de a deitar na valeta mais próxima – a esse nunca falta trabalho nem precisa declarar greve para obter salário mais elevado. É desses de que necessitamos em larga escala; tudo quanto peçam, deve ser-lhes concedido. Eis, pois, um exemplo para todos nós e em especial para a juventude. O importante não é sabermos muitas coisas mas sim que adquiramos serenidade perante os problemas, que sejamos leais e actuemos com rapidez. NOTA: Texto adaptado de “Uma carta para Garcia” escrito em 22 de Fevereiro do último ano do século XIX pelo americano Elbert Hubbard (1856 - 1915) por me parecer perfeitamente actual neste Portugal dos primeiros anos do século XXI. (1) Major-General Calixto Ramón Garcia Iñiguez (1836 – 1898) (2) William Mac-Kinley (1843 – 1901) (3) Coronel Andrew Summers Rowan (1857 – 1943) Lisboa, Março de 2004 Publicado em 19 de Março de 2004 no Suplemento de Economia de "O Independente"

CRÓNICA DE LISBOA – 2

O Doutor Lima era professor de português no Liceu que frequentei em Lisboa mas como também dava aulas no Colégio Militar, tinha o posto de Capitão. Para nós, adolescentes, ele era muito mais Capitão que Doutor e todos o temíamos mais do que o respeitávamos. Na primeira aula que tivemos com ele, no então quinto ano, avançou sem rodeios para “Os Lusíadas” e mandou que um dos meus colegas lesse a primeira estrofe. Timidamente, o Gonçalo leu: “As armas e os barões assinalados que da ocidental praia lusitana por mares nunca dantes navegados passaram ainda além da Taprobana em perigos e guerras esforçados mais do que permitia a força humana . . . “, tudo de uma ponta à outra sem hesitações nem pausas como se a pontuação lá não estivesse. E assim foi que o Doutor Lima nos lançou a esse mar para nós até então desconhecido que se chama divisão de orações e análise de conteúdos. Não tínhamos percebido nada do que acabara de ser lido em voz alta e desconhecíamos totalmente o que era essa tal coisa de Taprobana. Começámos a achar alguma graça quando o Doutor Lima explicou que a Taprobana era a ilha de Ceilão a que hoje chamamos Sri Lanka e que as armas e os barões eram as insígnias dos militares que se tinham lançado nessas aventuras por mares desconhecidos. E cada vez que saltávamos um par de vírgulas, percebíamos a frase com muito maior limpidez e, afinal, nós os adolescentes, convencidos de que o mundo era nosso, tivemos que concluir ali de repente que muito antes de nós tinha havido quem soubesse coisas que a nós ainda nem nos passavam pela cabeça. Creio que todos fizemos em silêncio um acto de contrição por tanta falta de humildade e, passados mais de quarenta anos, ainda recordo o espanto com que os versos de Camões nos iam aparecendo com uma transparência evidente surgindo de um emaranhado de orações poeticamente urdidas de modo a que um adolescente não os pudesse decifrar. Para mim, a glória de Camões está sobretudo na forma clara como ele escreveu e como, depois, embrulhou tudo arranjando emprego por esses séculos fora a tantos professores que ainda hoje se dedicam a explicar a evidência do conteúdo de “Os Lusíadas”. Ainda hoje ouço muita gente blasfemar contra a divisão de orações que consideram uma acção penosa e eu calo-me pensando que o azar deles foi não terem sido alunos desse tal Capitão façanhudo que era o Doutor Lima, afinal uma pessoa ilustre, de espírito fino e pensamento claro. REFLEXÃO O espírito é invisível; Um anjo é invisível; O vento é invisível; O pensamento é invisível. No entanto, pode-se sentir o vento E, com delicadeza, Podemos sentir o espírito, Podemos adivinhar o anjo E até, com alguns pensamentos, Podemos mudar o mundo. Esta poesia não é certamente de Camões e chega-me do Brasil por Internet sem indicação do autor. Transcrevo-a, portanto, sem pedido de autorização pois creio que ela nos dá uma lógica para não termos medo de um Capitão sem primeiro averiguarmos se lá dentro não está um Doutor. Lisboa, Janeiro de 2004 Publicado em Pangim no "Lusofonia- Goa", Março de 2004

JUÍZOS ESCOLARES

Em política internacional chama-se “elemento dinâmico” ao conjunto das consequências sobre países terceiros resultantes de acordos entre dois Estados. Por exemplo, se o país A exportar predominantemente para o país B e este estabelecer um tratado com o país C no sentido de que passa a privilegiar as exportações deste último, é lógico que o país A seja afectado negativamente em favor de C. O elemento dinâmico existente em todo o processo de integração europeia provoca enormes alterações nas relações económicas internacionais dentro da Europa e até fora dela. Foi disto exemplo paradigmático o estatuto preferencial durante anos dado na CEE às conservas de peixe marroquinas em clara vantagem sobre o estatuto permitido às congéneres portuguesas. E, contudo, Portugal já era então Estado membro da CEE. A recente adesão da China à Organização Mundial do Comércio e consequente abertura do mercado europeu às mercadorias chinesas é outro elemento dinâmico que introduz sérias dificuldades às Economias menos desenvolvidas na UE, nomeadamente à portuguesa. Importantes sectores tradicionais da nossa indústria têm que cumprir a legislação social e ambiental europeia e em simultâneo suportarem a concorrência de produtos congéneres produzidos no gigante asiático onde não existe democracia política, não existem sindicatos livres, os trabalhadores não têm direito a férias (e muito menos férias pagas e subsidiadas), onde poluir não é crime e onde a reciclagem deve ser termo sem cabimento no léxico pequinês. Todas estas negociações têm tido subjacente o princípio de que quem lidera as opiniões europeias são os países mais populosos, o que na Europa significa os mais ricos e, portanto, os maiores contribuintes para o Orçamento comunitário. Dito de outro modo, manda quem tem maior população pois o voto de cada europeu é igual e, portanto, o Estado membro com maior número de cidadãos é o que tem maior peso; contrariamente, se todos os Estados membro tivessem um peso igual, o voto de cada alemão valeria menos que o voto de cada português e muitíssimo menos que o de cada luxemburguês. Só que este raciocínio é falacioso (não chego ao ponto de o apelidar de sofisma) pois nas negociações internacionais a personalidade é a do Estado no seu conjunto como pessoa colectiva e não se colocam as questões na dimensão da pessoa singular. Estas devem colocar-se (e em Portugal nunca tal sucedeu) como fundamento democrático das decisões colectivas, assumindo estas a característica unicitária que lhes está na génese constitucional. Assim como o voto de um cidadão de elevada estatura física não vale mais que o de um anão e o do professor universitário vale tanto como o do vendedor ambulante, também na senda internacional o voto do Estado alemão deve valer tanto como o do Luxemburgo e o do Estado mais rico deve ter valor igual ao do mais pobre. A dimensão do voto singular devia fazer-se sentir no Parlamento Europeu mas nessa sede os deputados dividiram-se por cores políticas e não por nacionalidades tomando eles assim a iniciativa de inviabilizarem a dimensão por que os grandes Estados agora reclamam na futura Constituição Europeia. Manda também a lógica que a criação de uma consciência colectiva – europeia, no que nos interessa – anteceda a aprovação de políticas mas verificamos precisamente o inverso ao constatarmos que tudo conduz à entrada em vigor de um texto revisto dos Tratados da UE que promete afirmar o eixo Paris-Berlim como o decisor europeu em que aos demais Estados membro passa a caber uma função apenas marginal. A formalização deste Eixo Franco-Teutónico não tem cabimento numa instituição a que se exige solidariedade pois pretende decidir e fazer vincular as suas decisões sobre as opiniões alheias mesmo antes que elas se expressem. Neste conceito, a democracia prevalece desde que seja conforme à vontade dos mandantes. Já assim nasceu a moeda única, a tal que os alemães hoje criticam por claramente não ter assumido a função do velho Deutsch Mark, a tal cujo câmbio os franceses criticam na sua saga anti-americana, a tal cujo valor as Economias menos desenvolvidas não conseguem acompanhar. Enfim, a tal moeda que objectivamente não serve a ninguém dentre os próprios que a criaram. E porquê? Porque a solidariedade é muito mais um conceito filosófico do que económico e não nos podemos esquecer de que a exaustão de Bragança no princípio do Século XX se ficou muito a dever à incapacidade que aquela região teve de suportar uma moeda tão forte como era naquela época o Escudo: sobreviveram pouco mais que a economia de subsistência e os Serviços Públicos, uma porque arredada dos circuitos monetários, os outros porque pagos pelo Governo central. E aqui surge uma questão fundamental: que moeda serve a que Economia? O valor da moeda, as taxas de juro e a inflação estão intimamente relacionadas e se não houver uma grande mobilidade de factores (nomeadamente da mão-de-obra) e um Orçamento aglutinador com capacidade suficiente para gerir as diferenças regionais, a homogeneidade económica do espaço não existe e as assimetrias acentuam-se. Foi isso que sucedeu com Bragança a partir do início do século XX com o Escudo, é isso que tende a suceder com Portugal no início do século XXI com o Euro. Mais: com uma taxa de juros uniforme, padece a região com menor inflação por ter que suportar uma taxa real mais elevada que aquela outra região com inflação mais elevada. Ou seja, uma moeda serve para uma região economicamente homogénea e assim será forte ou fraca conforme os interesses e características dessa mesma região. As tensões inflacionistas em Portugal podem não ser conformes às taxas de juro definidas pelo BCE que também tem que tomar em consideração o que se passa na Alemanha cujos factores macroeconómicos são bem diferentes dos nossos e, não sendo as duas economias miscíveis, só muito por acaso é que poderiam interessar-se por uma mesma moeda. A ânsia política sobrepôs-se claramente à análise económica e o resultado está à vista: todos estão insatisfeitos. A solução economicamente razoável e politicamente neutra teria sido a do falecido ECU ter evoluído como meio internacional de pagamento na qualidade de moeda comum europeia permitindo aos Estados membro manterem entre si uma política cambial conveniente aos interesses próprios em vez de termos que nos submeter aos interesses de todos e, afinal, de ninguém. Os europeístas afirmam que a homologação das políticas estruturais europeias tem sido feita à posteriori nas votações que privilegiam os partidos que assumem essas mesmas negociações; os eurocépticos são mais directos e falam de política do facto consumado e de reserva mental face ao eleitorado. Já em 1795 Emmanuel Kant punha a ausência de reserva mental como condição essencial e primeira cláusula para que se pudesse alcançar a paz perpétua. E o filósofo ia mesmo mais longe quando apelidava esses reservados processos mentais de juízos escolares e pedantes. Lisboa, Janeiro de 2004 Publicado na "Economia Pura", edição de Janeiro/Fevereiro de 2004

Economia doméstica

A sofisticação das políticas de apoio ao investimento vem redobrando em Portugal e é já longa a história de diplomas que ficaram famosos e cujas siglas todos recordamos. Sem pretender ser exaustivo nem nada que se pareça, refiro-me ao SIII, ao PEDIP e ao SIFIT, ao POE e ao actual PRIME. Todos diferentes, ficou cada um deles ligado ao nome de quem o concebeu, o fez aprovar e o executou: o SIII ao Dr. Cadilhe, o PEDIP ao Eng. Mira Amaral, o POE ao Dr. Pina Moura, o PRIME ao Dr. Tavares. Todos diferentes e, afinal, todos iguais. Todos diferentes porque o eram ou são efectivamente nas fórmulas de cálculo previstas para os incentivos em cada um deles preconizados, na particularidade de cada um desses incentivos revestir a característica de fundo perdido ou reembolsável com mais ou menos juros, predominante neste subsector ou naquele tipo de região. Todos iguais porque sempre se apresentaram com o objectivo de resolverem por uma vez e definitivamente o problema do desenvolvimento económico nacional. Outra semelhança entre eles é a de que todos foram inaugurados ao som de trombetas como se antes deles nada tivesse sido feito em prol do desenvolvimento económico nacional. Ao contrário do que diria o Rei Sol, “avant moi, le désert ; après moi, la gloire”. E Portugal continua, afinal, a digladiar-se com sérios problemas de desenvolvimento quase como se nenhum daqueles diplomas tivesse existido. É disso exemplo a balança comercial que apresenta défices sistemáticos, reveladores da clamorosa incapacidade nacional de satisfação das necessidades do consumo doméstico. Fica por provar o que seria o nosso país se nenhum daqueles diplomas tivesse visto a luz dos dias mas fica também a suspeita de que nenhum deles resolveu os problemas estruturais do nosso desenvolvimento. E que problemas são esses? Fundamentalmente, o desajustamento legislativo, o império burocrata, o nível médio de instrução da população portuguesa. O desajustamento legislativo e o império burocrata traduzem-se por uma verborreica e persistente produção de diplomas condicionadores da vida empresarial que deve ser rapidamente substituída pelo desmantelamento progressivo do emaranhado lego-administrativo que hoje é o cenário português resultante da afanosa labuta de gerações sucessivas de legisladores auto-democratas e demo-autocratas alheados da vil preocupação de produzir para ganhar o pão de cada dia. Se a este emaranhado submetermos uma população de rude instrução ou de pura e simples falta de instrução, podemos então imaginar o tipo de empreendedorismo sagaz que “à outrance” tenta furar as sofisticadas malhas que não compreende para conseguir sobreviver. E então temos que colocar a questão se é o povo muito rude para o edifício legislativo à sua volta construído ou se é esta malha jurídica que nada tem a ver com o povo a que se destina. E como a classe empreendedora é maioritariamente oriunda da população indígena, então a sofisticação legal não é compatível com a rudeza da produção. E quando não é possível produzir porque a legislação a isso obsta, então alguma coisa tem que ser feita para levar o empreendedorismo às escassas classes mais educadas evitando que estas se entreguem como assalariadas. Enquanto a nossa tradição política pensar que a salvação da indústria está na libertação da excessiva mão de obra agrícola, continuaremos a ter uma força de trabalho impreparada e um muito baixo valor industrial acrescentado simultaneamente com uma agricultura a desempenhar o papel de parente pobre e, portanto, representando um verdadeiro travão ao desenvolvimento económico global. Muitos foram os países que enriqueceram como consequência do desenvolvimento sustentado do sector primário e poucos aqueles que o conseguiram apesar de não terem uma agricultura relevante. O erro estratégico das sucessivas políticas de desenvolvimento económico em Portugal está no facto de os nossos políticos se instalarem no Poder renegando algumas das suas próprias origens e olhando para o mundo rural como uma fatia subdesenvolvida da nossa sociedade que há que tratar como se de um bairro de lata se tratasse, pela simples demolição. Pelo contrário, há que dotar a agricultura e as pescas portuguesas dos meios necessários para que possam desenvolver as suas políticas comerciais com dignidade plena em vez de continuarem a ser tratadas como anormaizinhas que necessitam de caridosa protecção. E porque estamos numa época de globalização da economia, convenhamos que esta faz com que tenham que desaparecer todas as restrições aos movimentos internacionais de capitais, de produtos, serviços e pessoas e isso não está a ser verdade para as pessoas pelo que ainda há um factor de produção com liberdade condicionada. Eis como os excessos de mão de obra e as suas faltas virão brevemente a ser supridas, ao contrário das tradicionais políticas portuguesas. Sucede igualmente que cada país tem um Orçamento e um sistema fiscal próprios pelo que não é indiferente que a riqueza seja produzida e tributada em qualquer lugar do Globo. Essa indiferença só existiria se houvesse um Orçamento Global que cobrasse em todo o lado e distribuísse em conformidade com as necessidades de cada país ou região, à semelhança do que tradicional e infrutiferamente tem sido feito no nosso país com as referidas políticas de desenvolvimento. Portanto, a deslocalização da chamada indústria tradicional portuguesa também não é solução que nos interesse e, contudo, essa fuga resulta de se terem criado com subsídios e outros instrumentos de política variadíssimas condições artificiais para a ocupação industrial de mão de obra agrícola. O nível médio de instrução da população portuguesa é muito baixo e é por essa razão que a nossa indústria tradicional está a sofrer com a concorrência do Extremo Oriente, sobretudo quando os níveis médios de remuneração em Portugal são muito mais altos do que os praticados nos países asiáticos. Nesses países não há Sindicatos livres nem férias e, portanto, nem subsídios de férias e outras regalias sociais que para nós já são triviais. Estamos a sofrer uma concorrência desleal importando produtos fabricados em condições que qualquer um de nós consideraria de escravatura e, simultaneamente, a nossa Inovação industrial também é muito reduzida quando comparada com a dos países mais evoluídos pelo que também não conseguimos concorrer com eles. Eis, pois, como fomos conduzidos ao pior dos dois mundos com que temos que nos digladiar. Certamente que o Instituto do Emprego e Formação Profissional não vai ter mãos a medir nos próximos anos a tentar reciclar tanta gente que não sabe fazer nada de elevado valor acrescentado e não será estranho que a Estratégia de Lisboa para a Sociedade de Informação nada tenha a ver com a generalidade dos portugueses. Em conclusão, as tradicionais políticas de desenvolvimento económico em Portugal têm muito pouco ou mesmo nada a ver com o país real. Assim se explica a realidade que consiste em grande parte dos empresários portugueses dentro e fora de Portugal se dedicar ao comércio de víveres, confeccionados ou frescos, numa simples extensão da cozinha materna. Uma autêntica economia doméstica. Lisboa, Fevereiro de 2004 Henrique Salles da Fonseca Publicado em 6 de Março de 2004 no Suplemento de Economia de "O Independente"

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