A REVOLUÇÃO COMERCIAL E A NOVA SOCIEDADE- 9ª Parte
PROGRESSOS REVOLUCIONÁRIOS NA AGRICULTURA
Final da 8ª parte: A Revolução Comercial foi marcada pela tendência da adopção de métodos fabris em certas linhas de produção, juntamente com aperfeiçoamentos técnicos, como a descoberta de processos mais eficientes para refinar minérios. Assim, a Revolução Comercial conduziu inevitavelmente à Revolução Industrial.
Em fins do século XVII e, sobretudo, no século XVIII, ocorreram na agricultura europeia transformações profundas que podem ser consideradas, em parte, efeitos da Revolução Comercial. A alta dos preços e o aumento da população urbana, causados por alterações no sistema comercial, tornaram a agricultura um negócio cada vez mais rendoso, com o que foram estimulados progressos no sector. Um dos efeitos da expansão ultramarina foi tornar comuns na Europa culturas novas, como o milho e a batata. Provavelmente, o mais importante efeito da Revolução Comercial sobre a história agrícola foi o triunfo da mentalidade capitalista. Proprietários que até então permitiam aos camponeses lavrar suas terras de maneira ineficiente passaram a seguir o exemplo dos industriais, buscando o máximo de eficiência e de lucros.
Os países que lideraram o progresso na agricultura foram a Holanda e a Inglaterra, porque já haviam avançado bastante na Revolução Comercial. A Inglaterra teve condições de ultrapassar rapidamente a Holanda, devido às suas maiores dimensões e à maior disponibilidade de recursos naturais. No típico regime agrícola da Idade Média, grupos de camponeses cultivavam colectivamente faixas de terras longas e estreitas, sem cercas. Dessas faixas, um terço ficava de repouso a cada ano a fim de recuperar a fertilidade. Outras terras próximas eram ocupadas por pastos e campinas para o uso de rebanhos de propriedade colectiva. A verdadeira propriedade de todas essas terras era mal definida ou elas eram subdivididas quase aleatoriamente. Em geral, havia um importante Senhor de terras em cada área, capaz de afirmar ter a propriedade de uma grande proporção das terras, embora fossem lavradas, para ele, por camponeses. O mesmo indivíduo podia também reivindicar a propriedade legal das pastagens e campinas. Na Inglaterra, a maioria desses proprietários decidiu "fechar" suas terras, a fim de torná-las mais lucrativas.

Os primeiros "cercamentos" aconteceram nos séculos XV e XVI e acarretaram a transformação das terras em pastos de ovinos. Devido aos grandes lucros que podiam ser auferidos da lã, alguns proprietários resolveram converter pastos comuns, que até então haviam sustentado os animais dos camponeses, em terras de seu uso pessoal para a criação de ovinos. Às vezes conseguiam converter campos de cereais em pastos de ovinos, expulsando dali camponeses cujo direito à terra não estivesse bem caracterizado. Isso causou infortúnios aos camponeses atingidos.
A campanha dramática de fechamento de terras na Inglaterra ocorreu entre 1710 e 1810 e não visava fechar terras para ovelhas, mas aumentar a eficiência da lavoura. Nesse período os proprietários de terras convenceram-se da necessidade de uma "agricultura científica". Compreenderam que mediante a introdução de novas culturas e novos métodos agrícolas, podiam reduzir a área de terras em repouso e alcançar melhores rendimentos.
Assim, a alfafa, o trevo e o nabo reduziam a fertilidade da terra muito menos que os cereais e ajudavam a melhorar a qualidade do solo. Contribuíam para reduzir a área de repouso e constituíam excelente forragem de inverno para os animais, com o que ajudavam a aumentar e melhorar os plantéis. A adubagem intensiva foi outro meio utilizado pelos agricultores para eliminar a necessidade de deixar grandes áreas em repouso. Outro aperfeiçoamento adoptado foi o uso de semeadeiras para grãos em substituição do velho e antieconómico método de semear com a mão.
A agricultura "científica" determinou a necessidade do cercamento das terras porque o proprietário "progressista" precisava de flexibilidade para realizar as experiências que desejasse. Quando a campanha de cercamento ganhou impulso, os proprietários começaram a organizar e fechar territórios, de maneira a conquistar do campesinato novas terras. Em tudo isso tinham o governo ao seu lado. O Parlamento parou de tentar proibir o cercamento de terras em 1640 e em 1710 começou a determinar que isso fosse feito. Durante todo o século XVIII, "leis de cercamento" promulgadas pelo Parlamento estipulavam que todas as terras de uma determinada aldeia fossem completamente redistribuídas em glebas compactas e cercadas. Os maiores proprietários de cada área foram os que mais ganharam terras. O Parlamento agiu assim porque era dominado pela aristocracia fundiária. Muitos camponeses foram expulsos da terra, mas a produtividade cresceu vertiginosamente. No século XVIII, a produção de trigo na Inglaterra aumentou em um terço, enquanto dobrava o peso médio do gado. A maior abundância e concentração de riqueza trazidas pela revolução agrícola e pelo cercamento dos campos, foram pré-requisitos necessários para a Revolução Industrial que começou na Inglaterra por volta de 1780.
Na Europa continental, com excepção da Holanda, não existiu nada comparável ao avanço inglês na agricultura científica. Na maior parte do continente, as mudanças agrícolas desenrolaram-se mais devagar e o progresso real nos métodos científicos só se deu no século XIX e em certos lugares, no século XX. No entanto, o século XVIII foi uma época importante para a agricultura do continente europeu do ponto de vista da introdução de novas culturas. De máxima importância foi o cultivo do milho e da batata trazidos do Novo Mundo. Plantar batatas em pequenas glebas era lucrativo porque o seu rendimento era extraordinariamente grande. Elas se tornaram um alimento de subsistência na Prússia e no resto da Alemanha setentrional.
Provavelmente, o facto mais importante com relação à história económica da Europa no século XVIII é que aos poucos os pobres deixaram de morrer de fome. Até mais ou menos 1700, cerca de metade de todos os camponeses europeus podia esperar ver algum parente próximo morrer à míngua de alimento a cada dez anos aproximadamente. Com frequência, ao sobrevirem as fomes periódicas, famílias inteiras eram dizimadas. A introdução de novas culturas, como o milho e a batata, mudou tudo isso. Como resultado, a população começou a crescer como nunca e acabou havendo excedente de mão-de-obra, liberada para a industrialização.
Campo Belo, 25 de Julho de 2007
Therezinha B. de Figueiredo