Curtinhas XXXVIII
o novo aeroporto de lisboa (nal) – III (cont.)
(Uma oportunidade única)
v Quando se pensa em construir um hub intercontinental (e é este tipo de aeroporto que vem imediatamente à ideia a propósito do NAL), há que assegurar, antes, tráfegos aéreos e utilizadores competitivos em rotas de longo curso. Dito de outro modo, há que encontrar parceiros entre os ATA.
v Presentemente, os hubs europeus que servem as rotas transatlânticas para a metade sul do Golfo das Caraíbas, para a América do Sul e para a África Ocidental (que designarei por rotas transatlânticas sul-oeste) não são tantos assim: Londres (com três aeroportos), Paris (com dois aeroportos), Madrid (Barajas) e Lisboa (quase a rebentar pelas costuras). Frankfurt e Milão estão já demasiado afastados da bacia atlântica para permitirem, nas referidas rotas, uma gestão rentável de aeronaves e tripulações.
v One World - É importante notar que Londres e Madrid são, ambos, aeroportos-base de companhias aéreas (BA e Iberia) que integram um mesmo ATA, este, e que competem directamente nas rotas transatlânticas sul-oeste, sendo pouco provável que, numa óptica de optimização do agrupamento como um todo, alguma aceite ceder à outra determinados fluxos de tráfego. A instabilidade do One World nestas rotas é ainda mais patente se repararmos que dele faz parte uma terceira companhia aérea (LAN Chile) que tem também objectivos ambiciosos no tráfego aéreo entre a América do Sul e a Europa, e que, por enquanto, é livre de escolher o hub europeu que melhor lhe convier.
v IBERIA - Em particular, as fragilidades da Iberia nas rotas para o Brasil e para a África Ocidental são notórias – talvez porque a BA, sua parceira no One World, lhe rouba espaço de manobra junto das feeders.
v Sky Team - Paris é o aeroporto-base da companhia aérea líder do Sky Team (Air France/KLM), forte no tráfego aéreo com a África Ocidental e com a América Central e Caraíbas, mas mais fraca nas rotas para a América do Sul, sobretudo para o Brasil.
v Star Alliance – É o ATA com melhor cobertura do espaço aéreo europeu (principalmente nas rotas norte/sul) e nas rotas para oriente, sendo igualmente muito competitivo nas rotas que cruzam o Atlântico Norte. Após o colapso da VARIG, o Star Alliance só conta com a TAP para as principais rotas transatlânticas sul-oeste (sobretudo para o principal hub sul americano, S. Paulo), onde a presença da Lufthansa (a companhia aérea líder neste ATA) conta pouco – situação que tem beneficiado muito a TAP.
v Nem Star Alliance nem Sky Team dispõem, na Europa, neste momento, de um hub bem localizado para as rotas transatlânticas sul-oeste (dado que o aeroporto da Portela, pela sua exiguidade, está longe de oferecer as condições de operação/exploração adequadas aos volumes de tráfego aéreo que, pelo menos, o Star Alliance pode encaminhar através de Lisboa).
v Tudo somado, fácil é concluir que estão reunidas, por uma vez, as condições que apontam para a localização, em Portugal, mais a sul que a norte, de um hub intercontinental de importância estratégica:
v Os concorrentes directos, (Madrid/Barajas) e IBERIA, têm, nas rotas transatlânticas sul-oeste, as fragilidades que apontei mais acima.
v Convém ter presente, também, que a tendência actual, em matéria de Aviação Comercial, vai no sentido dos acordos open sky – e não é de crer que as rotas transatlânticas sul-oeste escapem, por muitos anos mais, a esta evolução.
v Na perspectiva de as principais rotas transatlânticas sul-oeste, pelo menos essas, ficarem abrangidas, mais dia, menos dia, por acordos open sky, é fundamental para a continuidade da TAP, tal como hoje a conhecemos: (a) estar baseada num hub que sirva a estratégia de longo prazo do Star Alliance; (b) ser vista pelos seus parceiros no Star Alliance como uma transportadora aérea de referência nas rotas transatlânticas sul-oeste. Só assim a TAP será poupada à pressão concorrencial vinda dos seus próprios parceiros (à imagem do que acontece com a IBERIA no seio do One World). Porque a concorrência que os outros dois ATA hoje lhe movem, essa, só poderá intensificar-se.
v Não é líquido que o Sky Team venha a adoptar o hub de Lisboa para as rotas transatlânticas sul-oeste. E, se o fizer, poderá ser em articulação permanente com Paris, para onde continuarão a seguir os maiores volumes de tráfego aéreo de e para o Atlântico Sul.
v Mas sabe-se já duas coisas: (a) Que está fora de questão a AIR FRANCE/KLM usar Madrid/Barajas para as rotas transatlânticas sul-oeste; (b) Que a AIR FRANCE/KLM tem em estudo a construção, em Casablanca, de um hub intercontinental orientado, precisamente, para estas rotas (com todas os receios que a insegurança da área suscita).
Virá o novo aeroporto de Lisboa a situar-se em ... Casablanca?
v Mas, se este projecto for por diante, será exemplar a, pelo menos, dois títulos: (a) é o primeiro hub intercontinental construído num país que não possui, nem intenta possuir, uma transportadora aérea de longo curso; (b) é o primeiro hub promovido e patrocinado por um ATA. Ou seja, será um projecto percursor do futuro a consolidação e reforço dos ATA está a traçar: à revolução nos céus seguir-se-á a revolução na rede mundial das infra-estruturas aeroportuárias.
v A presença de um hub intercontinental concorrente um pouco mais a sul levará, quase de certeza, a que a rentabilidade do NAL diminua (por ter de praticar, então, tarifas a rasar os custos marginais dos hubs mais eficientes, ainda que localizados noutros quadrantes).
v Daqui concluo que a decisão sobre o NAL não pode ignorar a possibilidade de Casablanca – e limitar o custo do investimento será, também por esta razão, uma questão de sucesso para uns, e de sobrevivência para outros.
v Conhece-se o que pensa o Governo sobre as consequências de um possível hub em Casablanca nas contas que faz ao NAL? Ou sobre o papel dos ATA no redesenho das infra-estruturas aeroportuárias por esse mundo fora? Ou, enfim, sobre o posicionamento do NAL na rede de hubs que vai dar forma a todo o tráfego aéreo durante as próximas décadas? (cont.)
a. palhinha machado
Abril 2007