NA MORTE DE SILVINO SILVÉRIO MARQUES, PORTUGUÊS
Senti muito o desaparecimento do “Nosso General”, oficial que eu tenho na mais elevada estima e consideração, quer pela minha condição de militar quer pela minha origem cabo-verdiana, conhecedor que sou da forma a um tempo valiosa, competente e, sobretudo, humanitária, como exerceu o seu cargo de governador em Cabo Verde.
Ficou para a História a decisão que ele tomou para minorar o problema das graves carências alimentares em Cabo Verde. Por seu despacho, nomeou uma comissão para elaborar o que ficou conhecido por “Plano de Abastecimento de Cabo Verde em Época de Seca”, 1959-1960, constituída pelo então capitão do Estado-Maior Arménio Nuno Ramires de Oliveira, hoje general reformado, pelo Dr. Júlio Monteiro e pelo Dr. Henrique Teixeira de Sousa. Este último teve, há uns anos, a amabilidade de me oferecer um exemplar desse Plano, em cuja introdução se pode ler: “Trata-se de um minucioso estudo de carácter oficial para o qual o Instituto de Investigação Científica Tropical não concorreu, nem com o seu pessoal, nem sequer com o seu patrocínio. O seu relatório, que é hoje um documento de inegável importância histórica, baseia-se em dados económicos e demográficos, utiliza informadores sobre a circulação de bens e de pessoas, e recorre a todos os índices de interesse para se estabelecer o projecto de combate aos efeitos gravosos das secas cíclicas de Cabo Verde, com as suas consequências desastrosas na população e também, na riqueza pecuária das ilhas. Todavia, para além de caracterizar situações, de pôr em confronto números que as indiciam, o projecto é mais ambicioso, visto propor soluções de emergência e soluções a longo prazo que poderiam, segundo os especialistas encarregados da missão, vir a mitigar os efeitos terríveis das secas”.
A verdade é que depois disso nunca mais voltaram a acontecer os calamitosos episódios de fome que marcaram tristemente a vida do arquipélago no passado.
Uma grande sensibilidade aos problemas humanos e o mais completo sentido de missão são os dois vectores principais que orientaram a acção do Governador. Pena é já não haver na actualidade Homens de semelhante têmpera e envergadura moral. As novas gerações, além de desprovidas de real preparação para o serviço público, parecem desatentas aos grandes exemplos do passado. É uma pena, e o problema é que estamos todos a pagar por este flagrante défice de valor e cidadania.
Pelos contactos que tenho com cabo-verdianos de boa cepa e gente séria, sei que o Governador deixou as mais gratas memórias em Cabo Verde. É o que ouço de pessoas da minha geração e de gerações mais velhas que têm em boa lembrança a sua acção governativa e o tamanho da sua humanidade. Certamente que as gerações mais novas não fazem a mínima ideia de quem seja o General Silvério Marques. E isso acontece em parte porque os que hoje detêm o poder não têm interesse em que a História se faça inteira e verdadeira, pelo que a informação pública não é de molde a realçar e a enaltecer Homens destes.
“Meu General”, também estou às suas ordens!
Coronel