Marquês d’Ávila e Bolama
Mais um faialense no topo da política da metrópole portuguesa
Apesar da falta de escolas nos vários níveis educacionais na maioria das ilhas atlânticas, os açorianos deixaram no universo português a sua marca não só como colonizadores e desbravadores mas também como homens de expressão na política e nas letras.
António José de Ávila nasceu na Horta a 8/3/1806 e faleceu em Lisboa a 3/5/1881.
Era um dos quatro filhos sobreviventes dos 10 filhos de Manuel José de Ávila, sapateiro descendente de picoenses, e de Prudência Joaquina Cândida, lavadeira, faialense.
Desde cedo mostrou vocação para o estudo e ainda na cidade da Horta deu os primeiros passos na gramática, no latim e na filosofia. Mas no Faial, como nas demais ilhas açorianas daquele tempo, para seguir os estudos a níveis superiores era necessário ir para o exterior, na maioria dos casos para o Continente, mais exactamente para Coimbra, berço da instrução universitária portuguesa. E para isso era necessário ter-se recursos financeiros, coisa difícil para aquela gente que mal tinha para viver. O estudo era só para os nobres e morgados, possuidores da riqueza e do poder. Sorte teve António José, seu pai enveredou pelos caminhos do comércio e melhorou de vida e assim, percebendo o potencial do filho, pode matriculá-lo em Coimbra no ano de 1822.
Formou-se em filosofia com brilho e distinção. Voltou para a Horta e lá ocupou a vaga do então falecido professor Roque Taveira. Mas seu espírito curioso e esclarecido almejava mais do que aquela pequena ilha podia lhe dar. Sonhava ir para a França, queria estudar medicina em Paris. As perturbações políticas não deixaram realizar o seu intento.
Sua cultura e prestígio insular levaram-no para a política faialense. Eleito para a presidência da Câmara, suscitou nas famílias abastadas e notáveis da ilha, o sentimento mesquinho da inveja, a ponto da morgada Labat, progenitora de larga prole, comentar aos amigos, o que se tornou piada na cidade: “Este mundo... O filho do Manuel José na Câmara e os nossos meninos em casa...”.
Já nessa ocasião redigia à rainha D. Maria II medidas urgentes para o progresso da nação. Galgou os vários postos políticos. Passou para o Senado em São Miguel, lá criou um batalhão de voluntários para guarnecer a ilha durante a guerra Constitucional. Activista e conservador, pugnou e conseguiu a elevação da então vila da Horta a cidade. Defendeu a autonomia do Faial no Parlamento. Ascendeu rápido e alto, foi um caso de sucesso atípico, no meio da elite daquele tempo, onde as pessoas de origem humilde praticamente não tinham chances de projecção e aceitação social. Venceu pela sua competência e qualidades de político. De subprefeito de São Miguel foi para deputado, par do Reino. Foi eleito Governador Civil do distrito de Évora e aos 34 anos deram-lhe a pasta da Fazenda, que por sinal ocupou por quatro vezes. Quando a assumiu, as finanças portuguesas estavam de rastros, a economia debilitada e desacreditada. Suas acções, mesmo desagradando a muitos, conseguiram salvar o tesouro público português e restauraram a credibilidade económica da nação. Sua competência levou-o a ministro dos Negócios Eclesiásticos, dos Negócios Estrangeiros, e teve nas mãos a presidência do Ministério Português. Representou Portugal no Congresso de Estatísticas em Bruxelas, Berlim e Paris. À Espanha e a Paris foi enviado como ministro plenipotenciário. Mas célebre foi a sua actuação na questão da Ilha de Bolama, quando a Grã-bretanha, que tanto havia esbulhado o património português, queria mais essa pequena ilha, era questão de honra detê-la. E foi advogando em prol da causa portuguesa, fazendo valer os seus direitos junto ao árbitro da questão, o presidente americano, que conseguiu a resolução a favor de Portugal. Esse episódio valeu-lhe o título de Marques de Ávila e Bolama (mais tarde de Duque) em reconhecimento da Coroa pelo seu excelente trabalho em defesa do património português.
Esse açoriano filho de sapateiro de ascendência picoense teve muitas outras actividades de importância. Foi Governador do Banco de Portugal e Vice-Presidente da Academia Real de Ciências. Recebeu tantas condecorações e comendas que foi chamado pelo caricaturista Bordalo Pinheiro de “Calvário de Condecorações”.
É preciso lembrar às gerações que descendem dos açorianos que apesar de todas as limitações impostas a esse povo, ele não perdeu a capacidade de sonhar, de fazer e de se orgulhar, mesmo nas dificuldades e pobreza.
Uberaba, 24 de Março de 2007
Maria Eduarda Fagundes
Referência bibliográfica:
Anais do Município da Horta (Marcelino Lima)
Subsídios para a História da Ilha do Faial