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A bem da Nação

RAPAZIADAS

 

Parece que é um filme português, este título que engloba os três artigos de “Fórum” de Alberto Gonçalves, publicados no DN de 20 de Julho - «António, um rapaz de Lisboa». Um título abrangente, que, se se aplica ao primeiro visado numa acepção denotativa – António Costa – não deixa de, figurativamente, se estender, na especificidade caracterológica que nos define - talvez não mais de Zé Povinho sofrido e repontão – aos Antónios, Américos, Sérgios e muitos outros, seres vagos, arrastando-se numa vida anódina de repente, porque criados em horizontes de valores limitados, em que as ambições se satisfazem muitas vezes no velho esquema do encosto, nas “amizades” ou no colaboracionismo partidário, retirado o tapete da justiça ou dos critérios de evolução na cidadania segundo os parâmetros competitivos do valor próprio.

 

Esta forma genérica se aplicará ao caso do BE e das suas pretensões, ou à questão dos apoios governativos irrisórios à natalidade dos artigos seguintes. Quanto ao último – “Um mundo de fantasia” – consiste numa crítica à mistificação “politizada” da Banda Desenhada dos pretensiosos tempos actuais, adulterando os heróis, mesmo os míticos, segundo as farsas espampanantes das politiquices ou das ideologias que acompanham a evolução dos tempos, em abismos de despudor e ignorância atrevida, destruindo os mitos clássicos, que poderiam ser meios de informação cultural, em personagens burlescas, próprias das mentes alucinadas dos respectivos autores.

 

São, uma vez mais, textos desinibidos, estes de Alberto Gonçalves, de uma crítica de humor sardónico que, não poupando ninguém, mostra a necessária ponderação e conhecimento do panorama nacional, nos arranjismos de uns, nas contradições de outros, nos remendos apressados de propostas sem critério para fomento da natalidade.

 

Textos de uma leitura fácil e rica, que encantam e ensinam. Sem ilusões:

 

 

António, um rapaz de Lisboa

 

Resultado de imagem para alberto gonçalves ALBERTO GONÇALVES

 

A cada semana, António Costa revoluciona a ciência económica. Primeiro foi a tese de que a riqueza é preferível à austeridade, inovadora aplicação na macroeconomia do princípio de Maria Antonieta. Depois, descobriu que o problema não é o excesso de licenciados, mas a falta de empregos para licenciados (criam-se os empregos e a chatice fica resolvida). Agora, explicou a uma embevecida plateia de sindicalistas que "não há crescimento sustentável com endividamento, mas também não há crescimento sustentável com empobrecimento", sentença que se comenta sozinha.

 

Se não se aproximassem as férias, o Dr. Costa ainda estaria a tempo de dizer que: 1) o investimento público é melhor do que o privado excepto nos casos em que o investimento privado é melhor do que o público; 2) o Estado social é sustentável desde que saia baratinho aos cidadãos; 3) Portugal não deve sair do euro enquanto os euros entrarem em Portugal; 4) pelo menos na perspectiva dos destinatários, os salários altos são preferíveis aos salários baixos; 5) o Pato Donald é um boneco.

 

Brincadeiras à parte, o que é isto? Não é de agora que Portugal não se pode queixar em matéria de produção de políticos absurdos. Mas entre as nulidades sem uma ideia na cabeça e o Dr. Costa, em cuja cabeça fervilham centenas de ideias desconchavadas, vai uma diferença considerável. Já nem falo da tentativa de vender o homem a título de salvador da pátria: falo do homem propriamente dito e da deprimente comparação com aqueles a quem sonha suceder. Ao pé do Dr. Costa, Passos Coelho passa por um modelo de estadista, Sócrates por um sujeito quase ponderado, Santana por um governante responsável, Barroso por um gigante do pensamento, Guterres por um paradigma da racionalidade financeira e Cavaco, ele sim, pelo salvador da pátria que nunca foi. Perante o Dr. Costa, até o jovem António José Seguro parece habitar o mesmo planeta que os restantes mortais.

 

Em suma, o Dr. Costa é um embaraço ambulante. Logo, provavelmente será depois do Verão o líder do PS e, se os amigos o mantiverem calado entretanto, hipotético primeiro-ministro no ano que vem. Um pessimista vê à distância e, na lógica do "depois de mim virá", tende a imaginar que espécie de calamidade pode aparecer ao País após o Dr. Costa. Um optimista desconfia que, após o Dr. Costa, é improvável haver País.

 

Quarta-feira, 16 de Julho

 

O BE que fica e o BE que parte

 

Em geral, tendemos a pensar no Bloco de Esquerda enquanto uma agremiação divertida. Dispõe bem contemplar à distância os movimentos de grupos, subgrupos e facções de um único indivíduo que diariamente abandonam esse partido moribundo a caminho do PS e das carreiras com que o PS, sobretudo o PS do Dr. Costa, lhes acena. O facto de todos os fugitivos se desculparem com a necessidade de "contribuir para convergências à esquerda" torna a brincadeira hilariante. O pormenor de todos se esconderem atrás de siglas, organizações, princípios e estatutos solenes eleva a brincadeira ao nível da grande comédia.

 

Ocasionalmente, porém, um pedacinho da realidade irrompe para nos lembrar da natureza do BE, e de que esta não é só galhofa. O Médio Oriente, por exemplo. Bastou Israel reagir aos constantes ataques sofridos a partir de Gaza para o BE vir falar em "banho de sangue" e propor as sanções económicas do costume. E o costume inclui o desprezo do BE face a um Estado civilizado e a simpatia pela barbárie mais à mão. O costume é o BE negar as "causas" que lhe valeram 15 minutos de fama em favor do seu exacto reverso.

 

O ódio aos ricos? Os líderes de Gaza passeiam-se em aviões de luxo e apascentam fortunas em contas offshore. Os direitos LGBT? Em Gaza a homossexualidade é punida por lei e os seus praticantes fogem da tortura rumo a uma certa nação vizinha. A igualdade de género? A islamização do território reduz as mulheres a um pechisbeque silencioso e reprodutivo. A violência doméstica? Calcula-se que mais de metade das mulheres locais sejam espancadas pelos maridos pelo menos uma vez por ano - tradicional e recatadamente. E há as restrições às artes e à internet. O racismo oficial. A imposição violenta da "virtude". As conversões forçadas de cristãos. E, numa prática que o BE lamentará não se usar por cá, o fuzilamento de dissidentes.

 

Sob o verniz da trupe burlesca e as mesuras progressistas para consumo dos simples, o BE, o que parte e o que resta, é essencialmente isto: criaturas avessas à democracia que usam o sistema democrático para ganhar a vida. Darmo-nos ao trabalho de as distinguir é tão inútil quanto perguntar-lhes porque é que a indignação que Gaza lhes suscita não se estende à Síria ou ao Egipto. Ou porque é que só nas recentes implosões eleitorais descobriram intolerante um partido que nunca foi outra coisa. Ou porque é que, em suma, se confere relevância pública a declarados ou dissimulados inimigos do público.

 

Quinta-feira, 17 de Julho:

 

Feliz natalidade

 

Reduções no IRS em função do número de filhos. "Baixas" prolongadas e subsidiadas. Emprego em part-time subsidiado. Licenças parentais simultâneas. Redução do horário laboral. Oferta de "vales sociais". Incentivos à contratação de mulheres grávidas. Etc.

Ao todo, são 27 as medidas propostas no relatório da comissão para a política de natalidade a fim de aumentar a mesma. Podiam ser 72, já que a ideia é só uma: as pessoas não procriam porque, coitadinhas, precisam de trabalhar. Se não fizerem nenhum, farão filhos em abundância e Portugal apresentará "lá fora" taxas dignas do Mali e do Uganda. Cá dentro, porém, a coisa tenderá a complicar-se: não é preciso um doutoramento em economia para perceber que a relação directa entre a natalidade e o ócio é pouco amiga da produtividade. E a menos que os "fundos" europeus nos patrocinem mais esta habilidade, não se vislumbra quem, dentre um povo entretido a mudar fraldas no lar, a financiará. Claro que se o objectivo for atingir uma economia comparável à do Mali e do Uganda, um dos problemas - o do rejuvenescimento populacional - está resolvido.

 

Outro problema é a discriminação implícita nas medidas, que presumo não ocorra aos senhores doutores juízes do Tribunal Constitucional. É que, por incrível que pareça aos membros da comissão da natalidade, há portugueses que já não podem ter filhos, há portugueses que nunca puderam ter filhos e, segurem-se bem, há portugueses que rejeitam a possibilidade de ter filhos mesmo que lhes ofereçam dois anos de férias pagas na Riviera italiana por cada rebento. Aqui em casa habitam dois exemplos do último caso, e a ambos não apetece o tratamento de cidadãos de segunda, na perspectiva moral e, para o que realmente importa, na fiscal. Esta amostra que admito pequenina preferia que o Estado não se intrometesse na vida alheia, não estabelecesse padrões familiares e sobretudo não ignorasse os meios para atingir duvidosos fins. De resto, o fim desta história não promete.

 

Um mundo de fantasia

 

Desde os 10 ou 11 anos que não leio banda desenhada, incluindo aquelas de super-heróis. Se lesse, não as reconheceria. Ao que consta, Thor (o semideus escandinavo com martelo de São João) é agora uma mulher. E o Capitão América vai ser preto, perdão, afro-americano. Mas, informam os autores da mudança, não será um afro-americano qualquer, e sim "um homem moderno em contacto com os problemas do século XXI". Isto é, o novo Capitão América "terá uma maior empatia com os mais desprivilegiados" já que, cito, "foi assistente social". Apetecia-me deixar um comentário sobre a terminal idiotia do nosso tempo. Porém, enquanto o Homem-Aranha não for "transgénero" e Hulk não acumular as aventuras com a presidência de um observatório, julgo ainda haver esperança.

 

 Berta Brás

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