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A bem da Nação

CURTINHAS Nº 76

 

ICH BIN EIN BERLINER!

 

 

 A tragédia grega tem trazido ao proscénio os costumeiros bem-pensantes com as costumeiras soluções: deite-se-lhe dinheiro para cima, que a coisa há-de passar.

 

 Obviamente, dinheiro de alguém, outros quaisquer, seja quem for. Sempre que não se vá ao bolso e às mordomias dos bem-pensantes, que nada é suficiente para os compensar do tempo que se dignam dedicar-nos e do bem que nos fazem.

 

 Valha-nos Santa Ângela Merkel que diz: “Basta! Quem vive acima das suas posses tem a miséria por destino. É tempo de todos esses que assim têm vivido aprenderem a viver com o que têm – mas, primeiro, pagam o que devem”.

 

 Nós por cá daríamos prova de sageza se, por uma vez, desertássemos do team José Manuel & Cia (que insiste em manter-nos subsídio-dependentes, subservientes, anestesiados pelo crédito fácil e pelas “transferências sociais” que, só por paródia, nos prometem inesgotáveis) para envergar, orgulhosos, a camisola da Santa Ângela (logo eu que nunca pensei canonizar nenhum alemão).

 

 Querem uma medida crua da situação a que chegámos? Esqueçam os deficits orçamentais e observem a série estatística dos deficits da Balança de Transacções Correntes (BTC). Sempre acima de 8% do PIB há mais de 10 anos (o que nunca mereceu uma palavra sequer àqueles que têm sido pagos para nos governar; o povo está contentinho, isso é que é importante”).

 

 Está ali, na BTC, o espelho do nosso endividamento interno e externo, o véu que tem mascarado a fragilidade de grande parte do nosso sector produtivo e de todo o nosso tecido económico – e a prova provada de que temos vivido bem acima das nossas posses.

 

 Será que os nossos bem-pensantes ainda não descobriram que os impostos não podem pagar tudo? Por exemplo, não pagam deficits da BTC.

 

 São os credores externos, aqueles que tornaram possível a bolha de crédito e de consumo que a Banca portuguesa alimentou desde 1997/98, a dizerem-nos agora: “Acabou! Tempo de pagar as dívidas”. Santos Mercados, Deo gratias.

 

 Por vezes, dá a impressão que os nossos governantes, ingénuos, estão em crer que conseguem extorquir mais uns dinheiritos aos Investidores externos - como fazem com o contribuinte por mor do Diário da República. Esquecem-se que aos Investidores externos só duas contrapartidas interessam: risco reduzido e isenções fiscais. Nada que a Despesa Pública possa comprar.

 

 Pede-se agora, mais do que nunca, liderança:

- Para se conseguir pagar o grosso das dívidas que fomos contraindo desde meados da década de ’90 – na sua maior parte poisada nos Passivos dos nossos Bancos;

- Para terminar de vez com a ficção dos direitos adquiridos (direitos que aqueles que os reclamam na rua não reconhecem ao treinador de futebol, ou ao comerciante da esquina que não é capaz de competir com as grandes superfícies, por mais que se esforce);

- Para fazer prevalecer o Estado de Direito sobre o Estado Social;

- Para nos ensinar a lidar com o risco e a incerteza;

- Para nos conduzir finalmente ao modelo de mercado e ao mundo de hoje;

- E para pôr os nossos Bancos na ordem (o que significa, exigir-lhes mais capital, mais transparência e melhor gestão do risco).

 

 Os Gregos (não tenham dúvidas, nós somos o elo frágil seguinte, façam-se as contas que se fizerem) podem ser convidados a sair do Euro?

 

 Só se estiver preparado já um Plano de Contingência para apoiar os Bancos e outras Instituições Financeiras do núcleo duro da zona-Euro que têm os seus Balanços atafulhados de dívida grega (e portuguesa e espanhola e italiana e...) – por regra, Dívida Pública e dívida de Bancos. E os montantes necessários para os aguentar não serão tão diferentes assim daqueles que o Governo Grego agora pede pelas alminhas (o que até pode ser um ponto a favor dos Gregos).

 

 O mais certo é o núcleo duro da UEM criar um super-Euro, com tabuleta à porta: Members only. E porteiro musculado para dissuadir os penetras. O controvertido EMF (European Monetary Fund) promete ser mais ou menos isso.

 

 Na realidade, é extremamente difícil sair “por baixo” de uma União Monetária (porque causa o colapso de todo o sistema financeiro nacional), mas é relativamente fácil sair “por cima” (quando se registam, ano após ano, superavits na BTC e se pode confiar em Bancos sólidos). Suspeito que Santa Ângela, nas suas asceses místicas, já deve ter tido visões destas (mas talvez não faça grande fé na solidez dos Bancos alemães, por enquanto).

 

 Nós por cá necessitamos é de um Pacto de Desendividamento (melhor diria: uma cura de desendividamento) que não conte com a ajuda nem da inflação (seria a via mais rápida para a nossa ruína) nem do crescimento económico (que terá de esperar primeiro que a transferência de recursos do Sector de Bens não Transaccionáveis para o Sector de Bens Transaccionáveis comece a produzir efeitos na BTC; e é preciso que quem governe saiba como isso se faz). E isso dói. Olá se dói.

 

 E doerá muito mais se o rating internacional da Dívida Pública portuguesa de longo prazo descer abaixo de “A-“ (ou equivalente), pois, se tal acontecer, estes títulos deixarão de ser aceites como garantia nas operações de tomada de fundos junto BCE. O que é dizer, para os Bancos (os de cá e os de lá de fora) a Dívida Pública portuguesa tornar-se-á pouco interessante – e despertar-lhes, de novo, o interesse é coisa para nos custar uns 3%-5% acima do que temos estado a pagar.

 

 Quantos dos actuais devedores (Famílias e Empresas por igual) conseguirão resistir a este salto nos custos financeiros? E para onde irá o malparado dos Bancos, se tal acontecer? E que futuro para os Bancos com perdas da ordem de grandeza que é fácil adivinhar?

 

 Que apareça alguém que fale com clareza e convicção, para dizer que há dores que valem a pena - porque nos reconduzem à realidade de onde temos de zarpar.

 

 A outra dor, aquela que espreita já ali na esquina da História (e que José Manuel & Cia, na sua burocrática ignorância, nos querem infligir), doerá muito mais, por ser a dor do nosso naufrágio.

 

Março de 2010

 

 A. Palhinha Machado

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