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A bem da Nação

A IMPORTÂNCIA DE SER POLIDO

 

 

Estudando a “ficção jurídica” denominada Ética nas últimas décadas, pude constatar que uma das carências do convívio contemporâneo é a polidez. A indigência vernacular dos que não leem pode suscitar a indagação: “O que é polidez?”. Não custa, então, fornecer sinônimos: amabilidade, civilidade, cortesia, delicadeza, diplomacia, educação de berço, gentileza, lisura, urbanidade.

 

Um ser “polido” é a criatura afável, amável, atenciosa, ética, áurea, bem-criada, bem-educada, cerimoniosa, correcta, cortês, distinta, galante, luzidia, urbana.

 

Dá para entender por que falta polidez na convivência? O que mais se vê é a grosseria, a indelicadeza, a falta de modos. Mesmo pessoas escolarizadas – nada a ver com polidez o facto de ostentar diplomas – não cumprimentam, não se levantam diante de mulher ou de pessoa mais velha. Ignoram a presença do próximo.

 

Daí para a rispidez, para a irritação, para a impaciência em grau crescente, até à violência, é um caminho inevitável. Reflectir sobre isto é fundamental para um Brasil cada vez mais pródigo em ostentar níveis preocupantes de violência. Aquela escancarada, a resultar em número absurdo de mortes – somos o 5º país em perdas vitais resultantes da violência – e aquela disfarçada na insensibilidade, na frialdade do trato, na indiferença que não deixa de ser uma espécie de crueldade.

 

O mundo inteiro apercebeu-se de que algo há-de ser feito para reverter a tendência egoística. Foi assim que aplaudiu Tony Blair que, em 2003, declarou guerra à incivilidade. Após a sua terceira vitória nas eleições legislativas, insistiu na urgência de restabelecer a “cultura do respeito”.

 

Para nós, militantes da arena jurídica, o respeito não é senão reflexo do princípio norteador da dignidade humana. Ver o outro – qualquer outro – como finalidade intrínseca, não como meio, é imperativo categórico kantiano. Mas não precisamos de sofisticação alguma, nem de singular erudição para sermos polidos. “Sem a polidez”, dizia o ensaísta Alphonse Karr, “não nos reuniríamos senão para combater. É preciso, portanto, ou viver só, ou ser polido”.

 

É o que pais e mães – ou os que exercerem o seu papel – têm obrigação de lembrar a seus filhos.

 

 Renato Nalini

Juiz

COMPARAR COM 1974

 

Dívida Pública em % do PIB (1850-2010)

 

 

Constantemente ouvimos comparar estatísticas actuais com as de 1974, como se Portugal tivesse parado no tempo nesse ano. Um jornal escreveu que “Cravinho disse que Portugal está hoje muito melhor do que em 1974”. Não podemos saber como estaria o país se não tivesse havido a revolução. Mas, 40 anos depois, estaria certamente bem diferente do que era em 1974.

 

Sem que isto seja uma apologia da anterior ditadura –  que o regime actual também é, pois os cidadãos, além de não se poderem candidatar a  deputados, só podem eleger quem meia dúzia de ditadores escolheu –  gostaria de ver algo mais do que a simples comparação apresentada. Deveriam ser apresentados os gráficos da evolução dessas estatísticas, não apenas de 1974 a 2014, mas também dos quarenta anos antes, ou seja, de 1934 a 2014. Só assim seria legítimo ver como os diferentes valores evoluíram.
É muito longa a lista que deveria ser considerada, lembrando apenas alguns: população; esperança de vida; PIB (valores e taxa de crescimento anual); inflação; dívida pública (valores e taxa de crescimento anual); défice governamental (em valor absoluto, em percentagem do PIB e taxa de crescimento anual); leque salarial; analfabetismo; escolaridade (descriminando básico, secundário e superior); escolas construídas (descriminando básico, secundário e superior, em número de escolas e em metros quadrados de construção); saúde; ciência (separando a produzida pelas universidades, pelos laboratório de investigação do estado, por entidades privadas sem fins lucrativos e por entidades empresariais e indicando os quantitativos investidos nessa actividade, descriminando, quando houver, os que foram dados pelo estado a estas entidades); marinha, de pesca, de recreio, mercante e militar; exército; aviação, civil e militar; agricultura, incluindo florestas e pecuária; indústria, extractiva e transformadora; comércio, etc.

 

Não é um trabalho difícil de fazer, pois a recolha de dados é possível consultando as estatísticas. Do estudo da evolução desses dados, que gostaria de ver em tabelas e em gráficos, deverá ser possível tirar interessantes conclusões. Ao longo desse período de 80 anos, os valores deveriam ser dados ano a ano. Alguns autores, talvez para encurtar o gráfico, usam as médias dos decénios. É um sistema perigoso, que pode levar a conclusões erradas, como já tive ocasião de mostrar a propósito de um gráfico apresentado pelo Dr. Medina Carreira.

 

Afigura-se-me que um estudo como este, certamente com muitos acrescentos e algumas alterações, daria uma boa tese de doutoramento em economia ou sociologia. Abrangendo um período relativamente longo – 80 anos – e, portanto, atravessando diferentes situações do mundo, as conclusões que permitiria tirar talvez até atingissem o campo da ciência política.

 

Publicado no Público de 11 de Agosto de 2014

 

 

 

Miguel Mota

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