BRASILEIROS MAIS "++"
Há anos ajudei a relembrar alguns nomes, grandes, da música e da literatura do Brasil. São por demais conhecidos para que se insista em falar, por exemplo, de João Cabral de Melo Neto e seu poema "Morte e Vida Severina" que retrata a fome e o retirante do Nordeste, de forma brilhante, e de muitos outros, que têm em Portugal um sem número de admiradores.
Outros há que mais dificilmente se tornam conhecidos do público em geral, mas que pela sua obra e valor intrínseco, alcançaram, talvez não a Iluminação de Buda, mas o título de Mestres que lhes são conferidos por quem os conheceu e por quem com eles continua a aprender.
Está a fazer nestes dias oitenta anos um desses inegáveis e Grandes Mestres a quem o Brasil preparou merecidas homenagens em todo o território.
Homem de cultura, alegre, simples, comunicativo, grande professor, dramaturgo, romancista, poeta e dono de muitas outras qualidades, os seus contos são uma irresistível mistura de história, tradição, folclore, religião, política e muita graça.
Nordestino, onde o sebastianismo continua vivo e cultuado, trouxe para os livros, teatro e cinema, e para as aulas que os alunos veneram, o retrato fiel da vida do povo sofrido daquelas regiões áridas onde a Europa começou a se instalar nestas terras ameríndias. Povo que mantém as suas tradições numa pureza tal que, somente lhes descartando as inevitáveis influências africanas, permitem imaginar o que seria a vida dum Portugal quinhentista.
O sebastianismo, o culto do Espírito Santo, o coronelismo, a esperteza nata do homem que tem que sobreviver na caatinga, o cabra-macho, tudo misturado a um humor impagável, fazem dos romances deste Mestre algo que tem que se ler, ouvir e ver.
A sua preocupação com as raízes brasileiras é tão autêntica que, disse ele em entrevista ao jornal "O Globo", na sua Fazenda Carnaúba, no sertão da Parnaíba, cria cabras nativas, de quatro cores. Vou começar pela ordem de chegada: pardas e vermelhas, por causa dos índios. Brancas, por causa dos portugueses. Pretas, por causa dos negros, e azuis, por causa dos outros que vieram depois, como os holandeses!
Quando se preparavam as celebrações dos "500 anos", em 2000, um grupo daqueles complexados pelo seu sangue português que lhes corre, talvez não nas veias mas "à ilharga", procurou o Mestre, de grande renome, pedindo para encabeçar uma espécie de protesto contra Pedro Álvares Cabral, Portugal, e se pronunciasse sobre a hipotética chegada de Vincente Yañes Pinzón a um qualquer ponto do Brasil, antes dos Portugueses. Resposta: «Quem documentou a chegada dos primeiros europeus? Não foi a carta de Pero Vaz de Caminha? Então esse é o documento oficial da descoberta e o resto são politiquices!» Encerrou a questão... quase, porque em 2002 um exmo. deputedo, o senhor Feu Rosa, propôs no Congresso, um projeto de lei alterando a data da descoberta do Brasil para 26 de Janeiro de 1500, pelo tal Pinzón, baseado "nalguns historiadores"! O congressista, cearense, quer, porque quer, celebrar a chegada dos europeus a Mucuripe... no Ceará.
Deixemos estas baixarias e curvemo-nos em sinal de respeito e admiração não só pela obra mas pela personalidade do Grande Mestre ARIANO SUASSUNA.
E... não deixem de ler e ver "O Auto da Compadecida" e "A Pedra do Reino"! E muito mais.
Rio de Janeiro, 14 de Junho de 2007
Francisco Gomes de Amorim