A SOCIEDADE DOS POVOS EM JOHN RAWLS - 7
5.1. Justiça Distributiva entre os Povos
Sobre este assunto existem duas conceções: uma sustém que a igualdade é justa, ou um bem em si mesma e outra observa que as desigualdades não são sempre injustas e quando o são, é por causa dos efeitos de injustiça na estrutura básica da Sociedade dos Povos.
Focaliza três razões, para a preocupação com a desigualdade numa sociedade nacional, aplicando-se cada uma delas à Sociedade dos Povos. Uma razão para reduzir as desigualdades, é diminuir o sofrimento e carências dos pobres não significando isto que tenha de haver igualdade em riqueza. Não importa o desnível entre classes sociais, o que interessa são as consequências. Essa distância não pode ser maior do que o permitido pelo critério da reciprocidade para que os menos favorecidos tenham meios bastantes para fazer uso inteligente e eficaz das suas liberdades e possam levar um estilo de vida razoável e digno.
A segunda razão para diminuir a distância entre ricos e pobres (com a injusta estigmatização/marginalização destes últimos), é evitar as convenções que estabeleçam hierarquias reconhecidas socialmente para alguns estratos sociais. Quando o dever de respeito e de reciprocidade é cumprido não existem sentimentos de inferioridade entre as pessoas ou entre os povos.
A terceira razão das desigualdades entre povos refere-se à necessidade de equidade no processo político da estrutura da Sociedade dos Povos, que assegura a honestidade das eleições e das oportunidades políticas a cargos público. A equidade básica entre povos é dada pela sua igual representação na segunda posição original com o seu véu de ignorância. Deste modo os representantes do povo quererão preservar a independência da sua própria sociedade e a sua igualdade em relação às outras. Pg.126, LP
Para manter a igualdade de oportunidades Rawls inclui na sua teoria uma educação imparcial para todos, eliminar a discriminação, intenções que, até ao momento, não foram concretizadas entre os povos pois o sistema internacional ainda não promoveu uma igualdade tão acentuada na educação e noutras esferas sociais devido, basicamente, ao elevado nível de desigualdades entre os próprios povos.
Entre os vários princípios para regular as desigualdades entre os povos dois deles são discutidos com Charles Beitz e outro, “o princípio igualitário” de Thomas Pogge, com que Rawls não concorda, não estando em causa a aceitação dos objetivos (presentes em ambos) de abranger instituições liberais ou decentes, garantindo os Direitos Humanos e satisfazendo as necessidades básicas (a coberto do dever de assistência).
Rawls discorda da posição de Beizt quanto aos dois princípios diferenciados por este, que são: princípio de redistribuição de recursos (que visa ajudar os países pobres em recursos naturais através da produção autárquica/nacional) e o princípio de distribuição global (que funcionaria de forma análoga ao princípio usado no caso nacional, dando um princípio de justiça distributiva entre as sociedades, crendo que a riqueza dos países se deve aos seus recursos. Contudo, Rawls indica … o elemento crucial do desempenho de um país é a sua cultura política - as virtudes políticas e cívicas dos seus membros - e não o nível dos seus recursos: a arbitrariedade na distribuição dos recursos naturais não causa qualquer dificuldade. Pg. 128, LP.
Para validar sua posição Rawls considera dois casos ilustrativos:
- países liberais ou decentes com mesmo nível de riqueza, o primeiro industrializa-se e aumenta a taxa de poupança (real), enquanto o segundo mantém sua estrutura agrária, preferindo reafirmar seus valores sociais. Após algumas décadas, o primeiro país detém duas vezes mais riqueza que o segundo;
- no segundo caso, que é similar, o índice de crescimento populacional é elevado em ambas as sociedades, liberais ou decentes, sendo que ambos os países (bem-ordenados) respeitam justiça igual para as mulheres, sendo que no primeiro caso as mulheres desenvolvem atividade crescente, ao nível económico e político, decrescendo a natalidade, e aumentando o nível de riqueza ao longo do tempo. A segunda sociedade, devido ao predomínio de crenças, valores religiosos e sociais, venerados, sobretudo, pelas mulheres, não reduz a sua taxa de crescimento populacional, a qual se mantém elevada. Após algumas décadas, a primeira sociedade estará duas vezes mais rica que a segunda. Rawls não considera justo que no primeiro caso o país industrializado seja taxado para dar fundos ao segundo, argumentando que esses povos são livres e responsáveis, capazes de tomar suas próprias decisões e escolher os seus caminhos.
Apesar dos princípios estabelecidos por Rawls, para a Sociedade dos Povos a igualdade absoluta não pode ser obtida de forma definitiva. A opção é reduzir ao mínimo possível as desigualdades entre os povos, sendo esse o ideal primordial para a sociedade internacional (dos povos).
Rawls observa que a diferença entre um princípio igualitário global é o dever de assistência. O princípio igualitário global tem por objetivo ajudar os pobres, em todo o mundo, propondo, para o efeito, um “Dividendo Geral de Recursos” a ser pago por cada sociedade a um fundo internacional administrado com esse propósito. Enquanto o dever de assistência procura elevar os pobres do mundo até que sejam cidadãos livres e iguais, de uma sociedade liberal, ou membros de uma sociedade hierárquica decente.
(continua)
Benilde Ferreira Tomaz da Fonseca