Curtinhas XL
o novo aeroporto de lisboa (nal) – V (fim)
(Um Project Finance lorpa)
v Se não houvesse a TAP, o Governo poderia planear, quase sem surpresas, um novo aeroporto regional para dar resposta aos fluxos de tráfego aéreo que daqui saem, ou que para cá vêm.
v Se não fosse, não direi o projecto Casablanca, mas a pressão que existe, ao nível dos ATA, para redesenhar a rede de apoios, o Governo poderia decidir, sem pressas, o que fazer.
v Felizmente, mais do que o aeroporto da Portela a aproximar-se do ponto de saturação, é o agarrar de uma oportunidade única que exige uma decisão rápida , segura e sensata.
v Contrariamente ao que se vê, adequado é planear ao revés. Em vez do tão português “ora vamos lá ver se construímos um aeroporto bonito, orgulho de todos nós, a inveja do mundo - e logo se verá se se paga a ele próprio”, a atitude correcta é: (a) averiguar onde está a procura demonstrável; (b) ver o que fazer para a captar; (c) e ter ideia das tarifas que essa procura está disposta a pagar. Em suma, partir da procura, do mercado, para a concepção de todo o projecto.
v É precisamente aqui, na procura e no mercado, não na selecção do melhor local, que o enredo começa. E, contrariamente aos pressupostos de onde partem os estudos de mercado que têm sido divulgados, quem dá voz a essa procura não é o passageiro, ou a carga. São os ATA e as companhias aéreas que os integram. Este o pecado original de um processo de decisão que o Governo não se cansa de dizer que tem tanto de exemplar como de irreversível.
v A ideia de que um esquema de Project Finance se resume a encontrar soluções financeiras mais ou menos habilidosas para o que quer que seja, ou de que o custo não-financeiro de um projecto é um dado imutável, uma fatalidade - é perigosamente naïf.
v Na realidade, a razão de ser do Project Finance é dupla: (a) tornar o projecto atraente para os mercados financeiros e, em particular, para os investidores do mercado de capitais; (b) fazer com que o custo do capital no projecto coincida com aquele que os mercados financeiros estão a oferecer em operações financeiras de risco semelhante.
v Ora, no caso do NAL, estas regras apontam para uma metodologia estrita a todos os níveis:
a) O projecto teria de ser modular e permitir futuras expansões das facilidades aeroportuárias, mantendo-se o hub perfeitamente operacional – só assim haveria a certeza de que, nos primeiros anos, os tarifários não eram sobrecarregados com investimentos feitos em capacidades que só mais tarde poderiam ser rentabilizadas
b) O interesse do Star Alliance deveria ser aprofundado e formalizado (o que, a acontecer, resultaria num duplo benefício: reforçaria as medidas de controlo de custos e de tempos; aumentaria o interesse dos mercados financeiros)
c) O interesse do Sky Team deveria ser sondado também
d) Em resultado destes contactos preliminares, se fossem positivos, seria possível elaborar projecções bem mais credíveis que as actuais (pelo menos, aos olhos dos mercados financeiros) para os volumes de tráfego aéreo esperados e para cenários pessimistas (stress testing);
e) Essas projecções, conjugadas com tarifários competitivos, permitiriam estimar, com razoabilidade, os Resultados Operacionais esperados, os Fluxos de Liquidez Operacional esperados – e, mais importante talvez, o tecto para o custo do investimento nas diversas fases de expansão, o break even do projecto e o rating da dívida a emitir
f) Como o que há a financiar é o investimento no NAL e, não, o equilíbrio financeiro de todos e de cada um dos actuais aeroportos portugueses, é isso e só isso que deveria ser colocado nos mercados financeiros
g) Para que as negociações com os mercados financeiros não tropeçassem em obstáculos inúteis, os terrenos onde o NAL vá ser construído, as áreas de expansão previstas e a zona de implantação da cidade aeroportuária deveriam ser do domínio privado, objecto de posse administrativa (com justa indemnização) para evitar futuros movimentos especulativos que pusessem em causa o polo de desenvolvimento que irá surgir (como aconteceu, por exemplo, com a especulação imobiliária que engoliu a primitiva servidão aeroportuária da Portela e a primitiva servidão industrial da refinaria de Matosinhos)
h) Por fim, apresentar o projecto aos mercados financeiros e negociar a ordem de grandeza do custo de capital nos instrumentos de dívida a emitir pelo NAL.
v Aqui terminaria a intervenção mais activa por parte do Governo ou de quem ele designar, ficando, desde logo, claro que o Estado não seria: (a) nem Financiador do projecto; (b) nem Avalista da dívida que o projecto emitir; (c) nem Subscritor de nenhuma opção que garanta o reembolso dos capitais aí investidos ou uma remuneração mínima para esses capitais; (d) nem Dono da Obra; (e) nem Operador Aeroportuário.
v Ao Estado competiria agir tão-somente como Regulador, Licenciador e Supervisor. A procura demonstrável e a credibilidade do Promotor do investimento e do futuro Operador Aeroportuário deveriam ser suficientes para mobilizar os capitais necessários.
v Com o projecto assim delineado, o Governo abriria concurso para encontrar empreendedores interessados em levar o projecto por diante, em nome próprio e sob o seu próprio risco.
v Alternativamente, o Governo, ainda e só na função de Promotor e de Dinamizador do projecto, poderia constituir a sociedade que iria fazer seu o projecto NAL, lançando seguidamente uma OPV, ao par, sobre a totalidade das suas acções, mas reservando-se a selecção de uma maioria de controlo.
v A solução financeira que o Governo parece acarinhar assenta em três ou quatro pontos: (a) um esquema BOT (Build-Operate-Transfer) ou DBOT (Design, idem) em regime de concessão; (b) a entrega do capital social da ANA e das concessões que esta empresa detém (logo, dos Fluxos de Liquidez que os actuais aeroportos a ela concessionados, que as suas participações sociais e que os seus outros negócios gerarem daí em diante); (c) a prestação do aval do Estado, sempre que necessário (nomeadamente, se forem contraídos empréstimos junto do BEI); (d) talvez, a entrega compensatória (ou a venda a preço simbólico) dos terrenos da Portela, uma vez este aeroporto desactivado.
v Quero crer que, com o que escrevi até aqui, é perceptível que o Governo, talvez inconscientemente, irá criar oportunidades de arbitragem (isto é, ganhos sem risco) a que só uns poucos escolhidos terão acesso.
v Os escolhidos agradecem.
a. palhinha machado
Abril 2007