«VAE VICTIS! VAE PARVULIS!»
A COMUNIDADE LUSO-BRASILEIRA
Quase onze milhões de quilómetros quadrados de territórios espalhados pelos cinco continentes e permitindo dar a volta ao mundo, num avião médio ou num pequeno navio, sem tocar senão em territórios portugueses ou brasileiros: mais de cento e sete milhões de almas abarcando todas as raças e religiões; cidades tão grandes, tão belas ou tão pitorescas como o Rio de Janeiro, Lisboa, São Paulo, Porto, Macau ou Coimbra; rios como o Amazonas, o Zaire, o Zambeze, o Tejo, o Cuanza, o Douro, o Rovuma e o Cunene; montanhas como a Estrela, a Chela, o Pico da Neblina ou o Ramelau; mais de doze milhões de crianças no ensino primário, dois milhões de rapazes e raparigas no ensino secundário e 54 universidades com cerca de 160.000 estudantes; o domínio absoluto na produção mundial de café; o primeiro lugar na produção mundial de cortiça, bananas, feijão, sisal e sementes de linho – tais são apenas algumas qualificações da Comunidade Luso-Brasileira à escala mundial...
Para quem pense alguns instantes no que significa existirem, na mesma comunidade, sem discriminação de raças nem de religiões, a alegria do minhoto, a austeridade do transmontano, a comunicabilidade jovial do brasileiro, a ironia do lisboeta, a perseverança do caboclo, a paciência e a delicadeza do macaísta, a bravura dos landins ou cuanhamas, o optimismo do negro, a frugalidade do amarelo, o poder de iniciativa do branco e tudo isto misturado no mestiço que é o novo homem do mundo lusíada, enriquecido com as virtudes dos mais nobres povos da velha Europa, de muitas etnias de África e de centenas de milhares de asiáticos que se juntaram no Brasil – quem se debruçar por momentos sobre esta espantosa e ímpar realidade demográfica da Comunidade Luso-Brasileira, não hesitará em concluir que é nela que melhor se realiza o Homem Universal.
REIS VENTURA, Manuel Joaquim (1910-1988), in "Em Defesa de Angola"
* * *
Como? Como é possível que hoje em dia, não haja Comunidade, nem Império, nem Irmandade, nem Solidariedade, nem União, nem sequer o legítimo orgulho de ser luso-português? Como é possível que andemos rastejando numa espúria "União Europeia", mendigando atenção e ordens, como um pobre desgraçado, perdido num mundo inóspito e trocista?
O que tornou isto possível? Foi um bando reduzido de "capitões" traidores e cobardes? Foi a pobreza de espírito duns fulanões vigaristas, estúpidos invejosos, ambiciosos oportunistas, que odeiam Portugal? Que foi? Foi tudo isto, ou foi o acaso? Não vou julgar ninguém, porque não tenho autoridade nem competência para o fazer, mas posso dizer, porque vi e senti, e com isso me arrepiei, que após certa data muito pacóvio se sentia ufano por estar em "democracia" e pertencer à "Europa", como se isso fosse alguma conquista e tivesse algum significado transcendente. Pobres daqueles que confundem uma grande derrota com uma vitória e largam tudo julgando ficar ricos com nada, não sendo franciscanos nem sequer tementes a Deus. Vae victis! Vae parvulis!
Joaquim Reis